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Cultura de Bancada, 23º Número

Cultura de Bancada, 23º número, lançado a 12 de junho de 2024

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Os Cravos ainda não chegaram

a todo o lado!

HISTÓRIA DO MOVIMENTO

ORGANIZADO DE ADEPTOS

no SC Farense

comunicação independente

tó madeira

à conversa com

desnorteados

38

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na pele de um interdito

memórias da bancada

54

74

resumo da bancada

quando a nigéria bateu os mestres

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bola de notas

80

84

92

97

glasgow away

uma maratona internacional

dérbi do minho

final da taça de portugal

101

103

106

djugarden x hammarby

cultura de adepto

A voz do leitor

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Edito

Mais uma época que está a acabar

e, com isso, repete-se a história de vida dos

adeptos. Uns celebram as conquistas dos seus

clubes e outros, pelo contrário, lamentam o

insucesso. É a sina de quem ama, num ciclo

que se repetirá eternamente.

Com os anos a passar, cada vez

fica mais longe a memória que temos das

nossas experiências “livres” na bancada. O

ritual de colocar as faixas, a preparação das

grandes bandeiras, a organização e ritmo

que o tambor trazia à bancada, só quem

esteve lá percebe. Para muitos de nós este

é mesmo um cenário cada vez mais distante

e, com isso, tem sido comum ver que existe

uma resignação e adaptação à realidade

actual. Não fazemos o julgamento de

qualidade, mas, era prejudicial esconder que

é lamentável termos de reconhecer que falta

força aos grupos e que estão a ser vencidos

pelo cansaço. Sem esquecer que as novas

gerações, tão importantes para o futuro, não

entendem a mensagem do passado porque

não viveram o mesmo que nós. É importante

sublinhar que as nossas palavras não têm

como intenção descredibilizar o que é feito

pelos grupos. Os tempos são o que são e a

realidade é difícil, mas queremos acreditar

que vale a pena lembrar que ser Ultra é dar

um pouco mais e o movimento precisa disso

como nunca.

Deixamos uma nota acerca da

participação dos adeptos na nossa rubrica

denominada por A voz do leitor. Queremos

salientar que vemos, com alguma surpresa,

a falta de interesse dos nossos leitores em

participar na janela que abrimos para o efeito.

Quando criamos essa secção, recordamos as

cartas que antigamente eram enviadas para

as fanzines. Tudo levava a crer que a facilidade

dos novos meios de comunicação poderia

conduzir a uma boa participação. Estávamos

errados.

Enquanto projecto, nascemos

com a consciência que existe a necessidade

de afirmar e reforçar a cultura colectiva dos

adeptos portugueses. Só que os factos, dos

quais temos conhecimento, demonstram que

Director

J. Lobo

Redacção

L. Cruz

G. Mata

J. Sousa

Design

S. Frias

M. Bondoso

Revisão

J. Rocha

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cada vez menos se faz para caminhar nessa

direcção. Isto é preocupante e irá determinar

o futuro.

Pela nossa experiência, a existência

de uma comunidade de adeptos activos é

essencial para a construção do caminho que

queremos trilhar e para a defesa do pouco

que nos resta. Essa foi, por exemplo, a base

que ajudou a APDA a nascer. A semente

que foi alimentada durante vários anos

tornou-se no corpo que abriu portas a uma

nova realidade cultural no nosso país. A

necessidade de erguer essa ponte, para

unir novos adeptos, também foi trabalhada

desde o início da Cultura de Bancada, só que

nem assim ficamos de consciência tranquila.

Estamos numa prova contra-relógio e, por

este andar, quando os adeptos acordarem

deste “sono” vai ser tarde demais. E depois

já sabem, “lá fora é que é, os alemães estão

anos-luz à nossa frente”.

Este pessimismo não nos pertence

- é antigo e subscrito por muitos ao longo de

vários anos. Já pensaram que, após tantos

anos de problemas, podiam unir o “melhor”

que temos entre todos para fazermos mais

e, salvo raras excepções, isso não acontece?

Fomos ousados na crítica, mas temos tento.

Assim, terminamos as nossas palavras com

um pedido de reflexão aos nossos leitores

e que se juntem a quem, por ventura, se

interesse por este tema tanto como vós.

Ajudem a agitar a malta, já dizia alguém que

é o que faz falta.

Aproveitem o 23º número da

Cultura de Bancada. Daqui a dois meses

estamos cá de novo.

Convidados

Martha Gens

Edgar Macedo

Desnorteados

Eupremio Scarpa

Daniel Freire Santos

Sergio P.

Pedro Marques

Guido Bruno

N. Oliveira

P. Alves

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OS CRAVOS AINDA NÃO CHEGARAM

A TODO O LADO!

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Comemorou-se, no passado mês

de Abril, 50 anos desde “a madrugada que

eu esperava”. Celebrou-se a restituição

da liberdade em todas as frentes, mas

sobretudo, a restituição da liberdade de

expressão – hoje configurada como um

direito constitucionalmente previsto.

A APDA fez circular um manifesto,

no feriado de Abril, no qual tecemos

diversas considerações sobre cumprir Abril.

Quisemos que pensassem connosco e que

nos acompanhassem, não só na celebração,

mas motivando todos os que nos seguem, no

caminho longo que nos falta percorrer.

Estas celebrações não podem, nem

devem, fazer-nos cruzar os braços. Antes de

sair para a rua com cravos na mão, é crucial

olharmos à nossa volta e perceber se o

legado que alguns conquistaram se tornou

uma realidade. Se esse legado é palpável, se

ele existe de forma pura, ou se é apenas uma

lápide onde todos os anos deixamos flores e

agradecemos.

À semelhança de muitos outros dias

do ano, em que celebramos factos em que

houve uma conquista de direitos, esquecemonos

que esse legado nos foi deixado, não

apenas para ser preservado, mas para que

nós, 50 anos depois, o tornemos exequível e

para que, sobretudo, seja uma realidade nas

nossas vidas.

A verdade é que, no que às nossas

bancadas diz respeito, ainda estamos longe

de cumprir este legado de Abril.

Vemos, por essa Europa fora,

bancadas cheias de bandeiras, safe standing,

coreografias que enchem os jornais de cores

e fazem qualquer leitor querer estar numa

bancada de futebol.

Nos termos da lei que foi projectada

e está em vigor, alegadamente por um partido

de centro/esquerda, os Grupos Organizados

têm de estar nas ZCEAP – e apenas aí (aquelas

que não têm condições para ninguém estar

de pé em segurança).

