UNIVERSIDADE DE SANTA CRUZ DO SUL - Unisc
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<strong>UNIVERSIDA<strong>DE</strong></strong> <strong>DE</strong> <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong><br />
PRÓ-REITORIA <strong>DE</strong> PESQUISA E EXTENSÃO<br />
MESTRA<strong>DO</strong> EM <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO REGIONAL<br />
O BASQUETEBOL EM <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong><br />
Gilmar Fernando Weis<br />
Santa Cruz do Sul.<br />
1996.
<strong>UNIVERSIDA<strong>DE</strong></strong> <strong>DE</strong> <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong><br />
PRÓ-REITORIA <strong>DE</strong> PESQUISA E EXTENSÃO<br />
MESTRA<strong>DO</strong> EM <strong>DE</strong>SENVOLVIMENTO REGIONAL<br />
O BASQUETEBOL EM <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong><br />
Gilmar Fernando Weis<br />
Dissertação apresentada ao curso de<br />
Mestrado em Desenvolvimento Regional<br />
da Universidade de Santa Cruz do Sul<br />
como requisito à obtenção do título de<br />
Mestre.<br />
Área de concentração: Sócio-cultural.<br />
Orientador: Dr. Phil. Jorge Luiz da<br />
Cunha<br />
Santa Cruz do Sul,<br />
1996.<br />
1
Dissertação defendida e aprovada, em 25 de abril de 1996, pela<br />
Banca Examinadora constituída pelos professores:<br />
Prof. Dr. Phil. Jorge Luiz da Cunha<br />
Prof. Dr. Dinizar Ferminiano Becker<br />
Prof. Dr. Renato Saul<br />
Prof. Ms. Luiz Fernando Kruel<br />
Prof. Dr. Francisco Camargo Neto<br />
Santa Cruz do Sul, 25 de abril de 1996.<br />
2
AGRA<strong>DE</strong>CIMENTOS<br />
�� Ao professor Dr. Phil. Jorge Luiz da Cunha, pela sua dedicação,<br />
paciências, simplicidade, interesse e, sobretudo pelas palavras de<br />
motivação na orientação do presente trabalho.<br />
�� A todos os professores do Mestrado em Desenvolvimento Regional da<br />
Universidade de Santa Cruz do Sul, especialmente ao professor Dr.<br />
Renato Saul incentivador e responsável pela escolha do tema do<br />
presente trabalho.<br />
�� A Universidade de Santa Cruz do Sul pela oportunidade que me<br />
proporcionou em levar em frente meu projeto de vida através de seu<br />
programa de capacitação docente.<br />
�� A todas as pessoas que, de uma forma ou de outra contribuíram para a<br />
realização deste trabalho.<br />
�� Meu agradecimento à professora Denise Beatriz Weigel que dedicou<br />
parte de seu tempo na revisão dos originais.<br />
�� A minha esposa Roci e filha Carolina motivos de minhas buscas dentro<br />
do saber.<br />
3
RESUMO<br />
Na cidade de Santa Cruz do Sul a modalidade esportiva do basquetebol<br />
tem se configurado como um elemento de especial importância. O basquetebol<br />
combina-se com aspectos culturais e econômicos complementando-os,<br />
contribuindo assim para a formação da imagem, não somente da cidade, mas<br />
da região. Os descendentes de imigrantes alemães sempre se destacaram nas<br />
mais variadas modalidades esportivas, como a ginástica, o atletismo, o<br />
voleibol, o futebol e, mais tarde, o basquetebol em crescente importância. O<br />
trabalho pretendeu recuperar a trajetória histórica do basquetebol desde a sua<br />
implantação na Sociedade Ginástica, em 1931, até 1994. Desde 1990 o<br />
basquetebol, especialmente a equipe formada pelo Corinthians Sport Club, tem<br />
vivido um acelerado processo de profissionalização; graças principalmente à<br />
celebração de parcerias com empresas de grande potencial econômico que<br />
viabilizaram recursos financeiros para aquisição e manutenção de jogadores de<br />
excelência. Em 1994 o basquetebol alcançou seu auge com a obtenção do<br />
título de Campeão da Liga Nacional de basquetebol, fazendo de Santa Cruz do<br />
Sul a capital gaúcha e brasileira desta modalidade esportiva. Foram utilizados<br />
como metodologia a combinação de instrumentos de pesquisa documental da<br />
História Oral e Histórias de Vida de pessoas envolvidas com o tema abordado.<br />
Fez-se um estudo desde a chegada dos imigrantes alemães em Santa Cruz do<br />
Sul, sua preservação das tradições, como e porque surgiu o basquetebol e<br />
quem o praticou e pratica atualmente. Com os dados obtidos na pesquisa,<br />
concluiu-se que: a) Os descendentes de imigrantes alemães sempre foram<br />
adeptos e afeitos a todas as modalidades esportivas; b) As duas sociedades de<br />
maior tradição no basquetebol criadas em Santa Cruz do Sul sofreram<br />
influências dos métodos Ginásticos Europeus; c) A popularidade do<br />
basquetebol não se alicerça no número de praticantes e sim no número de<br />
aficcionados e torcedores; d) A discriminação racial se transforma no momento<br />
em que o jogador negro retribui na quadra, com boa performance esportiva; e)<br />
A discriminação racial se tornou mais branda a partir de 1990, quando o<br />
basquetebol passou da condição de amador para a condição de profissional; f)<br />
O negro não tem tido uma participação mais efetiva no basquetebol<br />
santacruzense devido a discriminação racial a que é submetido ainda nas<br />
categorias de base, e, finalmente g) As mulheres a exemplo dos negros,<br />
também foram vítimas da discriminação.<br />
4
ABSTRACT<br />
In Santa Cruz do Sul, basketball has been placed as a special element of<br />
great importance. Basketball arranges itself along cultural and economical<br />
aspects, suplementing and contributing then for formation of the image, not only<br />
the city, but te whole region.The descendents from German immigrants have<br />
always standed out in many sorts of sports, such as gymnastics, athletics,<br />
voleiball, soccer and, most lately, basketball becoming more important.This<br />
paper intended to recover basketball historical trajectory since its introduction in<br />
sociedade Ginástica, in 1931 to 1994. Since 1990 basketball, specially the team<br />
organized by Corinthians Sport Club has lived an accelerated<br />
professionalization process. Due to important partneship with great economical<br />
potencial companies which viabilized financial sources for the acquisition and<br />
maintenance of highquality players. In 1994, basketball reached its peak by<br />
obtaining the title of National Basketball League Champions, and Santa Cruz do<br />
Sul became the “city” of basketball.In relation to methods, it was utilized a<br />
combination of instruments, research based on documental sources, personal<br />
and lives experiences from people envolved with the described subject. A study<br />
was made since the arrivel of German immigrants in Santa Cruz do Sul,<br />
maintenance of their tradition, how and why basketball emerged, and, those<br />
who practiced it and who does nowadays. a) The descendents from German<br />
immigrants were always fit to all kinds os sports. b) The two clubs of great<br />
basketball tradition created in Santa Cruz do Sul suffered influences from<br />
european gymnastics methods. c) Popularity of basketball is not related to the<br />
number of practitioners but to the number of fans. d) Race discrimination issue<br />
changes at the moment in which the black player retributes in basketball court<br />
whit a good performance. e) Race discrimination issue has become more gentle<br />
since 1990, when basketball became professional. f) Black man has not had a<br />
more efective participation in the local basketball due to race discrimination<br />
which is submited ye at younger levels. g) Women were also victims os<br />
discrimination as well as black men.<br />
5
SUMÁRIO<br />
INTRODUÇÃO........................................................................................... 7<br />
1 <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong>: Das Origens à Atualidade............................... 10<br />
2 A CULTURA ESPORTIVA <strong>DO</strong>S IMIGRANTES EM <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong><br />
<strong>SUL</strong>............................................................................................................ 21<br />
2.1 Sociedade Ginástica............................................................................ 30<br />
2.2 Corinthians Sport Club........................................................................ 33<br />
2.3 Grêmio Atlético Sampaio..................................................................... 39<br />
3 A INFLUÊNCIA <strong>DO</strong>S MÉTO<strong>DO</strong>S GINÁSTICOS NA CRIAÇÃO DAS<br />
SOCIEDA<strong>DE</strong>S ESPORTIVAS...................................................................<br />
3.1 As Sociedades Fundadas em Santa Cruz do Sul e os Métodos<br />
42<br />
Ginásticos Europeus................................................................................. 50<br />
3.1.1 O Método Ginástico Alemão............................................................. 52<br />
3.1.2 O Método Ginástico Sueco............................................................... 55<br />
3.1.3 O Método Ginástico Francês............................................................ 61<br />
4 A HISTÓRIA <strong>DO</strong> BASQUETEBOL......................................................... 64<br />
4.1 O Basquetebol no Brasil...................................................................... 68<br />
4.2 A Introdução do Basquetebol em Santa Cruz do Sul.......................... 69<br />
4.3 A Evolução do Basquetebol em Santa Cruz do Sul............................ 71<br />
5 REFLEXOS DA DISCRIMINAÇÃO RACIAL........................................... 110<br />
6 PIONEIRISMO NO BASQUETEBOL FEMININO................................... 119<br />
CONCLUSÃO............................................................................................. 139<br />
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................... 144<br />
6
INTRODUÇÃO<br />
O basquetebol foi introduzido em Santa Cruz do Sul, em 1931 na<br />
Sociedade Ginástica e, mais tarde, em 1939, foi implantado no<br />
Corinthians Sport Club. Com muitas dificuldades, os imigrantes<br />
alemães criaram sociedades esportivas no intuito de manter sua<br />
cultura, laços sociais e o espírito festivo que sempre os caracterizou. A<br />
cultura alemã, a agroindústria do fumo e o basquetebol compõem<br />
juntos, o quadro característico de Santa Cruz do Sul, que pode ser<br />
definido como sua marca.<br />
Desde cedo, Santa Cruz do Sul foi notícia de jornal como "Capital<br />
dos Esportes no Interior Gaúcho" e, confirmando o sucesso da<br />
comunidade em relação ao esporte, obteve várias conquistas de<br />
campeonatos estaduais. Recentemente, o título de campeão da Liga<br />
Nacional de Basquetebol foi conquistado pela equipe de Santa Cruz do<br />
Sul a PITT/CORINTHIANS.<br />
Em uma pesquisa de campo realizada por professores da UNISC,<br />
em 1993, o basquetebol já era apontado como o quarto esporte na
preferência da população urbana, perdendo somente para o futebol,<br />
futsal e voleibol.<br />
Alguns autores (BETTI; LENK), dizem que o esporte é o único<br />
movimento social que conseguiu se estender tão rápido em um curto<br />
espaço de tempo; tornando-se, atualmente, um elemento fundamental<br />
na constituição das sociedades, firmando-se no mundo globalizado do<br />
capitalismo.<br />
O basquetebol combina com os aspectos culturais e econômicos<br />
complementando-os e conferindo ao todo uma roupagem de sucesso,<br />
realização e força: - resultado do próprio caráter do basquetebol, que<br />
como o futebol, é um esporte intensamente competitivo que demanda<br />
grande condicionamento físico, técnico e tático dos atletas. No<br />
cotidiano do competitivo mercado capitalista, fica quase impossível não<br />
deixar de relacionar o esporte em geral e o basquetebol em particular -<br />
onde a melhor defesa é o ataque -, com a desenfreada concorrência e a<br />
busca incansável de lucro, e de sucesso.<br />
Em Santa Cruz do Sul, o basquetebol transformou-se nos últimos<br />
anos num componente inerente à existência do município, imprimindo-<br />
lhe originalidade e compondo seu “merchandising”, revitalizando e<br />
devolvendo sua energia à sua população. A esse respeito Hillmann<br />
(1993) diz que os eventos esportivos não são catárticos,<br />
tranqüilizadores. Ao contrário, os espectadores de uma partida<br />
8
esportiva ficam mais excitados depois do que antes de entrar no<br />
ginásio, ficando assim toda a cidade rejuvenescida quando seu time<br />
caminha em direção às finais. Nesse momento, uma revitalização<br />
ritualizada está em jogo.<br />
A dissertação compõem-se de seis capítulos, onde,<br />
primeiramente situa-se a origem do imigrante alemão e todo o<br />
processo de lutas e dificuldades enfrentadas desde a chegada em<br />
Santa Cruz, em 1849, a valorização e o significado da sua cultura<br />
esportiva e tradições culturais do povo alemão; a influência dos<br />
métodos ginásticos europeus na criação das sociedades esportivas,<br />
mais especificamente a Sociedade Ginástica, o Corinthians Sport Club<br />
e o Grêmio Atlético Sampaio, que possuem seus departamentos de<br />
basquetebol em atividade; um retrospecto do basquetebol em Santa<br />
Cruz do Sul desde 1931 até 1994, com a conquista do título do<br />
Campeonato Nacional de Basquetebol; a pequena participação do<br />
jogador negro de basquetebol em Santa Cruz do Sul e, finalmente, as<br />
dificuldades enfrentadas pelas mulheres em times de Santa Cruz do<br />
Sul.<br />
9
1 <strong>SANTA</strong> <strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong>: das origens à atualidade<br />
O atual município de Santa Cruz do Sul, situado ao norte do Rio Jacuí,<br />
encosta inferior do nordeste do Rio Grande do Sul, teve a sua primeira leva de<br />
imigrantes alemães assentada em 19 de dezembro de 1849, todos provenientes da<br />
Alemanha, insatisfeitos com a política e a falta de oportunidades na Alemanha.<br />
Montali (1980, p. 43), coloca que a instabilidade política e falta de<br />
oportunidades para numerosa parcela da população alemã teve seu início em 1830,<br />
quando se iniciou a revolução industrial na Alemanha. Vários fatores contribuíram<br />
para que ocorresse a imigração. Entre esses pode-se destacar:<br />
“a) artesãos que viviam em cidades ou em aldeias não podiam competir com<br />
os produtos manufaturados produzidos nas fábricas;<br />
b) a não sujeição por parte de muitos à proletarização que obrigava homens,<br />
mulheres e crianças a enfrentar uma jornada de trabalho que variava entre<br />
13 e 16 horas em condições sub-humanas;
c) a mecanização da lavoura que criou um excedente populacional nos<br />
campos, provocando, conseqüentemente, intenso êxodo rural”.<br />
Não foram apenas os relatos de sucesso que fizeram com que houvesse uma<br />
enxurrada de imigrantes alemães para o Brasil. Em Cunha (1991, p.20) encontra-se<br />
algumas causas que tiveram influência decisiva para que estes imigrantes<br />
deixassem sua terra natal em busca de lugares desconhecidos, e que alterassem<br />
seus costumes e tradições, fortemente arraigados:<br />
“a) a expansão do capitalismo com o declínio do feudalismo, provocando o início<br />
da industrialização, que se de um lado criou condições para o incremento<br />
do comércio exterior colocando a Alemanha como concorrente da França e<br />
Inglaterra, por outro trouxe efeitos devastadores sobre as condições de<br />
vida da população alemã;<br />
b) a destruição do regime de campesinato foi socialmente cruel, visto que para<br />
a classe burguesa era preciso, urgentemente, em nome do crescimento<br />
industrial alterar a estrutura social vigente no campo, que consistia numa<br />
produção autônoma de subsistência e de trocas de produtos agrícolas<br />
excedentes para a relação monetária;<br />
c) o crescimento da população foi outro fator decisivo para o aumento da<br />
miséria, visto que a procura de terras para a agricultura se tornou cada vez<br />
maior provocando a pulverização das propriedades, não havendo mais, em<br />
muitas regiões, possibilidades de produzir sequer para o sustento da<br />
11
família; gerando desta forma a emigração para as cidades que não<br />
possuíam a infra-estrutura necessária para absorver o contingente<br />
populacional excedente dos campos. “<br />
Os primeiros colonizadores que aqui chegaram eram provenientes de<br />
diversas províncias alemãs que formavam a Confederação Germânica. Entre estas<br />
podemos citar a Renânia, a Silésia, a Prússia, a Pomerânia, Hannover e Oldenburg,<br />
com a predominância de imigrantes das províncias prussianas do norte (KIPPER,<br />
1979).<br />
Estes colonos imigrantes vieram atraídos pelos relatos de sucesso dos<br />
primeiros imigrantes que se instalaram na vizinha colônia de São Leopoldo, que<br />
acalentavam o sonho da aquisição de terras para a construção de um melhor futuro<br />
para suas famílias. Outro aspecto que chama a atenção é de que estes imigrantes<br />
eram bastante religiosos, católicos e protestantes, instalavam-se lado a lado, embora<br />
a religião oficial do Império fosse a católica (KIPPER, 1979).<br />
Linha Santa Cruz foi o primeiro núcleo da colonização germânica na colônia<br />
de Santa Cruz, e foi a partir dos deslocamentos de moradores deste núcleo e com a<br />
ajuda de novos imigrantes que foram sendo fundados novos núcleos.<br />
Cunha (1991), afirma que, no início, praticamente todos os bens eram<br />
produzidos pela própria família, onde a circulação da moeda era rara,<br />
predominando a troca dos produtos plantados como garantia de sobrevivência<br />
(milho e feijão), a criação de animais e a produção dos pomares.<br />
12
Os serviços de carpintaria e alvenaria assim como os bens necessários à<br />
subsistência, eram igualmente responsabilidade da família que, via de regra,<br />
utilizava somente a mão-de-obra de seus próprios membros.<br />
No período pioneiro, 1849 a 1859, a economia colonial fundamentada na<br />
produção familiar lembra muito a estrutura da produção familiar medieval (CUNHA<br />
1991, p.132):<br />
A família camponesa medieval constituía uma comunidade<br />
econômica que se bastava a si mesma, auto-suficiente; uma<br />
comunidade que não somente produzia seus próprios meios<br />
de subsistência, senão que também construía sua<br />
habitação, seus móveis e utensílios domésticos, que<br />
fabricava seus instrumentos de trabalho, curtia as peles,<br />
fiava o linho à lã, confeccionava suas roupas, etc, etc. O<br />
camponês ia ao mercado, por certo, porém não vendia<br />
senão uma sobra de sua produção comprando supérfluos,<br />
exceção feita ao ferro que se servia limitadamente. Do<br />
mercado podia depender sua comodidade, porém de<br />
nenhum modo sua existência.<br />
Nos primeiros anos as dificuldades foram enormes e segundo relatórios do<br />
engenheiro João Martin Buff, diretor da colônia e responsável pela demarcação das<br />
terras, o fumo era produzido em quantidade suficiente para consumo próprio. Já a<br />
partir de 1851 eram exportadas algumas arrobas de fumo em rama, nos dando a<br />
certeza de que as sementes e técnicas de cultivo deste produto foram trazidas pelos<br />
imigrantes que já possuíam experiência no cultivo do mesmo (CUNHA, 1991, p.139-<br />
140).<br />
Em 8 de janeiro de 1859, pela lei nº 432, portanto apenas 10 anos após a<br />
chegada dos primeiros imigrantes, o Governo provincial, em reconhecimento ao<br />
13
desenvolvimento da colônia, elevou a condição de Freguesia a povoação de Santa<br />
Cruz, no então município de Rio Pardo, dotando a mesma de uma capela católica e<br />
uma escola pública (MONTALI, 1980).<br />
Um dos maiores problemas enfrentados pelos colonos que já produziam<br />
excedentes era o escoamento da produção, feito em carretas e em lombos de<br />
burros, levando dias para chegar ao destino, o que dificultava o desenvolvimento e o<br />
crescimento da colônia.<br />
Como pode-se observar, muitas foram as dificuldades dos imigrantes que<br />
aqui se estabeleceram, principalmente no período inicial, que vai de 1849 até 1859.<br />
Já com relação ao segundo período, 1860-1881, Montali (1980) afirma que pode ser<br />
considerado como aquele em que o artesanato e o comércio começaram a se<br />
estruturar, criando o mercado capitalista, os excedentes agrícolas produzidos aqui<br />
eram trocados por produtos manufaturados de outros Estados, principalmente Rio de<br />
Janeiro e São Paulo e até mesmo do exterior.<br />
Em 30 de outubro de 1872, aconteceu a emancipação da colônia, aprovada<br />
pela Assembléia Legislativa Provincial. Santa Cruz tornou-se distrito de Rio Pardo.<br />
Esta condição durou apenas 5 anos. Pela Lei nº 1079 de 31 de março de 1877, a<br />
colônia tornou-se um município autônomo batizado pelo nome de São João de<br />
Santa Cruz (KIPPER, 1979).<br />
Embora entre 1860 e 1881 houvesse um grande aumento da produção de<br />
fumo, milho, feijão e erva mate é importante destacar que o milho e o feijão eram<br />
14
usados, principalmente, para o consumo interno, mas também contribuíam como<br />
produtos de exportação, embora em menor escala. Percebe-se que a produção se<br />
dividia em produção para a subsistência e de mercado.<br />
Mesmo com o grande crescimento verificado na região concernente à<br />
produção agrícola, pode-se constatar que o trabalho desenvolvido pelos colonos era<br />
bastante rudimentar, isto pode ser comprovado pelos dados estatísticos que indicam<br />
que em 1866 havia 753 estabelecimentos agrícolas e apenas 118 arados. A<br />
estrutura da unidade de produção e consumo familiar também era pequena, sendo<br />
que apenas a família trabalhava na lavoura e esta era composta de no máximo 4<br />
pessoas (MONTALI, 1980).<br />
O comércio passou a estruturar-se a partir de 1860, sendo que Porto Alegre<br />
passou a ser o centro comercial de toda região colonial e o comerciante rural passou<br />
a exercer importante papel, funcionando como intermediário entre os produtores<br />
agrícolas e os centros de consumo, pois o mesmo recebia os produtos dos colonos e<br />
providenciava no seu transporte para os locais de consumo (VOGT, 1994).<br />
O problema do transporte foi historicamente um dos entraves mais<br />
importantes ao desenvolvimento da região. As estradas que ligavam Santa Cruz a<br />
Rio Pardo, distante 40 Km, não tinham a mínima condição de tráfego. As mesmas<br />
eram abertas pelo pisotear das mulas e rodado das carroças, abrindo desta forma,<br />
caminhos estreitos, muitas vezes impossíveis de transitar, sendo este um dos<br />
principais empecilhos para o desenvolvimento econômico da colônia.<br />
15
O comerciante rural além de oferecer serviços de transporte e manter postos<br />
de trocas para produtos locais, exercia o papel de banqueiro, emprestando dinheiro<br />
com a cobrança de juros e não era raro observar que estes colonos depositavam<br />
quantias em dinheiro e pagavam uma taxa para que o mesmo fosse guardado<br />
(MONTALI, 1980).<br />
A acumulação de capital pelos comerciantes iniciou-se em virtude das trocas<br />
de produtos agrícolas excedentes por produtos manufaturados e cobranças de taxas<br />
de transportes dos produtos coloniais. Segundo Vogt (1994), havia uma relação de<br />
dependência entre os comerciantes e o produtor, pois o mesmo além de comprar os<br />
produtos excedentes adiantava-lhe produtos que garantiriam a sobrevivência de sua<br />
família até a próxima safra.<br />
Diante das dificuldades de transporte da produção da região, a população<br />
clamava por uma estrada de ferro que ligasse a cidade com seu principal porto - Rio<br />
Pardo, e com a capital - Porto Alegre, que sem dúvida seria uma alavanca para o<br />
progresso da economia local além de agilizar o escoamento da produção agrícola<br />
que, como foi citado anteriormente, era muito precário impedindo o desenvolvimento<br />
de melhores condições de concorrência no mercado.<br />
Em 1882, a câmara enviou o pedido para a construção da via férrea ao<br />
presidente da província justificando o pedido pela falta de uma via navegável e de<br />
boas estradas. Em abril de 1888 foi aprovado o pedido, a estrada de ferro ligando<br />
Santa Cruz com a Estação do Couto, em Rio Pardo, foi inaugurada oficialmente em<br />
19 de novembro de 1905. Borges de Medeiros, que ocupava o cargo de presidente<br />
16
do Estado na época, aproveitou a oportunidade para anunciar que Santa Cruz fora<br />
elevada a categoria de cidade, justificando ser a via férrea uma reivindicação antiga<br />
da comunidade e que certamente daria um novo impulso ao crescimento econômico,<br />
principalmente em relação às exportações, e que a mesma seria um prêmio "a um<br />
povo tão ordeiro e trabalhador". (KRAUSE, 1991).<br />
A construção da via férrea e as melhorias nas vias de escoamento que davam<br />
maior agilidade às transações comerciais, fez com que houvesse um grande<br />
desenvolvimento no comércio, que até então tinha como base a comercialização de<br />
produtos coloniais no mercado local e regional, e passasse também a exportar<br />
produtos agrícolas para outras regiões do Rio Grande do Sul e até para outros<br />
Estados brasileiros (MONTALI, 1975).<br />
Além da ligação ferroviária outros fatores contribuíram decisivamente para o<br />
crescimento da região. Entre estes, pode-se destacar a instalação de uma rede<br />
telegráfica em maio de 1889, ligando Rio Pardo a Nonoai, passando por Santa Cruz,<br />
e a iluminação pública inaugurada em agosto de 1906.<br />
O primeiro banco inaugurado em Santa Cruz do Sul foi o Banco da Província,<br />
em 1904, com a finalidade de oportunizar empréstimos a juros acessíveis, bem<br />
como depósitos a todos seus associados. A partir de 1904 outros bancos foram<br />
sendo inaugurados. A fundação destes bancos na rede do município veio ratificar o<br />
crescimento e desenvolvimento verificado na indústria e no comércio (KRAUSE,<br />
1991).<br />
17
Foi principalmente, o sucesso da exportação de produtos agrícolas locais que<br />
iniciou a industrialização, permitindo, no começo do século XX, o surgimento de<br />
novas instalações industriais com tecnologia mais avançada.<br />
Em 1916 Santa Cruz do Sul já possuía 12 empresas com uma considerável<br />
estrutura, isto é, com capital razoável, força motriz, valor de produção e número de<br />
operários em crescimento (KRAUSE, 1991).<br />
Outro fato importante, que não pode deixar de ser mencionado, é a formação<br />
da União Comercial e Industrial que foi fundada em 1917 e que tinha como meta<br />
principal organizar os setores comerciais e industriais e torná-los mais competitivos<br />
(KRAUSE, 1991).<br />
Montali (1975), considera que, no período compreendido entre 1918-1965, a<br />
relação de produção no interior das unidades de produção agrícola continuava não<br />
sendo capitalista, pois todo o trabalho realizado era feito pelo proprietário e membros<br />
da família, normalmente ajudado por um dos filhos e no máximo dois. Não havia,<br />
portanto, mão-de-obra assalariada fixa a não ser, eventualmente, para algum tipo de<br />
serviço especializado ou cuja urgência o justificasse.<br />
A partir de 1918, as agroindústrias de fumo começaram a interessar-se pelo<br />
cultivo do mesmo, passando a interferir diretamente na sua produção com o objetivo<br />
de melhorar a qualidade do produto. Começa, então, uma relação de dependência<br />
econômica entre indústria e agricultor, que precisa vender o seu produto para<br />
garantir os meios necessários para a sua subsistência (MONTALI, 1975).<br />
18
O mesmo ano marca uma crescente presença das indústrias fumageiras em<br />
Santa Cruz do Sul. A companhia de fumos Souza Cruz, aquela que ditava a política<br />
de preços pagos aos agricultores, de 1918 até 1947, viveu uma ascenção muito<br />
grande, fazendo sentir sua presença na economia local e regional. De 1948 até<br />
1968 houve uma crise muito grande neste setor devido a superprodução, perda de<br />
clientes no exterior e da política anti-inflacionária adotada pelo governo que passou<br />
a restringir o crédito para as operações industriais, o que afetou consideravelmente<br />
o cultivo do fumo (VOGT, 1994).<br />