Por aqui, os grupos organizados

de adeptos, na sua maioria, continuam

sem povoar as infames zonas especiais com

condições especiais para adeptos, como a lei

obriga. Porque, na verdade, não deve ser a lei

a determinar onde nos devemos sentar – nem

num recinto desportivo, nem num concerto,

nem em lado nenhum. Muito menos porque

essa mesma lei cria essa obrigação baseada

num estereótipo de adeptos conveniente

a muitas instituições - estereotipo esse

bolorento, errado e que atropela gravemente

o direito à igualdade. E assim, nos nossos

estádios, prevalece a resistência, e resistir

a estas obrigações tem um reverso – estes

adeptos, sentando-se fora das zonas que a lei

determina, estão assim impedidos de fazer

tudo aquilo que os fascinou no dia em que

quiseram fazer parte deste movimento. Não

há bandeiras grandes, não há tambores, nem

há zonas que lhes permitam estar de pé e

saltar em segurança.

Perdeu-se a magia de cativar os

nossos sobrinhos, irmãos e filhos para vir ao

fim do dia à sede pintar a bandeira ou fazer

a coreografia do dia de jogo – aquela que

orgulhosamente fariam questão de levantar

no apito inicial – aquela que os faria entrar


cedo para o estádio no dia de jogo, a fim

de ter tudo preparado. A longo prazo, esta

cultura irá definhar, com a conivência e a

cumplicidade de todos os intervenientes, que

viram tudo a acontecer, e nada fizeram para o

impedir.

A liberdade nos estádios é uma

liberdade que não se exerce em pleno. Talvez

seja uma frase difícil de escrever, mas aqui

fica, para que a leiam e pensem no tanto

que nos falta fazer – não há liberdade de

expressão dentro de um estádio de futebol.

Portanto, se abdicarem de TUDO, “podem”

estar em qualquer outra zona do estádio.

Mas cuidado com o que cantam.

Não podem cantar em manifestação a outras

instituições do futebol. Serão multados

e interditos. Não podem levar bandeiras

políticas. Nem com o Che Guevara. Também

não podem levar t-shirts da Amnistia

Internacional, a favor dos direitos humanos

- serão barrados à entrada. Também não

convém fazerem muito barulho quando vos

tentam reprimir ainda mais os vossos direitos

– estarão a ser insurretos e a incentivar

comportamentos antidesportivos.

Podia estar a escrever de forma

extremamente pessimista, mas na verdade,

são estes os testemunhos que nos chegam

todos os fins de semana. São estas as

experiências que vivemos todos os fins de

semana.

Por esse motivo, resolvi trazê-las

para o papel – para vos lembrar que, para

nós, há muito Abril por cumprir.

Estádio Novo? Pois é, foi este o mote que

escolhemos para a nossa reflexão nos 50

anos de comemoração do 25 de Abril –

porque mesmo em tempos de censura, havia

liberdade num estádio.

Queria recordar-vos que há tanto

por fazer… não façamos dos legados uma

pedra preciosa que colocamos numa redoma,

apenas para admirar e celebrar. Deram-nos o

mote, cabe-nos a nós transformá-lo numa

realidade.

Viva a Liberdade.

Por Martha Gens, Presidente da Associação

Portuguesa de Defesa do Adepto

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Desta feita a caminhada é feita de chinelos... Aqui há 10 meses de verão e mistura

de azáfama da cidade e a calma da ilha, beijada pela água doce da ria e pelo salitre do mar.

Os seus primeiros registos recuam à era de domínio romano, durante o século III a. C. Após os

visigodos conquistarem aquele território, seriam os fenícios a dominarem-no a partir do século

IV a. C., denominando esta localidade, que já se destacava como centro urbano e comercial, por

Ossonoba. No século XI, já como capital de um principado independente, veio a ser chamada de

Santa Maria Ibn Harum, numa altura em que se edificaram muralhas para a proteger. Falamos

de Faro, a capital do Algarve, e falaremos dos farenses, até porque “é tudo uma questão de

educação” e “és de Faro, és Farense”

Já depois da independência portuguesa e da reconquista dos nossos territórios

aos mouros, a cidade foi renomeada para Santa Maria de Faaron ou Santa Maria de Faaram,

aproximando-se do seu nome actual. Continuaram os tempos prósperos, muito por culpa dos

Descobrimentos Portugueses, da sua posição geográfica, do seu porto marítimo e do comércio de

sal e produtos biológicos. Era uma localidade de artesãos, recheada de empreendedores, tendo a

comunidade judaica peso na prosperidade da cidade, até que D. Manuel I expulsa de Portugal os

judeus que não se convertessem ao catolicismo. O século XV foi de construção de infra-estruturas,

tendo ficado o século seguinte marcado pela elevação a cidade e pela invasão inglesa, que causou

danos. Apesar disso, os séculos seguintes foram de expansão territorial da cidade, somente

travada pelo terramoto de Lisboa, em 1755, que arruinou também os principais edifícios de Faro.

Até finais do séc. XIX, a cidade manteve-se dentro dos limites da Cerca Seiscentista, uma segunda

muralha construída para defender uma possível invasão espanhola na sequência da Restauração

de 1640.

A corveta de guerra “Duque de Palmela” foi espaço de promoção do futebol no Algarve,

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uma vez que estava ancorada na Ria Formosa como navio-escola. Os aprendizes de marinheiros

aprenderam a jogar à bola nos primeiros anos do séc. XX, sendo o primeiro jogo oficial em 1907,

no atual Largo de São Francisco, entre os militares do exército e os marinheiros da corveta. Já os

alunos do liceu de Faro também quiseram experimentar o novo desporto, e o professor Lyster

Franco ensinou-lhes as regras que trazia do Club Lisbonense. Este desporto foi conquistando

o interesse dos farenses e, em 1909, surgiu a ideia de se fundar um clube com equipamentos,

campo, sede e sócios que contribuíam semanalmente com uma quota de um pataco. É esta a

semente do que se efetivou, a 1 de abril de 1910, como Sporting Club Farense. A inspiração

dos fundadores foi o Sporting Clube de Portugal, possível de perceber através do nome e do

equipamento “Stromp”. A escolha das cores preta e branca deveu-se à tonalidade das fotografias

da equipa sportinguista que chegavam a Faro. A sua primeira casa foi o Campo de São Francisco,

depois o Campo da Sra. da Saúde, onde hoje está instalada a emissora nacional, antes de se

instalar definitivamente no Santo Stadium, hoje Estádio de São Luís.

O SCF é um dos principais impulsionadores do futebol na região mais a sul do país,

tendo sido fundador da União Foot-ball de Faro, juntamente com a Associação Académica do

Liceu de Faro, a Escola Normal de Faro e o Boavista Foot-ball Club no decorrer de 1914. É criado o

Campeonato de Faro e o Campeonato do Algarve, tendo o Farense vencido as primeiras edições

de ambas as competições. Esta organização acabaria por se extinguir em 1916, sucedendo-se a

formação da Associação de Foot-ball do Algarve, em 1917, que viria a extinguir-se volvido um

ano. Já em 1921, o Ginásio Club Farense recebe dirigentes do Sporting Club Farense, Sport Lisboa

e Faro, Boxing Foot-ball Club, Sporting Club Olhanense, Luzitano Foot-ball Club, Esperança Football

Club, Gloria Foot-ball Club, Portimonense Sporting Club, Sport Club União e Sport Club Os

Leões Portimonenses, símbolos que fundaram a ainda ativa Associação de Futebol do Algarve.


Dada a falta de campos dignos da dimensão da cidade, Manuel Santo, emigrante que

tinha regressado, projeta a construção do Santo Stadium, em 1922, num terreno perto da Igreja

de São Luís. Este recinto foi projetado de raiz para a prática desportiva, algo raro à época. Portanto,

assegurou-se que o campo tinha medidas apropriadas e bancadas para acolher adeptos, com

camarotes incluídos. Dá-se a sua inauguração a 1 de dezembro de 1923 e, no ano seguinte, o

Farense arrendou o estádio para receber os seus jogos, jogando lá até aos dias de hoje.

A temporada 1934/1935 marca a estreia dos campeonatos nacionais, com a formação

da I e II ligas, tendo o Sporting Club Farense participado no segundo escalão. Continuou nessa

divisão até depois de se sagrar campeão nacional da 2ª Divisão, em 1939/1940, uma vez que

a 1ª Divisão não permitia a participação de clubes fora de Lisboa e do Porto até 1941/1942. A

tão desejada subida foi sendo adiada porque, mesmo após vencer a série do sul, não conseguiu

voltar a tornar-se campeão nacional e assim consumar a ascensão. As décadas seguintes foram

de subidas e descidas entre a segunda e terceira divisão, marcando presença nas fases de subida

por várias vezes, como é o caso de 1956/1957. Encontramos uma fotografia de farenses num

autocarro em que rumaram ao Porto, num momento de confraternização com a equipa antes do

encontro com o Salgueiros.

Em 1969/1970 conseguem ascender pela primeira vez ao mais alto patamar português.

Nesse ano já é possível ver as bancadas do São Luís bem compostas com muitas bandeiras a

serem onduladas ao vento, sendo o início das três décadas com mais sucesso da história daquele

que é o maior representante algarvio nos campeonatos nacionais. Entre sucessivas permanências

e descidas, surge a primeira organização de um grupo de apoio mais organizado, a Juventude

Farense. Dá-se a segunda conquista do Campeonato Nacional da II Divisão em 1982/1983, o

ano que também entra na história por ver surgir os Demónios Brancos, coletivo de apoio que

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se manteve ativo até 1988, reaparecendo na Final da Taça de Portugal em 1990. Contudo, havia

pouca organização e cultura de claque, tendo a maioria do público uma maior participação

através de cânticos curtos, apupos, palmas e pressão junto às vedações, o que fez do São Luís um

estádio sempre animado e difícil de passar. Os Demónios Brancos apoiavam munidos de faixa,

bandeiras, um panal, capacetes de construção civil com o seu nome inscrito, tambores e gaitas,

por exemplo.

O Farense disputou a II Liga de 1989/1990, vencendo a zona sul, conseguindo novo

regresso ao primeiro escalão. Juntou a isso o feito inédito de ser finalista da Taça de Portugal,

decidida à segunda numa finalíssima contra o primodivisionário Estrela da Amadora. Diz-se

que Faro ficou vazia, tendo milhares de farenses enchido o Jamor de bandeiras, de pequenas e

grandes dimensões. Foi a última aparição dos Demónios Brancos.

Na época seguinte, aparece a Pujança Moura, grupo que se apresentava na bancada

com faixa, fumos, papel cortado e bandeiras grandes. A Pujança Moura, existente entre 1991 e

1992, e a Alma Algarvia, com atividade entre 1992 e 1993, ajudaram o SCF a conseguir um 7º e

dois 6º lugares consecutivos.

É à quinta jornada de 1994/1995, em recepção ao Sporting de Braga, que aparecem

os South Side Boys. Formado por jovens, tornou-se um grupo disruptivo com o estilo dos seus

antecessores, fruto da irreverência mostrada e pela aglomeração de malta de diversas ideologias

e subculturas sob o estilo Ultras, levando a cabo uma valorização de Faro e do que o seu povo

proporcionava. Logo no seu primeiro jogo deram espetáculo: juntaram cerca de 100 elementos,

abanaram balões e abriram extintores, tochas e potes de fumo. Não fugindo à regra do movimento

de apoio nacional nos anos 90, faziam cachecoladas com cachecóis de Portugal e de diversos

clubes e grupos estrangeiros, especialmente de Itália, Espanha e Inglaterra. A primeira de quatro


deslocações (nessa época) fica na memória do grupo não só por ser a de estreia, mas sobretudo

pelas aventuras desde a chegada, à hora de almoço, até à saída de Setúbal. Na chegada ao

estádio, a polícia apreendeu um extintor, dois potes e uma tocha, tendo sido recuperados pelos

South Side alguns desses dispositivos. Fizeram então uma tochada com mais de uma dezena de

artefactos, cenário que se repetiria no Municipal de Leiria. Provocações na bancada, pedrada no

autocarro dos Ultras Sul, lembranças nas áreas de serviço e luta de comida dentro da viatura… os

danos contribuíram para a perda de um patrocínio e consequente demissão de vários membros

da primeira direcção da claque. Este primeiro ano fica também marcado pela censura policial às

faixas “Ragazzi della Violenza” e “Hooligans”, bem como pelo aumento de receitas, inauguração

da primeira sede, criação da SS Zine e belas coreografias (uma cascata de papel, outra com dois

lençóis), oscilando as mobilizações em Faro entre os 200 e os 500 elementos. Para isso também

contribuíram as iniciativas que os SS organizavam com bandas da cidade, como concertos de

conjuntos locais que chegaram a ensaiar na sede do grupo, bem como a criação de núcleos por

zonas da cidade. Desde logo começaram a surgir tensões e confrontos com equipas da cidade do

Porto, inicialmente com os Super Dragões. Acabariam por ajudar o Farense a atingir o 5º lugar na

I Divisão, a sua melhor classificação de sempre, adquirindo o direito a disputar as competições

europeias na época posterior. Na última jornada festejaram com uma coreografia com dois

lençóis e os dizeres “Nascemos para te levar à Europa”, havendo ainda invasão de campo. Para

culminar, deslocaram-se em bom número a Olhão, onde o Farense festejou a subida de divisão à

primeira divisão de Basquetebol.