As restrições impostas pelo governo federal e que atingiam principalmente as<br />
indústrias nacionais, propiciaram a entrada de empresas estrangeiras que tinham<br />
acesso a empréstimos com juros mais baixos, facilitando a compra de empresas<br />
locais, que não tinham estas facilidades, obrigando os empresários a se desfazerem<br />
de suas empresas por preços apenas razoáveis (VOGT, 1994). Contudo, a<br />
transferência da agroindústria fumageira de capital nacional para grupos<br />
estrangeiros representou um salto tecnológico.<br />
Segundo Vogt (1994), as empresas multinacionais que se instalaram em<br />
Santa Cruz do Sul implantaram uma tecnologia de ponta, melhorando sensivelmente<br />
a qualidade e quantidade do produto, possibilitando um pequeno aumento no preço<br />
pago aos produtores.<br />
De 1965 até 1985 ocorreu uma evolução nas exportações do fumo, e a partir<br />
de 1985 estes índices de exportação se estabilizaram, permancendo até hoje, com<br />
pequenas alterações em torno de 200 mil toneladas/ano (VOGT, 1994).<br />
19
Se de um lado a tecnologia de ponta tem trazido melhorias em relação à<br />
quantidade e qualidade do produto, por outro lado vem originando problemas de<br />
ordem social. O emprego da tecnologia de ponta na indústria fumageira tem<br />
conseguido aumentar a produtividade nas fábricas com a utilização de um número<br />
cada vez mais reduzido de operários, principalmente em épocas de safra (MONTALI,<br />
1975).<br />
Santa Cruz do Sul possui, atualmente (1995), uma população de 91.170<br />
habitantes, sendo considerado o maior centro produtor e beneficiador de fumo do<br />
Brasil, produzindo em torno de 400.000 toneladas/ano (Santa Cruz do Sul, SMIC,<br />
1992).<br />
De acordo com pesquisa realizada pela Universidade de Santa Cruz do Sul -<br />
<strong>Unisc</strong>, existem atualmente 298 indústrias, 2.260 estabelecimentos comerciais, 1.676<br />
prestadores de serviços e 3.516 trabalhadores autonômos (op. cit).<br />
Segundo a Secretaria Municipal da Fazenda, o município contribui com uma<br />
carga tributária ao Estado de 7,41% e para a União de 0,4%. O volume de<br />
arrecadação coloca o município na 7º posição no Estado (op. cit).<br />
20
2 A CULTURA ESPORTIVA <strong>DO</strong>S IMIGRANTES EM <strong>SANTA</strong><br />
<strong>CRUZ</strong> <strong>DO</strong> <strong>SUL</strong><br />
Instituições de caráter religioso, esportivo, cultural e econômico têm sido<br />
utilizadas historicamente pelos imigrantes alemães e seus descendentes como<br />
agentes veiculadores do “germanismo” (Deutschtum), procurando manter as<br />
tradições, costumes e preservando laços de amizade (GERTZ, 1991).<br />
O imigrante alemão que chegou à região de Santa Cruz do Sul com a idéia de<br />
melhorar suas condições de vida e a de seus familiares, encontrou muitas<br />
dificuldades e preocupou-se, logo depois de tomadas as providências necessárias à<br />
sua subsistência, com o cultivo de seus costumes e de suas tradições culturais e,<br />
entre essas, principalmente, a língua alemã (KIPPER, 1968).<br />
Na busca da manutenção dos laços de afetividade, preservação da cultura e<br />
tradições alemãs, muitas sociedades de cunho esportivo e recreativo foram criadas<br />
no Brasil, no Rio Grande do Sul e, mais especificamente, em Santa Cruz do Sul.<br />
Tanto os imigrantes alemães como os seus descendentes além de se reunirem em<br />
comunidade com o objetivo de defenderem-se e amparar-se mutuamente,
cultivavam o lazer como uma das formas de manter suas raízes culturais, e esse<br />
espírito associativo originou uma série de sociedades culturais, recreativas e<br />
esportivas (KIPPER, 1979).<br />
Na Alemanha, a ginástica tinha grande importância e ocupava espaço<br />
importante na vida cotidiana. A ginástica figurava entre as principais ocupações,<br />
principalmente entre os jovens e, nas escolas, os alunos não eram dispensados da<br />
prática da educação física, a não ser que fossem apresentados atestados médicos<br />
(OLIVEIRA, 1987).<br />
A ginástica, em toda a Alemanha, era obrigatória. Todos os professores dessa<br />
área tinham que, necessariamente, conhecer a origem histórica, o valor da prática<br />
para o processo educacional e os efeitos anátomo-fisiológicos da ginástica.<br />
Buscando manter a tradição esportiva tão arraigada na cultura de seu país de<br />
origem, o imigrante alemão procurou logo recuperar essa tradição, criando<br />
sociedades onde pudesse cultivar a prática esportiva, sem o que, na fase inicial de<br />
assentamento e instalação, não pôde ser feito por questões de sobrevivência<br />
(KIPPER, 1968).<br />
As sociedades de cavalaria criadas em Santa Cruz do Sul foram as pioneiras<br />
do Estado e tinham como principal objetivo, a sadia recreação e a conservação dos<br />
bons costumes, além de oferecer a seus membros oportunidade de mostrar sua<br />
habilidade no manejo do cavalo. Alguns fundadores dessas sociedades, antes de<br />
emigrarem para o Brasil, ocupavam postos no exército alemão (KIPPER, 1968).<br />
22
Torneios de lanceiros montados, que buscavam acertar um alvo com uma<br />
lança, já eram conhecidos entre as legiões romanas e chamavam-se "quintanas". Na<br />
literatura medieval, festivais de lanceiros são, inúmeras vezes, mencionados. No<br />
começo da Idade Moderna, os torneios de lanceiros eram muito comuns entre a<br />
nobreza, mas também ocorriam nas cidades. Já no começo do século XIX, tais<br />
torneios começaram a se tornar comuns entre a população camponesa da<br />
Alemanha, onde especialmente os jovens solteiros exercitavam-se em suas<br />
montarias para participar dos torneios em que tentavam, com lanças de dois metros<br />
de comprimento, alcançar um alvo suspenso, confeccionado de couro com furos ou<br />
um anel feito do mesmo material (PETZOLDT, 1983).<br />
A finalidade das sociedades de cavalaria encontra exemplo nos estatutos do<br />
"Deutschbrasilianischer Cavallarie Stechklub" de Ponte Rio Pardinho, que teve a sua<br />
fundação em 1899:<br />
“a) Exercitar-se no cavalgar e, com a lança, acertar o alvo.<br />
b) Sã recreação social, conservação das boas maneiras e dos bons<br />
costumes”. (KIPPER, 1968, p. 69).<br />
As finalidades dessas sociedades para com os jovens associados tinham<br />
como meta o aspecto esportivo e o convívio coletivo, mas, na prática, os exercícios<br />
sobre montarias tinham cunho militar, demonstrando a estreita ligação entre<br />
recreação e adestramento.<br />
23
O esporte exercia uma atração muito forte sobre os agricultores de<br />
descendência germânica, que procuravam, nessas entidades desportivas, o convívio<br />
social e oportunidades para habilitar-se nas práticas esportivas e marciais.<br />
Em todas as competições esportivas que envolviam os lanceiros, os<br />
competidores zelavam sempre por suas montarias que recebiam selas, estribos e<br />
outros apetrechos em perfeitas condições (HARTLEBEN, 1952).<br />
Waechter (1995), em entrevista oral, afirmou que, para fazer parte da<br />
sociedade, o candidato deveria ser indicado por um membro e efetuar o pagamento<br />
de uma taxa. Somente depois desses trâmites é que era feita uma votação secreta<br />
na qual era decidida a aceitação ou não do pretendente.<br />
Enfatizou ainda o processo da votação:<br />
24<br />
A votação era bastante interessante, consistia de duas caixas, uma de cor<br />
branca e outra de cor preta e cada membro colocava uma bolinha dentro<br />
da caixa com a respectiva cor. Se, na contagem das bolinhas brancas e<br />
pretas houvesse o predomínio das brancas sobre as pretas, o pretendente<br />
faria parte como associado da agremiação, caso contrário, não seria aceito.<br />
Oliveira (1987) diz que os torneios realizados pelos lanceiros na região de<br />
Santa Cruz do Sul consistiam em acertar, com uma lança, alvos que tinham onze<br />
furos numerados: cada cavaleiro, com seu cavalo a galope, tinha que acertar os<br />
alvos com uma lança em punho, e a cada lanceiro eram concedidas três tentativas.<br />
Aos poucos, algumas sociedades passaram a utilizar-se de uma cadeira que<br />
deslizava sobre um cabo de aço estendido em um terreno inclinado com o fim de
proporcionar velocidade à cadeira, sendo que o cavaleiro sentado na cadeira, com<br />
sua lança, tentaria atingir o alvo descrito anteriormente.<br />
Mas, a partir do momento em que algumas sociedades passaram a utilizar-se<br />
de cadeiras para substituir os cavalos, passaram, também, a idéia de que a<br />
manutenção das montarias era um fardo muito pesado para a maioria dos<br />
associados, que não possuíam condições para manter as despesas. O fato é que<br />
esse esporte já começava a perder a sua identidade, pois uma coisa é ter que<br />
acertar os furos montado em um cavalo, e outra, bem diferente, é acertar de cima de<br />
uma cadeira que proporciona uma melhor estabilidade aos competidores.<br />
Existiam dois tipos de sociedades de cavalaria: os "ulanos" e as "sociedades<br />
de cavaleiros-lanceiros", que, a princípio, tinham, em sua estrutura interna, o mesmo<br />
objetivo: manter o espírito de germanidade através de festas, torneios, bailes. A<br />
diferança básica entre essas agremiações dava-se através do uniforme, sendo que<br />
os primeiros se espelharam nos uniformes dos oficiais dos regimentos de ulanos da<br />
Alemanha, e os segundos, mais humildes e que tinham que se adaptar à dura<br />
realidade das linhas coloniais mais pobres, usavam uniformes mais modestos se<br />
comparados ao dos membros das sociedades de ulanos (KIPPER, 1968).<br />
A última sociedade de ulanos de Santa Cruz do Sul, o "Ulanenklub", encerrou<br />
suas atividade em 1939, depois de cinqüenta e quatro anos de existência. O<br />
fechamento se deu como consequência da campanha de nacionalização deflagrada<br />
pelo governo de Getúlio Vargas, que também atingiu a região de Santa Cruz do Sul.<br />
(Gazeta do Sul, 27 e 28.09.1985, p.17). Havia o temor por parte das autoridades de<br />
25
que houvesse alguma conspiração nazista em curso entre a população de origem<br />
imigrante.<br />
Os membros dessas sociedades, com medo de maus tratos e de<br />
perseguições a si e a suas famílias desfizeram-se de objetos que pudessem vir a ser<br />
considerados subversivos.<br />
As demais sociedades de lanceiros também começaram a acelerar seu<br />
processo de dissolução a partir de 1940, quando algumas sofreram<br />
constrangimentos pelos mesmos motivos acima expostos. Após a guerra, poucas<br />
sociedades voltaram a ser reativadas e estas poucas, começaram a enfrentar outros<br />
problemas relacionados principalmente ao progresso. Os jovens foram atraídos por<br />
outros esportes e outras formas de divertimento como o cinema e o rádio (KIPPER,<br />
1968).<br />
Na região também foram criados, pelos imigrantes e seus descendentes, as<br />
sociedades de atiradores. A primeira a ser criada foi o "Deutscher Schützenverein"<br />
em 1882, que também foi fundada com objetivos como o da manutenção do espírito<br />
de germanidade. A fundação da primeira sociedade de atiradores aconteceu 30<br />
anos após o início da imigração, quando os colonizadores já haviam fundado<br />
escolas e igrejas.<br />
Nas sociedades de tiro ao alvo, a disciplina era fundamental, pois ali se<br />
formavam, ainda que indiretamente, excelentes soldados para o serviço da Pátria.<br />
Esse fato, mais tarde, que mais tarde era comprovado durante o serviço militar, pois<br />
26
os jovens, membros das sociedades de atiradores, distinguiam-se dos demais pelas<br />
habilidades adquiridas no manejo das armas e nos exercícios de ordem unida.<br />
O método de ginástica alemão foi um dos elementos componentes da<br />
ideologia do germanismo, que tinha como objetivo a preparação dos jovens para a<br />
guerra, isto é, preparar homens e mulheres fortes e robustos, para servir à causa da<br />
unidade do território nacional alemão, que ainda não existia antes de 1871, e cuja<br />
realização foi obra militar (SOARES, 1994). Assim, considerando-se as<br />
características e os objetivos das primeiras sociedades fundadas ainda na colônia<br />
alemã de Santa Cruz, depreende-se a influência que o método ginástico alemão<br />
teve sobre seus idealizadores e participantes.<br />
Waechter (1995) salientou ainda o mérito da criação em 1904, da primeira<br />
sociedade de damas, o "Damenverein", clube que promovia às festas sociais e<br />
oferecia à suas associadas a prática de bolão de mesa, do Kegelklub (grupo de<br />
bolão) em 1912 e do fussballklub (futebol) em 1932, todas na cidade de Santa Cruz<br />
do Sul.<br />
A campanha de nacionalização, do Governo Vargas (1937 - 1945) atingiu<br />
muitas sociedades fundadas em Santa Cruz, assim também a Sociedade Ginástica e<br />
o Corinthians Sport Club, sendo que a primeira sofreu maiores represálias em<br />
função até do nome "Turnerbund", que, em alemão, significa sociedade ginástica.<br />
Na Sociedade Ginástica foram recolhidos muitos documentos e livros em alemão.<br />
Essa mesma atitude foi tomada em relação às escolas e igrejas onde eram proibidos<br />
o ensino e os sermões em língua alemã.<br />
27
Existem casos bastante pitorescos que ocorreram durante a campanha de<br />
nacionalização. Um diz respeito a um busto de Vater Jahn 1 , apreendido pela polícia<br />
sob a alegação de ser este um propagador do nazismo.<br />
A título de ilustração gostaria de transcrever o teor do ofício que se encontra<br />
31<br />
transcrito na Ata nº 6 (p.56) da reunião do dia 26 de fevereiro de 1948, da<br />
Sociedade Ginástica, enviado pelo delegado de polícia, Sr. José Henrique Mariante,<br />
ao Sr. Romildo Knak, presidente da Sociedade Ginástica.<br />
28<br />
Ao assumir esta Delegacia de Polícia, encontrei, entre tantos outros objetos<br />
apreendidos, um busto de Vater Jahn, criador da ginástica Sueca (sic) e<br />
propagador dos princípios de saúde e desen-volvimento físico da<br />
sociedade universal. Surpreso fiquei em encontrá-lo nesta repartição,<br />
apreendido como adepto do nazismo, quando a sua existência no mundo<br />
foi de cem anos antes, nascido em 1778 e falecido em 1851, denominado o<br />
pai da ginástica, nada tinha "a ver" com a doutrina daquele que deixou o<br />
universo em desorganização e a sua própria pátria em perfeito caos.<br />
Assim, isentado Vater Jahn da responsabilidade como quinta-colunista,<br />
devolvo a esta digníssima sociedade o busto em referência, para que volte<br />
ao seu papel digno de patrono de uma agremiação cujo caráter de<br />
brasilidade nunca foi posto em dúvida.<br />
Muitas foram as represálias sofridas pelas sociedades esportivas em Santa<br />
Cruz do Sul. No Corinthians Sport Club, não foi diferente. Em ofício enviado pelo<br />
Delegado de Polícia, Brasil Seadi, à diretoria do clube, datado de 20 de abril de<br />
1941, eram pedidas providências imediatas quanto ao envio dos seguintes<br />
documentos:<br />
1 Friedrich Ludwig Jahn (1778-1852), criador do sistema ginástico que consistia em<br />
preparar os jovens à dura e rígida vida militar, além de procurar, através de<br />
exercícios, dar e conservar a saúde. Também conhecido por Turner Vater (Pai da<br />
Ginástica Alemã), foi uma das figuras mais significativas da história da educação<br />
física. Estudou Teologia, Literatura Germânica e formou-se em Filosofia (Grifi, 1989,<br />
p.229.)
a) relação nominal dos sócios, com a nacionalidade de cada um;<br />
b) relação dos membros da diretoria, com a nacionalidade de cada um;<br />
c) os estatutos;<br />
d) o regulamento interno do Corinthians Sport Club.<br />
Em outro documento, Ofício nº 476 de 1942, enviado pelo Delegado de<br />
Polícia da 3ª Região Policial, François Néhme, eram dadas instruções sobre<br />
algumas medidas que, acreditava, deveriam ser tomadas pela diretoria do clube com<br />
a maior brevidade possível:<br />
a) nenhum elemento de nacionalidade alemã, mesmo brasileiro naturalizado,<br />
poderia fazer parte da diretoria da sociedade;<br />
ser retirado.<br />
b) o dístico em língua alemã, impresso no busto de Carlos Trein Filho, deveria<br />
Durante o Estado Novo a Secretaria de Segurança Pública do Estado<br />
preocupou-se especialmente com as sociedades esportivas. As autoridades<br />
entendiam que essas poderiam ser um campo fértil para propaganda nazista na<br />
época.<br />
29
Na verdade, muitas sociedades se filiavam ingenuamente a uma liga de<br />
Sociedades Alemãs (Verband Deutscher Verein), que era subordinada à liga das<br />
Sociedades Alemãs no Exterior (Verband Deutscher Verein in Ausland), que ditava<br />
as normas aos clubes alemães no exterior. (OLIVEIRA, 1987).<br />
O partido nazista, através do departamento que ditava as normas aos clubes<br />
alemães no exterior, tentava se infiltrar em sociedades e clubes nas regiões de<br />
colonização alemã, especialmente no sul do País, oferecendo auxílios para as<br />
sociedades teuto-brasileiras, verbas para aquisição de material necessário para<br />
treinamento ginástico e esportivo, bolsas de estudo, livros didáticos e viagens. Em<br />
troca dessas vantagens, os clubes e sociedades deveriam propagar e seguir as<br />
diretrizes do Führer e Chanceler do Reich Adolf Hitler (HOFMEISTER 1987).<br />
Kipper (1979) coloca que, apesar de a população de Santa Cruz do Sul ter<br />
preservado as tradições germânicas, a língua, os costumes e a leitura, a propaganda<br />
hitlerista nunca encontrou, entre a maioria, a simpatia que os órgãos repressores<br />
imaginavam, embora houvesse um pequeno grupo- não mais do que dez pessoas -<br />
que distribuía panfletos pela cidade com propaganda nazista.<br />
2.1 Sociedade Ginástica<br />
Criada em Santa Cruz do Sul com o nome de Turnverein Santa Cruz, (a atual<br />
Sociedade Ginástica), foi fundada em 15 de setembro de 1893.<br />
30
A sua primeira sede localizava-se ao lado do atual Museu do Colégio Mauá,<br />
na rua Marechal Floriano. O terreno pertencia a Gustavo Iserhard. Hardy Martin, em<br />
uma série de artigos publicados no jornal Gazeta do Sul a partir de 29 de março de<br />
1993, sob o título "Centenário da Ginástica", afirma que foram fundadores da<br />
Sociedade Ginástica: Richard Textor, Bernhard Krische, Paul Schönwald, Philipp<br />
Hagemann, Karl Bartholomay, Theodor Sommerfeld, Wilhelm Keber, Georg Schütz,<br />
Heinrich Schmidt, Max Butze, Wilhelm Lamberts, F. Schnepfleitner, Paul Dietrich e<br />
Ferdinand Günther.<br />
A sociedade foi criada com fins sociais, culturais e esportivos sendo grande a<br />
adesão de novos associados, demonstrando grande motivação por parte da<br />
população santa-cruzense em relação à prática de exercícios físicos que<br />
proporcionavam a educação do corpo.<br />
No estatuto submetido à aprovação na Assembléia Geral Extraordinária em<br />
abril de 1938, encontramos no Capítulo I, "Das Finalidades da Sociedade", Art.1:<br />
31<br />
A finalidade da Sociedade Ginástica Santa Cruz é promover e auxiliar a<br />
educação física e moral de seus associados, tornando-os sadios e fortes,<br />
de maneira a torná-los consócios e aptos para o serviço da Pátria.<br />
Procurar-se-á alcançar este objetivo pela prática de exercícios de ginástica,<br />
tais como atletismo, escoteirismo, excursões ginásticas, natação e canto;<br />
pela manutenção de biblioteca adequada, pela organização de festas e<br />
exibições de ginástica de canto ou de reuniões de famílias.<br />
Percebe-se, claramente, que essa sociedade fundada ainda no século<br />
passado, tem imbricada no seu estatuto (Capítulo I Art. 1) forte, influência do método
alemão, que busca a realização e a formação de um homem forte robusto e<br />
saudável e com princípios morais elevados, portanto, apto para defender a Pátria.<br />
É importante, pois, esta referência: preparar um corpo forte e sadio, pela sua<br />
sintonia com o método ginástico alemão. Um trecho de uma carta enviada pela<br />
diretoria da Sociedade Ginástica, solicitando verba para a construção de um ginásio<br />
de educação física ao interventor federal, Tenente Coronel Ernesto Dorneles, em<br />
outubro de 1945, assim se expressou:<br />
32<br />
A finalidade base, durante os 52 anos de existência da Sociedade Ginástica<br />
Santa Cruz, foi preparar homens fortes para o engrandecimento sempre<br />
crescente de nosso amado Brasil, haja vista que sempre praticou esporte de<br />
ginástica em aparelhos, atletismo e os diversos jogos ao ar livre,<br />
participando de todas as competições e de campeonatos estaduais. Devido<br />
à estreita ligação com as diversas Sociedades Congêneres, tem aumentado<br />
o entusiasmo pela educação do corpo, na mais ampla acepção da palavra<br />
entre a sociedade local.<br />
Até 1905, o canto, a música e a ginástica impulsionaram a Sociedade<br />
Ginástica, onde, a partir de 1905, foi introduzida a modalidade de futebol, que teve<br />
grande aceitação por parte dos associados. Na Ata de número 2, de 1910, foi<br />
registrada a criação do Departamento de Esgrima. Em 1916 foi construída uma<br />
cancha de bolão, para o qual cinco grupos se estruturaram. Ainda em 1916 houve a<br />
instalação de uma mesa de "billard", e foi criado um grupo de escoteiros.<br />
Aos poucos, foram sendo introduzidas outras modalidades esportivas, como o<br />
atletismo. Em 1924, a sociedade participou com atletas, de uma maratona em<br />
comemoração ao centenário da imigração alemã realizada em Santa Cruz do Sul.
Conforme artigo publicado por Hardy H. Martin no jornal Gazeta do Sul (23<br />
mar., p.25), o basquetebol foi introduzido em 1931. O Departamento de<br />
Basquetebol Feminino na Sociedade Ginástica foi criado em 28 de abril de 1957,<br />
enquanto o primeiro jogo foi em 20 de agosto do mesmo ano contra o seu maior<br />
rival, o Corinthians Sport Club (Gazeta do Sul, 20 ago. 1957, p.4).<br />
Iserhard 2 , em entrevista realizada em 31 de janeiro de 1995, enfatizou que, na<br />
época da introdução do basquetebol na Sociedade Ginástica, não existiam quadras,<br />
somente mato e capoeira, e que os atletas tinham que fazer tudo, trabalhando vários<br />
dias, roçando, fazendo os aros e as tabelas. Ressaltou, ainda que o piso era de<br />
chão batido.<br />
2.2 Corinthians Sport Club<br />
O Corinthians Foot Ball Club, foi fundado em 25 de julho de 1939 também<br />
com fins sociais e esportivos. A atividade inicial resumia-se à prática do futebol<br />
amador, mas, em 04 de outubro do mesmo ano, o Clube passou a ser chamado de<br />
Corinthians Sport Club.<br />
Euclydes Kliemann, em discurso proferido por ocasião da inauguração do<br />
ginásio esportivo e social, em 1955, enfatizou que o Corinthians era uma realidade<br />
devido ao espírito de união apresentado por jovens entusiastas, que se sentiram<br />
desafiados pela sociedade arcaica e, por vezes, retrógrada, que os cercava e que<br />
2 Hugo ISERHARD, 66 anos nascido em Santa Cruz do Sul, dentista aposentado, foi um<br />
dos primeiros jogadores de basquete da Sociedade Ginástica, tendo, inclusive,<br />
ajudado a construir as quadras improvisadas para a prática desse esporte.<br />
33
acreditava ter o Corinthians uma vida efêmera. Acrescentou também, que era crença<br />
geral que somente instituições profundamente arraigadas e estribadas em glórias<br />
passadas pudessem sobreviver e progredir. (Gazeta do Sul, 28 dez. 1955).<br />
No discurso de Kliemann, percebe-se, portanto que o Corinthians foi fundado<br />
por jovens que não concordavam com as idéias de determinados segmentos da<br />
sociedade local.<br />
Com a adesão de muitos novos associados e sem uma sede social própria, o<br />
Clube se viu obrigado a fazer fusão com a Sociedade Bailante (sociedade social que<br />
promovia bailes), passando á realizar promoções sociais conjuntamente.<br />
Essas promoções eram realizadas na sede do Clube União, que, mais tarde,<br />
em 1942, decidiu não mais ceder suas dependências, obrigando o Corinthians a<br />
usar, juntamente com a Sociedade Santa Cruz, hoje Futebol Santa Cruz, o prédio da<br />
Loja Maçônica, nos fundos da praça da Prefeitura Municipal.<br />
Como o novo clube, o Corinthians, não parava de crescer, a diretoria passou<br />
a alugar e, mais tarde, adquiriu as canchas pertencentes à família Bartholomay, que<br />
se situam no mesmo lugar onde hoje se encontra a sede do Corinthians Sport Club,<br />
na rua Marechal Floriano.<br />
De acordo com o Livro de Atas nº 1, do dia 25 de julho de 1939, (p.1), foram<br />
14 os membros fundadores dessa sociedade: Elemar Gruendling, Affonso Simões<br />
Pires, Carlos E. Kraether, Reinaldo Matte, Eugênio Kaempf, Júlio de Oliveira, Bruno<br />
34
Neumann, Gastão Reisswitz, Euclydes N. Kliemann, Ruy F. Moreira, Arlindo Kessler,<br />
Carlos Knabach, Arno C. Binz e Agostinho Kliemann.<br />
Em discurso realizado pelo Sr. Reinaldo C. Matte, um dos fundadores da<br />
sociedade por ocasião dos festejos do 46º aniversário, realizado em 27 de julho de<br />
1985, afirma-se que os objetivos que se propuseram os jovens que fundaram o<br />
Corinthians tinham sido plenamente atingidos e que a sociedade havia indicado<br />
novos rumos para a sociedade santa-cruzense tanto na área social quanto na área<br />
esportiva.<br />
Quanto às atividades desportivas do Corinthians, ainda em outubro de 1939,<br />
foram criados os Departamentos de Basquetebol e Tênis, que passaram, desde<br />
logo, a contar com quadras de cimento. Em 1940, foi criado o Departamento de<br />
Ping-Pong (CORINTHIANS, 1939).<br />
A primeira partida intermunicipal de basquetebol foi realizada em Estrela, no<br />
dia 27 de maio de 1940 e foi vencida pela equipe de Estrela pelo placar de 33 X 2.<br />
Na verdade é importante salientar que o Corinthians foi derrotado em todas as<br />
partidas realizadas no primeiro ano de criação do Departamento de Basquetebol<br />
(CORINTHIANS, 1939).<br />
A partir de 1941, o basquete passou a ser o esporte mais praticado no Clube,<br />
ficando o futebol em segundo plano, o que fez com que fosse abandonado no<br />
mesmo ano, por falta de atletas que se dispusessem a treinar. Além disso, o Clube<br />
havia alugado o campo do F.B.C. Santa Cruz e, para conter despesas<br />
35
desnecessárias, houve por bem fechar o Departamento (Relatório da Diretoria<br />
referente ao ano de 1942).<br />
Na reunião do dia 15 de fevereiro de 1945, a direção do Corinthians Sport<br />
Club contratou o primeiro professor de Educação Física com curso superior, Ari<br />
Soares de Oliveira, tenente do exército de Santa Cruz do Sul, sob a alegação de<br />
proporcionar aos jogadores de basquete mais resistência e agilidade durante os<br />
jogos (CORINTHIANS, 1945).<br />
Em 14 de março de 1949, foi implantado o Departamento de Atletismo com o<br />
objetivo de aprimorar a forma física dos associados interessados.<br />
Em 25 de agosto de 1950, Dia do Soldado, foi feita uma apresentação de<br />
basquete feminino, sendo que uma equipe tinha como patrono o Ten. Cel. Renato<br />
da Costa e Souza e a outra equipe, o Major Mário Fonceca (CORINTHIANS, 1950).<br />
Outros esportes foram introduzidos pela Sociedade, como o futebol de salão,<br />
em 15 de dezembro de 1956, tendo a equipe conquistado o título de Campeã<br />
Estadual em 31 de março de 1958. Apesar do sucesso obtido, o Departamento de<br />
Futebol de Salão teve vida curta, pois, em 20 de dezembro de 1960, foi extinto. O<br />
voleibol também possuía o seu departamento, embora nunca tivesse obtido sucesso<br />
em termos de resultados em campeonatos estaduais.<br />
36
Na Ata de fundação da Sociedade, no dia 9 de julho de 1941, (p.60),<br />
encontramos na transcrição do estatuto, Capítulo 1, as Finalidades da Sociedade<br />
(art.1):<br />
37<br />
O Corinthians Sport Club, fundado em 25 de julho de 1939, nesta cidade,<br />
onde tem a sua sede, é uma sociedade constituída para promover, entre<br />
seus sócios, o cultivo da educação física através da prática de jogos e<br />
exercícios atléticos, bem como outras diversões.<br />
Já é possível perceber, pela análise desse artigo dos estatutos do Corinthians<br />
Sport Club, que o espírito nacionalista, tão marcadamente presente nas finalidades<br />
da Sociedade Ginástica, não está mais presente de forma tão marcante.<br />
No Corinthians, encontram-se o jogo e outras diversões como fatores<br />
preponderantes para o desenvolvimento da educação física. Contudo, não é<br />
possível desconsiderar que ele tinha como objetivos, ainda que menos explícitos e<br />
mais brandos, o adestramento físico e o cultivo de valores nacionalistas, embutidos<br />
na utilização do método francês.<br />
Esse espírito nacionalista, incutido e seguido pelos consócios do Corinthians,<br />
é confirmado pelo ofício enviado pelo Tenente Coronel Renato da Costa e Souza do<br />
8º Regimento de Infantaria à diretoria do Clube, em 13 de julho de 1949, com o<br />
seguinte teor:<br />
Tendo este comando em recente visita a esse clube, verificado que a digna<br />
diretoria tem se esforçado em manter sempre vivo o espírito de brasilidade<br />
em todos os atos dessa sociedade, venho com este felicitá-los por esta<br />
orientação que tão útil tem sido à campanha de nacionalização nesta
valorosa cidade de Santa Cruz do Sul. Esperando que tal conduta seja<br />
sempre seguida, subscrevo-me com toda a estima e consideração.<br />
Com a informação de que o tenente - coronel, comandante da guarnição<br />
militar local, teria proferido uma palestra e que o mesmo teria elogiado o Corinthians<br />
pelo espírito de brasilidade mantido pelos seus associados, José Henrique Mariante,<br />
delegado da 3º região policial, enviou um ofício sob o nº 247, em 19 de julho de<br />
1949, com o seguinte teor: "Sendo um patrimônio moral atitude como esta, peço e<br />
insisto para que prossigam com estes desígnios, para maior engrandecimento da<br />
nossa cidade de Santa Cruz do Sul.”<br />
Como se pode observar, a campanha de nacionalização atingiu fortemente a<br />
Sociedade Ginástica e o Corinthians, as duas agremiações mais importantes.<br />
Essa campanha teve o seu início no final da década de 30, em função da<br />
preocupação do governo com a importância numérica, econômica e cultural da<br />
população alemã, especialmente no sul do país, o que poderia, segundo círculos<br />
nacionalistas, tornar possível uma conspiração nazista. O movimento ficou mais forte<br />
ainda com a introdução do regime político implantado a partir de 1937, por Getúlio<br />
Vargas, denominado "Estado Novo", provocando mudanças drásticas na cultura, na<br />
língua, e nas tradições das populações de origem imigrante, principalmente de<br />
origem alemã (KIPPER, 1979).<br />
Essa campanha foi tão rigorosa, que as sociedades culturais, esportivas,<br />
recreativas e mesmo as religiosas tinham que providenciar, junto aos órgãos<br />
38
policiais, o seu registro, apresentando cópia de seus estatutos bem como a relação<br />
de seus membros com a devida nacionalidade (KIPPER, 1979).<br />
2.3 Grêmio Atlético Sampaio<br />
No dia 4 de maio de 1944, foi realizada uma reunião com oficiais do 7º<br />
Regimento de Infantaria a convite do 1º sargento Otacílio Falkenbach, do 2º<br />
sargento Jorge Cavalcante de Oliveira e do 2º sargento João dos Santos. A reunião<br />
foi realizada no pavilhão central do Parque Imembuí, em Santa Maria. A finalidade<br />
primeira do encontro era a da criação de um "Grêmio Esportivo" entre os<br />
subtenentes e sargentos do Primeiro Batalhão do Oitavo R.I, Regimento de<br />
Infantaria (GRÊMIO A. Sampaio, 1944).<br />
A idéia foi muito bem aceita pelos membros presentes, tendo em vista que,<br />
logo após, foi proposto que fosse eleita, por aclamação, uma diretoria composta por<br />
um presidente, um tesoureiro, um secretário e um orador.<br />
Foram indicados, para presidente, o subtenente Pedro Angelo Goldani; para<br />
tesoureiro, o subtenenente Irineu Silva; para secretário, o 2º sargento Arthur do<br />
Santos, e, como este não estava presente, o 2º sargento, João dos Santos<br />
respondeu provisoriamente pelo cargo.<br />
Na mesma reunião, ainda foram eleitos, para diretor dos Departamentos de<br />
Basquetebol e Voleibol, o subtenente Mozart Ribeiro da Silva; para diretor técnico de<br />
39
futebol, o 2º sargento Jorge Cavalcante de Oliveira e, para guarda-esporte, o 3º<br />
sargento Blair Domingues (GRÊMIO A. Sampaio, 1944).<br />
Nos estatutos do G. A. S., encontram-se os objetivos dessa sociedade:<br />
a) incentivar e cultivar os esportes de caráter amadorista em todas as suas<br />
modalidades, estreitar os laços de união e solidariedade entre as sociedades<br />
congêneres por meio de competições esportivas, oficiais e amistosas;<br />
b) promover reuniões e diversões de caráter beneficente, social, cultural e<br />
cívico entre seus associados.<br />
Em 31 de outubro de 1944, o Grêmio Esportivo Sampaio já estava<br />
acantonado em sede provisória na Sociedade Aliança em Santa Cruz do Sul, onde<br />
deu continuidade às atividades propostas quando da sua fundação.<br />
No dia 7 de julho de 1953, a referida entidade se filiou à F.G.B para participar<br />
do Campeonato Citadino de Basquetebol, criando, dessa forma, a possibilidade de<br />
formar a Liga Atlética de Santa Cruz do Sul (LASC), órgão normativo e consultivo<br />
que dirigiu o destino do basquetebol em Santa Cruz do Sul até 1958. Em janeiro de<br />
1959, a Liga Atlética de Basquetebol passou a ser denominada Liga Santa-cruzense<br />
de Basquete (LSCB) (GAZETA do Sul, 1953).<br />
Em 30 de maio de 1969, o Grêmio Atlético Sampaio passou a ser<br />
denominado “Clube dos Subtenentes e Sargentos do Primeiro e do Oitavo<br />
40
Regimento de Infantaria” e, em 14 de março de 1975, passou a denominar-se “Clube<br />
dos Subtenentes e Sargentos (CSS)”.<br />
41
3 A INFLUÊNCIA <strong>DO</strong>S MÉTO<strong>DO</strong>S GINÁSTICOS NA<br />
CRIAÇÃO DAS SOCIEDA<strong>DE</strong>S ESPORTIVAS<br />
Betti (1991) afirma que o movimento de expansão dos métodos ginásticos<br />
coincidiu com uma fase de grande influência política, econômica e social do países<br />
europeus sobre a américa latina em geral e sobre o Brasil, em particular.<br />
O final do século XVIII caracterizou-se por mudanças na educação européia<br />
provocadas pelas influências da Revolução Francesa, deixando assentadas as<br />
bases de uma nova educação nacional com a participação mais efetiva do cidadão,<br />
que antes ocupava a posição de súdito. As características desta fase, segundo<br />
Luzuriaga (citada por Betti, 1985, p.24) podem ser resumidas em:<br />
“a) desenvolvimento da educação estatal, da educação do Estado, com maior<br />
participação das autoridades oficiais de ensino;<br />
b) começo da educação nacional, da educação pelo povo ou por seus<br />
representantes políticos;<br />
c) princípio da educação universal, gratuita e obrigatória, na escola primária;
d) iniciação do laicismo no ensino, com a substituição do ensino de religião<br />
pela instrução pública em unidade orgânica da escola primária à universidade;<br />
e) acentuação do espírito cosmopolita, universalista, que une pensadores e<br />
educadores de todos os países;<br />
f) sobretudo, a primazia da razão, a crença no poder racional na vida dos<br />
indivíduos e dos povos;<br />
g) reconhecimento, ao mesmo tempo, do papel da natureza e das instituições<br />
na educação”.<br />
Já no século XIX, a revolução industrial teve papel decisivo, em função do<br />
aumento da população que buscava melhores condições de vida nos centros<br />
urbanos, provocando um inchaço das cidades que não estavam preparadas para<br />
absorver um número tão elevado de pessoas em busca de melhores condições de<br />
vida.<br />
Este foi o momento propício para que a educação pudesse efetivar os seus<br />
programas com a finalidade de cuidar da educação da população, especialmente a<br />
de mais baixa renda. A escola primária foi universalizada. Escolas normais<br />
preparavam para o magistério enquanto o ensino secundário preparava os filhos de<br />
burgueses para a Universidade (LUZURIAGA citado por BETTI, 1991).<br />
43
A história da institucionalização dos métodos de ginástica nos países<br />
europeus, principalmente na Alemanha, além de ser decorrente da expansão da<br />
educação escolar ocorrida a partir da França desde o final do século XVIII, também<br />
tem vinculação direta com a afirmação do nacionalismo e do militarismo europeus.<br />
Orientação constatada tanto no século XVIII quanto no XIX (BETTI, 1991).<br />
Segundo Soares (1994), a Alemanha, a Suécia e a França foram as<br />
precursoras na sistematização dos métodos ginásticos, enquanto na Inglaterra foi o<br />
esporte que conseguiu concentrar um maior número de adeptos, isto é, popularizou-<br />
se.<br />
Castelanni (1991), coloca que os métodos ginásticos tiveram grande<br />
influência médica, já a partir do século XVIII, quando já era vendida a imagem de um<br />
corpo sadio, em um ambiente purificado, limpo e arejado. O médico passou a ser o<br />
agente capaz de observar, corrigir, melhorar as condições de saúde.<br />
A revolução industrial ocorrida na Europa, principalmente na França e<br />
Inglaterra, teve a influência do método ginástico de cunho médico, pois esta<br />
revolução provocou um rápido e desordenado crescimento das cidades que não<br />
previam condições mínimas em relação ao serviços mais elementares, como a<br />
limpeza das ruas e serviços sanitários, provocando epidemias como o cólera, o tifo e<br />
instalando o caos tanto entre a classe operária como entre a classe que detinha o<br />
poder (SOARES, 1994).<br />
44
Na Alemanha, a derrota da revolução de 1848 fortaleceu as posições do<br />
primeiro ministro Bismarck. Como parte do processo de unificação levado a efeito<br />
por ele, a organização de um programa de saúde pública evoluiu. Nas décadas que<br />
se seguiram ao ano de 1848, agiu-se em todos os Estados germânicos para<br />
melhorar as condições de trabalho, em particular as de mulheres e crianças e<br />
empreenderam-se esforços para aperfeiçoar a administração sanitária. Tornavam-se<br />
reais as idéias: - de que a saúde dos indivíduos era assunto de interesse público,<br />
especialmente, quando submetidos a condições nocivas, tornando-se um peso para<br />
a sociedade; - de que nessas circunstâncias, seria dever do governo criar e manter<br />
condições capazes de proteger o indivíduo, e restabelecer e manter sua saúde<br />
(ROSEN, 1994).<br />
Por outro lado, a revolução liberal de 1848, criou condições para que os<br />
trabalhadores se organizassem em sindicatos que buscavam melhores condições<br />
de trabalho e de vida. Era preciso agir rápido para que o "status quo" fosse mantido<br />
pela burguesia que se achava ameaçada. Para isto foram acionados mecanismos<br />
ideológicos com um conjunto de crenças que vinculavam o ideal de uma sociedade<br />
onde cada um ocuparia o seu lugar, de acordo com as suas aptidões. A hierarquia<br />
deveria ser respeitada sobre todos os aspectos. Para Comte, um dos ideólogos<br />
burgueses desta época, a organização da sociedade resultaria da:<br />
45<br />
... dedicação dos fortes pelos fracos, veneração dos fracos pelos fortes".<br />
Comte afirma ainda: "Nenhuma sociedade pode perdurar se os inferiores<br />
não respeitarem os superiores. Nada confirma melhor semelhante lei do<br />
que a degradação atual em que, por falta de amor, cada um não obedece<br />
senão à força, se bem que o orgulho revolucionário deplore o pretendido<br />
servilismo de nossos antepassados, que sabiam amar nossos chefes.<br />
(COMTE, citado por SOARES, 1994, p.18).
Outro discurso ideológico vinculado pelos médicos higienistas do século XIX<br />
era o de que classes menos favorecidas possuíam hábitos, vícios, que propiciavam<br />
uma vida desregrada, portanto, propensa à doenças degenerativas, que precisariam<br />
ser combatidas com a veiculação de propostas que pudessem fazer com que estas<br />
classes operárias adotassem bons hábitos (SOARES, 1994).<br />
A família através da figura da mãe foi escolhida para ser a propagadora da<br />
adoção de bons hábitos. Era ela que tinha um maior contato com os filhos que<br />
passavam a maior parte de seu tempo em casa. A família teria condições de fazer o<br />
trabalho de extensão que seria iniciado nas escolas (op.cit., p.35).<br />
À mulher, era atribuído papel fundamental para que as mudanças ocorressem<br />
em nível de conscientização da família, a ela era dada a responsabilidade de tentar<br />
fazer com que marido e filhos incorporassem bons hábitos de vida que pudessem<br />
diminuir a incidência de doenças que provocavam o processo de decadência<br />
observados nos séculos XVIII e XIX .<br />
Novaes (citado por SOARES, 1990, p.35) acrescenta que mais uma vez se<br />
percebe o discurso ideológico dos higienistas, que segundo ela, tomam uma<br />
situação que é efeito e a transformam em causa, isto é, não era a falta de<br />
informação e sim as condições de vida a que esta classe de operários estava<br />
exposta, que provocavam todo este caos social.<br />
Em nome da saúde, os higienistas investiram também na remodelação do<br />
sistema habitacional da classe proletária, o novo espaço urbano destinado aos<br />
46
operários deveria ser suficientemente arejado e permitir que somente uma família<br />
pudesse morar em cada lote ou domicílio. Teria como principal finalidade tirar os<br />
homens da vida desregrada que os teria levado a incorporar uma vida cheia de<br />
vícios, enfim afastá-los da vida insana e imoral (SOARES, 1994).<br />
Portanto, a ginástica de cunho "científico" aliada à "disciplina" foram<br />
personagens importantes na construção e consolidação da sociedade industrial. A<br />
ginástica associada à saúde do trabalhador, que era submetido a jornadas de<br />
trabalho que variavam entre 13 e 16 horas, com movimentos repetitivos, provocando<br />
vícios posturais que somente a ginástica poderia compensar, ficando, daí, claro o<br />
seu vínculo com a medicina (SOARES, 1994).<br />
Nos séculos XVIII e XIX, Alemanha, França e Suécia adotaram sistemas<br />
ginásticos que afirmavam o espírito de nacionalidade, principalmente a partir das<br />
guerras napoleônicas. Havia uma constante preocupação em preparar fisicamente<br />
os indivíduos para a guerra e disciplinar os corpos para a nova ordem capitalista<br />
industrial (BETTI, 1985).<br />
No Brasil, três métodos tiveram influência marcante e ditaram as normas da<br />
educação física, especialmente após a Proclamação da República, através de um<br />
golpe militar em 1889. No primeiro momento - 1889-1920, destacam-se os métodos<br />
alemão e suéco, já o segundo período, 1920-1946, é marcado pela influência do<br />
método francês (GOELLNER, 1993).<br />
47
Nas sociedades esportivas criadas por volta de 1889, o método alemão foi<br />
aquele que trouxe uma maior contribuição. Isto deve-se principalmente a dois<br />
fatores:<br />
“a) aos imigrantes alemães, que se instalaram no Sul do Brasil em busca de<br />
melhores condições de vida para suas famílias e que ainda hoje conservam os<br />
hábitos e a cultura trazidos de seu país de origem, entre os quais destacamos a<br />
ginástica preconizada por Friederish Ludwig Jahn;<br />
b) a vinda de soldados e oficiais prussianos que faziam parte da guarda<br />
imperial brasileira e que quando deixavam o serviço não mais queriam voltar para o<br />
país de origem, e se utilizavam do método para manter vínculo com suas raízes<br />
germânicas” (MARINHO, s.d., p.39).<br />
Segundo Marinho (s.d.), o método alemão persistiu até recentemente quando<br />
a ginástica de solo e a ginástica olímpica passaram a predominar, absorvendo o<br />
interesse dos ginastas. A ginástica alemã se arraigou no Brasil quando:<br />
“a) o alféres do Estado Maior de 2º classe, de origem alemã, Pedro<br />
Guilhermino Meyer foi nomeado contra-mestre de ginástica militar;<br />
b) em São Paulo foi fundada, em 12 de dezembro de 1888, a "União de<br />
Ginástica Alemã";<br />
48
c) em Porto Alegre, em 11 de abril de 1867, foi criada a primeira sociedade de<br />
Ginástica “Turnerbund” (associação de ginástica) segundo os moldes preconizados<br />
por Jahn.”<br />
O método de ginástica Francês chegou ao Brasil em 1907. Foi, contudo,<br />
oficialmente instituído e regulamentado em 1921, pelo decreto n° 14.784. Em 1927<br />
sofreu pequenas transformações na França, que foram implantadas posteriormente,<br />
em 1931, no Brasil (GOELLNER, 1993).<br />
Cabe destacar que devido a questões conjunturais e estruturais, no período<br />
compreendido entre 1920 e 1946 houve por parte das autoridades, uma maior<br />
preocupação com a educação física fundamentada no método Francês<br />
(GOELLNER, 1993).<br />
No caso brasileiro, passada a Primeira Guerra Mundial e a crise a que deu<br />
resultado, alguns setores da sociedade passaram a preocupar-se com a realidade<br />
nacional e buscar a superação do atraso histórico a que o Brasil estava sujeito,<br />
ainda como efeito de seu passado colonial que o tornara um país periférico e<br />
dependente. Ao lado das profundas mudanças econômicas, sociais, políticas e<br />
culturais que marcaram as décadas de 1920 a 1940, emergiu o nacionalismo. Esta<br />
tentativa de construção de uma identidade "étnica" acabou por produzir seus efeitos<br />
na saúde pública e na educação, criou espaço para os higienistas e para a<br />
expansão da educação física, até então monopólio das escolas militares inspiradas<br />
nos modelos franceses (BRUM, 1987).<br />
49
O método Francês era utilizado em 1938, por 56% das escolas existentes, já<br />
no ano seguinte este percentual subiu para 77.89% e em 1940 o percentual<br />
alcançou 88.87% mantendo-se estável e vigorando até 1944 sem qualquer tipo de<br />
modificação (CANTARINO FILHO, citado por GOELLNER, 1993).<br />
Até nossos dias pode-se constatar a influência do método de ginástica<br />
Francês nas escolas onde são encontrados professores que pautam suas atividades<br />
no caráter disciplinador e no espírito militarista.<br />
3.1 As sociedades fundadas em Santa Cruz do Sul e os métodos<br />
ginásticos europeus<br />
Percebe-se que as sociedades fundadas em Santa Cruz do Sul,<br />
especialmente a Sociedade Ginástica, o Grêmio Esportivo Sampaio e o Corinthians<br />
Sport Club, a exemplo da educação física brasileira, de um modo geral, nas suas<br />
instituições escolares e militares, tiveram forte influência dos métodos ginásticos<br />
europeus.<br />
A sociedade ginástica, de acordo com depoimentos de Müller 3 (1995),<br />
preconizava, através de seus professores de ginástica, o método alemão, que tinha<br />
conotações políticas no sentido de incutir nos praticantes a necessidade da ginástica<br />
para o preparo de um indivíduo mais forte e apto para a defesa da pátria e dos<br />
valores da sociedade. A Sociedade Ginástica chegou a contratar os professores<br />
3 Hanz Müller, nascido em 1924, em Porto Alegre, Técnico em Eletrônica, aposentado,<br />
foi um atleta aficcionado pela Ginástica Olímpica. Foi o aluno do prof. Ricardo<br />
Schmiedel ao qual tinha um profundo respeito e admiração, Schmiedel era, segundo<br />
Hanz, um Campeão Olímpico.<br />
50
Ricardo Schmiedel e Martym Boysen, sendo o primeiro alemão e o segundo<br />
descendente de alemão.<br />
Muller (1995) disse que professor Ricardo Schmiedel, além de ser professor<br />
na Sociedade Ginástica, também ministrava aulas de Educação Física no colégio<br />
São Luís e no Colégio Mauá, os dois educandários de maior tradição em Santa Cruz<br />
do Sul. Como essas instituições educacionais não possuíam uma sala com<br />
implementos para a prática da ginástica, as aulas eram ministradas nas<br />
dependências da Sociedade Ginástica.<br />
Ainda que tenha salientado que suas aulas nunca tiveram uma conotação<br />
política, Quatke (1995), que também foi professora de ginástica feminina na<br />
Sociedade Ginástica a partir de 1940, afirma que o método que utilizava na<br />
preparação de suas equipes era o método alemão.<br />
O Corinthians Sport Club, quando elaborou o estatuto da sociedade, no<br />
capítulo das finalidades certamente se baseou no método Francês. Isso se explica<br />
pelo fato de que todos os seus fundadores eram jovens estudantes do ensino<br />
secundário na época de fundação da sociedade, em 1939.<br />
Certamente esses jovens estudantes foram influenciados por esse método,<br />
visto que o mesmo foi oficializado em 1931, através da Portaria nº 70, do governo<br />
federal, segundo a qual o método deveria ser aplicado em todas as escolas, para<br />
ambos os sexos. Além disso, a Portaria determinava a prática da Educação Física<br />
em todos os estabelecimentos de ensino do Brasil.<br />
51
Na ata de fundação do Grêmio Esportivo Sampaio, não se encontra o estatuto<br />
com as finalidades de sua fundação. É possível que o método que exerceu maior<br />
influência sobre essa sociedade, a exemplo do Corinthians Sport Club, também<br />
tenha sido o francês.<br />
No Manual de Campanha do Ministério do Exército (1981, p.2), consta que<br />
no Regulamento de educação física publicado em 1934, o método francês foi<br />
utilizado como guia da educação física das tropas nos estabelecimentos militares.<br />
Considerando que os associados do Grêmio Atlético Sampaio eram;<br />
necessariamente, oficiais do exército, pode-se concluir que essa sociedade foi criada<br />
por fortes influências do método francês.<br />
3.1.1 O Método Ginástico Alemão<br />
O método ginástico alemão foi preconizado para desenvolver o espírito de<br />
nacionalidade e um corpo forte e saudável, apto para a construção de uma nação<br />
poderosa, capaz de reconstituir, manter e expandir a sua unidade territorial<br />
(SOARES, 1994).<br />
Gusts Muths, um dos idealizadores desse método, assim se referiu em<br />
relação a ele (SOARES, 1994 p.66):<br />
52<br />
... eu bem sei que uma verdadeira teoria da ginástica deverá ser fundada<br />
sobre bases fisiológicas e que a prática de cada exercício ginástico deverá<br />
ser calculada segundo a constituição de cada indivíduo.
Na afirmação acima, percebe-se claramente que a ginástica deveria ser,<br />
segundo Muths, de cunho científico, observando princípios da biologia, fisiologia e<br />
anatomia, embora Muths também tivesse ideais nacionalistas (SOARES, 1994).<br />
Se, por um lado, a ginástica alemã preconizada por Muths tinha um cunho<br />
mais científico, o mesmo não se podia afirmar da ginástica de Friedrich Ludwig Jahn,<br />
professor primário, que foi grandemente influenciado pelo discurso adotado por<br />
Gottlieb Fichte, adepto da teoria de que a salvação do espírito de nacionalidade<br />
alemã estava na escola pública, por isso era um ferrenho defensor de que a<br />
educação deveria ser promovida pelo Estado (BETTI, 1991).<br />
O trabalho de Jahn fundamenta-se em jogos e exercícios de correr, saltar,<br />
arremessar e lutar.<br />
Jahn foi um verdadeiro entusiasta do espírito nacionalista que deveria ser<br />
forjado nas escolas. Ainda no século XIX, criou um movimento nacional na<br />
Alemanha, chamado de "Turnen", que persiste até hoje.<br />
Os "Turnen" criados por Jahn tinham forte caráter cívico e patriótico,<br />
reforçando o espírito de nacionalismo. Obtiveram logo a simpatia da classe dirigente.<br />
O movimento foi assim descrito por Soares, 1994, p.67:<br />
... grandes festas gímnicas, grandes encontros de massas muito<br />
disciplinados. São organizados a partir de 1814, mas sobretudo depois de<br />
1860. Encontra-se (no Turnen) ... uma primeira forma de instrução física<br />
militar, destinada às massas, que corresponde às necessidades práticas da<br />
burguesia.<br />
53
Jahn fundou, em junho de 1811, o primeiro "Turnplatz" (praça de ginástica),<br />
que tinha, como principal finalidade, o fortalecimento físico e moral do jovem alemão<br />
para a libertação da terra natal (BETTI, 1991).<br />
O Turnplatz era um lugar em que todas as atividade físicas e até mesmo as<br />
palestras proferidas por Jahn eram realizadas ao ar livre, sendo que os lugares<br />
cobertos eram utilizados apenas em dias de chuva (GRIFI, 1989).<br />
Entre 1813 e 1814, vários "Turnen" se uniram às forças armadas e lutaram<br />
contra Napoleão. Com a expulsão dos franceses, esse movimento se expandiu por<br />
todos os cantos da Alemanha, transformando Jahn em um herói nacional<br />
(NIPPER<strong>DE</strong>Y, 1991).<br />
Em 1819, Jahn, acusado de traição, foi preso, e o governo prussiano<br />
proscreveu os Turnen, pois temia que o movimento servisse para a difusão das<br />
doutrinas liberais. O esforço de nada valeu, pois não conseguiram impedir que os<br />
Turnen seguissem sua trajetória de crescimento, principalmente no reinado de<br />
Frederico Guilherme IV (NIPPER<strong>DE</strong>Y, 1991).<br />
Anteriormente, em 1842, foi reconhecido pelo governo prussiano que a<br />
educação física deveria ser dever do Estado. Como o método de educação física<br />
idealizado por Jahn entrou em suspeição por receio das classes conservadoras,<br />
especialmente da Prússia, de que pudesse servir de base para a propagação dos<br />
ideais do liberalismo, o governo convidou Spiess, que, em seu método, preconizava<br />
bastante ênfase à disciplina e à educação, tendo como princípios básicos, o<br />
54
desenvolvimento completo do corpo, através do treino da memória com respostas<br />
rápidas e precisas ao comando (BETTI, 1988).<br />
3.1.2 O Método Ginástico Sueco<br />
O método sueco que também teve forte influência no Brasil, foi idealizado, no<br />
século XIX, pelo escritor e poeta Pehr Henrick Ling (1776-1839) e tinha, como<br />
principais objetivos, criar cidadãos fortes e saudáveis, que estivessem livres de<br />
vícios perniciosos à saúde, para que pudessem ser úteis na produção. Nessa época,<br />
estava em andamento o processo de industrialização em toda a Europa (SOARES<br />
1994).<br />
A preocupação também voltava-se, nesse caso, para a preparação de bons<br />
soldados para a guerra . Na Europa, durante todo o século XIX, a situação era tensa<br />
e, a qualquer momento, poderiam surgir novos conflitos.<br />
Ling dividiu a ginástica sueca em quatro categorias (MARINHO citado por<br />
SOARES, 1994, p.71 e 72):<br />
a) Ginástica pedagógica ou educativa: a que tinha como princípios básicos,<br />
eliminar os vícios e criar bons hábitos posturais, desenvolvendo o indivíduo<br />
harmoniosamente, não importando a idade e o sexo;<br />
b) ginástica militar: de cunho marcial, incluía o tiro e a esgrima em sua<br />
seqüência pedagógica;<br />
55
c) ginástica estética: procurava desenvolver um corpo harmonioso e, para tal,<br />
foi incluída a dança com seus movimentos suaves e inspiração dos sentidos;<br />
d) ginástica médica e ortopédica: além do aspecto pedagógico, visava<br />
eliminar vícios posturais e determinadas enfermidades através de movimentos<br />
específicos para cada caso detectado.<br />
Para Soares (1994), o método sueco não tinha como principal objetivo, a<br />
preparação do indivíduo para aspectos marciais/militares, mas apresentava<br />
acentuada predominância sobre os aspectos anátomo-fisiológicos, usados<br />
principalmente quando o país estava em paz.<br />
Quanto ao Brasil, onde a ginástica alemã foi ministrada mais em nível de<br />
instituições militares, o método sueco foi mais utilizado em estabelecimentos de<br />
ensino devido ao seu caráter pedagógico.<br />
A ginástica sueca, no Brasil, encontra, em Rui Barbosa (citado por SOARES,<br />
1994, p.113), um ardoroso defensor:<br />
56<br />
... a ginástica, além de ser o regime fundamental para a reconstituição de<br />
um povo cuja virilidade se depaupera e desaparece de dia em dia a olhos<br />
vistos, é, ao mesmo tempo, um exercício eminentemente,<br />
insuperavelmente moralizador, um gérmen de ordem e vigoroso alimento<br />
de liberdade, dando à criança uma presença erecta e varonil, passo firme e<br />
regular, precisão e rapidez de movimentos, prontidão , no obedecer, asseio<br />
no vestuário e no corpo. Através dela, assentamos insensivelmente a base<br />
de hábitos morais, relacionados pelo modo mais íntimo com o conforto<br />
pessoal e a felicidade da futura família, damos lições práticas de moral,<br />
talvez mais poderosas do que os preceitos inculcados verbalmente.