A temporada 1995/1996 trouxe novidades. Em Setembro, jogaram-se os dois únicos

jogos europeus da história do clube. Em Faro, os South Side Boys prepararam uma grande

coreografia de cartolinas a recriar a bandeira nacional, estando todos com uma t-shirt do grupo,

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tendo recebido o reconhecimento dos Bad Gones no final da partida. Para a segunda-mão,

disputada em solo francês, compareceram 15 ultras, que se depararam com um aparato policial

fora do normal da realidade portuguesa. Houve abusos nas revistas, tendo a polícia exigido o

corte das faixas para poderem estar expostas na rede do sector e, devido a isso, a faixa principal

ficou deslocada, não tendo de ser recortada. Mais tarde, antes de um jogo contra o Porto, Faro

foi presenteada com o primeiro cortejo dos SS, onde perfilaram cerca de 250 elementos. Ao

nível de mobilizações para outras terras, dobraram a primeira época, contabilizando um total de

oito deslocações. Praticamente isolados no Algarve e numa altura em que era muito mais difícil

viajar, as viagens ao norte eram realizadas por três (Guimarães), cinco (Porto) ou dez elementos

(Braga), por exemplo. Em Campo Maior, naturalmente, a mobilização foi maior, registando-se um

dos maiores confrontos da história dos South Side Boys, com 15 membros a receberem ordem de

detenção.

Há então uma reestruturação, passando os núcleos das zonas de Faro a serem

considerados grupos. Dada a maturação e de se levantarem valores mais altos do que as zonas

de residência, a identificação de uns elementos com outros torna-se mais importante na coesão

do grupo e dos subgrupos. Isto aconteceu numa altura em que a claque atraia adeptos de outras

terras, constituindo aquilo que eram considerados núcleos nas suas áreas residenciais, onde

quem pagasse a quota anual de 1 000$00 tinha direito a presenciar todos os jogos caseiros.

A permanência viria a ser garantida numa deslocação à Luz, na qual participaram 60 SS, numa

época em que mereceram várias menções honrosas em fanzines nacionais e internacionais.

A época seguinte é de alguma regressão, uma vez que o número e a postura da

maioria da bancada decresceram. Contudo, este momento foi de afirmação/revelação de alguns

membros. O grupo inaugurou a sua nova sede, na qual esteve sediada por muitos anos de forma


intermitente, num edifício do clube adjacente ao estádio. No âmbito coreográfico, há a destacar

a coreografia “Ontem, hoje e sempre... Sempre Farense!” na recepção ao Sporting, numa

temporada em que marcaram presença em cinco partidas longe de Faro.

Nova época, nova reestruturação na direcção dos South Side, embora esta tenha sido

mais profunda, pois foram convidados dois membros de cada núcleo a serem integrados. Surgem

então alguns grupos muito militantes e históricos, em contraciclo, uma vez que o espírito de

grupo estava em baixo, notando-se isso, por exemplo, nas parcas coreografias executadas. Nos

jogos fora, destacaram-se as transfertas realizadas até ao Mondego.

Em 98/99 a faixa não é apresentada em alguns jogos, fruto do estado do grupo, que

quase não festeja o seu quinto aniversário. Com presenças pouco numerosas, perdem alguns

dirigentes e a sede, bem como a liderança técnica da equipa do mítico Paco Fortes. Dá-se ainda a

criação da SAD e, na época seguinte, a situação do clube deteriorou-se. Entre as cinco transfertas,

destaca-se aquela em que os adeptos farenses lotaram 10 autocarros para irem até ao terreno

do Campomaiorense. Surgem espanhóis para o comando da sociedade anónima desportiva,

com supostos intentos de mudança do símbolo farense, aumentando o descontentamento

e o fosso entre sócios, cidade e o clube. Apesar de tudo, os South Side Boys criam um bom

relacionamento com o representante dos espanhóis, que tinha liderado os ultras do Salamanca e,

por isso, contribuído com algumas propostas para os algarvios. Entre outras, uma foi aplicada em

2000/2001: Bancada Jovem SS - um bilhete anual com custo de 12 000 escudos. O colectivo de

apoio acabou por mostrar a sua verdadeira força numa época em que redobraram as intervenções

contra a direcção e a equipa técnica.

Apesar do regresso do treinador Paco Fortes, o Farense acabaria por descer na época

2001/2002, após 12 épocas na Primeira Liga. Por essa altura, os South Side, que estiveram

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presentes em cinco estádios fora de Faro, constituem-se enquanto associação. Meses depois

iriam apoiar o Farense pela primeira vez numa divisão secundária. Foi a primeira de três descidas

consecutivas, uma fase que se pode considerar o período mais negro da sua história. O maior

emblema algarvio só parou na antiga III Divisão (quarto escalão nacional), mas culminando

com a desclassificação em 2005/2006, por ter três faltas de comparência devido a dificuldades

financeiras que impediram a inscrição da equipa sénior nesse ano.

Em 2002/2003, no regresso da II Liga ao São Luís, há mudanças na direcção do grupo.

Num ano em que são feitos os primeiros cachecóis de cetim do grupo, velhos amigos voltam

à bancada e novos criam subgrupos, e os SSB passam a contabilizar cerca de 100 elementos

activos. O seu apoio foi sentido em nove estádios de sul a norte de Portugal, destacando-se

a mobilização de 130 SS a Portimão, num dos dérbis mais apetecidos por aquelas bandas. O

9º aniversário da claque foi comemorado em grande estilo com um concerto no pavilhão do

clube, onde actuaram três bandas. Em campo, os alvinegros garantiram a permanência, somente

desfeita pela gestão danosa da SAD, que levou à descida na secretaria. Os South Side Boys iamse

tornando cada vez mais o maior bastião do clube, que na maioria das vezes seria o único.

Fizeram desta fase do clube um motivo para coesão grupal, tendo na época seguinte marcado

presença em todos os campos da II Divisão B, nos continentes e no arquipélago madeirense. A

equipa era composta por jogadores juniores, o que não impediu uma invasão de barco por parte

dos ultras a Olhão e a inscrição de 230 sócios nessa época. As assistências aumentaram e o apoio

foi incondicional, numa verdadeira demonstração de amor e fidelidade, numa tendência que se

fez notar na fundação de mais núcleos e numa maior responsabilidade dentro do clube, com os

South Side a tomarem conta da gestão dos bares do estádio.