Percebe-se aqui a preocupação de Rui Barbosa em relação à ginástica, que<br />
deveria preparar, de forma harmoniosa, o ser humano, em outras palavras, a<br />
dicotomia entre corpo e mente.<br />
Rui Barbosa foi, em seu tempo, advogado e político brilhante e trouxe<br />
contribuições enormes para a área da educação física. Criou uma mentalidade<br />
favorável para a sua implantação no Brasil, quer em forma de ginástica, de esporte<br />
ou com espírito militarista (MARINHO, s.d.).<br />
O método sueco, com seus exercícios naturais, como jogos ao ar livre,<br />
corridas, saltos, passeios, patinação, natação e remo foi, na visão dos médicos e<br />
pedagogos da época, o mais indicado para nosso país, visto que a criança, nas<br />
escolas, ficava horas e horas sentada em carteiras e cadeiras inapropriadas para a<br />
formação e manutenção de uma boa postura, além de ficar exposta, nos ambientes<br />
pouco ventilados, a doenças infecto-contagiosas (SOARES, 1994).<br />
Ao contrário dos países da Europa e dos E.U.A, que iniciaram seus<br />
processos de industrialização desde a metade do século XIX, o Brasil começou a<br />
industrializar-se no começo do século XX. O processo de desenvolvimento<br />
capitalista, que se fundamenta no trabalhador assalariado desprovido de qualquer<br />
meio de produção, fez com que as diferenças sociais se tornassem ainda mais<br />
pronunciadas, desencadeando problemas que somados aos da área econômica e<br />
política, trouxeram reflexos negativos à saúde comunitária.<br />
57
Assim, nas primeiras duas décadas da República:<br />
58<br />
...morria-se de uma infinidade de pragas e o interior não se diferenciava<br />
muito das capitais, quanto à variedade. A varíola a febre amarela, a malária,<br />
a tuberculose e a lepra eram doenças comuns (...) A concentração urbana<br />
facilitava a disseminação dessas doenças (...) e de outras menos<br />
comentadas na literatura a respeito da situação de saúde da época, tais<br />
como o sarampo, a coqueluche, a difteria, o tétano, a poliomelite, as<br />
diarréias infantis, a desnutrição e o parto que também faziam inúmeras<br />
vítimas, sendo que a tradução geral do quadro era uma elevada mortalidade<br />
geral, uma altíssima mortalidade infantil, da ordem de trezentos a<br />
quatrocentos por mil, e uma baixa expectativa de vida ao nascer.<br />
(ZANETTA, citado por SOARES, 1994, p.117).<br />
É nessa época que os médicos higienistas do Brasil, a exemplo da Europa no<br />
século XVIII, encontraram um campo fértil para começar a fazer parte na formação<br />
dos quadros dos governos. O médico passou a ser o grande perito, se não na arte<br />
de governar, pelo menos na tentativa de melhorar as condições sociais e manter<br />
homens, mulheres e crianças em perfeitas condições de saúde. As intervenções dos<br />
médicos higienistas se deram principalmente nas zonas urbanas, onde a<br />
concentração populacional era mais intensa, o que facilitava a disseminação das<br />
doenças infecto-contagiosas (SOARES, 1994). Para Foucault (1982), no final do<br />
século XVII, todos os custos envolvendo doenças eram marcados por órgãos de<br />
assistência aos pobres. Contudo, em épocas de epidemias, eram baixadas normas<br />
de medicalização extremamente autoritárias (quarentena, vacinas) e que não<br />
estavam, organicamente, ligadas às fundações leigas ou religiosas de caridade.<br />
Essas fundações de caridade tinham múltiplas proposições, dentre as quais<br />
podemos destacar a distribuição de alimentos, a distribuição de vestuários, o<br />
recolhimento de crianças abandonadas e a educação elementar.<br />
No século XVIII, com o grande crescimento da população e com a<br />
necessidade de integrá-la ao processo de industrialização, foram tomadas novas
medidas de saúde pública, principalmente, em relação ao corpo, buscando sua<br />
maior utilização e proveito por um período maior de tempo, tendo em vista os<br />
interesses econômicos relacionados ao mercado de mão-de-obra (FOUCAULT,<br />
1982).<br />
A política adotada pelos médicos higienistas no Brasil, a exemplo da política<br />
médica européia no século XVIII, foi muito competente na erradicação das doenças,<br />
e se deu em vários segmentos; entre esses, podemos destacar a canalização dos<br />
rios, controle e tratamento de água e vacinação obrigatória (SOARES, 1994).<br />
Se, de um lado, houve a preocupação com a erradicação das moléstias, de<br />
outro, houve a preocupação em controlar, domesticar e modificar o pensamento das<br />
classes subalternas (SOARES, 1994).<br />
Foucault (1982) afirma que, já no século XVIII, o domínio e a consciência dos<br />
indivíduos sobre seu próprio corpo foram adquiridos através de relações de poder.<br />
Os corpos eram exaltados através de investimentos como a ginástica, os exercícios,<br />
o desenvolvimento muscular, enfim, a exaltação do corpo saudável e perfeito como<br />
fonte de força de trabalho. Essa relação de poder via-se ameaçada no momento em<br />
que esse corpo se colocava contra as formas de exploração impostas pelo trabalho<br />
capitalista através de comportamentos que fugiam às normas estabelecidas.<br />
É preciso afastar a idéia de que o poder, nas sociedades burguesas<br />
capitalistas, teria negado a realidade do corpo em proveito da alma, da consciência<br />
59
e da identidade. Segundo Foucault (op.cit), do século XVII ao início do século XX, a<br />
apropriação do corpo pelo poder foi densa, rígida e constante.<br />
De volta ao Brasil, já no final do século XIX, a ginástica estruturada em<br />
princípios anátomo-fisiológicos seria, juntamente com os princípios higiênicos, a<br />
base de todo o programa de Educação Física e deveria ser competência da escola<br />
preparar o indivíduo para a vida através da difusão de bons hábitos.<br />
As instituições educacionais teriam essa incumbência, visto que trabalhavam<br />
com uma população ainda em fase de crescimento, facilitando a educação moral,<br />
que, aliada a exercícios físicos e a princípios higiênicos, deveria ser a fórmula ideal<br />
de formar o caráter e a personalidade para uma tomada de decisões mais rápidas e<br />
precisas e, ao mesmo tempo, proporcionar maior rendimento na escola e depois no<br />
trabalho.<br />
Castelanni (1991) afirma, ainda, que os médicos higienistas, ao definirem o<br />
papel da educação em relação à produção de corpos saudáveis, fortes e robustos<br />
para a construção de uma nação saudável, portanto, mais produtiva, também<br />
incentivaram o racismo e os preconceitos em relação ao corpo relapso, flácido e<br />
doentio.<br />
60
3.1.3 O Método Ginástico Francês<br />
Na França do século XIX, a exemplo de outros países da Europa, a Educação<br />
Física passou por momentos de grandes transformações provocadas por mudanças<br />
políticas no país.<br />
Na França do século XIX, surgiram vários métodos e teorias na Educação<br />
Física, e todos reconheciam a necessidade de não somente cultivar o corpo para a<br />
saúde, mas também desenvolver qualidades, como destreza, força e resistência com<br />
o objetivo de ajudar o indivíduo a enfrentar as dificuldades do dia-a-dia, contribuindo,<br />
também, para a formação de indivíduos preparados para o combate, com espírito<br />
patriótico, capazes de lutar nas guerras e na conquista de novos territórios.<br />
Após a Guerra Franco- Prussiana, 1870 , escritores e filósofos franceses<br />
atribuíram a vitória alemã ao espírito militarista e nacionalista implantado por Vater<br />
Jahn na Alemanha. Acreditavam, então, que, somente com a implantação, na<br />
França, de uma estrutura parecida aos "Turnen", haveria condições de preparar<br />
jovens aptos militarmente para o futuro (GRIFFI, 1989).<br />
O método ginástico francês tem, em Clias e Amoros, dois de seus principais<br />
teóricos e divulgadores. Clias, ginasta adepto de Guts Muths e de Vater Jahn,<br />
notabilizou-se não somente por enfatizar, em seu método, o desenvolvimento<br />
orgânico, mas sobretudo, por implantar um método que podia ser aplicado nas<br />
escolas e que não necessitava de material muito sofisticado. Para ele, a ginástica<br />
61
deveria ter um caráter utilitário, embora não tenha negado que a atividade motora<br />
proporcionasse maior vigor e força às faculdades mentais. (GRIFFI, 1989).<br />
Já Francisco Amoros, coronel espanhol, que lutou ao lado das tropas<br />
napoleônicas e que posteriormente se naturalizou francês, buscava, com seu<br />
método, além da formação de um homem forte e saudável, a consciência dos<br />
deveres desse indivíduo para com a pátria (BETTI, 1988).<br />
Em 1813, Amoros deixou a Espanha por motivos políticos e fixou residência<br />
em Paris, onde, a convite do Rei José Bonaparte, foi ensinar ginástica aos oficiais<br />
franceses, obtendo enorme aceitação e sucesso, razão pela qual recebeu a direção<br />
de uma escola normal de ginástica militar em Paris. (GRIFFI, 1989).<br />
Foi nessa escola normal, edificada no parque de Grenelle, que Amoros<br />
elaborou seu próprio método ginástico que teve como referenciais técnico-teóricos<br />
as duas escolas: a alemã e a sueca - os aspectos marcial-militaristas de Vater Jahn<br />
prevalecendo sobre os educativos de Ling. Amoros sutentava que a educação física<br />
deveria ser tanto de cunho civil quanto de cunho militar (GRIFFI, 1989).<br />
Uma das características do método criado por Amoros era o princípio de que<br />
a ginástica deveria ser agradável, com muitas variações para qualquer tipo de<br />
clientela, tanto do sexo feminino quanto do sexo masculino, motivando a todos para<br />
a prática de exercícios físicos.<br />
62
Demeny, nascido em Douai em 12 de junho de 1850, foi aluno da Faculdade<br />
de Ciências de Lille e Sorbone de Paris; consagrou-se biologista e fisiologista<br />
notável e merece menção quando se trata do método ginástico francês. O seu<br />
método visava sempre a um maior rendimento nas atividades do dia-a-dia,<br />
principalmente, no trabalho. A intenção era propiciar condições para que os<br />
trabalhadores produzissem mais em quantidade e qualidade, através de um menor<br />
consumo de energia física (GOELLNER, 1993). Evidenciava-se, então, a<br />
coincidência de objetivos do método de Demeny e da nova classe dirigente, a<br />
burguesia.<br />
63
4 HISTÓRIA <strong>DO</strong> BASQUETEBOL<br />
James Naismith nasceu em Almonte, no Canadá, no dia seis de novembro de<br />
1861. Aos oito anos de idade, ficou órfão, passando a morar com seus tios, na<br />
mesma cidade onde nascera. Lá completou seus estudos primários, ajudando seus<br />
avós. Com 22 anos, ingressou na Mc. Gill University em Montreal (LIMA, 1988).<br />
Como havia perdido muito tempo trabalhando no campo, Naismith resolveu<br />
estudar bastante para recuperar o tempo perdido e aproveitar a bolsa de estudos<br />
que lhe fora oferecida. Mais tarde, entusiasmou-se pela prática de atividades<br />
esportivas, tendo, inclusive, feito parte da equipe de rugby da Universidade onde foi<br />
diplomado bacharel em 1887. "Deixar este mundo um pouco melhor do que o<br />
encontrei" foi o lema de Naismith, que, movido por esse ideal, ingressou no Curso de<br />
Teologia do Colégio Presbiteriano.<br />
Concluído o curso em 1890, Naismith foi para Springfield, Massachussets, a<br />
fim de observar o trabalho que era desenvolvido pela Associação Cristã de Moços<br />
(A.C.M.) no setor de atividades físicas. Para ele havia aí uma grande possibilidade<br />
de formar e desenvolver o caráter através do esporte. No ano seguinte, 1891, iniciou
seus estudos em Springfield e, nos meses finais desse mesmo ano, criou o<br />
basquetebol (LIMA, 1988).<br />
Naismith nunca deixou de estudar. Em 1898, recebeu o título de Doutor em<br />
Medicina pela Universidade de Colorado e em, 1910, o de professor de Educação<br />
Física. Sempre foi considerado um excelente educador, tendo sacrificado muito de<br />
sua vida privada pela causa que considerava nobre: educar por intermédio das<br />
atividades esportivas.<br />
Lima (1988) cita trecho de uma célebre conferência pronunciada por Naismith,<br />
em 1932, para professores de Educação Física presentes:<br />
65<br />
É a sua vida interna, as coisas que você faz ou diz que influenciarão esses<br />
rapazes e poderão transformá-los em verdadeiros homens. Desejo a cada<br />
um de vocês não só o prazer de possuírem uma boa equipe de<br />
basquetebol mas também um grande grupo de rapazes que, a qualquer<br />
momento, espontaneamente, poderão se levantar e dizer: Estou<br />
imensamente satisfeito por conhecê-lo. Você foi um grande auxílio na<br />
minha vida.<br />
Naismith publicou diversas obras. Em 1936, foi eleito presidente honorário da<br />
Federação Internacional de Basquetebol; nesse mesmo ano, teve a oportunidade e<br />
a satisfação de assistir à Olímpiada de Berlim, onde, pela primeira vez, foram<br />
disputadas partidas de basquetebol. Em 1939, com 78 anos de idade, Naismith<br />
faleceu acometido por moléstia cardíaca e hemorragia cerebral (LIMA, 1988).
Conhecidas algumas das principais características desse que foi o criador do<br />
basquetebol, é de fundamental importância saber quais os fatores determinantes da<br />
criação do basquetebol.<br />
Lima (1988) coloca que a situação da educação física, a partir de 1870 estava<br />
se tornando crítica nos EUA.<br />
Ferreira & De Rose (l987, p.1) citaram os seguintes motivos para a crise da<br />
Educação Física nos Estados Unidos na década de l870:<br />
- modificações introdutivas nas atividades físico-esportivas realizadas nas<br />
aulas de Educação Física, principalmente nos meses de rigoroso inverno, não<br />
havendo um lugar apropriado para a sua prática;<br />
das aulas;<br />
- a indisciplina por parte dos alunos por falta de motivação e pela monotonia<br />
- a falta de uma atividade esportiva que pudesse ser praticada por um grande<br />
número de pessoas ao mesmo tempo.<br />
Naquela época, os programas enfatizavam exercícios de força e destreza,<br />
adaptados do método alemão, os quais faziam uso de pesos e halteres.<br />
Como os problemas mencionados estavam se proliferando na rede Y.M.C.A,<br />
o diretor da secção de Educação Física, Luther Gulick, enviou para Springfield o<br />
66
professor Dr. Naismith, com a finalidade de resolver os problemas de indisciplina e<br />
estudar o método sueco com o barão Nils Posse. Buscava, assim, despertar<br />
novamente o gosto pelas aulas de Educação Física entre os jovens.<br />
Naismith teve que enfrentar uma série de dificuldades. Vendo que o novo<br />
método também não estava surtindo efeito, pois os alunos se mostravam muito<br />
arredios quanto a qualquer tentativa de mudanças, resolveu criar um novo jogo<br />
(LUZ, s.d.).<br />
O primeiro passo foi fazer um estudo analítico de todos os jogos praticados na<br />
época para detectar os elementos comuns e as ações predominantes. Observando<br />
atentamente a prática dos esportes mais populares na época, Naismith chegou à<br />
conclusão de que os esportes que eram jogados com bola tinham uma maior<br />
aceitação. O tamanho da bola foi uma preocupação muito grande, tendo em vista<br />
que o novo jogo deveria ser jogado por um grande número de alunos e, por isso,<br />
houve a escolha de uma bola maior, pois, do contrário, haveria muito contato físico<br />
entre os jogadores praticantes (LIMA, 1988).<br />
Outro item observado foi o de que a bola não deveria ser conduzida e sim<br />
passada entre os parceiros de equipe, que deveriam lançá-la para dentro de dois<br />
cestos colocados em lados opostos de uma quadra, a uma altura aproximada de três<br />
metros do solo. Daí, também, a denominação de "basketball". (baskets = cestos; ball<br />
= bola).<br />
67
As primeiras regras de basquetebol foram publicadas em 1891, sob o título<br />
"Um novo jogo". Eram muito simples: não caminhar com a bola na mão, a bola pode<br />
ser batida em qualquer direção, não agarrar ou empurrar, entre outras. O número de<br />
jogadores para cada lado variava. A Universidade de Cornell dividia o número de<br />
alunos, que era de cem, em duas equipes. Em 1893, houve uma padronização no<br />
número de jogadores para cada equipe: em quadras menores, o número era de<br />
cinco e, para quadras maiores, o número subia para nove. Somente em 1897 surgiu<br />
a obrigatoriedade de cinco jogadores por equipe (MARQUES, 1979).<br />
A estrutura básica do basquetebol se mantém até os dias atuais, com<br />
pequenas modificações introduzidas a cada nova olimpíada, com a finalidade de<br />
tornar o jogo mais atraente para o público e para os jogadores.<br />
Naismith certamente não poderia ter imaginado que o jogo criado por ele, com<br />
a finalidade de alterar o quadro de total desinteresse demonstrado pelos alunos da<br />
rede Y.M.C.A, viria a ser, nos dias atuais, um dos esportes mais praticados em todo<br />
o mundo.<br />
4.1 O Basquetebol no Brasil<br />
Em 1896, Augusto Shaw, que era professor do Colégio Mackenzie de São<br />
Paulo, ao voltar dos Estados Unidos, trouxe, em sua bagagem, uma bola de<br />
basquetebol. O Brasil foi o primeiro país da América do Sul a introduzir esse esporte<br />
(FERREIRA; <strong>DE</strong> ROSE, 1987).<br />
68
Mas foi, somente em 1912, que o basquetebol foi definitivamente introduzido<br />
no Brasil. Esse fato se deveu principalmente à campanha levada a efeito pela<br />
Associação Cristã de Moços do Rio de Janeiro (MARQUES, 1979, p.12).<br />
4.2 A Introdução do Basquetebol em Santa Cruz do Sul<br />
Em Santa Cruz do Sul, desde o momento em que o basquetebol foi<br />
introduzido pioneiramente na Sociedade Ginástica, ele tem figurado entre os<br />
esportes mais apreciados na cidade. Existem muitas evidências que comprovam<br />
essa afirmação; somente a título de exemplo, é importante fazer referência à<br />
entrevista realizada com Froehlich 4 (1995), que enfatiza que as partidas entre os<br />
dois maiores rivais, Ginástica e Corinthians, cujo primeiro clássico (GIXCO) ocorreu<br />
em 27 de novembro de 1940, sempre levaram um grande número de pessoas para<br />
prestigiar os jogos.<br />
A afirmação de que os jogos entre esses dois rivais levavam enorme público<br />
aos ginásios também foi confirmada por Martin (1995), que foi jogador e, mais tarde,<br />
diretor de basquetebol da Sociedade Ginástica.<br />
O jornal "Correio do Povo" (10 set. 1948) faz referência a um público estimado<br />
em duas mil pessoas no estádio, nas partidas em que se defrontaram os dois<br />
tradicionais adversários, Corinthians e Ginástica, em jogos realizados durante a<br />
4 Zildo C. Froehlich, nascido em 1928, trabalhou como funcionário público da Corsan,<br />
hoje aposentado. Foi atleta até a categoria juvenil. Foi treinador da Sociedade<br />
Ginástica e do Corinthians Sport Club nas modalidades de basquetebol masculino e<br />
feminino, atletismo e futebol de salão. Nessa função, teve destacada atuação nos<br />
cenários local e regional.<br />
69
Semana da Pátria de 1948. Naquela época ainda não existiam quadras cobertas,<br />
mesmo assim, o jornal faz referência a um estádio.<br />
Em resumo histórico do Corinthians Sport Club, publicado para divulgação do<br />
II Campeonato Estadual de Basquetebol Juvenil em 1953 (p.1), consta que, em<br />
1942, foi realizado o primeiro campeonato de basquete da cidade, sendo que o<br />
Corinthians Sport Club conquistou o título de Campeão local.<br />
Froehlich (1995) ressaltou que, na semana que antecedia o clássico GI x CO,<br />
a competição era assunto de animadas rodas esportivas no quiosque da praça e<br />
bares da cidade, o mesmo acontecendo após o jogo, durante a semana que a ele<br />
se seguia.<br />
Ao se falar em basquetebol em Santa Cruz do Sul, não se pode deixar de<br />
mencionar um dos personagens mais importantes para que esse esporte figure,<br />
hoje, entre as modalidades mais praticadas na cidade. Trata-se do Sr. Edgar Hart,<br />
nascido em Santa Cruz do Sul, responsável pela introdução do basquetebol na<br />
cidade e na região.<br />
Edgar Hart, de 90 anos, eletricista aposentado, extremamente humilde, lúcido<br />
e de memória invejável, bom falante da língua portuguesa, demonstrando ser uma<br />
pessoa bastante culta, foi entrevistado para este trabalho, em 6 de fevereiro de<br />
1995. Questionado sobre onde teria conhecido o basquetebol para introduzi-lo em<br />
nossa cidade, Hart respondeu que conhecera esse esporte em Cruz Alta, onde<br />
cumpriu o serviço militar, e que o basquetebol fora trazido por oficiais militares<br />
70
transferidos para aquela cidade, provenientes do Rio de Janeiro e São Paulo.<br />
Quando esse esporte chegou a Santa Cruz do Sul, os jovens, sócios da Sociedade<br />
Ginástica, que jogavam futebol e outros esportes, foram convidados para jogar o<br />
basquetebol e tiveram, eles mesmos, que confeccionar as tabelas e os aros. O<br />
basquetebol era, então, praticado em chão batido, e os locais para a prática desse<br />
esporte se reduziam somente às quadras improvisadas ao ar livre (HART, 1995).<br />
Naquela época, era necessário que os praticantes de basquetebol fossem<br />
associados da Sociedade Ginástica e, mais tarde, do Corinthians Sport Club para<br />
poder praticar o basquetebol. Esse era, portanto, um fator que dificultava a<br />
participação mais efetiva de um maior número de praticantes (FROEHLICH, 1995).<br />
4.3 A Evolução do Basquetebol em Santa Cruz do Sul<br />
O basquetebol em Santa Cruz do Sul, desde a sua criação, passou por crises<br />
que alternaram melhores e piores momentos. A rivalidade entre as duas mais<br />
tradicionais agremiações - a Sociedade Ginástica e o Corinthians Sport Club - era<br />
muito positiva, uma vez que essa competividade, demonstrada principalmente nos<br />
clássicos Ginástica x Corinthians - GI x CO, fez com que esse esporte se tornasse<br />
um dos mais atraentes para o público de Santa Cruz do Sul.<br />
Em reportagem publicada no jornal Gazeta do Sul do dia 23 de março de<br />
1995 (p.23), com o título "O Basquete em Santa Cruz", escrito por Hardy Martin,<br />
consta que esse esporte foi apresentado à comunidade pela primeira vez, numa<br />
quadra improvisada, em 27 de setembro de 1931, na chácara de Rudolfo Neumann,<br />
71
que cedeu o local para a prática de competições esportivas ao ar livre. A partida foi<br />
realizada por dois quadros da Sociedade Ginástica e foi composta pelos seguintes<br />
jogadores: Edgar Hart, Hugo Iserhard, Hugo Luft, Bruno Lux, Alfredo Marx, Ricardo<br />
Schmiedel, Arthur Daudt, Walter Dreyer, Alfredo Wagner, Rudolfo May e Bruno<br />
Kliemann.<br />
Falando sobre as maiores dificuldades encontradas na implantação do<br />
basquetebol em Santa Cruz do Sul, Hart (1995) afirma que “Ninguém se opôs ou fez<br />
qualquer tipo de pressão contrária ao esporte. Disse que o pessoal os deixou fazer,<br />
garantindo que, se desse resultado iria apoiá-los”, e, de fato, foi o que aconteceu.<br />
Esse depoimento de Edgar Hart, quanto ao sucesso da introdução do<br />
basquetebol em Santa Cruz do Sul, pode ser comprovado pela posição de<br />
destaque que as equipes de Santa Cruz do Sul ocuparam no cenário gaúcho,<br />
principalmente nas décadas de 40 e 50, havendo uma queda nos anos 60 e<br />
70, uma nova ascensão na década de 80, culminando, na década de 90, com<br />
a formação das equipes de alto nível do Corinthians Sport Club, que<br />
projetaram Santa Cruz do Sul no cenário brasileiro. Hart (1995) afirma que,<br />
no início, foi muito difícil, visto que não existia uma local apropriado para a<br />
prática desse esporte. Além disso, os jovens já praticavam outras<br />
modalidades esportivas, e o basquetebol seria apenas mais uma entre tantas<br />
outras opções esportivas. Assim uma das maiores dificuldades apontadas<br />
por Hart foi convencer os companheiros a ajudar na capina, e fazer mais ou<br />
menos a marcação das linhas da quadra. Além disso, as tabelas e os aros<br />
dependiam, também, do trabalhoda equipe.<br />
Perguntado se o basquetebol, na época de 1931, quando foi introduzido em<br />
Santa Cruz do Sul, já era praticado com cinco jogadores de cada lado e com regras<br />
estabelecidas, Hart respondeu:<br />
Quanto ao número de jogadores até podia ter mais do que cinco para cada<br />
lado. Nunca menos! Quanto às regras, era mais ou menos. Naquele tempo<br />
era muito "bruto"! Não havia boas combinações para iludir o inimigo. Era bem<br />
rudimentar, como todo começo. Por exemplo, a altura do aro tinha mais ou<br />
menos a altura de hoje em dia, mas não tinha uma medida exata. Era no olho<br />
mesmo! Os tênis, na época, eram bem rudimentares. Eu sei que uma vez eu<br />
72
importei um tênis de basquete para mim dos E.U.A. Aquele tênis durou uns<br />
dois anos!.<br />
Quanto ao número de praticantes, Hart colocou que, logo que o basquetebol<br />
foi introduzido em Santa Cruz do Sul, havia poucos adeptos.<br />
73<br />
Nós convidávamos algumas crianças para jogar e eram feitas equipes. Os<br />
jogadores iam-se revezando. Nunca havia brigas porque nós jogávamos<br />
como adversários e não como inimigos. Aos poucos, o número de<br />
praticantes nesta modalidade foi crescendo.<br />
Naquela época, comenta Hart (1995), os pais pagavam todas as despesas de<br />
viagem, a alimentação, os calções e os tênis. O alojamento era de graça. Na sua<br />
opinião naquele tempo, era "mais gostoso" praticar esportes, era "puramente<br />
amador", os atletas não recebiam nada para jogar.<br />
Perguntado se o basquetebol era elitizado Hart (1995) respondeu:<br />
Não. O basquete no começo, não tinha nada disso, era tudo pessoal,<br />
simples, já pelo sistema, que era um jogo com as mãos e, tal como o futebol<br />
também não era de elite, o futebol tem os coitados que assistem o<br />
camarada que ganha uma fortuna para jogar.<br />
Ao ser questionado sobre o fato de o basquetebol, criado nos Estados<br />
Unidos, ter uma aceitação tão intensa numa cidade de descendentes de origem<br />
alemã, Iserhard (1995) respondeu:<br />
A questão não é esta. É que nós tínhamos a tendência para o esporte, nós<br />
fazíamos a ginástica, atletismo, vôlei e futebol, tudo na mesma semana.As<br />
moças jogavam vôlei e praticavam a ginástica rítmica e aparelhos. Nós<br />
fazíamos física todos os dias. A ginástica era praticada antes do basquete.
Quanto aos maiores adversários da época, Iserhard (1995), recorda:<br />
74<br />
As partidas mais acirradas eram contra Lajeado. Era complicado jogar lá.<br />
Nós íamos de ônibus para Lajeado e Estrela. Quando chegávamos lá,<br />
quase ninguém conhecia o outro de tanta poeira, os bancos eram de tábua<br />
dura. Não era fácil. Hoje não, vai de avião.<br />
Iserhard (1995) recorda que a primeira partida intermunicipal disputada pela<br />
Sociedade Ginástica foi contra uma equipe de Estrela e que o placar do jogo indicou<br />
um empate de 14 a 14. Lembra ainda que no dia seguinte foi realizada uma partida<br />
contra uma equipe de Lajeado, havendo novamente um empate, dessa vez, 12 a 12.<br />
Em 1939, com a fundação do Corinhians Foot - Ball Club, o basquetebol, que<br />
já vinha tendo um número razoável de praticantes na Sociedade Ginástica, tomou<br />
um impulso maior ainda, angariando novos adeptos entre a juventude santa-<br />
cruzense.<br />
A exemplo da Sociedade Ginástica as primeiras partidas amistosas<br />
intermunicipais das equipes dos quadros "A" e "B" do Corinthians Sport Club<br />
ocorreram em 27 de maio de 1940, contra as equipes do Ginástico de Estrela,<br />
naquela cidade. O Corinthians perdeu pelos placares de 38 x 18 e de 23 x 17,<br />
respectivamente. Nas duas partidas realizadas com as equipes dos quadros "A" e<br />
"B", respectivamente, mais de 70 pessoas acompanharam a delegação corinthiana<br />
(CORINTHIANS, 1939, p.30).<br />
O “five” titular do 1º quadro de basquete do Corinthians foi formado por Lucio<br />
A. Rech, Leo Krather, Ottmar R. Pohl, L. F. Heuser, e Siefried E. Heuser.”
A exemplo dos atletas da Sociedade Ginástica que construíram eles próprios<br />
a sua primeira cancha de basquetebol, os jovens do Corinthians Sport Club também<br />
construíram a sua primeira cancha oficial com iluminação. A reportagem do Jornal<br />
Gazeta do Sul (03 ago. 1945, p.08) aborda o assunto:<br />
75<br />
O basquetebol foi introduzido no Corinthians Sport Club com muito<br />
entusiasmo. Rapazes fanáticos fazendo toda a espécie de serviços. Uns<br />
capinando, outros fazendo buracos para os postes da instalação elétrica,<br />
trabalhando noite e dia. Até chegaram a trabalhar sob a luz de velas...<br />
Deve-se levar em conta que todos os rapazes eram de modestos recursos,<br />
Treinavam com afinco e entusiasmo... Enfim chegou o grande dia: a<br />
inauguração da cancha... O resultado da partida foi fatídico: 33 a 2... Estes<br />
rapazes jogaram um ano e meio sem nenhuma vitória sequer... Quanto mais<br />
perdiam, mais treinavam... Era uma turma unida e disposta a todos os<br />
sacrifícios.<br />
O primeiro clássico entre os dois clubes de maior tradição em basquetebol,<br />
Ginástica x Corinthians - Gi x Co, disputado em Santa Cruz do Sul, foi um jogo<br />
amistoso em 27 de novembro de 1940, sendo os quadros "A" e "B" do Corinthians<br />
Sport Club derrotados pelas equipes da Sociedade Ginástica: o primeiro pelo placar<br />
de 41 x 17 e o segundo pelo de 29 x 21. Esses jogos foram comemorados como<br />
vitórias pelos corinthianos porque, segundo eles, se a partida tivesse transcorrido<br />
normalmente o Corinthians teria vencido o jogo (CORINTHIANS, 1940).<br />
Em 1942, foi realizado o primeiro Campeonato Citadino, reunindo as duas<br />
agremiações esportivas. De um lado, a Sociedade Ginástica, pioneira nessa<br />
modalidade desde 1931; de outro lado, o Corinthians Sport Club, que implantara o<br />
seu departamento em 1939, e que no primeiro ano e meio de existência de seu<br />
Departamento de Basquetebol, não havia vencido nenhuma partida. O primeiro<br />
Campeonato de Basquetebol da cidade foi vencido pela equipe do Corinthians Sport
Club numa melhor de três partidas: duas vitórias e uma derrota.( Gazeta do Sul, 26<br />
jul. 1958).<br />
O título de Campeão Citadino deu direito ao Corinthians Sport Club de<br />
representar Santa Cruz do Sul no Campeonato Estadual de 1942, que foi realizado<br />
em Porto Alegre, em janeiro de 1943. Mesmo na condição de caloura, a equipe do<br />
Corinthians representou muito bem a cidade, conseguindo, nesse certame, obter o<br />
título de Vice-Campeã Estadual, perdendo apenas para a equipe do Internacional. O<br />
primeiro jogo foi realizado no dia 4 de janeiro de 1943 e foi vencido pelo Campeão<br />
de Porto Alegre pelo placar de 76 X 23; o egundo jogo foi realizado no dia 6 de<br />
janeiro e foi vencido novamente pelo Internacional por 49 X 26. A equipe do<br />
Corinthians foi composta pelos seguintes cestinhas: Lauro Pomerehnn, Gastão<br />
Werlang, José Schulte, Fernando Fetter, Walter Kern, Agostinho Kliemann, Euclydes<br />
Kliemann, Elemar Gruendling, Lucio Rech, Carlos Kraether e Erich Gerhardt.<br />
(CORINTHIANS, 1943).<br />
Em 1945, o Corinthians Sport Club já era Tricampeão Citadino. O<br />
basquetebol sempre alternou bons e maus momentos, ora com as equipes da<br />
Sociedade Ginástica, ora com as equipes do Corinthians Sport Club, devido a uma<br />
maior ou menor motivação por parte dos praticantes. Isso se confirma no conteúdo<br />
de uma reportagem sobre o basquetebol, publicada no jornal Gazeta do Sul de 3 de<br />
agosto de 1945 (p.8), por um "tricolor” (corinthiano), que escreve:<br />
76<br />
Onde ficou aquela união aquela força de vontade? Convoca-se um treino...<br />
O técnico avisa por telefone, fulano hoje tem treino, vais? Sim, é a resposta.<br />
O técnico satisfeito, todos vão. Chega a hora do treino. Chega um, dois,
três, seis, parou. E os outros? Ora, fulano foi jogar bolão, ciclano foi ao<br />
cinema, beltrano treinou futebol à tarde e está cansado e assim por diante.<br />
Froehlich (1995) citou, em entrevista oral, que realmente o Corinthians Sport<br />
Club passara por dificuldades para reunir atletas nos treinamentos em 1945, mas<br />
enfatizou que o mesmo não acontecia com a Sociedade Ginástica, pois, naquele<br />
ano, a mesma estava com muitos jogadores nas categorias infantil, juvenil e adulto,<br />
o que facilitava os treinos.<br />
O basquetebol no Rio Grande do Sul, a partir de 1942, passou a ser dirigido<br />
pela Federação Atlética do Rio Grande do Sul - FARG, órgão normativo e consultivo<br />
de várias modalidades do desporto amadorista no Estado. Em 1952, a FARG foi<br />
dividida em federações específicas para cada modalidade esportiva. A Federação<br />
Gaúcha de Basquetebol ( F.G.B) foi fundada em 18 de abril de 1952 e passou a ter<br />
a incumbência de dirigir e regulamentar essa modalidade no Estado do Rio Grande<br />
do Sul.<br />
Em 7 de julho de 1953, o Grêmio Atlético Sampaio enviou ofício à F.G.B.<br />
solicitando a sua filiação naquela entidade. Em resposta à solicitação, o presidente<br />
da F.G.B Diogo Antonio Pastor, enviou um ofício ao Grêmio Atlético Sampaio,<br />
solicitando providências para a formação de uma Liga de Basquetebol em Santa<br />
Cruz do Sul (Gazeta do Sul, 24 jul. 1953).<br />
No dia 24 de julho do mesmo ano, através do jornal Gazeta do Sul, Belmiro<br />
Karam Menezes convocou uma reunião para o dia 28 de julho de 1953, para tratar<br />
dos estudos preliminares para a criação de uma Liga que envolveria<br />
77
epresentantes de vôlei, basquetebol e atletismo. Nessa mesma reunião, realizada<br />
na sede do Grêmio Atlético Sampaio, foi criada a Liga Atlética de Santa Cruz do Sul<br />
- LASC.<br />
Essa associação não conseguiu cumprir com o seu papel. Numa reportagem<br />
do jornal Gazeta do Sul (31 jan. 1959, p.8), sob o título "A LASC e o Basquete em<br />
Santa Cruz", um observador escreve:<br />
78<br />
Uma liga não pode congregar mais do que uma modalidade esportiva. Na<br />
prática, realmente, a atual LASC - que foi feita ATLÉTICA para reunir os<br />
demais esportes amadoristas, o que não pode mais, conforme vimos - não<br />
representa mais do que o basquete. Logo, Liga Santa-cruzense de<br />
Basquete - L.S.C.B".<br />
E complementa "É preciso que a Liga de Basquete funcione e que não<br />
atrapalhe como está fazendo atualmente".<br />
O Campeonato Citadino de Basquetebol de 1959 já foi dirigido pela Liga<br />
Santa-cruzense de Basquetebol.<br />
Pela reportagem do jornal Gazeta do Sul, de 6 de outubro de 1959 (p.5),<br />
percebe-se que o Corinthians Sport Club teve um domínio quase que absoluto sobre<br />
o seu maior rival, a Sociedade Ginástica, nos certames citadinos que eram<br />
realizados anualmente, desde 1942. Froehlich (1995) colocou que o último clássico<br />
GI x CO fora realizado em 1970.