Na III Divisão, em 2005/2006, os South Side fazem o seu segundo pleno, numa época que


o Farense iniciou com os juniores. A nova sede é um espaço fundamental para o fortalecimento

da coesão do grupo, que se mostra com imensa vitalidade e com uma rivalidade interna saudável,

provocando uma crescente vontade de darem o melhor à causa, muito por culpa da iniciativa

“O Grupo Mais Fiel”. Expandem o seu raio de acção e mostram-se à cidade na concentração de

motos, na semana académica e na semana da juventude. Este trabalho contribuiu para presenças

memoráveis, como a dos 100 elementos em casa do Imortal. Contudo, a situação do clube não

melhorava e os South Side mostraram-se sempre na linha da frente, fazendo uma manifestação

no centro da cidade, que contou com a presença de 400 pessoas, e uma invasão de campo, onde

mostraram a frase “Tens vergonha de ser Farense?”. Dada a pressão dos farenses, a muito custo,

o clube foi inscrito no mesmo campeonato na época seguinte, mas viria a desistir depois de oito

jogos com os juniores, que jogavam dois campeonatos em simultâneo.

Um grupo de apoio sem equipa para apoiar... isto aconteceu em Faro e os South Side

Boys continuaram a palmilhar o seu caminho, fortalecendo o grupo, vindo a formar uma lista para

concorrer às eleições do clube. Os elementos do grupo consideraram essa assembleia-eleitoral

ilegal, por não se terem cumpridos os prazos devidos.

Em 2006/2007, o Farense reergue-se a partir da última divisão distrital algarvia. Sagrase

campeão duas vezes seguidas e está de volta aos nacionais, tendo-se feito festa por vários dias

em ambas as ocasiões. A experiência nos distritais é descrita como inesquecível por quem a viveu,

por diversos motivos, como verem o Farense jogar em pelados. Era uma realidade desconhecida.

Nesta altura, poucos mais são aqueles que, além dos SS, se mantêm fiéis ao clube da cidade,

sendo então lançada a campanha “És de Faro... és Farense”. Embora os esforços, houve ainda

uma situação que aumentou a distância entre a cidade e o clube: o clube passou a jogar no

Estádio do Algarve, construído para o Euro 2004, até porque o São Luís esteve à venda, tendo-se

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projectado ali a construção de habitações. Neste período destacam-se as deslocações a Salir, a

Vila Real de Santo António (onde 200 ultras desfilaram até ao estádio), a Odeceixe e a Alvor. Pode

dizer-se que memorável também foi o festejo dos 14 anos de actividade do grupo, na baixa da

cidade.

O regresso aos nacionais expande o raio de acção do apoio além da região algarvia.

O autocarro volta a ser muito solicitado para percorrer quilómetros e quilómetros. Estiveram

duas vezes em Évora, tendo-se registado confrontos com a polícia por ocasião do jogo com o

Lusitano e ocorrido o resgate de um membro que se encontrava detido na esquadra. Na partida

em casa da Juventude, apareceram com 100 ultras. Já na Cova da Piedade, com o clube da casa a

aumentar excessivamente o preço do bilhete, os South Side Boys apoiaram a sua equipa a partir

de um monte com faixas e panos presos em árvores. As expectativas a nível desportivo eram

altas, mas acabaram deflagradas, com o director desportivo a terminar a época a treinador, saída

do líder dos SS e consequentes eleições, cenário que também se verificou no clube. Elementos

de grupos constituem uma lista, não vencendo o sufrágio, que desta feita é considerado legítimo.

Para a nova época, o velho desígnio: aproximar Faro do Farense. Distribuem a bandeira

“Farense Sempre”, com diversos estabelecimentos comerciais, e abrem a sua sede para artistas

conterrâneos contemplarem a cidade com a sua arte. Continuam o trabalho social desenvolvido

na época anterior, através da recolha de roupa e brinquedos no Natal, enquanto uma grave

crise económica assolava Portugal. O SCF festejou o seu centenário na baixa de Faro, tendo

homenageado a sua claque nessa ocasião. Contudo, alguns ainda teimavam em conotar o

grupo com a Schutzstaffel, organização paramilitar e policial nazi, criando divergências quanto à

intenção de patrocinarem as escolas de formação, introduzindo o seu símbolo nas camisolas de

jogo. Posto isto, os South Side Boys acabaram por ajudar o 11 Esperanças, outro clube da cidade.


Num ano em que as trasfertas ao Barreiro e a Monte Gordo ficam marcadas por confrontos com a

polícia, o Farense volta ao São Luís. Visto como um mal necessário para a sobrevivência do clube,

havia a intenção de vender o terreno, mas tal não se sucedeu. Com o estádio cheio a apoiar, é

garantida a subida à II Divisão B, abrilhantando o centenário.

Os South Side Boys mostraram logo no primeiro jogo do campeonato que não queriam

perder o comboio que tinha como próxima paragem a 2ª Liga, numa época em estiveram

presentes nos Açores por três vezes, uma vez com 15, outra com cinco e outra com 25 elementos.

Outras deslocações que ficaram na memória foram a Merelim e a Chelas, onde decorreram fortes

confrontos com os locais e a polícia. Entretanto, Joaquim Sequeira, treinador da equipa, morre

no decorrer da temporada e, apesar de uma fase positiva que recuperou a equipa, o Farense viria

a sucumbir perante 5 000 farenses, que se mostraram ao lado da equipa mesmo descendo de

divisão.

Não seria este percalço desportivo que afectaria profundamente a vitalidade do grupo,

que no primeiro jogo oficial da época estaria nas Caldas da Rainha. No Campo da Mata, na

sequência de provocações do keeper do Caldas, os SS invadem o relvado e envolvem-se numa

troca de galhardetes com os jogadores adversários e a polícia. Já na fase final do campeonato, o

Farense teria o seu estádio interditado por um jogo como castigo. Na semana seguinte, em Faro,

dão o mote com umas das maiores fumaradas da sua história. A vontade de contribuírem para

o desenvolvimento da formação perdurou, até que o clube aceitou o patrocínio, tendo o grupo

organizado um almoço para estreitar laços com os jovens e os seus pais. A dobrar a primeira

volta, 130 ultras viajam até à Costa da Caparica, numa época de novos feitos internos, como

a coreografia “Amor Eterno” que ocupou todo o topo norte, num jogo em que a festa acabou

estragada pela actuação policial, sucedendo-se confrontos com os azuis. No jogo seguinte no São

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Luís, os South Side Boys fazem um protesto, com boicote parcial de apoio e a apresentação da

frase “Repressão policial, bancadas vazias, silêncio total”, sendo ovacionados quando entram no

sector ultra. Para o jogo, no qual o Farense viria a tornar-se campeão, a claque distribuiu convites

para o jogo amarrados a balões pretos e brancos pelos carros estacionados na cidade, tendo

a festa alargado pela baixa da cidade, pela semana académica e pelo primeiro Arraial Farense,

iniciativa dos próprios.