O Corinthians Sport Club embora tenha introduzido o seu Departamento de<br />
Basquetebol Masculino apenas em 1939, portanto, mais tarde que o seu maior rival,<br />
conquistou os seguintes títulos citadinos na categoria adulto: 1942 - 1943 - 1944 -<br />
1945 - 1947 - 1948 - 1950 - 1951 - 1954 - 1955 - 1956 - 1957 - 1958 - 1960 - 1961 -<br />
1962 - 1963 - 1965. Já a Sociedade Ginástica, que introduziu o basquetebol em seu<br />
quadro esportivo a partir de 1931, sendo portanto, a pioneira nesse esporte em<br />
Santa Cruz do Sul, conquistou os seguintes títulos citadinos: 1946 - 1949 - 1952 -<br />
1953 - 1959 (Gazeta do Sul, 25 jul. 1959, p.4) - 1964 - 1966 - 1967 - 1968 - 1969 -<br />
1970- 1971 (Gazeta do Sul, 20 out. 1971, p.7).<br />
Em 1990, a Sociedade Ginástica reabriu o Departamento de Basquetebol<br />
Adulto, possibilitando a realização de mais um campeonato citadino. Esse GixCo foi<br />
disputado numa melhor de três partidas, tendo sido o Corinthians vencedor das duas<br />
primeiras, não tendo havido, pois, a necessidade da terceira. Nesse mesmo ano, a<br />
Sociedade Ginástica fechou o Departamento de Basquetebol Adulto, permanecendo<br />
assim até hoje.<br />
Froehlich (1995) enfatizou que tanto a Sociedade Ginástica como o<br />
Corinthians Sport Club sempre representaram condignamente Santa Cruz do Sul em<br />
todos os campeonatos por eles disputados. As duas representações de maior<br />
tradição na cidade revezavam melhores e piores resultados nos certames por elas<br />
disputadas, mas sempre com um espírito altamente competitivo.<br />
O Corinthians Sport Club, pelo fato de ter sido o clube que mais vezes<br />
conquistou o Campeonato Citadino, e por ser o único clube nessa modalidade que<br />
79
nunca interrompeu as suas atividades, teve maiores oportunidades de disputar não<br />
somente campeonatos estaduais, mas também campeonatos nacionais e, como<br />
conseqüência, trouxe vários títulos de Campeão Estadual de Basquetebol na<br />
categoria principal.<br />
Em 1944, o Corinthians Sport Club participou, pela primeira vez, de um<br />
campeonato nacional, "IX CAMPEONATO ABERTO <strong>DO</strong> INTERIOR", disputado em<br />
Taubaté, São Paulo. No jornal Gazeta do Sul de 8 de janeiro de 1955 (p.8),<br />
encontra-se uma reportagem a esse respeito:<br />
80<br />
Entre os muitos títulos que honram o Corinthians Sport Club, na sua<br />
brilhante trajetória no cenário esportivo esportivo do país, sobressai o de<br />
"Campeão da Disciplina", conquistado galhardamente, em 1944, pela<br />
rapaziada tricolor, entre dezenas de clubes de todo o país que se<br />
encontravam naquela cidade paulista... Esta competição é considerada uma<br />
das mais empolgantes e concorridas da América do Sul.<br />
Comunicada pela Federação Atlética Rio-grandense de que o Campeonato<br />
Estadual seria realizado em Uruguaiana no dia 5 de novembro de 1945, a direção<br />
tricolor concluiu que o Clube não teria condições de participar do Campeonato<br />
Estadual por diversos motivos, entre os quais, a ausência de um dos seus maiores<br />
valores, o atleta Agostinho Kliemann, a impossibilidade de dois outros atletas se<br />
ausentarem da cidade na primeira quinzena de novembro e, finalmente, a falta<br />
completa de reservas. Em vista desses problemas, o Clube não teria nem mesmo<br />
condições de disputar uma melhor de três partidas com a Ginástica para apurar o<br />
campeão citadino nessa época. Ficou acertado, entre os dirigentes da Sociedade<br />
Ginástica e do Corinthians, que seria disputada apenas uma partida, e a equipe<br />
vencedora seria a representante de Santa Cruz do Sul naquele campeonato
estadual. A equipe seria formada por atletas de ambas as agremiações. Resultado:<br />
Ginástica, Vice-Campeã Estadual de Basquetebol de 1945.<br />
Resolvida a questão referente ao Campeonato Estadual de 1945, nos dias 10,<br />
12 e 19 de dezembro, foram realizadas as partidas do Campeonato Citadino,<br />
apontando o Corinthians como Campeão (CORINTHIANS, 1945).<br />
Em 1946, a Sociedade Ginástica e o Corinthians Sport Club fizeram uma<br />
parceria e juntos patrocinaram a realização do Campeonato Estadual de<br />
Basquetebol em Santa Cruz do Sul. A Sociedade Ginástica sagrou-se Campeã do<br />
Interior e Vice-Campeã Estadual, perdendo apenas para o Internacional de Porto<br />
Alegre, que ficou com o título. A Sociedade Ginástica incluiu, em sua equipe, dois<br />
atletas: Agostinho Kliemann e Erich Gerhardt, ambos jogadores do Corinthians Sport<br />
Club (CORINTHIANS, 1946).<br />
Embora o Campeonato Citadino de 1947 tenha sido vencido pelo Corinthians<br />
Sport Club, coube novamente à Sociedade Ginástica representar Santa Cruz do Sul<br />
no Campeonato Estadual organizado pela F.A.R.G. Esse fato ocorreu porque os<br />
atletas Erich e Agostinho, emprestados pelo Corinthians para a Sociedade Ginástica<br />
disputar o Campeonato Estadual de 1946, não haviam cumprido o estágio de 265<br />
dias previsto em regulamento. Como houve denúncia por incrição irregular dos dois<br />
atletas nos jogos do Campeonato Citadino, a F.A.R.G comunicou ao Corinthians<br />
Sport Club que o representante de Santa Cruz do Sul no Campeonato Estadual a<br />
ser disputado em Santa Maria, seria a Sociedade Ginástica. Em reunião do dia 28 de<br />
81
novembro de 1947 (Ata nº3, p.84), o Conselho Deliberativo decidiu mandar mandar<br />
publicar a seguinte nota no jornal Gazeta do Sul:<br />
E termina a nota, dizendo:<br />
82<br />
Nosso repúdio a tão infeliz gesto, proclamando nossa vitória e afirmando<br />
que, invertidos os papéis, tivéssemos sido nós os derrotados, não iríamos<br />
representar Santa Cruz do Sul no Campeonato Estadual.<br />
"Assim, apesar de não reconhecidos oficialmente, conquistamos o<br />
Campeonato de Basquetebol da cidade, em 1947.”<br />
Nos dias 8, 9 e 10 de fevereiro de 1951 o Corinthians Sport Club sediou o<br />
primeiro Campeonato Estadual de Basquetebol na categoria juvenil. Participaram da<br />
campanha os seguintes atletas: Normélio Boetcher, Nelson Steinhaus, Jurgen<br />
Klemm, Ingo Stumm, Gilberto Renner, Hardy Dummer, Pojucan Menezes, Luiz<br />
Gaspar Beck da Silva e Guido Frantz , tendo como técnico, Zildo C. Froehlich. O<br />
Corinthians Sport Club sagrou-se campeão nesse campeonato, realizando uma<br />
expectativa da direção da agremiação expressa nas atas da Diretoria. No ano<br />
seguinte, essa categoria conseguiu o Vice-Campenato Estadual Juvenil. Alguns<br />
atletas dessa categoria que se sagrou Campeã Estadual em 1951 e vice-campeã no<br />
ano seguinte, destacaram-se na equipe principal nas temporadas seguintes<br />
(CORINTHIANS, 1952).<br />
Em 23 de outubro de 1954 e em 19 de outubro de 1957, tendo Rio Grande<br />
como cidade sede, o Corinthians Sport Club ficou com o título de Vice-Campeão
Estadual de Basquetebol, O Livro de Atas nº5 de 1957, p.86, novamente indica o<br />
conceito que o basquetebol tinha no Rio Grande do Sul: "O Vice-Campeonato do<br />
Estado elevou bem alto o prestígio de Santa Cruz do Sul nessa modalidade<br />
esportiva". A equipe perdeu somente a partida final para a equipe de Santa Maria<br />
pelo placar de 46 x 43 nos minutos finais do jogo.<br />
Uma reportagem no jornal Gazeta do Sul (26 out. 1954), sob o título<br />
“Consagradora Recepção ao Vice-Campeão Estadual”, assim se expressou:<br />
83<br />
O Corinthians S.C., em Rio Grande, honrou sobremaneira as tradições<br />
esportivas santa-cruzenses, mercê de sua brilhante campanha no Estadual<br />
de Basquete recentemente findo. Os tricolores obtiveram os títulos de<br />
Campeões Estaduais de Lance-Livre, por equipe e individualmente, e ainda<br />
de Campeões do Interior e Vice-Campeões do Estado, tendo, além disso,<br />
conquistado as simpatias gerais do público social de Rio Grande, devido à<br />
conduta disciplinada dos rapazes corinthianos.<br />
Anualmente, eram disputados os campeonatos citadinos, que davam à equipe<br />
campeã o direito de passar para outra fase, a zonal. O Estado era dividido em várias<br />
Zonas, sendo que os Campeões das Zonas disputavam o Campeonato Estadual de<br />
Basquetebol. As Zonas eram: Porto Alegre, da Serra, Norte, Zona Centro e<br />
Fronteira (Gazeta do Sul, 22 dez. 1955).<br />
Já em outra reportagem, datada de 15 de outubro de 1957, no jornal Gazeta do<br />
Sul, se percebe que o Corinthians teve que vencer a equipe do Flamengo de<br />
Cachoeira do Sul por duas vezes consecutivas, sagrando-se, dessa forma,<br />
Tetracampeão da Zona Centro, o que dava condição à equipe local representar<br />
Santa Cruz do Sul no Campeonato Estadual.
Corinthians será o 1º Clube do Brasil a receber a Ordem de Honra ao Mérito<br />
da Confederação Brasileira de Basquetebol - C.B.B ": com esse título o jornal<br />
Gazeta do Sul do dia 31 de dezembro de 1955 (p.8) anunciava que a C.B.B. -<br />
Entidade Máxima do Basquete Brasileiro, ofertaria um troféu ao clube tricolor em<br />
reconhecimento aos relevantes serviços prestados para o desenvolvimento do<br />
basquete. O Corinthians foi indicado para receber a distinção pelo vice-presidente<br />
Carlos Chagas, que havia participado da solenidade de inauguração do ginásio<br />
tricolor em 25 de dezembro de 1955. Para o dirigente carioca, em 1955, o ginásio<br />
do Corinthians Sport Club era o 3º maior ginásio do Brasil em se tratando de<br />
instalações.<br />
Um fato que merece destaque negativo no cenário esportivo, ocorreu em<br />
1956, quando na segunda partida do tradicional GI x CO, válido pelo Campeonato<br />
Citadino, a Sociedade Ginástica, em ofício endereçado ao presidente da LASC,<br />
solicitou o afastamento do árbitro daquela partida, Franco Conte, acusando o mesmo<br />
de ter tido participação direta na derrota da Sociedade Ginástica. Tal fato motivou<br />
uma reunião do Conselho Deliberativo do Corinthians Sport Club, que enviou um<br />
ofício ao presidente da Liga para comunicar as seguintes resoluções (GINÁSTICA,<br />
1956, p.67-70).<br />
a) suspender toda e qualquer relação com a Sociedade Ginástica até<br />
completo esclarecimento dos fatos, ou, então, retratação pública;<br />
dos fatos;<br />
b) solicitar à Liga a abertura de um inquérito para completo esclarecimento<br />
84
c) solicitar o adiamento da última partida que seria disputada no ginásio<br />
tricolor, enquanto não fossem apurados todos os fatos;<br />
d) hipotecar integral solidariedade ao técnico e jogadores do Corinthians por<br />
reconhecer neles qualidades de esportividade que o passado de lutas e sacrifícios<br />
em prol do desenvolvimento do esporte santa-cruzense lhes assegurava.<br />
O primeiro título de Campeão Estadual conquistado pelo Corinthians Sport<br />
Club foi disputado em Santa Cruz do Sul, no ginásio do Corinthians Sport Club, de<br />
14 a 21 de dezembro de 1958. A equipe local disputou seis jogos, não perdendo<br />
nenhuma partida. Na Ata n. 6 de 22 dezembro de 1958 (p.20), encontra-se toda a<br />
história da conquista do Corinthians Sport Club, que se sagrou campeão invicto no<br />
7º Campeonato Estadual, depois de vários anos ocupando a condição de vice<br />
(1942, 1954 e 1957). A equipe teve, na direção técnica, Lauro Pomerehn e os<br />
seguintes atletas corinthianos, que conquistaram esse expressivo título: Walter<br />
Glauche, Nelson Tech, Jurgem Klemm, Gilberto Renner, Nino Rohr, Ruben Borba,<br />
Lauro Schweickardt, Pojukan Menezes, Eolândio Borba, Chico Vogel, Fernando<br />
Schulte, Gilberto Müller e Garincha (Jaburu). Nesse mesmo campeonato, o<br />
Corinthians Sport Club conseguiu o primeiro lugar por equipe no certame de lance<br />
livre, que era disputado paralelamente, com 53% de aproveitamento.<br />
Sob o título “Papai Noel de 1958 trouxe o título tão sonhado: Corinthians,<br />
Campeão Estadual de Basquete”, uma reportagem no jornal Gazeta Sul do dia 24 de<br />
dezembro (p.8) assim se expressou:<br />
85
86<br />
Corinthians conquistou, finalmente, o título de Campeão Estadual de<br />
Basquete ao encerrar a sua brilhante jornada no Estadual - que, durante<br />
uma semana, empolgou toda a cidade. Após muitos anos de eterno “vice”<br />
que já desanimava atletas dedicados- eis que Deus fez justiça um dia, e o<br />
tão sonhado título está nas mãos do Corinthians.<br />
O primeiro título estadual foi muito festejado por toda a comunidade esportiva,<br />
com estrondoso foguetório e passeata nas principais ruas de Santa Cruz do Sul.<br />
Pela primeira vez, o ginásio do Corinthians se tornou pequeno para abrigar todas as<br />
pessoas que vieram prestigiar a conquista de tão cobiçado título. A Câmara de<br />
Vereadores de Santa Cruz do Sul aprovou a entrega de um troféu ao Corinthians<br />
Sport Club e medalhas aos jogadores campeões estaduais. No dia 22 de agosto de<br />
1959, no banquete de aniversário do Corinthians, com a presença de convidados<br />
especiais e sócios fundadores, todos os jogadores, bem como a direção técnica que<br />
participou da campanha que culminou com a obtenção do título de Campeão<br />
Estadual de 1958, foram laureados. (CORINTHIANS, 1958, p. 22, 48).<br />
Em 29 de abril de 1959, um observador escreveu um artigo que foi publicado<br />
no Jornal Gazeta do Sul (p. 8), alertando:<br />
O Corinthians necessita, urgentemente, dar mais atenção à renovação de<br />
novos valores, pois, caso contrário, muito em breve terá pela frente longos<br />
anos de vacas magras, como agora os tem de vacas gordas.<br />
Continua o observador na mesma matéria:<br />
"A culpa do que está ocorrendo é dos jogadores que precisam treinar mais e<br />
dos diretores que devem se interessar mais pelas categorias menores”.
Embora o Corinthians fosse Pentacampeão citadino e o Campeão Estadual<br />
de 1958, portanto o favorito para conquistar novamente o título citadino, foi<br />
surpreendido pela Sociedade Ginástica, que, conforme seus dirigentes haviam<br />
previsto no churrasco de abertura da temporada, conquistou o referido título.<br />
Cláudio Backes, em reportagem na Gazeta do Sul do dia 17 de fevereiro de 1959,<br />
assim se referiu ao assunto:<br />
87<br />
Muito nos honra o título do Corinthians (Campeão Estadual), pois, se não<br />
fôssemos nós, eles nem treinariam. No ano passado, tive a honra de<br />
envergar a gloriosa camiseta da Pioneira e ali pude notar a debacle moral<br />
(complexo), que sentem os nossos jogadores diante do Corinthians.<br />
Individualmente e tecnicamente, somos superiores. Falta-nos apenas o fator<br />
psicológico.<br />
Na mesma reportagem, Hélio Schweitzer expressou-se em nome dos atletas,<br />
referindo-se à nova etapa de basquetebol na Ginástica: “Uma vitória em 1959<br />
compensará praticamente os 5 anos perdidos, pois este ano vamos fazer tudo para<br />
ficarmos campeões da cidade.”<br />
Assim, o prognóstico feito na festa de reinício da temporada da Sociedade<br />
Ginástica tornou-se realidade pois o Campeonato Citadino de 1959 foi vencido por<br />
esta sociedade que pôde representar Santa Cruz do Sul no VIII Campeonato<br />
Estadual, disputado na cidade de Rio Grande de 31 de outubro até 5 de novembro<br />
daquele ano (Gazeta do Sul, 6 out. 1959, p.4).<br />
Uma reportagem do jornal Gazeta do Sul do dia 12 de novembro de 1959 (p.<br />
8), sob o título " Ginástica honrou o basquete de Santa Cruz, o melhor do Estado",
faz uma análise deste certame, em que a equipe local perdeu a partida final para a<br />
equipe do Internacional por apenas um ponto 47 x 46:<br />
88<br />
Novamente ficou patenteado e no presente certame mais do que no<br />
passado, a superioridade das equipes representativas dos dois centros<br />
onde indiscutivelmente se pratica o melhor basquete do Estado: Porto<br />
Alegre e Santa Cruz do Sul.<br />
A Ginástica, após muitos anos de ausência, reaparecera num campeonato<br />
estadual. Muitos não acreditavam na equipe ginasticana, unicamente pelo fato de<br />
não a conhecerem. A Ginástica tinha menos nome no cenário cestobolístico do<br />
Estado do que o Corinthians, seu tradicional rival, que contava com muitos mais<br />
títulos citadinos e, por conseguinte, com maior número de oportunidades nos<br />
certames estaduais.<br />
Decididamente, Corinthians e Ginástica nunca tiveram um bom<br />
relacionamento: às vezes o ambiente hostil extrapolava as dimensões das quadras<br />
de jogo. Na Ata nº 7 do dia 22 de dezembro de 1964, (p.69) pela segunda vez,<br />
Corinthians e Ginástica romperam relações. A primeira fora em 1956. Dessa vez, o<br />
motivo foi que, após o Gi x Co do dia 13 de dezembro, foram encontradas, por<br />
dirigentes do Corinthians, num “W.C” diversas flâmulas da agremiação que haviam<br />
sido dadas aos atletas da Ginástica. A acusação foi publicada no dia seguinte ao<br />
jogo no Jornal Gazeta do Sul. O presidente da Sociedade Ginástica, Edmundo<br />
Steffens mandou públicar a resposta no jornal Gazeta do Sul do dia 19 de dezembro<br />
de 1964 (p.8): "Nossos atletas receberam com muita honra e dignidade esportiva a<br />
doação das sete flâmulas deste tradicional clube.”
A reportagem faz entender que as flâmulas não haviam sido postas no "W.C"<br />
pelos atletas da Sociedade Ginástica. Na mesma ata, dirigentes tricolores afirmam<br />
textualmente:<br />
89<br />
Nossas relações já haviam sido interrompidas e não haviam sido<br />
oficialmente reatadas, tendo a Ginástica, em certa ocasião, manifestado<br />
desejo de reatamento, sendo disputado então, um "Torneio da Amizade.<br />
Esse ambiente competitivo existente entre as duas agremiações, Corinthians<br />
e Ginástica, era tão intenso, que os confrontos esportivos eram transferidos para os<br />
dois colégios particulares de maior tradição em Santa Cruz do Sul, São Luís e Mauá.<br />
Nas disputas dos jogos de basquete da Semana da Pátria, uma curiosidade que<br />
sempre chamou atenção foi a de que, geralmente, os alunos do Colégio São Luis<br />
jogavam pelo Corinthians e torciam pelo Futebol Clube Avenida, enquanto os alunos<br />
do Colégio Mauá jogavam pela Sociedade Ginástica e torciam pelo Futebol Clube<br />
Santa Cruz. Essa curiosidade foi confirmada pelo ex-diretor do Colégio Mauá Hardy<br />
Martin. Tech (1995), integrante da equipe campeã estadual em 1958, o Corinthians<br />
Sport Club, atribui esse fato à liderança exercida por Hardy Martin, que também era<br />
dirigente e ex-atleta da Sociedade Ginástica.<br />
Nas décadas de 60 e 70, o basquetebol de Santa Cruz do Sul começou a<br />
entrar numa fase de decadência. Essa situação pode ser comprovada através de<br />
reportagens da época principalmente do jornal Gazeta do Sul, as quais enfatizaram<br />
esse fato e, ao mesmo tempo buscaram respostas para a situação. A primeira<br />
reportagem publicada sobre o assunto data do dia 2 de julho de 1963 (p. 8), com o
seguinte título: " Basquete de Sta Cruz não é mais aquele: GI X CO foi péssimo".<br />
Venceu a Ginástica (17x13 no 1º tempo e 38x36 no final), e continua a reportagem:<br />
90<br />
Há bem poucos anos, ainda, o esporte da cesta praticado na Fumocap se<br />
alinhava entre o que tínhamos de melhor no Estado. Hoje, porém, o<br />
basketball se apresenta bem diverso, num nível técnico que dá pena.<br />
Em outra reportagem, datada do dia 2 de julho de 1969 (p.8), o repórter<br />
enfatiza que o declínio do basquetebol está na forma como é tratada essa<br />
modalidade:<br />
Como em tudo é preciso inovar... É preciso imitar os americanos em<br />
algumas coisas: introduzir bandas - cada instituição deve ter sua banda<br />
fardada para o espetáculo esportivo, balizas para os intervalos,<br />
apresentações artísticas nos intervalos, etc. Existe uma série de medidas<br />
que podem trazer de volta o público.<br />
O técnico recém-contratado pelo Corinthians Sport Club, Juergen Klemm, em<br />
entrevista ao Jornal Gazeta do Sul de 2 de julho de 1969 (p.8), faz uma série de<br />
considerações a respeito da crise do basquetebol. Segundo Klemm, essa queda não<br />
pode ser creditada somente a Santa Cruz do Sul:<br />
[...] Esta queda é verificada em todo o Estado... Responsáveis por isto são<br />
os atletas, dirigentes, público esportivo, imprensa [....] Todos na razão direta<br />
têm a sua participação no incremento do esporte [...]. As direções, a meu<br />
ver, levam uma maior culpa: atualmente é de “empanturrar” os associados<br />
com bailes e reuniões dançantes. Parece que a competição esportiva tão<br />
sadia transferiu-se da cancha para as pistas de dança [...]. Há os que dizem<br />
que a queda do basquete se deve ao incremento do futebol. Mentira ou<br />
desconhecimento de causa. Os clubes de futebol lutam com as mesmas<br />
dificuldades [...]. A falta de dinheiro não é desculpa, pois a entrada para os<br />
jogos de basquete é de graça [...]. A televisão também tem muita influência<br />
para a falta de adeptos e de público.