No regresso à Segunda B, as expectativas de subida imediata são atiradas para canto,

embora dessem o mote de estarem “em busca do tesouro perdido”, como dizia na coreografia

onde perfilavam duas caravelas. O grupo mostra-se em todos os jogos fora, fazendo todas as

viagens de autocarro, à excepção da viagem à Madeira, onde compareceram 60 ultras. Há ainda

invasões a Chelas e a Mafra, embora o número de sócios tenha diminuído, acreditando que isto

se deveu à obrigatoriedade de um sócio SS ser também sócio do clube, inédito na vida da claque.

Nesse mesmo ano voltariam ao seu sector original, o topo sul, que esteve fechado três épocas

por parcas condições de segurança, facto merecedor de coreografia para assinalar. Contudo, o

período junto dos sócios comuns foi bom, para os mesmos compreenderem melhor a dinâmica

e envolvente do grupo, culminando em aproximação de ambas as partes. Para a partida em que

confirmaram a subida à 2ª Liga, houve uma grande concentração dos SS, tendo a equipa chegado

ao estádio escoltada pelo Moto Clube de Faro, onde jogaram perante 14 000 farenses. Os South

Side Boys fizeram nova coreografia, conotada com a primeira da época, onde 1 500 bandeiras

com o símbolo do grupo se conjugaram com a frase “Tesouro à vista, vamos à conquista!”. Subida

carimbada e o mar de alegria dos adeptos inundou o relvado.

A temporada 2013/2014 é marcante, pelo regresso aos campeonatos profissionais

depois de tanta fidelidade e militância e pelos 20 anos de actividade dos South Side Boys.


Esses foram festejados com aquela que nos parece a maior coreografia da história do grupo,

complementada por tochada no relvado. Uma realidade diferente para todos os membros,

até porque era um campeonato com 46 jornadas, mais Taça da Liga e Taça de Portugal. Ainda

mais diferente seria para a nova guarda, que entrara para o grupo quando a equipa militava

nas divisões secundárias, mas fizeram questão de marcar presença em todos os jogos, tentando

sempre ter o maior número possível na bancada. Sempre que o SCF jogou fora durante o fim-desemana,

estava garantido um autocarro do grupo. Começaram em Tondela e, de seguida, foram

até Portimão, onde 250 ultras marcaram presença. Naquela que é a maior viagem do futebol

profissional português, seis ultras percorreram o caminho da Estrada Nacional 2 durante três dias.

Um belíssimo exemplo da capacidade dos SS nessa altura foi a deslocação a Matosinhos, com o

autocarro esgotado, para um jogo a uma quarta-feira à tarde. Outubro foi um mês desafiante no

que a viagens diz respeito, pois obrigou o Farense a estar presente na Madeira por três ocasiões,

nas quais os South Side Boys marcaram presença com seis membros de cada vez. Brindaram a

sua equipa com bons espetáculos coreográficos, como “A Morte em Chamas” (Oliveirense) e

“Honra o Teu Clube, Defende a Tua Cidade” (Tondela), por exemplo. Contribuíram ainda para a

vida farense com iniciativas como o Arraial SS, o SS Music Fest, distribuição de autocolantes nas

escolas de Faro, um lanche com o Futebol de Formação e o apoio ao Basquetebol.

O grupo de apoio do “maior do Algarve” abre 2014/2015 com a Taça da Liga, a segunda

da sua história, marcando boas presenças nos primeiros três jogos. A Segunda Liga é novamente

reformulada, passando a ser constituída por 24 equipas. Na abertura da mesma apresentam

um tifo de bancada, associando o símbolo do grupo ao lema “Este é o Símbolo Que Nunca Vos

Abandonará”, dando assim o mote para ultrapassarem, por mais um jogo, as 49 presenças em jogos

oficiais na época anterior. Nesse ano reencontram o Olhanense para mais um derby escaldante.

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Na primeira volta vão até Olhão centenas de ultras, tendo ainda antes do apito inicial conseguido

roubar duas faixas de um grupo rival, através de uma incursão pelo relvado. De seguida, exibição

da faixa e destruição da mesma, certamente ao som de “na minha vida uma missão: pôr uma

bomba em Olhão”. Para a entrada das equipas, cascata de rolos, bandeirada, lençol e pirotecnia,

numa belíssima combinação. Entretanto, o topo sul entra em obras e os South Side voltam à norte

durante alguns jogos. De volta ao seu lugar, até ao fim do campeonato desenvolvem coreografias

como “Fidelidade Eterna À Minha Cidade”, “Sou de Faro... Sou Farense” e “21 Anos de Incrível

Paixão”. Outro grande jogo foi em casa do Portimonense, onde 150 ultras foram brindados com o

empate farense quase no fim do jogo, num forte e incondicional apoio durante 90’.

Os SSB começaram a pré-época 15/16 em grande forma, desenvolvendo um concurso

interno. Cada grupo deveria pintar um mural pela cidade sob o tema “Sou de Faro, Sou Farense”,

e o vencedor receberia uma bandeira grande, saindo todos com o troféu, mas acima de tudo

com boas memórias de companheirismo em mais uma operação de charme perante a cidade.

Esta iniciativa representa a continuidade na aposta na pintura de murais pela cidade, que fez

de Faro a cidade portuguesa mais próxima de Split no que a arte dedicada ao clube local diz

respeito. Como vinha sendo hábito, na primeira jornada caseira do campeonato realizaram uma

coreografia - “Sempre Convosco!” - seguida de uma em forma de homenagem e apelo à subida

de divisão - “Reencarnem o Espírito de 69/70”. A verdade é que, apesar de todos os intentos e do

incansável apoio dos SS, a equipa acabaria por sucumbir na fase final da época, muito por culpa

do caso Harramiz, numa época em que desceram cinco equipas e o Farense ficou a um ponto da

manutenção. Ainda no que a coreografias diz respeito, há a salientar a expressão do desejo de

irem ao Jamor, através de “Ontem Tive Um Sonho - Vamos Torná-lo Realidade” em jogo contra o

Braga. Numa altura em que se sentia uma perda de interesse em volta da equipa há alguns jogos,


certamente fruto do desgaste e dos maus resultados, os SS fecham os jogos em casa com uma

coreografia de topo, combinando imagens da cidade com o dizer “84 Anos Até Nos Veres - Agora

é Até Morrer”.

Depois de mais um murro no estômago, mais uma prova de resiliência e fidelidade na

sua missão. Para isso foi fundamental a mudança de liderança na SAD farense, com um investidor

local a assumir o papel principal até aos dias de hoje. Os South Side Boys não desarmaram no

regresso aos estádios sem cadeiras, alguns ainda com peão, sem medidas de segurança excessiva,

sem incontáveis jogos à quarta-feira... O adversário era o Armacenenses, mas que importa?