Outra causa do declínio no basquetebol data de 1969 : trata-se da rejeição<br />
por parte do Conselho Deliberativo do Corinthians a uma tentativa de reatamento<br />
das relações entre os dois clubes. Na época, o presidente do Corinthians, Walter<br />
Glauche, solicitou ao Conselho Deliberativo que as relações entre Corinthians e<br />
Sociedade Ginástica fossem reatadas. Para ele, o rompimento tinha trazido sérios<br />
prejuízos, principalmente ao basquetebol área em que cada vez se tornava mais<br />
difícil conseguir um maior intercâmbio entre os clubes. Glauche sugeriu, pois ao<br />
Conselho Deliberativo do Corinthians que fosse mandado um ofício à Sociedade<br />
Ginástica para que esses se retratassem. Todos, no Conselho Deliberativo, foram,<br />
porém, contra a proposta feita pelo presidente Walter Glauche (CORINTHIANS,<br />
1969).<br />
Na década de 70, apesar de todas as dificuldades já mencionadas<br />
anteriormente, a Sociedade Ginástica conseguiu conquistar o título de Campeã<br />
Estadual na categoria juvenil 5 . A partida final foi disputada em Rio Grande no dia 8<br />
de outubro de 1972, contra a equipe do Ipiranga daquela cidade. A equipe santa-<br />
cruzense venceu pelo placar de 70 x 52. Das 13 partidas disputadas durante o<br />
campeonato, a representação juvenil da Sociedade Ginástica perdeu apenas dois<br />
jogos (Gazeta do Sul, 11 out. 1972).<br />
Vários jogadores desse grupo se destacaram mais tarde nas equipes adultas<br />
formadas em Santa Cruz do Sul, ora defendendo as cores tricolores, ora as cores<br />
5 Comissão Técnica da temporada de 1972: Técnicos: Edvar Barcelos Alves e Antonio<br />
Carlos Schenckel, Atletas: Juarez Franco, Rudimar Gerhardt, Hilton Teichmann,<br />
Aurélio Wartchow, Paulo Kist, Roberto Mendes, Paulo Kaercher, Geraldo Limberger,<br />
Mauro Lang, Paulo Afonso Morais, Raul Assmann, Ado Armborst e Gilberto Sad.<br />
91
ubro negras. Entre esses atletas, estão Juarez Franco, Rudimar Gerhardt, Hilton<br />
Teichmann e Aurélio Wartchow.<br />
No início da década de 80, tudo levava a crer que as décadas de 60 e 70<br />
seriam reeditadas. Somente alguns atletas, em torno de 7 ou 8, mantinham<br />
regularidade nos treinamentos, o que manteve aberto o Departamento de<br />
Basquetebol Adulto do Corinthians Sport Club. A maior dificuldade encontrada era<br />
que os jogadores trabalhavam durante o dia e estudavam à noite, dificultando os<br />
treinamentos que eram feitos à tardinha, entre 18:00 e 19:00 horas.<br />
Haas (1995), dirigente do Corinthians que teve participação direta, ao lado de<br />
Osvaldo Garcia, na formação da equipe de jogadores para a temporada de 1983, a<br />
qual alcançou o título de Campeã Estadual naquele mesmo ano - título que havia<br />
sido alcançado pela última vez em 1958 - diz que o basquetebol em Santa Cruz do<br />
Sul, no começo dos anos 80, estava numa fase muito ruim, cogitando-se até a<br />
possibilidade de fechar o Departamento de Basquete Adulto do Corinthians.<br />
Garcia (1995) lembra:<br />
92<br />
Como em todas as crises muitas vezes aparecem as melhores soluções, foi<br />
neste mesmo ano 1983, que decidimos montar uma equipe que pudesse<br />
disputar em igualdades de condições com as melhores equipes do Estado<br />
pela reconquista do título de Campeão Estadual que fora ganho pela última<br />
vez no dia 20 de dezembro de 1958. Para isto mantivemos os jogadores<br />
que já faziam parte do grupo como: Juarez Franco, Gilmar Weis, Gilberto<br />
Teichmann, Sérgio Pepino, Curt Loewenhaupt, Luiz Lauchner e mais tarde<br />
contratamos os jogadores Rudimar Gerhardt e Alex Wagner que já haviam<br />
defendido o Corinthians em outras temporadas. Em março se integrou ao<br />
plantel o jogador Ricardo Glauche.
estadual:<br />
Para Garcia, o mês de julho de 1983 foi decisivo para reconquista do título<br />
93<br />
Ao contratarmos o armador Mauro da Rosa, o pivô Amilcar Melgarejo e o<br />
ala Stiva Miglio, jogadores que pertenciam ao Internacional de Porto Alegre,<br />
que naquele momento estavam sem clube pois o Internacional estava sem<br />
patrocínio e havia fechado o seu departamento de basquetebol, demos um<br />
passo decisivo para a reconquista do título estadual.<br />
A comissão técnica de 1983 era composta pelo Vice de Esportes, Roberto<br />
Grüendling; Diretor de Basquete, Osvaldo Garcia; Presidente, Abegai<br />
Sagastume e Vice Presidente, Romário Haas; Técnico, Luiz Schwarowsky e<br />
Preparador Físico, Fernando Vilela.<br />
O título foi reconquistado em Santa Cruz do Sul, no ginásio do Corinthians<br />
Sport Club, no dia 19 de dezembro de 1983, quando a equipe do Corinthians venceu<br />
o seu maior rival, a Sogipa de Porto Alegre, pelo placar de 80 x 53, não deixando<br />
nenhuma dúvida sobre a sua superioridade. O ginásio tricolor estava totalmente<br />
lotado e, mais uma vez, o público demonstrou gostar de bons jogos. Isso pode ser<br />
confirmado numa reportagem do jornal Gazeta do Sul de 22 de dezembro de 1983<br />
(p.8), que afirma ter sido a conquista uma jornada inesquecível dos comandados do<br />
técnico "Killi" (Luiz Schwarowsky), emoldurada por uma torcida incrível, que gritou<br />
durante toda a partida.<br />
No ano seguinte, 1984, o Corinthians manteve os jogadores Mauro da Rosa,<br />
Stiva Miglio, Sérgio Pepino, Gilberto Teichmann, Rudimar Gerhardt, Amilcar<br />
Melgarejo, Gilmar Weis e Luiz Lauchner, que, no ano anterior, haviam conquistado o<br />
título de Campeão Estadual. Trouxe ainda alguns jogadores para reforçar a equipe.<br />
Entre esses, os pivôs Marcio Ribeiro e João de Deus Lucena; os alas Marcos<br />
Poyares, Eleno Haussmann e Reginaldo Soares. A Comissão técnica também foi<br />
bastante modificada em relação ao ano anterior: Vice de Esportes, Hiram Almeida;<br />
Diretor de Basquete, Raul Hermes; Diretor de Basquete Adulto, Roberto Gründling;
Técnico, Juarez Franco e Preparador Físico, Pedro Tomachewski. (Gazeta do Sul, 8<br />
dez. 1984).<br />
A última fase do campeonato estadual da temporada de 1984 foi disputada no<br />
ginásio da Sogipa em Porto Alegre, onde, mais uma vez, o Corinthians conseguiu<br />
conquistar o título de Campeão Estadual. Mesmo jogando fora de casa, a torcida<br />
tricolor, aficcionada pelo basquetebol, lotou as arquibancadas do ginásio sogipano,<br />
empurrando a equipe para a vitória frente à Sogipa de Porto Alegre, pelo placar de<br />
77 x 69. Em reportagem do jornal Gazeta do Sul, de 6 de dezembro de 1984 (p.13),<br />
com o título "Corinthians, um bicampeão com raça, suor e justiça", a torcida tricolor,<br />
que soube ajudar a equipe a enfrentar todas as dificuldades e trazer o bicampeonato<br />
para Santa Cruz do Sul, foi parabenizada.<br />
Haas (1985) lembra que a conquista do título de Campeão Estadual de 1984<br />
possibilitou ao Corinthians representar o Rio Grande do Sul na Taça Brasil de<br />
Basquetebol, competição nacional que reunia as 16 melhores equipes do Brasil.<br />
Mesmo tendo participado pela primeira vez dessa competição, o Corinthians<br />
conseguiu colocar-se entre as oito melhores equipes do País. Lembra, ainda, que<br />
dirigentes, imprensa e técnicos ficaram surpresos com a presença de um clube do<br />
interior do Estado do Rio Grande do Sul entre as oito melhores equipes do País.<br />
Haas (1995) comenta que em 1984 quando foi o presidente do clube, adotou<br />
no Corinthians, uma filosofia empresarial. A equipe de basquetebol adulto teria que<br />
autogerir seus custos, que incluíam pagamento de jogadores, alimentação,<br />
transporte, hotéis, despesas médicas hospitalares e outros gastos. Esta estrutura,<br />
94
segundo Haas, foi necessária, uma vez que não haveria condições de manter o<br />
departamento de basquetebol adulto em igualdade de condições com as grandes<br />
equipes do Estado, sem buscar recursos em diferentes fontes. Em 1985, Hiran<br />
Almeida assumiu a presidência do clube e implantou esta filosofia para todas as<br />
categorias do basquetebol. Ao clube somente caberiam os custos de fardamento e<br />
pagamento de treinadores.<br />
Em 1986, o Corinthins Sport Club novamente montou um forte grupo de<br />
jogadores para tentar buscar o título de Campeão Estadual, desta vez trazendo<br />
reforços do interior paulista, para recuperar o título perdido em 1985. A equipe foi<br />
treinada durante toda a temporada pelo técnico Juarez Franco, o Bola, que pediu<br />
demissão no dia 31 de dezembro de 1986. Perguntado porque pedira demissão do<br />
cargo, Franco respondeu: "naquele momento aquela foi a melhor decisão que<br />
poderia ter tomado" visto que já vinha no comando da equipe por três temporadas e<br />
sentia que aquele era o momento de deixar a equipe.<br />
Para o lugar de Bola os dirigentes tricolores trouxeram o técnico Fernando<br />
Larralde, de nacionalidade uruguaia, que já vinha trabalhando no Brasil há vários<br />
anos: anteriormente, na equipe Guanabara, de Santana do Livramento, e, 1986, no<br />
Ipiranga da cidade de Rio Grande. Larralde começou os preparativos da equipe<br />
corinthiana para os dois quadrangulares finais, que seriam disputados, em Santa<br />
Cruz do Sul e outro em Porto Alegre, e que decidiriam o título do Campeonato<br />
Estadual. O confronto que definiu o título de 1986 foi contra a equipe do Grêmio<br />
95
Naútico União de Porto Alegre 6 . Papel fundamental foi novamente exercido pela<br />
torcida, que, em mais uma decisão, mesmo sendo em Porto Alegre, lotou o ginásio e<br />
ajudou o Corinthians a sagrar-se Campeão Estadual de 1986 7 (Gazeta do Sul, jan.<br />
1987).<br />
Na temporada de 1988, a equipe principal esteve sob o comando do<br />
professor Gilmar Fernando Weis, e o clube não participou das partidas finais do<br />
campeonato estadual, que foi disputado em Porto Alegre, no Ginásio da Sogipa, por<br />
discordar da decisão da Federação Gaúcha de Basquetebol em escalar árbitros<br />
vetados pelo clube para apitar os jogos da agremiação tricolor. Esta decisão foi<br />
bastante polêmica e gerou muita confusão no basquetebol gaúcho e, principalmente,<br />
no Corinthians Sport Club. O jornal Gazeta do Sul, do dia 22 de novembro de 1988 8 ,<br />
(p.15), comenta que a atitude do Corinthians teria sido tomada em protesto à<br />
escalação dos juízes Fernando Mabilde e Fernando Santoro, que no entender dos<br />
dirigentes do clube teriam prejudicado a equipe em alguns jogos.<br />
Em 1989, também sob o comando de Gilmar Fernando Weis, o Clube voltou<br />
a disputar o campeonato estadual, depois de muito diálogo entre dirigentes do<br />
Corinthians e dirigentes da Federação Gaúcha de Basquetebol. Novamente o Clube<br />
foi finalista do certame estadual, devendo disputar um "Play Off" de 5 partidas com o<br />
6 Para conquistar o título, a equipe tricolor teria que vencer por uma margem mínima<br />
de 6 pontos, e foi exatamente por essa contagem que a equipe tricolor venceu, 66 x<br />
60.<br />
7 Participaram da temporada de 1986: Comissão Técnica: Técnico: Fernando Larralde;<br />
Preparador Físico, Erni Gassen; Massagista, Clóvis Garcia. Plantel: - João Lucena,<br />
Hugo, Bruno Cei, Marcio Ribeiro Cássio Carvalho, Leonardo Generoso Marcos<br />
Poyares, Reginaldo Soares, Rudimar Gerhardt, Luciano TECH e Eleno Haussmann;<br />
Diretor de basquete Adulto, Milton Nagel; Vice de Esportes, Armin Lederer.<br />
8 Sob o título "Corinthians abandona o Campeonato".<br />
96
seu maior adversário, a Sogipa de Porto Alegre. O Corinthians foi derrotado na 5ª<br />
partida pelo placar de 96 X 89 (Gazeta do Sul, 05 dez. 1989).<br />
Larralde (1995), gerente administrativo do Corinthians Sport Club desde 1988,<br />
conta que, em 1990, foi convidado pelo diretor da empresa Arcal, Waldir<br />
Schwarowsky, para montar uma equipe de ponta como forma de veicular a marca da<br />
empresa de Santa Cruz do Sul que representava no Brasil, a multinacional Umbro. A<br />
Arcal tinha interesse em montar uma equipe que pudesse figurar entre as equipes<br />
de primeira linha do basquetebol nacional. Nesse contato ficou decidido que Larralde<br />
seria o técnico da equipe e teria a assessoria de um técnico de primeira linha do<br />
basquetebol nacional, que viria periodicamente para acompanhar a execução do<br />
plano de trabalho.<br />
Larralde (1995) comentou que a primeira atitude tomada foi entrar em contato<br />
com o técnico Ari Vidal, convidando-o para passar alguns dias em Santa Cruz do<br />
Sul, para conversar. Quando Ari Vidal desceu no Aeroporto Salgado Filho, toda a<br />
imprensa da Capital registrou o encontro, dando como certa a sua transferência para<br />
o Rio Grande do Sul. As manchetes de toda a imprensa em torno da vinda do<br />
técnico para o Rio Grande do Sul motivaram mais ainda os diretores da empresa<br />
para a montagem de uma forte equipe.<br />
Quando chegou a Santa Cruz do Sul, Ari Vidal participou de uma reunião com<br />
dirigentes tricolores e diretores da empresa Arcal. Ao final do encontro Vidal já<br />
acenava com a possibilidade de aceitar o desafio: dirigir uma equipe fora de um<br />
97
grande centro do País. O primeiro grande passo havia sido dado: as partes<br />
interessadas mostraram interesse em seguir com o projeto.<br />
Haas (1995), enfatizou que a maior responsabilidade coubera à Arcal, que<br />
teria que dar todo o suporte financeiro para fazer todos os empreendimentos<br />
necessários para a formação da equipe. Ao Corinthians caberiam as despesas com<br />
alimentação, transporte, hospedagem e demais gastos relativos aos jogos oficiais e<br />
amistosos.<br />
Vidal (1995), treinador da Equipe/Corinthians (1995), conta que quando<br />
esteve em Santa Cruz do Sul, no dia 9 de fevereiro de 1990, deixou três projetos<br />
para que os dirigentes estudassem. O primeiro seria a formação de uma equipe de<br />
jogadores jovens com potencial de representar o Clube e o patrocinador na disputa<br />
do Campeonato Estadual. O segundo seria a formação de uma equipe que pudesse<br />
figurar entre as oito melhores equipes do País, e o terceiro seria a formação de uma<br />
equipe que pudesse brigar para figurar entre as quatro melhores equipes do País.<br />
Vidal (1995) salienta que a estrutura do basquetebol no Rio Grande do Sul<br />
era e é muito precária. O próprio Corinthians não possuía as mínimas condições,<br />
quer em estrutura física para os treinamentos, quer em termos de um plantel de<br />
jogadores que pudessem participar de competições nacionais. O nível técnico dos<br />
jogadores, principalmente em São Paulo, era bem superior ao existente no Rio<br />
Grande do Sul. Outra dificuldade salientada pelo técnico é a distância geográfica do<br />
Estado com os grandes centros do país, o que dificulta um maior intercâmbio com<br />
grandes equipes do basquetebol brasileiro. O ginásio do Corinthians que já fora<br />
98
orgulho da "família corinthiana", por ser um dos maiores e mais bem equipados do<br />
Brasil, em 1990, já não apresentava mais as mínimas condições para realização de<br />
treinamentos e jogos em função das dimensões da quadra e do espaço para abrigar<br />
o grande público que lotava suas dependências.<br />
No dia 17 de abril de 1990, o técnico Ari Vidal foi contratado pelo Corinthians.<br />
Vidal (1995) lembra que aceitou o convite com intenção de colocar o basquete<br />
gaúcho em posição de destaque no cenário nacional. Perguntado como foram feitos<br />
os contatos com os jogadores para a montagem da equipe, Vidal respondeu que a<br />
formação da equipe começara lentamente e sem muitas pretensões porque não<br />
havia uma definição por parte dos patrocinadores. O mês de abril de 1990 coincidiu<br />
com o lançamento do novo pacote econômico "Brasil Novo", o que dificultou aos<br />
empresários fazer uma projeção da verba que poderia ser repassada ao Corinthians<br />
para a contratação de jogadores de primeira linha. Aos poucos, lembra Vidal (1995):<br />
99<br />
Fui ganhando um grande aliado para a formação da equipe, Luiz Alberto<br />
Schwarowsky, diretor da Empresa Arcal, que fora jogador de basquetebol<br />
do Corinthians. Esta amizade e confiança depositada em meu trabalho<br />
possibilitou a contratação de jogadores que puderam dar uma maior<br />
qualificação ao plantel que já contava com duas contratações: Alessandro<br />
Brás Martins e Juliano Cavallini Landin. Depois foram acertadas as<br />
contratações de Mauro Gomes e dois jogadores norte americanos: o<br />
armador Derryl Parker e o ala Alvin Frederick.<br />
Gradativamente o grupo foi sendo melhorado. Em agosto de 90, foi acertada<br />
a contratação do pivô da Seleção Brasileira Rolando Ferreira e do ala Marx Martins<br />
para fazer parte do plantel e completar o grupo de jogadores considerados da casa,<br />
como Rudimar Gerhardt, Mauro Dreher, Ivan Poll, Paulo Ferreira, Darci Wermann,<br />
Bruno Cei e João de Deus Lucena. No dia 4 de setembro de 1990, a direção
corinthiana acertou a contratação do renomado jogador da Seleção Nacional, o ala<br />
Marcel de Souza, que deu o toque de qualidade que que a equipe necessitava.<br />
Estava, pois, pronta a equipe que disputaria a Liga Nacional de Basquetebol de<br />
1990 e que, já na sua primeira participação, conseguiu a 3º colocação dessa Liga.<br />
VidaI (1995) lembra que essa posição criou um clima de euforia entre dirigentes e<br />
patrocinadores, que buscaram qualificar ainda mais o grupo de jogadores, para<br />
conquistar o título da Liga Nacional de Basquetebol nas temporadas seguintes.<br />
Todos os jogos em Santa Cruz do Sul foram realizados no Ginásio do Colégio Mauá,<br />
que tinha capacidade para abrigar 1.000 pessoas.<br />
100<br />
Vidal (1995) enfatizou que os frutos do investimento não tardaram a<br />
aparecer, visto que o Corinthians Sport Club do dia 6 ao dia 14 de novembro de<br />
1990, fez uma série de partidas amistosas contra Universidades dos Estados Unidos<br />
nas cidade de Amarilho, Lubock, San Angelo, e Portales, Novo México. Para o<br />
técnico Vidal, esse também foi um fato importante, que somente foi possível pela<br />
contratação de jogadores como Marcel de Souza e Rolando Ferreira, ambos<br />
jogadores da Seleção Brasileira, e que tinham enorme prestígio internacional 9 .<br />
Nas temporadas de 91/92 10 e 92/93 11 , o Clube não conseguiu repetir a<br />
mesma performance de 90/91, embora tenha conquistado o Bicampeonato e o<br />
9 Comissão Técnica da temporada de 90/91: Técnico, Ari Vidal; Auxiliar Técnico,<br />
Fernando Larralde; Preparador Físico, Gilmar Weis; Massagista e Roupeiro, Luciano<br />
Hillesheim; Médicos, Dr. Tibiriça Segala e Dr. Paulo Weiss; Diretores, Romário HAAS<br />
e Hiran Almeida; Patrocinador: Arcal/Umbro.<br />
10 Comissão Técnica na Temporada 91/92: Técnico, Ari Vidal; Auxiliar Técnico,<br />
Fernando Larralde Teixeira; Preparador Físico, Gilmar Fernando Weis; Massagista e<br />
Roupeiro, Luciano Hillecheim; Médico, Dr. Tibiriça Segala; Diretores, Romário Haas<br />
e Hiran Almeida. Patrocinador(es), Arcal/Perdigão. Plantel na Temporada 91/92:<br />
Alvin Frederick, Derryl Parker, Juliano Landin, Ivan Poll, Guilherme Duarte, Rodrigo<br />
Mello, Alexei Martins e Paulo Ferreira.
Tricampeonato Estadual e outros torneios não menos importantes, como a Taça de<br />
Belo Horizonte, que serviram para ratificar o trabalho que vinha sendo feito. Nessas<br />
duas temporadas, o basquete virou uma mania entre jovens e adultos na região. Por<br />
toda a parte, nas praças, nos ginásios, nos colégios e residências, o basquete era<br />
tema de discussões e fonte de lazer. Até mesmo tabelas em postes e cestas<br />
improvisadas com latas espalhavam-se pelas ruas da cidade. A comoção foi tão<br />
grande, que, em 1992, o governo municipal acelerou a construção do Ginásio<br />
Poliesportivo, com capacidade para sete mil e quinhentas pessoas sentadas e<br />
dotado da mais avançada tecnologia desportiva. O Ginásio foi inaugurado no dia 29<br />
de dezembro de 1992.<br />
101<br />
Na temporada 93/94 12 , ocorreu, pois, a consagração de todo o trabalho<br />
realizado ao longo das três temporadas anteriores: o título de Campeão da Liga<br />
Nacional de Basquete foi uma conquista de muitas gerações de dirigentes, técnicos<br />
e jogadores, que deram a sua parcela de contribuição para que o Corinthians<br />
conquistasse esse título. Assim, essa conquista, inédita no Rio Grande do Sul,<br />
mobilizou toda a comunidade riograndense. Durante os jogos do "Play Off" final,<br />
realizado em Porto Alegre, no Ginásio Tesourinha, reuniram-se cerca de vinte e uma<br />
11 Comissão Técnica na Temporada 92/93: Técnico, Ari Vidal; Auxiliar Técnico,<br />
Fernando Larralde; Preparador Físico, Gilmar Weis; Massagista e Roupeiro, Luciano<br />
Hilleshein; Médico, Dr. Tibiriça Segala; Diretores, Flávio Kohmann, Roberto<br />
Gründling e Ricardo Gründling. Plantel na temporada 92/93: Evandro Saraiva, Raul<br />
Filho, Cliff Morgan, Rolando Ferreira, Alvin Frederick, Luiz Magalhães, Carlos Thunn,<br />
Paulo Scheid, Alexandre Cruxen, Ivan Poll, João Luciano, Alberto Seabra e Paulo<br />
Ferreira. Patrocinador(es): Projesan, Ticket Restaurantes, Jackar, União de<br />
Seguros e Pitt.<br />
12 Comissão Técnica na Temporada 93/94: Técnico, Ari Vidal Auxiliar Técnico, Valdir<br />
Boccardo; Preparador Físico, Leandro Burgos; Massagista e Roupeiro, Luciano<br />
Hileshein; Médico, Dr: Tibiriça Segala; Diretor, Romário Haas; Atletas: Alvin<br />
Frederick, Almir de Souza, Oldair Silva, Marcionilio Nascimento, Brent Merriet, Ivan<br />
Poll, Alexandre Cruxen, Joel Sanches, Eduardo Sales, Silvio Conceição, João Batista<br />
e Carlos Nóbrega. Patrocinador(es): Projesan, Pitt, Jackar, União de Seguros, Ticket<br />
Restaurantes.
mil pessoas. O jogo foi transmitido pela Rede Manchete de Televisão para todo o<br />
País, mobilizando, dessa forma, toda a comunidade nacional.<br />
102<br />
Com a conquista do título da Liga Nacional, coube ao Corinthians representar<br />
o Brasil no XXXII Sul-Americano de Basquetebol, em Lima, no Peru, e na Copa das<br />
Américas de Clubes Campeões, em Córdoba, Argentina, em 1994, obtendo a 3º<br />
colocação nas duas competições. Já na Liga Nacional referente às temporadas<br />
94/95 13 , a equipe foi estruturada pelo técnico Ari Vidal, que chegou a dirigir o<br />
Corinthians em quatro jogos pela Liga Nacional. No dia 6 de janeiro de 1995,<br />
entretanto pediu o seu afastamento para se dedicar exclusivamente a Seleção<br />
brasileira. Para o seu lugar, Ary Vidal indicou o nome de Valdir Boccardo, que fora<br />
seu auxiliar técnico quando da conquista do título de Campeão Brasileiro na<br />
temporada 93/94. A sugestão foi aceita, pois segundo os dirigentes Boccardo teria a<br />
mesma filosofia de Ary Vidal. No dia 9 de janeiro, o novo técnico iniciou as suas<br />
atividades com o grupo de jogadores.<br />
No dia 31 de janeiro de 1995, o jornal Gazeta do Sul circula com a seguinte<br />
manchete: “Campeão Brasileiro em Crise”, essa crise, segundo a reportagem, teria<br />
sido deflagrada pelas 5 derrotas consecutivas da corinthiana na Liga Nacional.<br />
13 Comissão Técnica na Temporada 94/95: Técnico, Valdir Boccardo depois Fernando<br />
Larralde; Preparador Físico, Leandro Burgos; Massagista e Roupeiro, Luciano<br />
Hillesheinn; Médico, Dr.Tibiriça Segala; Diretor, Osvaldo Garcia. Plantel de<br />
Jogadores na temporada: Alexandre Cruxen, Joel Sanches, João Batista, Frank<br />
Jackson, Todd Williams, Ivan Poll, Marcos Limoeiro, João Luciano, Carlos Nóbrega e<br />
Rodolfo Moreira. Patrocinadores: Pitt, Kappa, União de Seguros, Phillip Morris,Souza<br />
Cruz.
103<br />
No dia 07 de março de 1995, o jornal Correio do Sul anuncia a saída de Valdir<br />
Boccardo do comando técnico da equipe, assumindo, em seu lugar, Fernando<br />
Larralde. Mesmo com a mudança no comando técnico, a equipe não conseguiu<br />
derrotar a equipe do Cesp/Rio Claro, que, no Play Off, fechou a série em 3X1,<br />
eliminando, assim, a Pitt/Corinthians, que acabou na 8 posição, dessa forma, sem o<br />
sonho do bi-campeonato.<br />
Haas (1995) disse que, no dia 5 de maio de 1995, juntamente com Oswaldo<br />
Garcia (diretor da equipe), e Telmo Kist (diretor financeiro), foram feitos planos com<br />
o objetivo de estruturar uma equipe competitiva, capaz de disputar o título de<br />
campeã brasileira da temporada 95/96. A primeira providência da direção foi acertar<br />
a contratação e a renovação de jogadores de primeira linha do basquetebol<br />
brasileiro.<br />
Outra alteração significativa relatada por Haas (1995) foi a mudança do<br />
patrocinador oficial da equipe, que passou a ser uma empresa de Farroupilha, a<br />
Grendene, e que veicularia um de seus produtos: a marca do tênis Pony. Além da<br />
“Pony”, um pool de empresas, como a Souza Cruz, Banco do Brasil, Phillip Morris, e<br />
Cia União de Seguros e a Kappa deu suporte financeiro necessário para a<br />
estruturação da equipe.<br />
A primeira competição oficial da Pony/Corinthians foi a Copa América de<br />
Clubes Campeões, realizada em Santa Cruz do Sul, de 23 a 29 de outubro de 1995,<br />
alcançando a equipe a 3ª colocação, ficando atrás, apenas das equipes do<br />
Cesp/Rio Claro e do Penãrol.
104<br />
No dia 17 de janeiro de 1996, o Pony/Corinthians conquistou o<br />
hexacampeonato estadual ao vencer o Minuano/Bira de Lajeado, e fechar, de forma<br />
invicta, o Play Off de 3 partidas válidas pelo Campeonato Estadual da temporada<br />
95/96.(Riovale, 18 jan. 1996).<br />
Mais uma vez, ficou demonstrada a diferença do nivel técnico das equipes<br />
que disputam esse campeonato. De um lado, o Corinthians com uma equipe de<br />
jogadores profissionais de primeira linha, os quais treinam diariamente, em dois<br />
turnos. De outro, as equipes que apenas participam com o objetivo de disputar o<br />
vice-campeonato.<br />
O presidente Renato Britto Cunha da Confederação Brasileira de<br />
Basquetebol, enfatizou que o Campeonato Brasileiro da temporada 96 marcara uma<br />
nova fase no basquetebol brasileiro. Segundo ele, todas as pessoas diretamente<br />
envolvidadas nesta modalidade de esporte deverão proceder a mudanças que visam<br />
ao profissionalismo.<br />
Essa mudança foi possível a partir da parceria selada com a Globosat, que<br />
viabilizou recursos financeiros da ordem de oito mil dólares, que serão repassados<br />
nos próximos quatro anos. Com esse acerto, os clubes participantes ficarão isentos<br />
dos custos de pagamento das passagens aéreas, hospedagem e arbitragem,<br />
possibilitando às equipes investir as verbas de apoio e patrocínios na formação das<br />
equipes.
105<br />
Para que o sonho da profissionalização se torne uma realidade, o presidente<br />
da C.B.B, Renato Brito Cunha, salientou que o Campeonato Brasileiro sofreu uma<br />
série de alterações. Entre essas a mudança do nome da Liga Nacional, que vinha<br />
sendo utilizado desde 1990, para Campeonato Brasileiro, com a aplicação de leis<br />
mais rígidas, uso de estatísticas nos jogos, além da padronização visual dos<br />
ginásios. (Revista do Campeonato Brasileiro de Basquetebol, 1996, p.1).<br />
No dia 23 de janeiro o Pony/Corinthins fez a sua estréia no Campeonato<br />
Brasileiro, contra a equipe do Nosso Clube de Limeira/Cosesp. A competição reuniu<br />
as doze melhores equipes do País, representando seis estados.<br />
Para Haas (1996), o objetivo da direção ao fazer a montagem da equipe, foi<br />
alcançado, pois coube aos dois Corinthians (RS) e (SP) disputar a final do<br />
campeonato brasileiro num play off de melhor de cinco partidas, com vantagem ao<br />
Corinthians Paulista, que jogaria três dos cinco jogos em São Paulo. Resultado:<br />
Corinthians/Amway, Campeão Brasileiro; Pony Corinthians Vice Campeão.<br />
Para a temporada 96/97, houve muitas mudanças na equipe Vice-Campeã<br />
Brasileira: vários jogadores deixaram o Clube e outros foram contratados.<br />
As contratações feitas pela direção do Corinthians não animaram muito os<br />
aficcionados do basquetebol, que não acreditavam nessa equipe, a qual manteve<br />
da última temporada, o armador Marc Brown e os alas Alexandre Cruxen e Jõao<br />
Batista. Até mesmo jogadores e comissão técnica estavam descrentes em relação à<br />
boa performance da equipe no Campeonato Brasileiro.
106<br />
Haas (1996), no entanto, salientou que o grupo de jogadores para a<br />
temporada 96/97 seria mais homogêneo, e que o objetivo da direção, ao formá-lo,<br />
era o de estar novamente entre os quatro finalistas do Campeonato Brasileiro,<br />
brigando novamente pelo título.<br />
Para o dirigente, essa seria uma temporada totalmente atípica, pois a equipe<br />
teria diferentemente das outras uma série de competições antes de estrear no<br />
Campeonato Brasileiro, o que possibilitaria ao técnico fazer uma série de<br />
observações, além de adquirir o ritmo necessário para a competição mais importante<br />
em nível nacional.<br />
Além da Copa das Américas Interclubes de Basquete Haas solicitou à C.B.B a<br />
oficialização da Copa Sul-Sudeste de Basquete Centenário que seria disputada por<br />
equipes do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais. Essa<br />
competição teria como objetivo minimizar as dificuldades, principalmente no que diz<br />
respeito ao intercâmbio esportivo.<br />
O primeiro compromisso oficial da Pony/Corinthians foi a Copa das Américas<br />
Interclubes disputada em Franca interior paulista, de 9 a 16 de setembro. Embora a<br />
equipe não tenha conseguido uma boa colocação (5º lugar), mostrou muito empenho<br />
e disposição dos jogadores requisitos fundamentais para a obtenção de sucesso nas<br />
competições.<br />
No dia 5 de outubro, a equipe fez a sua estréia em Minas Gerais contra a<br />
equipe do Sollo/Minas pela Copa Sul-Sudeste. O inicio da competição foi marcado
por dificuldades de entrosamento, ritmo e pela ausência dos jogadores norte<br />
americanos.<br />
107<br />
Com a integração dos norte-americanos Marc Brown e Marvin Andrews a<br />
equipe foi aprimorando o seu padrão de jogo no transcorrer da competição,<br />
chegando à conquista do título da primeira Copa Sul-Sudeste, ao derrotar o Londrina<br />
com um modesto público presente no ginásio Poliesportivo.<br />
No dia 3 de janeiro, o Pony/Corinthians faz a sua estréia no Campeonato<br />
Brasileiro de Basquetebol 96/97, que, a exemplo da temporada passada, seria<br />
diputado por doze equipes e teria quatro fases. Estréia contra a equipe do<br />
Corinthians/ Amway do astro Oscar Schmidt. Nesse primeiro jogo, os gaúchos<br />
venceram os paulistas pelo placar de 105x89, dando uma amostra do que a equipe<br />
poderia render durante a competição.<br />
Já no dia 17 de janeiro, a equipe disputou a partida final do Campeonato<br />
Gaúcho. Esse campeonato foi disputado por oito equipes divididas em duas chaves<br />
e não incluiu a Pony/Corinthians nas etapas classificatórias a fim de preservar a<br />
equipe para o Campeonato Brasileiro. Os primeiros colocados de cada chave,<br />
Colégio Mauá e Sogipa (POA), realizaram um play off de melhor de duas partidas<br />
para definir quem iria disputar, em um único jogo, o título de campeão estadual com<br />
o Pony/Corinthians. Coube ao Colégio Mauá/Ping Pong realizar a partida decisiva. O<br />
prognóstico do jogo era previsível Pony/Corinthians, heptacampeão. O resultado<br />
contentou dirigentes, jogadores e torcedores de ambas as equipes (Jornal Zero<br />
Hora, 15 jan. 1997, p.17).
108<br />
Esse jogo entre as duas equipes santacruzenses apresentou uma outra<br />
curiosidade: reuniu o maior público presente no ginásio Poliesportivo nos jogos da<br />
Pony/Corinthians, que já vinha disputando a primeira fase do Campeonato Brasileiro.<br />
A cidade de Santa Cruz do Sul foi representado por quatro equipes no<br />
Campeonato Estadual. Esse expressivo número de equipes, entretanto não reflete<br />
um problema de dificil solução: a falta de oportunidade para esses jogadores nas<br />
equipes profissionais, fazendo com que muitos deles fiquem sem alternativas e,<br />
conseqüentemente desistam do basquete.<br />
Paralelamente ao Campeonato Brasileiro, o Pony/Corinthians fez a sua<br />
estréia, no dia 4 de fevereiro, no Campeonato Sul-Americano de Basquete. O Brasil<br />
foi representado pelos dois Corinthians o de SP e o do RS e Franca (interior<br />
Paulista). Começa dia 4 o Sul - Americano de Basquete jornal Correio do Povo 29<br />
jan. 1997).<br />
A maratona de três jogos por semanais às terças, sextas e aos domingos em<br />
diferentes países impossibilitou os treinamentos da equipe, criando divergências na<br />
comissão técnica. O técnico priorizava o Campeonato Brasileiro, porém a direção<br />
entendia que as duas competições eram importantes para o Clube e<br />
patrocinadores, pois o campeão teria o direito de representar a América do Sul no<br />
Mc. Donald’s Open, em Paris, França.<br />
No dia 25 de março, a Pony/Corinthians é eliminada do Campeonato Sul-<br />
Americano, pois se recusou a enfrentar a equipe Los Piratas do Perú, em partida
que deveria ser disputada no dia 25 de março. Comentário de Haas (1997) sobre o<br />
assunto:<br />
109<br />
Se deveu pelo fato da C.B.B não ter acatado o pedido do clube em<br />
transferir o jogo válido pelas quartas de final do Campeonato Brasileiro<br />
contra a equipe do Joinville que seria disputado no dia 26 de março em<br />
Joinville.<br />
Fora do Campeonato Sul-Americano, e apesar do descontentamento dos<br />
atletas por essa eliminação, todas as atenções se voltaram ao Campeonato<br />
Brasileiro. Assim, depois de eliminar o Joinville pelas quartas de final e o<br />
Corinthians/Amway pelas semifinais, a equipe estava novamente nas finais do<br />
Campeonato Brasileiro. Dessa vez contra a equipe do Cougar/Franca de<br />
Franca/SP.<br />
As duas equipes fizeram uma final sensasional, pautada pelo equilibrio<br />
técnico. O título foi conquistado pela equipe paulista no último jogo de uma play off<br />
de melhor de cinco partidas. O fator local foi decisivo para que a equipe paulista<br />
fechasse o play off em 3 a 2. Para dirigentes, jogadores e imprensa de todo o Pais<br />
esse Campeonato Brasileiro foi o de melhor índice técnico de todos os tempos. Esta<br />
opinião generalizada se explica pelo fato de que durante o Campeonato as equipes<br />
que detinham o mando de quadra dificilmente perdiam os seus jogos, a equipe da<br />
Pony Corinthians foi a única equipe que não perdeu nenhuma partida em seu<br />
ginásio.
5 REFLEXOS DA DISCRIMINAÇÃO RACIAL<br />
Ao fazer referência às condições sócio-econômicas como um dos fatores<br />
limitantes da prática do basquetebol, é importante analisar a participação do negro<br />
no basquetebol em Santa Cruz do Sul. Contudo, antes de analisar essa participação<br />
nesta modalidade esportiva, é preciso voltar na história e verificar sua participação<br />
nos diversos setores e atividades: no trabalho, no esporte e na cultura.<br />
No Caderno Especial da Folha de São Paulo, publicado no dia 25 de junho de<br />
1995, sobre a maior pesquisa quantitativa já publicada no Brasil em relação ao<br />
racismo, encontramos que 52% dos homens negros e 54% das mulheres negras<br />
apontam a discriminação no trabalho como o maior problema. Essa questão fica<br />
mais evidente ao considerar-se que somente 70% dos negros estão empregados,<br />
sendo que a metade deles ganha até R$ 200,00 (Datafolha, 25 jun. 1995).<br />
Realmente, a herança escravista ainda permeia a mentalidade do povo<br />
brasileiro ao estabelecer distinções entre o trabalho braçal e o trabalho intelectual, o<br />
primeiro mais relacionado ao negro e o segundo, ao branco (PEREIRA, 1988).
111<br />
Quando são atribuídas ao negro habilidades específicas, tais como danças<br />
(samba), práticas de determinados esportes, ou quando o negro é tratado como um<br />
objeto sexual, a herança escravista em nossa sociedade se torna mais enfática. A<br />
discriminação racial fica mais evidente ainda quando o negro é abordado em batidas<br />
policiais, ou é barrado nas portas de elegantes clubes, com o pedido da carteira<br />
social, e ao freqüentar restaurantes e edifícios residenciais (PINSKY, 1982).<br />
Costa (1988) afirma que o negro continua a ser vítima dos preconceitos que a<br />
escravidão criou, e que o processo de emancipação não findou com a abolição,<br />
sendo essa apenas o início de uma luta que deverá prosseguir por muitos anos<br />
ainda.<br />
Um fato que vem comprovar a afirmação de Costa: um jogador negro,<br />
integrante da equipe de basquetebol da Pony/Corinthians, Rogério de Almeida Silva,<br />
também conhecido pelo apelido de Big, perguntado, em entrevista realizada no dia<br />
11 de agosto de 1995 se já havia sido vitíma de discriminação racial, relatou um fato<br />
lamentável:<br />
Em 1992, depois de um treino no clube em que eu jogava na época, o<br />
Botafogo do Rio de Janeiro, fui para a praia, o dia estava muito quente e<br />
fazia dois meses que não ía mais para a praia. Eu e alguns conhecidos<br />
estávamos jogando frescobol. Resolvi dar um mergulho. Quando pisei na<br />
água, alguém me cutucou por trás me pedindo os documentos. Eu<br />
prontamente mostrei minha carteira de identidade.
BIG continua o seu relato acrescentando:<br />
112<br />
O soldado me pediu para que eu o acompanhasse até a presença do major.<br />
Eu respondi que não iria, porque eu não tinha feito nada para acompanhá-lo<br />
e nem mesmo para falar com o major. O soldado insistiu e eu o<br />
acompanhei. Qual não foi minha surpresa quando me aproximei do local<br />
indicado: todo o circo estava preparado, repórteres de televisão, rádio,<br />
imprensa escrita e muitos soldados estavam me esperando.<br />
O major chegou em mim com toda a pose, e disse: "Finalmente te peguei,<br />
preto. Faz tempo, que estou atrás de ti!" Logo começou a dar entrevistas<br />
para a imprensa, dizendo que a minha captura tinha sido muito difícil mas<br />
que, finalmente, eles tinham conseguido prender o chefe da gangue do<br />
arrastão.<br />
Big mostrou uma reportagem do Jornal do Brasil, do dia 27 de outubro de<br />
1992 (p.15), como prova do ocorrido. Relatou que esse episódio tinha acontecido<br />
porque era preto e que essa não havia sido a primeira vez que tinha sido parado em<br />
função de sua cor. Acrescentou: "Nunca imaginei parar na cadeia".<br />
O episódio chocou todos os colegas de Big e os dirigentes do clube Botafogo.<br />
Ninguém admitia que o atleta fosse acusado de chefiar uma gangue de arrastão. No<br />
seu clube, ele era visto como atleta exemplar, promessa de títulos e de boas<br />
surpresas para o basquetebol carioca.<br />
O jornal O Globo cita, numa reportagem publicada também em 27 outubro de<br />
1992 (p.11), que para o major da 23° BPM, pivô do episódio, Big preenchia todos os<br />
requisitos de um chefe de arrastão: negro, pobre e morador da zona norte.”<br />
Big obteve, na ocasião toda a assistência dos advogados da Federação<br />
Carioca de Basquetebol e do Botafogo, conseguindo comprovar, no interrogatório,
que estava com seus documentos quando foi detido e que estava desacompanhado,<br />
ao contrário das acusações de que foi vítima quando foi levado preso (O Globo, 27<br />
out. 1992, p.11.)<br />
113<br />
Retornando à análise do artigo publicado no Caderno Especial da Folha de<br />
São Paulo, de 25 de junho de 1995, sobre a pesquisa sobre o racismo e a<br />
discriminação racial no Brasil, pode ser feita a seguinte destribuição estatística das<br />
respostas:<br />
as únicas coisas que o negro sabe fazer bem são música e esportes, 48%<br />
dos entrevistados responderam que discordavam totalmente; 2% não<br />
sabiam; 28% concordavam totalmente; 12% concordavam em parte; 10%<br />
discordavam em parte. (Folha de S.Paulo, 1995, p.4).<br />
Uma questão poderia ser colocada a respeito: se os negros são jogadores de<br />
grande destaque em várias modalidades esportivas e se, nos Estados Unidos, eles<br />
os negros os melhores e mais bem pagos jogadores de basquetebol, por que em<br />
Santa Cruz do Sul não têm tido uma participação mais efetiva nessa modalidade<br />
esportiva de tanto sucesso na região?<br />
A questão da participação mais efetiva do negro no basquetebol não se<br />
coloca para as equipes que foram formadas a partir de 1990, quando a condição do<br />
esporte passou a ser outra, isto é, houve a passagem do amadorismo para o<br />
profissionalismo, embora este "profissionalismo" não seja totalmente explícito.
114<br />
Nas décadas de 30 e 40, não existia nenhum jogador negro participando de<br />
uma equipe principal. Em entrevista realizada com Franco 14 , no dia 17 de julho de<br />
1995, este colocou que mais para o final da década de 50 e na década de 60, havia<br />
dois negros que faziam parte das equipes da Sociedade Ginástica, mas somente um<br />
fazia parte da equipe principal.<br />
Franco (1995) diz que a sua entrada na Sociedade Ginástica se deu em 1969,<br />
quando tinha apenas 13 anos e seu porte físico era bastante avantajado para a<br />
idade. O convite partiu de seu professor de Educação Física. Lembra inclusive, que,<br />
no mesmo ano em que chegou à sociedade, um dos dois outros jogadores negros<br />
que faziam parte do plantel de formação, deixou de jogar. No começo da década de<br />
70, Franco (1995) passou a ser o único jogador negro:<br />
Quando fiz 16 anos, isto em 1971, o Tibica, jogador negro que fazia parte<br />
do plantel principal, deixou de jogar basquete porque foi morar em São<br />
Leopoldo. Passei a ser o único jogador negro integrante da equipe principal.<br />
O Corinthians Sport Club não possuía, em seus quadros principais, nenhum<br />
jogador negro. Froehlich (1995) afirma que, mesmo na Sociedade Ginástica, quando<br />
havia um negro participando em qualquer categoria, o mesmo não era associado,<br />
pois os membros dessas Sociedades não aceitavam as assim chamadas "pessoas<br />
de cor" em seus quadros.<br />
O negro jogava o basquetebol mas não podia tomar parte nas atividades<br />
sociais da agremiação. Sentia-se relegado. Isso podia ser notado nos<br />
colégios particulares onde se isolavam em seus cantinhos, tinham seus<br />
14 Juarez Franco, o Bola, nascido em 1955 em Santa Cruz do Sul, é funcionário do<br />
Banco do Brasil. Foi o primeiro jogador negro a fazer parte da categoria adulto do<br />
Corinthians Sport Club. O "Bola" como é conhecido, teve atuação destacada como<br />
atleta nessa modalidade.
115<br />
próprios grupos e faziam suas próprias festinhas, das quais o branco<br />
também não participava. (FROEHLICH, 1995).<br />
Realmente o negro passou "maus bocados" em Santa Cruz, até por ser uma<br />
terra de descendentes de imigrantes alemães, ainda que a discriminção racial<br />
sempre tenha existido em todos os lugares.<br />
Aliás, aconteceu um fato bem pitoresco. Certa vez, no Corinthians Sport Club,<br />
havia um negro, muito bom jogador, chamado José Carlos, que treinava<br />
normalmente no Clube. No dia do jogo, um GI x CO a direção pediu-lhe que tirasse a<br />
camiseta, alegando que ele não deveria jogar naquele dia. José Carlos foi, então,<br />
acolhido na Ginástica. Na semana seguinte, houve um segundo jogo do campeonato<br />
da cidade: José Carlos fez uma partida muito boa, "acabando" com o jogo.<br />
Resultado: a Ginástica venceu.<br />
Perguntado a respeito da participação do negro na época, Hart (1995)<br />
comentou que o mesmo não participava como membro das equipes de basquetebol,<br />
somente das de futebol. Salientou, também, que o negro em nossa cidade era<br />
respeitador, que tinha a sua linha, isto é, nas festas ou locais públicos, ele "ficava na<br />
dele”, sem se misturar com os brancos.<br />
Franco (1995), que sempre conviveu com pessoas brancas desde a mais<br />
tenra idade e que era convidado para as festas de aniversário e outras, afirma que<br />
não sentiu a discriminação racial, porque todos os seus colegas de escola já eram<br />
praticantes do basquetebol na Sociedade Ginástica, seu primeiro clube.<br />
Eu nunca havia sido barrado para freqüentar a sociedade, mesmo na parte<br />
social, e a primeira vez que eu fui barrado por discriminação racial foi no
E acrescenta:<br />
116<br />
clube de meus irmãos de cor; não sei se estes achavam que eu não<br />
quisesse assumir a minha cor, ou, até quem sabe, por inveja. Eu sempre<br />
tentei colocar pra eles que a minha passagem na sociedade era importante,<br />
porque eu poderia abrir caminho, para mais tarde, seus filhos poderem<br />
usufruir das vantagens que um clube pode oferecer aos seus associados.<br />
Fui considerado o primo maldito, talvez porque eu não quisesse largar tudo<br />
que eu havia conquistado e fosse morar num canto de uma vila qualquer,<br />
jogar meu futebol no final de semana e sentar num bar e tomar cachaça.<br />
Eles ficavam ofendidos porque achavam que eu estava chamando-os de<br />
bêbados, mas não era esta a questão. Eu sei que eles queriam sair daquela<br />
clausura, mas se debatiam pelas próprias barreiras, criadas e impostas<br />
pelos mais velhos, reflexo da escravidão. Este também é um preconceito, e<br />
este se apresenta de diversas formas e maneiras.<br />
O caso de Franco demonstra que a discriminação racial se torna mais branda<br />
e até desaparece à medida que o negro ascende socialmente. Assim, o sucesso no<br />
esporte e na vida profissional serviu, nesse caso, como uma alavanca para o<br />
"branqueamento", provocando, por sua vez, a reação discriminatória dos "irmãos de<br />
cor" tão bem descrita por Franco.<br />
Juarez Franco foi o primeiro jogador negro a participar da equipe principal do<br />
Corinthians Sport Club. Além de freqüentar a parte social, possuía um título de sócio<br />
e sua transferência para o Clube se deu em 1976, depois de participar por uma<br />
temporada no S.C. Internacional de Porto Alegre.<br />
Franco comenta que, no primeiro ano de Corinthians, bem mais maduro e<br />
experiente em relação ao tema racismo, mudou sua atitude:<br />
[...] mas sem esta de subir em mesas, palanques e levantar a bandeira e<br />
gritar como fazem determinadas pessoas. Comecei a fazer meu<br />
preconceito, de uma forma silenciosa, tomando algumas atitudes em
117<br />
relação a determinadas pessoas que se aproximavam de mim, respondendo<br />
somente o necessário e sem muita confiança. No final da temporada, não<br />
freqüentei mais o Clube. Até fui chamado para conversar com dois diretores,<br />
que queriam saber o motivo de eu não estar freqüentando o clube. Nesse<br />
momento, eu abri o jogo dizendo que eu estava fazendo a minha forma de<br />
preconceito."<br />
Naquele momento um dos dirigentes me chamou a atenção e observou:<br />
Nem sempre o racismo parte de um lado só; muitas vezes ele parte do lado<br />
contrário. Neste momento, eu cheguei à conclusão de que estava fazendo a<br />
mesma coisa. Eu dizia para meus irmãos de cor que o racismo está na<br />
nossa cabeça. Eu era uma pessoa que, de um lado, estava convivendo com<br />
o pessoal da minha raça, e, de outro lado, com o pessoal com o qual eu me<br />
criei. Se eu ficasse de um lado, estes ficariam contra mim; se eu passasse<br />
para o outro lado, iria jogar fora tudo que já havia conseguido.<br />
No Corinthians Sport Club, antes da montagem de equipes mais competitivas,<br />
a partir da década de 80, com o objetivo de reconquistar o título de Campeão<br />
Estadual, conquistado pela primeira vez em 1958, apenas um negro chegou a<br />
integrar a equipe principal, conseguindo romper com quase todos os tabus (racistas)<br />
da cidade, destacando-se como atleta, no cenário municipal e estadual, Juarez<br />
Franco, o "Bola".<br />
Antes de Franco, outros negros começavam a jogar basquetebol, mas,<br />
quando atingiam a idade para integrar as equipes principais, encerravam suas<br />
carreiras. A entrevista realizada com Campos 15 (1995) confirma a afirmação acima,<br />
pois o entrevistado ressalta que o fator econômico não é preponderante para que o<br />
jogador negro de Santa Cruz do Sul tenha uma participação mais efetiva na<br />
categoria de basquetebol adulto, mas sim, o preconceito em relação à cor.<br />
15 Reginaldo Martins Brito de Campos, nascido em 1975, em Santa Cruz do Sul,<br />
também foi um dos poucos jogadores negros que teve uma atuação de destaque nas<br />
categorias menores do Corinthians Sport Club. Atualmente estuda direito na <strong>Unisc</strong> -<br />
Universidade de Santa Cruz do Sul.
Campos cita uma série de acontecimentos que comprovam esses fatos:<br />
118<br />
No final da temporada quando todos os meus colegas ganhavam carteirinha<br />
de atleta que dava direito a freqüentar a piscina do clube, eu não ganhava.<br />
Meu pai mandou uma proposta de sócio e esta foi vetada pela sociedade.<br />
Eu nunca tive acesso ao fardamento de treinamento, enquanto os outros<br />
ganhavam calção, meia e camiseta, eu tinha que trazer tudo de casa. Na<br />
divisão dos quartos, todos já tinham os seus colegas de quarto, enquanto<br />
eu ficava por último com mais dois ou três colegas. As brincadeiras tinham<br />
sempre alguma piada envolvendo negros, mesmo que não fossem por<br />
maldade.<br />
É claro que não se pode atribuir um papel isolado ao preconceito racial.<br />
Quantitativamente, era fraca a participação do negro nessa modalidade esportiva. O<br />
fator sócio-econômico também é importante.<br />
Como o basquetebol era uma modalidade esportiva amadora, dessa forma,<br />
os jogadores tinham que pagar todas as despesas de fardamento para treinamento<br />
(calção, camisetas, meias e tênis), além das despesas de viagens (passagem e a<br />
alimentação), tornou-se uma modalidade inacessível para a maioria.
6 PIONEIRISMO NO BASQUETEBOL FEMININO<br />
É inegável o prestígio que o basquetebol de Santa Cruz do Sul ostenta desde<br />
a sua criação em 1931, em nível regional e estadual e no começo da década de<br />
1990 até os dias atuais em nível nacional. Esta posição, nos últimos 70 anos, é<br />
comprovada pelas manchetes de jornais de época e atas dos clubes mais<br />
tradicionais da cidade.<br />
Quando se fala de esporte amador, há a referência às diversas modalidades<br />
praticadas nas sociedades esportivas e culturais. Duas delas introduziram<br />
departamentos de basquetebol feminino entre as suas atividades: a Sociedade<br />
Ginástica e o Corinthians Sport Club, embora tenha havido outras tentativas de<br />
implantar essa modalidade com o apoio do Conselho Municipal dos Esportes<br />
(C.M.D).<br />
Se o basquetebol masculino foi praticado pela primeira vez, em Santa Cruz do<br />
Sul, na Sociedade Ginástica a partir de 1931, o Corinthians Sport Club foi o pioneiro<br />
no interior de nosso Estado na prática dessa modalidade esportiva no naipe<br />
feminino. Em 25 de agosto de 1950, foi realizada uma partida de exibição entre duas<br />
equipes do mesmo clube (CORINTHIANS, 1950).
120<br />
Essa partida de apresentação foi oferecida como espetáculo aos associados<br />
do Corinthians, aos militares estacionados em Santa Cruz do Sul e a todos os seus<br />
familiares em comemoração ao Dia do Soldado. Uma das equipes tinha como<br />
patrono o Tenente Coronel Renato da Costa e Souza, e a outra equipe tinha como<br />
patrono o Major Márcio Fonseca.<br />
"Novidade no Interior" é o título de matéria publicada no jornal Gazeta do Sul<br />
(22 ago. 1950), a qual comenta o assunto parabeniza a sociedade pela brilhante<br />
iniciativa, afirmando que "a família santa-cruzense" seria brindada com uma exibição<br />
inédita de basquete feminino.<br />
O basquetebol feminino, a exemplo do masculino, encontrou campo fértil no<br />
Brasil, mais especificamente em São Paulo, que já realizava campeonatos estaduais<br />
de basquetebol feminino desde 1940.<br />
Assim, na mesma matéria da Gazeta do Sul, encontra-se a informação de que<br />
a idéia de implantar esta modalidade no Corinthians surgiu durante uma excursão<br />
para Taubaté, interior de São Paulo, em 1944, onde os integrantes da equipe<br />
puderam assistir a partidas de basquete feminino e vibrar com essa, modalidade.<br />
Em 6 e 7 de outubro de 1951, na quadra da Sociedade Sogipa de Porto<br />
Alegre, foi realizado o primeiro Torneio Estadual de Basquetebol Feminino com<br />
participação de três equipes: Corinthians Sport Club, Fundação Evangélica de Novo<br />
Hamburgo e o clube locatário, a Sogipa. O torneio foi vencido pelas atletas do<br />
Corinthians Sport Club (CORINTHIANS, 1951).
121<br />
A equipe teve como técnico Ely Fontoura e foi composta pelas seguintes<br />
atletas: Lia Schulte, Marieta Cabron, Erica Koeller, Therezinha Farah, Irene Wilke,<br />
Ana Maria Kliemann, Wally Pfeifer e Asta Grünnewald, que, depois disso, passaram<br />
a tomar parte, com freqüência, em jogos fora de Santa Cruz do Sul.<br />
Nos meios esportivos, o feito da equipe feminina, conquistando o primeiro<br />
troféu instituído para uma competição de basquetebol feminino em nível estadual, foi<br />
bastante comentado e festejado. Uma reportagem da Gazeta do Sul de 12 de<br />
novembro de 1951 afirma que a Federação Gaúcha (órgão normativo e consultivo<br />
para essa modalidade no Rio Grande do Sul) estaria pensando em instituir, a partir<br />
de 1952, o primeiro Campeonato Estadual, que teria como sede a cidade de Santa<br />
Cruz do Sul.<br />
Ao que parece, esse propagado Campeonato Estadual de Basquetebol<br />
Feminino, que, a princípio, seria realizado no ano de 1952, somente foi realizado em<br />
dezembro de 1955, sendo disputado, conforme constatado no Livro de Atas nº5 de<br />
19 dezembro de 1955 (p.51), por, apenas, duas equipes.<br />
No dia 7 de novembro de 1955, foi expedido um ofício à Liga Atlética de<br />
Santa Cruz do Sul (LASC), pedindo a inscrição da equipe no Campeonato Estadual<br />
de Basquetebol Feminino, que seria disputado no dia 13 de dezembro de 1955, em<br />
Santa Cruz do Sul (CORINTHIANS, 1955).<br />
Em outra fonte, uma reportagem publicada no Jornal “A Voz do Progresso”,<br />
no dia 10 de outubro de 1955, afirma-se que a equipe do Corinthians Sport Club era
a pioneira no interior do Estado na prática dessa modalidade e se ressaltava que<br />
durante a temporada de 1955 a equipe não se apresentava tão qualificada como as<br />
formadas nos anos anteriores. Segundo a reportagem, a disputa da equipe santa-<br />
cruzense com as atletas da Capital seria árdua. A equipe de Porto Alegre havia<br />
realizado um maior número de partidas amistosas naquela temporada e estaria,<br />
portanto, mais bem preparada.<br />
122<br />
O Campeonato Estadual foi disputado em Santa Cruz do Sul, com apenas<br />
duas equipes inscritas: o Corinthians Sport Club e a Sogipa. O resultado do jogo foi<br />
de 45 a 24 para a equipe visitante, sagrando-se, dessa forma, a Sogipa a Campeã e<br />
o Corinthians, Vice-Campeão Estadual, respectivamente (HOFMEISTER, 1987).<br />
Em dezembro de 1956, o Corinthians participou, novamente do Campeonato<br />
Estadual, realizado em Porto Alegre, na quadra da Sogipa, onde mais uma vez o<br />
clube da Capital foi campeão estadual. O Corinthians não venceu nenhuma partida<br />
(Folha da Tarde, 17 dez. 1956, p.23).<br />
O Rio Grande do Sul, através dos dirigentes da F.G.B., estava muito<br />
interessado em desenvolver e difundir o basquetebol feminino, assim como vinha<br />
acontecendo com o basquetebol masculino. Isso pode ser comprovado em uma<br />
reportagem no jornal Gazeta do Sul (29 dez. 1953), que noticia para a comunidade<br />
local que o Corinthians Sport Club teria recebido um telegrama da F.G.B.,<br />
convidando a equipe de basquetebol feminino desse clube a representar o Rio<br />
Grande do Sul no Campeonato Brasileiro do "Belo Sexo".
123<br />
O telegrama recebido no mesmo dia pela diretoria do Corinthians tinha o<br />
seguinte teor: "Informe Urgente possibilidade equipe feminina Corinthians<br />
representar Estado campeonato brasileiro Curitiba início vinte e nove janeiro pt.<br />
Saudações Federação Gaúcha Basketball".<br />
No dia 29 de dezembro de 1953, a F.G.B. mandou outro telegrama,<br />
confirmando o Corinthians Sport Club como representante oficial do Rio Grande do<br />
Sul no Campeonato Brasileiro e informando que a delegação deveria ser composta<br />
por 12 atletas, o técnico e mais uma senhora que acompanharia a delegação como<br />
dirigente, enfatizando que a equipe deveria sujeitar-se às normas disciplinares da<br />
Federação.<br />
Ivone Maria Farah, atleta integrante do plantel feminino do Corinthians,<br />
entrevistada pelo jornal Gazeta do Sul em 28 de janeiro de 1954 (p.8), sobre como<br />
encarava a participação da equipe no Campeonato, assim se expressou:<br />
A Federação nos encarregou desta missão pois era sabedora de que o<br />
Corinthians foi o iniciador do basquetebol feminino no Estado, e na minha<br />
opinião possuímos maiores condições de alcançar a vitória ou pelo menos<br />
representar condignamente o Rio Grande do Sul, embora saibamos que não<br />
temos condições de enfrentar, com igualdade de condições, as equipes de<br />
São Paulo e Rio de Janeiro.<br />
Julita Adelaide L. Berger (1995), outra atleta que integrou o plantel que viajou<br />
para Curitiba, em 1954 comentou:<br />
Se a condição de ser pioneiro em algum tipo de atividade já é motivo de<br />
orgulho, imagina a felicidade das meninas e dos dirigentes ao saberem que<br />
nossa equipe iria representar o Rio Grande do Sul no VI Campeonato<br />
Brasileiro de Basquete.