Coreografia a elevar os “ULTRAS” alvi-negros. Mais tarde, apesar da diminuição de presentes no

topo, apresentariam “Defende o Clube da Nossa Cidade” e uma das mais emblemáticas: “É Tudo

Uma Questão de Educação”, numa alusão à passagem do amor à camisola por parte de um pai

para um filho. Em campo, o SCF não atingiria a subida por um ponto, prolongando a sua estadia

no Campeonato de Portugal por mais um ano.

2017/2018 ficou marcado pela subida de divisão e pela boa campanha na Taça de

Portugal, somente travada pelo incrível Caldas no Campo da Mata, onde os South Side Boys

marcaram uma grande presença. Acabariam por chegar ao Jamor, mas para decidirem o campeão

do terceiro escalão, suportados por mais de 5 000 farenses. “Defensores de Uma Cidade” foi

a primeira coreografia da época, antecedente à que foi feita na recepção ao Olhanense. Esta

foi realizada em duas partes, numa excelente execução sobre a deixa “A Nossa Glória… Será o

Vosso Pesadelo!”. Também na Taça de Portugal, esta de Futsal, o Farense faz uma bela campanha,

chegando à final 8 disputada em Gondomar. Para o jogo em que carimbaram a passagem a essa

fase, os South Side Boys prepararam uma coreografia em duas bancadas, uma de cartolinas e

outra com um lençol. Mais tarde, o grupo apresentou-se no pavilhão nortenho, apesar do jogo

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ser realizado durante uma tarde a meio da semana, enchendo uma carrinha para o efeito. A

subida de divisão foi garantida em Vila Franca de Xira, onde parte da faixa SS Penha foi cortada e

levada durante o jogo, onde houve confrontos entre grupos e invasão de campo para festejar a

vitória. Uma tarde à moda antiga.

Seguiu-se uma caminhada cheia de sobressaltos na II Liga, sendo a permanência

assegurada numa emocionante última jornada. Mas, antes disso, os South Side percorreram

imensos quilómetros, sempre presentes como seu lema e posicionando-se desde a primeira

hora contra o Cartão do Adepto. “Tudo por Esta Camisola” frente ao Varzim e “Até ao Fim! Nós

Queremos, Nós Conseguimos” frente ao Académico de Viseu foram coreografias realizadas

em recepções a adversários directos que demonstram a importância que o grupo deu a estes

confrontos num ano em que comemoraram 25 anos de vida dos South Side Boys. Para esse

efeito, novo tifo bem concebido, onde proclamaram “Somos Um Modo de Vida!”.

De uma época difícil formou-se a base para o feito de 2019/2020, associando-se a

isso um grande investimento na melhoria da equipa e das condições na sua envolvente. Com

o Farense bem lançado na luta pelo regresso à Primeira Liga, em Dezembro disseram ao Pai

Natal, através de uma bela coreografia, “Queremos a Prenda Em Maio”. Entram em 2020 com

uma boa deslocação a Pina Manique e fazem, a 9 de Março, o último jogo antes das bancadas

serem interditas pelo Covid-19, no Estádio do Mar. Por essa altura, o SCF encontrava-se em 2º

lugar e a Liga decidiu terminar as competições e atribuir a subida aos algarvios. Consumou-se

assim o regresso do clube à principal divisão portuguesa, 18 anos após a sua última participação.

Contudo, o sentimento foi agridoce para os South Side Boys, que gostavam de ver a sua equipa

subir por mérito próprio e estando na bancada a fazerem o que mais gostam.

Mesmo com o Covid, os Ultras Sul continuaram o seu caminho. Efectuaram doações


solidárias a instituições e levaram a cabo a iniciativa “Pintar Faro de Preto e Branco”, com a

pintura competente de vários murais nas ruas e em cafés da cidade. Após meio ano de paragem,

as competições voltam a ser disputadas, embora que o adepto tenha sido relegado para o sofá.

Os South Side Boys aprontaram-se e encheram uma carrinha que rumou a Moreira de Cónegos,

onde receberam a equipa à chegada ao estádio. Foram 1 200 quilómetros de amor à camisola

para apoiarem, durante poucos segundos, o seu símbolo neste tão desejado regresso. Fizeram

o mesmo em jogos em casa, em Lisboa, em treinos, destacando-se as ocasiões em que viram

e apoiaram em cima de prédio, em que fizeram concentrações no estágio da equipa, cordões

humanos e o espectáculo pirotécnico na recepção ao Portimonense. Apesar de todo o esforço,

a equipa não conseguiu manter-se na I Divisão.

Em Augusto de 2021, regressam às bancadas fruto da abertura parcial ao público,

viajando regularmente por todo o país. Jogaram a 2ª Eliminatória da Taça de Portugal na casa

do São Roque, nos Açores, sendo o grupo representado por um membro, que não se fez rogado

e fez ouvir a sua voz. O grupo consegue manter boas presenças nos jogos em casa, perdendo

fulgor nas deslocações, numa época em que o clube terminou no 11º lugar. Fecham a época

com mais uma presença nas Festas de São Pedro com a barraca SS.

O Cartão do Adepto passou a condicionar mais os grupos, sendo os South Side

Boys também afectados por isto. O seu sector foi fechado para portadores do cartão, tendo

de se deslocar uns metros para o lado e impossibilitando o grupo de apresentar tifos como

fazia regularmente. Os campeonatos profissionais sempre brindaram os SS com a maioria das

equipas sendo nortenhas e, nos últimos anos, a capacidade de mobilização regrediu, sendo

grande parte delas feitas por menos de 20 elementos. 2022/2023 ficou marcado por ser uma

época de sucesso, onde o Farense regressou ao mais alto patamar nacional para gáudio dos

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seus adeptos. Neste ano há a destacar a presença em Alvalade e Seixal pela quantidade, mas há

a destacar a presença em 21 estádios a mais de 100 quilómetros de Faro. Os South Side Boys

podem finalmente festejar a subida à Primeira como ambicionavam, sentindo esta vitória como

fruto do seu esforço.

Mantêm-se “fortes na vitória, fiéis na derrota” numa época em que o Farense faz um

campeonato tranquilo e os SS completam novo pleno. O Inferno do São Luís é a maior força do

clube, muito impulsionado pelos aficionados que a partir do topo sul fazem a festa durante todo

o jogo. Por esta altura, o Farense tem das melhores assistências e ambientes caseiros, fazendo

o grupo deslocações em maior número até à zona metropolitana de Lisboa, agregando-se a

eles algumas centenas de farenses por ali radicados. Para fecharem a época em beleza, juntam

à festa da manutenção a festa pelos 30 anos de devoção à causa farense, que certamente não

ficará por aqui.