124<br />
A ex-atleta afirma, ainda, que o uniforme de jogo para o referido Campeonato<br />
foi todo confeccionado pelas jogadoras, que receberam o tecido do Clube. Percebe-<br />
se aí que realmente o espírito amadorista predominava, diferentemente dos dias<br />
atuais.<br />
O basquetebol feminino precisava melhorar muito o seu nível técnico. Havia<br />
grandes dificuldades em realizar um maior intercâmbio esportivo. Ainda que as<br />
contagens nos placares fossem elevadas em favor de equipes de outros estados,<br />
certamente a participação no campeonato nacional trouxe muita experiência às<br />
atletas santacruzenses, além de motivar outros clubes para a formação de equipes<br />
femininas de basquetebol.<br />
Devido à distância geográfica que separa Santa Cruz do Sul dos grandes<br />
centros, onde o basquetebol feminino tinha um maior número de praticantes, já se<br />
previa, antes mesmo de o Campeonato iniciar, que o Rio Grande do Sul,<br />
representado pelo Corinthians Sport Club, não teria as mínimas condições de aspirar<br />
a uma vitória sequer, em todo o evento (Gazeta do Sul, 29 dez. 1953, p.8.) A<br />
expectativa se confirmou. O Rio Grande do Sul, representado pelo Corinthians, não<br />
venceu nenhuma partida, e todos os jogos foram perdidos por uma diferença de<br />
pontos bastante elevada. A imprensa de todo o Estado Gaúcho, apesar de ter dado<br />
toda a cobertura para a F.G.B. no final do campeonato, criticou os dirigentes da<br />
Federação por terem mandado uma equipe que, segundo os críticos, não tinha a<br />
mínima possibilidade de representar o Estado num campeonato de tamanha<br />
envergadura.
125<br />
A reportagem da Gazeta do Sul de 11 de fevereiro de 1954 procurou ressaltar<br />
os aspectos positivos que a participação da equipe de Santa Cruz do Sul traria a<br />
médio e longo prazo, entre estes:<br />
“- uma maior experiência em novos campeonatos;<br />
- observação do trabalho de equipes mais evoluídas tecnicamente.<br />
- a perda do temor em relação ao grande público presente nos ginásios;”<br />
Além desses aspectos, a reportagem procurou focalizar a participação da<br />
equipe do Paraná, que no ano anterior também havia perdido todos os seus jogos<br />
por enormes diferenças, e que já no campeonato de 1954, sagrava-se vice-campeã,<br />
e conquistando o título máximo de lances livres, além de ceder duas atletas de seu<br />
plantel para a Seleção Brasileira.<br />
Quanto à Sociedade Ginástica, numa reunião realizada pela diretoria no dia<br />
11 de junho de 1956, foi cogitada, pela primeira vez, a abertura de um departamento<br />
de basquetebol feminino (GINÁSTICA, 1956). Infelizmente, em 1956, não houve a<br />
abertura do referido departamento.<br />
Zildo Froehlich, técnico da equipe feminina de basquetebol da Ginástica,<br />
comunicou, em reunião realizada no dia 19 de agosto de 1957, que a primeira<br />
partida da equipe seria disputada em 24 de agosto de 1957, em Santa Cruz do Sul,<br />
contra a equipe da Sogipa (Ata nº8, p.90). A Gazeta do Sul de 20 de agosto de 1957<br />
(p.4) confirma que esse foi o primeiro jogo de basquetebol feminino da "Pioneira",<br />
como também era conhecida a Sociedade Ginástica. A mesma reportagem informa
ainda que o departamento feminino fora criado naquela temporada e que a equipe<br />
recentemente formada, ostentava ótima forma e que faria uma bela partida de<br />
apresentação, ainda que a equipe adversária, da Sogipa de Porto Alegre, fosse a<br />
campeã estadual de 1957, e que não tivesse perdido nenhum jogo durante aquela<br />
temporada. A primeira equipe ginasticana tinha como técnico Zildo Carlos Froehlich<br />
e era formada pelas atletas: Nilda Herbert, Tecla Plumer, Carmem Bremm, Nelsa<br />
Valentini, Miriam Plumer, Iraci Bremm, Miriam Dreher, Marlene Viega e Iria Bistow.<br />
126<br />
No dia 28 de agosto de 1957, foi realizado o jogo que seria o primeiro<br />
confronto entre as duas sociedades de maior tradição no basquetebol de Santa Cruz<br />
do Sul, representadas por duas equipes femininas (Gazeta do Sul, 30 ago. 1957).<br />
De um lado, a equipe do Corinthians, pioneira nessa modalidade no Estado, criada<br />
em 1950 e que já havia sido vice-campeã estadual e representara o Rio Grande do<br />
Sul no VI Campeonato Brasileiro de 1954; do outro lado, a equipe da Sociedade<br />
Ginástica, fundada meses antes do jogo considerado histórico.<br />
O jornal “A Voz do Progresso”, em reportagem de 01 de dezembro de 1957,<br />
(p.8) comenta:<br />
Caiu por terra o prognóstico que apontava o “five” corinthiano como favorito<br />
ao título do torneio início após a brilhante exibição das meninas que vestiam<br />
a jaqueta colorada. O encontro em si foi bastante movimentado e<br />
equilibrado em suas ações, tendo inclusive alguns lances hilariantes.<br />
O ginásio estava completamente lotado para assistir ao jogo que ficou<br />
marcado na memória do público que se fez presente. De acordo com matéria<br />
divulgada pela Gazeta do Sul em 30 de agosto de 1957 (p.4), a partida foi muito<br />
tensa. A Ginástica conseguiu dominar a segunda etapa da partida, vencendo o
primeiro "Torneio Início" pelo placar de 33 x 28. A reportagem da Gazeta do Sul<br />
afirma que o resultado se deveu ao controle psicológico da equipe da Ginástica. A<br />
afirmação de que a equipe ginasticana havia conseguido um maior domínio sobre o<br />
aspecto psicológico, é confirmada pela ex-atleta do Corinthians, Julita Berger, que<br />
afirma que as atletas ficavam muito nervosas durante as partidas, tendo que tomar<br />
tranqüilizantes para joga" (Informação verbal).<br />
127<br />
Passados alguns meses, nos dias 18, 20 e 22 de dezembro de 1957, a Liga<br />
Atlética de Santa Cruz - LASC realizou o I Campeonato Citadino de Basquetebol<br />
Feminino, que foi disputado numa melhor de três partidas para apurar a equipe<br />
campeã daquela temporada.<br />
A primeira partida, foi marcada para o ginásio do Corinthians, e a segunda,<br />
para o ginásio da Ginástica. Caso fosse necessária uma terceira partida o ginásio<br />
seria definido por sorteio (Gazeta do Sul, 14 dez. 1957).<br />
As atletas da Sociedade Ginástica venceram as duas primeiras partidas, não<br />
havendo a necessidade de disputar um terceiro jogo. O Jornal Gazeta do Sul de 28<br />
de dezembro de 1957 (p.4) publica uma reportagem a esse respeito:<br />
A campanha da Sociedade Ginástica é digna de elogios porque soube se<br />
impor neste primeiro ano de atividade ao conjunto tricolor, que há mais<br />
tempo vem se movimentando. Mais uma vez, a exemplo do "Torneio Início",<br />
as atletas da Ginástica surpreenderam a todos, diante do Corinthians.<br />
Com a vitória no clássico Ginástica e Corinthians - GI x CO, as atletas da<br />
Sociedade Ginástica qualificaram-se para disputar o campeonato estadual, realizado
em Santa Cruz do Sul, nos dias 25 e 27 de janeiro de 1958. Esse campeonato foi<br />
vencido pela Sogipa, que, graças, apenas, ao terceiro jogo e por uma diferença de<br />
somente três pontos (Gazeta do Sul, 16 jan. 1958).<br />
128<br />
Os resultados da Ginástica no campeonato estadual já haviam sido previstos<br />
pelo então Vice-Presidente de Esportes naquela temporada, Zildo Froehlich, que,<br />
em entrevista à Gazeta do Sul, disse que o plantel não havia treinado<br />
satisfatoriamente desde a vitória no campeonato citadino. Segundo Zildo a equipe<br />
estava em quase completo abandono, pela ausência de seu técnico Victor Nagel.<br />
Froehlich finaliza dizendo que duas atletas estariam deixando a equipe, o que<br />
diminuiria ainda mais o reduzido plantel.<br />
Em 1959 coube novamente à Ginástica representar a Cidade no<br />
campeonato estadual, tendo em vista a desistência do Corinthians em disputar o<br />
campeonato citadino daquela temporada. Os jogos foram realizados no ginásio da<br />
equipe locatária, nos dias 10 e 11 de janeiro de 1959. A equipe ginasticana disputou<br />
novamente o título máximo contra a equipe da Sogipa.<br />
A esperança era muito grande por parte de atletas e dirigentes quanto à<br />
possibilidade de conquistar o título máximo do "belo sexo" e, mais uma vez, a<br />
frustração: Sogipa, campeã e Ginástica, vice-campeã. A página esportiva do jornal<br />
Gazeta do Sul de 13 de janeiro de 1959 (p.6) observa que o quadro da Ginástica era<br />
muito bom, mas que "se descontrolava em virtude da emotividade natural da<br />
mulher". O público que se fez presente aos jogos saiu bastante decepcionado com o<br />
baixo nível técnico apresentado pelas duas equipes. O basquetebol feminino no
Estado, para o repórter do jornal, estava entrando numa fase de decadência, com<br />
um número cada vez mais reduzido de equipes, o que diminuía ainda mais a<br />
possibilidade de um maior intercâmbio, que, certamente, favoreceria um melhor nível<br />
técnico-tático.<br />
129<br />
O Corinthians já nem participou do campeonato citadino de 1958, tendo<br />
desativado o seu departamento ainda naquele mesmo ano. Também a Ginástica,<br />
após a disputa do título nos dias 10 e 11 de janeiro de 1959, quando alcançou o<br />
Vice- Campeonato, desativou o seu departamento, pois a maioria das atletas das<br />
duas agremiações deixar de jogar.<br />
Berger (1995) cita vários motivos que determinaram a decadência do<br />
basquetebol feminino em Santa Cruz do Sul, provocando a desativação do<br />
departamento nas duas sociedades:<br />
equipe;<br />
a) a falta de um maior número de atletas, desmotivando as outras colegas de<br />
b)o fato de muitas jogadoras não jogarem por acharem que o basquetebol era<br />
jogo para homens;<br />
c) a perda de interesse por parte daquelas que integravam o grupo;<br />
d) o fato de a maioria das atletas trabalhar, o trabalhava, o que dificultava<br />
uma maior dedicação;
130<br />
e) o fato de algumas atletas terem ido residir em outras cidades,<br />
principalmente, Porto Alegre;<br />
f) falta de persistência de outras jogadoras;<br />
g) o fato de os namorados das atletas proibirem a sua participação;<br />
h) o número cada vez mais reduzido de equipes no Estado, o que dificultava<br />
um maior intercâmbio.”<br />
Para Froehlich (1995), as atletas treinavam com muito mais dedicação e<br />
afinco que os homens, mas existiam dificuldades que a mulher tinha que enfrentar<br />
na época: "Existia o preconceito em relação a mulher na prática do esporte. Os pais<br />
não queriam. Nas rodas esportivas os homens comentavam que este esporte era<br />
para homens e que mulher não deveria jogar: era uma barbaridade.”<br />
Berger(1995) endossa as colocações de Froehlich quanto às dificuldades que<br />
as atletas enfrentavam em relação ao preconceito que a sociedade impunha a<br />
respeito de sua participação nas equipes de basquetebol. Perguntada a respeito,<br />
Berger conta que as jogadoras ouviam insinuações do tipo:<br />
"Que é que vocês querem jogando basquete? Vocês nunca vão ganhar!”<br />
“O basquetebol é um jogo para homens e não para mulheres.”
131<br />
Quando perguntada de que tipo de piadinhas as jogadoras de basquetebol<br />
eram vítimas, Berger ficou constrangida em contar, com maiores detalhes, o seu<br />
conteúdo. Informou que vinham de pessoas menos esclarecidas. Outro fato<br />
lembrado pela ex-atleta foi o de que a assistência nos jogos, logo de início, era<br />
fraca, mas, com o tempo, foi melhorando, embora não pudesse ser comparada com<br />
a dos jogos de basquetebol masculino.<br />
Castelanni (1989) comenta o artigo 54º do Decreto-Lei nº 3.199, promulgado<br />
em 1941, que faz referência à prática do desporto pelas mulheres: "[...] às mulheres<br />
não se permitirá a prática de Desportos incompatíveis com a condição de sua<br />
natureza, devendo para este efeito, o Conselho Nacional de Desportos baixar as<br />
necessárias instruções de entidades desportivas do país [...]"<br />
Para o autor, nesse decreto, a legislação deixava explícita a distinção de<br />
atividades que deveriam ser praticadas por homens e pelas mulheres, oportunizando<br />
naturalmente aos primeiros uma maior possibilidade para o desenvolvimento de<br />
suas qualidades biopsicossociais. O documento procurava ratificar legalmente a<br />
suposta superioridade do sexo masculino sobre o feminino: a mulher deveria ser<br />
preparada fisicamente para a maternidade, isto é, a figura da mulher era associada à<br />
figura da mãe (CASTELLANI, 1989, p.89).<br />
Para Rui Barbosa, as atividades físicas realizadas pelas mulheres deveriam<br />
ser de natureza frágil e delicada, de maneira a não colocar em risco as suas<br />
características maternais (CHAGAS, 1991, p.133).
132<br />
Essa discriminação da mulher nos esportes, em países do Ocidente, está<br />
ligada aos valores culturais. A mulher era preparada para o casamento e para ser<br />
dona de casa, enquanto o homem era preparado para o trabalho, pois era ele quem<br />
ia para as guerras. Na atualidade, essa concepção já mudou muito: a mulher vem<br />
conquistando dia a dia mais espaço em todas as áreas, inclusive nos esportes onde<br />
era muito discriminada (TUBINO, 1992, p.46).<br />
Büenecker (1995), ex-jogadora da Sociedade Ginástica nas modalidade de<br />
voleibol e basquetebol, diz que um dos principais motivos que a levaram a deixar de<br />
jogar o basquetebol, foi a brutalidade com que eram disputadas as partidas. Na<br />
verdade, é possível afirmar que as jogadoras, naquela época, não possuíam uma<br />
técnica muito apurada, o que tornava as partidas violentas.<br />
Em maio de 1973, houve uma tentativa de fazer com que o basquetebol<br />
feminino fosse reativado em Santa Cruz do Sul, com o objetivo de participar dos<br />
Jogos Intermunicipais do Rio Grande do Sul - JIRGS. O Conselho Municipal de<br />
Esportes (CMD), juntamente com a Escola Superior de Educação Física (ESEF),<br />
formou uma equipe, mas essa foi desfeita logo depois da participação da equipe na<br />
competição (Gazeta do Sul, 04 ago. 1973).<br />
Tentativa idêntica foi feita em 1985 quando a professora Erotides K. da Cruz<br />
montou uma equipe para disputar a Olimpíada Farroupilha, que foi disputada em<br />
Santa Cruz do Sul entre os dias 31 de agosto a 3 de setembro. Embora a equipe<br />
tivesse pouco tempo para treinamentos e pouca experiência, saiu-se bem no torneio,<br />
conseguindo a quarta posição na competição (Gazeta do Sul, 03 set. 1985).
133<br />
Perguntada sobre quais os principais obstáculos para que a equipe fosse<br />
desfeita, Tessmann (1995) respondeu que vários fatores determinaram o<br />
fechamento dessa equipe, entre os quais poderiam ser destacados:<br />
a) Pouco intercâmbio com outras equipes;<br />
b) falta de espaço físico e material para treinamentos;<br />
c) pouco apoio recebido;<br />
d) falta de remuneração, pois tudo era feito de graça, tudo pelo amor.<br />
Nessa competição, três atletas santa-cruzenses foram convocadas para uma<br />
fase de treinamento na Seleção Gaúcha de basquetebol. Um trecho de uma<br />
entrevista realizada pelo repórter do jornal Gazeta do Sul, com a atleta Janice<br />
Hickmann, demonstra que o preconceito em relação à participação feminina no<br />
basquetebol ainda continuava. Questionada sobre a possibilidade de o basquete<br />
masculinizar a mulher ou deformar o seu corpo, Janice respondeu : "Quem gosta de<br />
mim não deve se preocupar com os calos, mesmo porque posso fazer carinho com<br />
as costas das mãos".<br />
Coube à Sociedade Ginástica retomar o basquetebol feminino em 1990 com a<br />
reabertura de seu departamento.
134<br />
O Riovale Jornal, em 21 de novembro de 1990 (p.17), menciona que a<br />
Ginástica foi a primeira a introduzir o basquetebol feminino em Santa Cruz do Sul,<br />
demonstrando claramente que o público e mesmo as pessoas ligadas ao<br />
basquetebol, treinadores e dirigentes, desconhecem a história dessa modalidade<br />
esportiva na região.<br />
A referência ao desconhecimento da história do basquetebol entre treinadores<br />
e dirigentes está embasada em fatos concretos. O Riovale Jornal fez uma série de<br />
reportagens no mês de novembro de 1990, nas quais treinador e atletas afirmam<br />
que a Sociedade Ginástica havia sido o primeiro clube de Santa Cruz do Sul a<br />
oportunizar essa modalidade para o sexo feminino.<br />
Todas as atletas que participaram do grupo de jogadoras de 1990,<br />
entrevistadas pela reportagem do Riovale Jornal, afirmam que têm recebido grande<br />
apoio da família para a prática dessa modalidade e todas demonstram grande<br />
paixão pelo basquetebol.<br />
O primeiro treinador da equipe de basquetebol feminino da Sociedade<br />
Ginástica, em 1990 foi Ériton Vetoretti, que disse ter sido que o reinício dessa<br />
modalidade, embora muito difícil, bastante gratificante, pois as "meninas" adoravam<br />
treinar.<br />
Fernanda Haas (11.08.95), estudante de Psicologia da UNISC, uma das<br />
atletas que participou da equipe feminina reativada pela Sociedade Ginástica em<br />
1990, ressaltou que a maioria das meninas integrantes do plantel eram alunas dos
Colégios São Luís e Mauá. Para a atleta, a rivalidade entre estas escolas<br />
particulares nessa modalidade era muito acirrada e, de uma hora para outra, todas<br />
estavam fazendo parte de um mesmo grupo, criando laços de amizade muito fortes.<br />
135<br />
Na primeira temporada das categorias infantil e infanto-juvenil, as equipes<br />
saíram-se muito bem, sendo que o Infantil conseguiu colocar-se entre as quatro<br />
melhores equipe do Estado, e o Infanto-Juvenil conseguiu o Vice-Campeonato<br />
Estadual, demonstrando um bom potencial das jogadoras nessas categorias.<br />
Segundo Fernanda:<br />
[...] a caminhada foi muito difícil, como todo o início, mas, com muita<br />
determinação e espírito coletivo, conseguimos achar o nosso espaço, e,<br />
logo na primeira temporada, mostramos poder representar um clube de<br />
tradição no Campeonato Estadual.<br />
Numa matéria do jornal Riovale de novembro de 1992 (p.18), afirma-se que o<br />
maior problema enfrentado no campeonato de 1990, foi a falta de um maior<br />
intercâmbio esportivo, aliás, o mesmo problema enfrentado pelas equipes formadas<br />
em 1950 e 1957 em Santa Cruz do Sul.<br />
Vários aspectos a esse respeito foram apresentados pela jogadora:<br />
[...] todas as meninas eram de Santa Cruz do Sul, e era muito difícil<br />
conseguir mais adeptas por vários motivos. O primeiro é o de que os pais<br />
das atletas que não faziam parte do plantel não queriam que jogassem<br />
basquetebol, porque para estes esta modalidade masculinizava as filhas. Às<br />
vezes tinha casos onde alguma menina ia treinar sem os pais saberem; as<br />
pessoas achavam que este esporte era somente para homens e que todas<br />
as mulheres que o praticassem eram olhadas de forma diferente; outro fator<br />
era o de que aquela equipe tinha uma amizade tão grande que foi formado
136<br />
um espírito corporativista: quando alguém diferente chegava para treinar, a<br />
gente tratava com indiferença.<br />
Perguntada por que tinha havido essa resistência ao ingresso de novas<br />
atletas na formação da equipe, Fernanda respondeu:<br />
Isto ocorreu principalmente porque nós sofremos juntas a discriminação<br />
imposta pela sociedade em relação ao basquetebol feminino. Nós<br />
conseguimos vencer esta barreira com muito mais união, porque o grupo<br />
colocava o basquetebol acima de tudo, muitas vezes até acima dos estudos.<br />
Em 1991, todas as integrantes da equipe da Sociedade Ginástica se<br />
transferiram para o Corinthians Sport Club. Em 1992, jogando pelo Corinthians, a<br />
equipe sagrou-se novamente Vice Campeã Estadual. Na temporada de 1993, a<br />
maioria das atletas foi estudar em outras cidades e algumas foram convidadas a<br />
participar de outras equipes, provocando a extinção do Departamento de<br />
Basquetebol Feminino do Corinthians.<br />
Na temporada de 1994, o basquetebol feminino continuou desativado por<br />
falta de um clube que se dispusesse a bancar uma equipe. Ainda que tenha havido<br />
algumas tentativas de reativação dessa modalidade esportiva na cidade, não<br />
existem, a respeito, perspectivas alentadoras.<br />
Perguntada se, realmente as atletas do sexo feminino teriam maiores<br />
dificuldades para acompanhar os treinamentos, Fernanda afirma o seguinte:<br />
Isto é verdadeiro embora fosse mais difícil de acontecer com aquela<br />
primeira equipe formada na Ginástica. Atualmente existe uma maior<br />
rotatividade e qualquer coisa é motivo para que as atletas faltem nos<br />
treinamentos.
137<br />
Juarez Franco (informação verbal, 1995) ex-treinador da equipe de<br />
basquetebol feminina do Corinthians, ao ser perguntado sobre quais as maiores<br />
dificuldades enfrentadas para a manutenção daquela equipe e de novas equipes que<br />
poderiam vir a ser formadas, disse que: "o maior problema é a falta de uma melhor<br />
estrutura financeira que pudesse viabilizar condições para que estas equipes<br />
consigam realizar um número maior de jogos".<br />
Finalizando, percebe-se, pelas declarações feitas pela atleta Fernanda, que<br />
mesmo com toda a velocidade com que ocorrem as transformações no mundo atual,<br />
as pessoas ainda tem preconceito quanto aos esportes praticados pelas mulheres,<br />
especialmente em relação ao basquetebol.<br />
Assim, podem-se imaginar as dificuldades encontradas pelas atletas da<br />
década de 1950, quando os tabus e preconceitos eram bem mais acentuados do<br />
que hoje em relação ao sexo feminino, e muito mais ainda com respeito à prática<br />
esportiva.<br />
Quanto ao aspecto do intercâmbio esportivo que viria em benefício do nível<br />
técnico das atletas, enfatizado pelo técnico Juarez Franco, também não houve<br />
mudanças significativas ao comparar-se as equipes formadas na década de 50 e<br />
na de 90, embora as circunstâncias tenham sido diferentes. Dessa forma, enquanto,<br />
na década de 50, os princiapais motivos da dificuldade de intercâmbio foram a falta<br />
de jogos e o número reduzido de equipes no Estado, nos anos 90, pode-se apontar<br />
como seu principal motivo a falta de aporte financeiro para suportar os gastos
necessários à manutenção de toda a estrutura necessária, o que possibilitaria um<br />
maior intercâmbio de jogos.<br />
138
CONCLUSÃO<br />
Procurando descrever todos os passos que o basquetebol de<br />
Santa Cruz do Sul teve que percorrer desde sua implantação até a<br />
década de 90, percebeu-se que a popularidade desse esporte não se<br />
alicerça no número de praticantes e sim no número de homens,<br />
mulheres e crianças de todas as idades que lotam o ginásio para<br />
assistir aos jogos e torcer pela equipe que representa a cidade.<br />
Para que o basquetebol atingisse o nível em que se encontra,<br />
muitas foram as dificuldades que tiveram que ser transpostas, a<br />
começar pelas condições de vida a que os imigrantes alemães foram<br />
submetidos ao chegar a Santa Cruz do Sul. Nos primeiros anos,<br />
principalmente no período de 1849 até 1859, todos os seviços, como os<br />
bens de subsistência, eram produzidos pela própria família, o que<br />
impossibilitava ao imigrante alemão a criação de organizações sociais.<br />
Com a melhoria das condições de vida, instituições começaram a ser<br />
criadas no intuito de preservar e ampliar os laços sociais, para a<br />
manutenção do espírito de germanidade e a preservação da língua<br />
alemã.
140<br />
Justamente as sociedades esportivas priorizadas pelos imigrantes<br />
e descendentes, como a cavalaria, no Rio Grande do Sul, foram<br />
fundadas em Rio Pardinho, distrito de Santa Cruz do Sul; e o tiro-ao-<br />
alvo, esporte preferido pelos jovens imigrantes, foram as que sofreram<br />
maior repressão. As autoridades entendiam que as sociedades<br />
poderiam ser um campo fértil para a propaganda nazista e provocavam<br />
o fechamento destas. Outras sociedades foram fundadas com<br />
atividades culturais e esportivas, mas com outro perfil e entre estas<br />
encontram-se a Sociedade Ginástica (1893), o Corinthians Sport Club<br />
(1939) e o Grêmio Atlético Sampaio (1944), que introduziram o<br />
basquetebol em seus quadros esportivos.<br />
A Sociedade Ginástica e o Corinthians Sport Club, as duas<br />
sociedades de maior tradição em Santa Cruz do Sul no basquetebol,<br />
sofreram influência de métodos ginásticos europeus. Assim, a primeira,<br />
fundada em 15 de setembro de 1893, teve forte influência do método<br />
alemão, enquanto, o Corinthians Sport Club, fundado em 25 de julho de<br />
1939, sofreu maior influência do método francês.<br />
Santa Cruz do Sul sofreu os reflexos da discriminação racial<br />
sobre os jogadores negros de basquetebol, mas essa discriminação se<br />
tornou mais branda a partir de 1990. Quando o Corinthians resolveu<br />
investir em uma equipe de alto nível. Assim, no momento em que o<br />
jogador, na quadra, passou a ter boa performance esportiva, passou,<br />
também, a funcionar como uma espécie de funcionando como uma
espécie de instrumento de "branqueamento", conferindo-lhe aceitação e<br />
status social.<br />
141<br />
Dez anos depois de criar o Departamento de Basquetebol<br />
Feminino em Santa Cruz do Sul, as jogadoras, que tantos sacrifícios<br />
fizeram para a manutenção do departamento, que lutaram contra a<br />
discriminação pelo fato de uma mulher jogar um esporte que era, e<br />
ainda é - considerado por muitos, como um esporte para homens e que<br />
tentavam compensar a falta de um maior intercâmbio esportivo com<br />
outras agremiações, viram-se desmotivadas e presenciaram o<br />
fechamento dos departamentos de basquetebol feminino. A primeira<br />
sociedade a fechar o seu departamento foi o Corinthians Sport Club e,<br />
mais tarde, a Ginástica.<br />
Em 1990 a Sociedade Ginástica reativou o seu Departamento de<br />
Basquetebol Feminino, cujas atletas tiveram que enfrentar as mesmas<br />
dificuldades das jogadoras na década de 50, o que mostra, claramente,<br />
que, mesmo quarenta anos depois, a discriminação em relação à<br />
mulher, na prática de uma modalidade esportiva que requer um maior<br />
contato físico, continua dominando grande parte da população, mesmo<br />
a mais esclarecida.<br />
Quanto ao basquetebol masculino, pode-se dizer que ele<br />
encontrou, em Santa Cruz do Sul, um campo fértil para seu<br />
desenvolvimento. Nas décadas de 40 a 70 e até 80, a maioria dos
jogadores era natural de Santa Cruz do Sul. Já na década de 40 o<br />
nome do Corinthians Sport Club projetava o basquetebol especialmente<br />
no cenário estadual e, em menores proporções, em nível nacional.<br />
142<br />
Os jogadores que faziam parte do plantel da Sociedade Ginástica<br />
e do Corinthians entre as décadas de 40 e 80 praticavam o basquetebol<br />
no mais puro amadorismo, sem receber nenhum tipo de remuneração,<br />
sendo obrigados a trabalhar e a pagar seus próprios estudos.<br />
Em 1990, iniciou-se uma nova fase no basquetebol santa-<br />
cruzense, quando o Corinthians Sport Club resolveu que o<br />
Departamento de Basquetebol Adulto deveria deixar a condição de<br />
amador para passar à condição de profissional. No Brasil a condição<br />
profissional não está regulamentada, embora se saiba que muitos<br />
jogadores de basquetebol, principalmente de grandes equipes, recebem<br />
salários e se dedicam a esse esporte em tempo integral.<br />
O Corinthians Sport Club conseguiu levar em frente o projeto<br />
graças à aliança celebrada em 1990 com a Empresa Arcal. Outros<br />
patrocinadores surgiram a partir de 1992, todos eles com o mesmo<br />
objetivo: veicular seus nomes na grande mídia esportiva. As empresas<br />
patrocinadoras oferecem todo o aporte financeiro para a contratação e<br />
a manutenção dos jogadores, enquanto ao Corinthians Sport Club cabe<br />
veicular e projetar os produtos da empresa patrocinadora.
143<br />
A estrutura alcançada pelo basquetebol em Santa Cruz do Sul<br />
foi sendo montada ao longo da história da região. Atualmente, Santa<br />
Cruz do Sul é considerada a Capital Gaúcha do Basquetebol,<br />
conseguindo implantar uma excelente estrutura de treinamento para a<br />
equipe principal, com o auxílio da comunidade, que prestigia essa<br />
modalidade, que, ao lado das indústrias do fumo e da Oktoberfest, é<br />
uma marca. É importante ressaltar que essa mesma estrutura não é<br />
extensiva para as equipes de base.<br />
Pode-se afirmar, pois, que, se o basquetebol em Santa Cruz do<br />
Sul, nos anos 90, conseguiu atingir o estágio de excelência, de possuir<br />
uma equipe de basquetebol cotada entre as melhores do país, é porque<br />
muitos investimentos têm sido feitos para a contratação e a<br />
manutenção de jogadores de excelente nível técnico, além da comissão<br />
técnica.<br />
Assim, apesar de todos os entraves pelos quais o basquetebol de<br />
Santa Cruz do Sul passou, desde a sua criação até agora, é,<br />
seguramente, o esporte que leva crianças, jovens e adultos de ambos<br />
os sexos aos ginásios, tornando-se, pois assim, uma mania no<br />
município.
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