Por L. Cruz

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Talvez seja melhor começar por

esclarecer quem é Tó Madeira. Para quem

não esteja familiarizado, eventualmente

por algum “gap geracional”, o Tó Madeira

era um ponta de lança do Clube Desportivo

de Gouveia que constava de uma primeira

versão do jogo de computador Championship

Manager de 2001/02. Tratava-se de um

“super avançado” e quem o contratasse

tinha a garantia de pelo menos uns 30 golos

por época. Contudo, o que distinguia este

craque de outros dessa edição, como por

exemplo o avançado Maxim Tsigalko, era o

facto de o Tó Madeira na realidade não existir

enquanto jogador de futebol. Reza a lenda

(que um dia será devidamente tratada num

episódio do Podcast, fica a promessa) de que

foi a pessoa responsável pela introdução da

equipa do CD Gouveia na base de dados do

jogo que se colocou a si próprio com aquelas

caraterísticas. E foi exatamente por eu ter

observado esse gesto como um exemplo de

subversão do sistema, o de alguém que não

pertence ao jogo introduzir-se como parte do

mesmo, baralhando as regras e trocando as

voltas a partir de um local tão improvável como

Gouveia, que não hesitei na hora de baptizar

dessa maneira o Podcast, simultaneamente

prestando uma homenagem mas também

querendo transmitir a mensagem de que há

um futebol que está a passar fora do radar do

sistema, mas que só depende de nós baralhar

as regras do jogo e colocá-lo em lugar de

destaque. Não sou, portanto, o “verdadeiro

e famoso” Tó Madeira. O meu nome é Edgar

Macedo, de Lisboa, um gajo que tem um

podcast.

O Podcast Tó Madeira nasce de um

certo desconforto e desilusão com o futebol

profissional em Portugal nas suas mais

amplas vertentes. Desde a sempre constante

e cada vez mais feroz visão “tripartida”, em

que tudo gira em torno de três clubes, até às

cada vez mais absurdas regras que asfixiam

os adeptos, os horários dos jogos ou a visão

empresarial que faz passar como inevitável a

ideia de que 90% dos emblemas tenham de

estar sob domínio de indivíduos ou grupos

empresariais dos quais pouco ou nada se

sabe e cujos intentos deixam muito a desejar.

Que o associativismo é uma ideia romântica

de “meia dúzia de líricos”, condenada à

morte, porque os “tempos mudaram”. Como

se não estivéssemos todos de uma forma

constante e tristemente repetitiva a sermos

confrontados com o fracasso do modelo

empresarial que afasta clubes do seu próprio

estádio, que compra e vende direitos de

participação como se fosse dia de peixe fresco

na lota ou atira emblemas à falência. Acresce

a isto a experiência, enquanto sócio do Clube

de Futebol “Os Belenenses”, que permitiu

testemunhar um percurso desde a 7ª divisão

até ao futebol profissional, constatando e

comprovando que outro futebol existe e é

possível. Que podemos ter jogos a horas

decentes, a preços populares, que pode

ser consumido álcool na bancada, que as

crianças podem fazer a festa com bandeiras,

cornetas, buzinas. Que há um sem número

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de clubes a viver o associativismo, com sedes

a serem pontos de encontro, a cumprirem

a sua natureza de instituições de utilidade

pública, facultando a prática de desporto à

sua comunidade e cuja História, muitas vezes

absolutamente central nas localidades onde

se encontram, está por descobrir.

Os episódios foram sendo

concentrados em torno destes temas

e o Podcast tem evoluído ao sabor das

descobertas que tem feito, procurando

sempre que possível sair para o terreno e

ir conhecer estádios, gentes e memórias,

mas também obter respostas para situações

assumidas como “inevitáveis” no futebol

moderno e em relação às quais muita gente

se pergunta “porquê” sem que chegue uma

resposta esclarecedora, e estabelecendo por

vezes uma ponte com o mundo académico,

contrariando a ideia de que o futebol é

aquilo que junta umas pessoas aos berros

em programas de “debate” televisivo, para

conhecer e divulgar investigações e teses

que têm o futebol como objeto de estudo.

Desde, por exemplo, procurar resposta

para o sentido da proibição do consumo de

álcool nos estádios (episódio 13 a partir da

investigação de Phelipe Caldas), da submissão

do futebol às apostas desportivas e à ameaça

do match-fixing (episódio 16 com o britânico

James Grimes e a tese do investigador

Marcelo Moriconi), ou como os clubes eram

donos dos jogadores antes do nascimento do

sindicato (episódio 9 com o académico Pierre

Marie). Ou então, por exemplo, ir conhecer a

“versão portuguesa” de um Botafogo vs Vasco

da Gama, que existe na distrital de Setúbal,

ir a Coimbra saber porque existem “duas

Académicas” ou escutar sobre a identidade

e projeção social e cultural de Marítimo,

Nacional e União na ilha da Madeira. A

relação entre a gentrificação de Marvila e

o Clube Oriental de Lisboa, a memória do

mítico Campo da Hortinha em Alhandra ou

um punk-rocker que escrevia hinos de amor

ao futebol, mas também demonstrando

como é possível estabelecer uma relação

entre o futebol e os 50 anos do 25 de Abril

de 1974, temática à qual irei dedicar todos

os episódios de 2024. Até ao momento,

desde Janeiro, já permitiu fazer a ponte entre

locais e acontecimentos da revolução com

a realidade do Clube Atlético e Cultural da

Pontinha, com a “casa às costas” desde que o

município de Lisboa deitou o estádio abaixo,

dos mais de 200 clubes portugueses que

existem em França, fruto da emigração dos

anos 60, da história da centenária Associação

de Futebol de Santarém, do “desconhecido”

São Domingos Futebol Clube que esteve na

génese do futebol em Setúbal ou da feroz

rivalidade entre os dois clubes de Grândola

antes de se fundirem em um só.

Em paralelo com o Podcast,

escrevo ocasionalmente na página

tomadeira.substack.com textos de opinião

ou de divulgação de filmes, livros ou música

relacionada com o futebol.

A ideia passa por continuar a

acreditar que outro futebol existe e é possível.

Conhecer cada vez mais gente, locais, jogos,

histórias. É o que se leva disto.

Por Edgar Macedo

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À CONVERSA COM

DESNORTEADOS

Quando e como nasceram os Desnorteados?

Os Desnorteados nasceram em 1990, fruto

da junção de dois grupos já existentes. Um

dos grupos (com poucos rasgos ultras), os

TMUC (Tuna Musical Unidos da Carriça),

era composto por atletas das várias

modalidades e camadas jovens do clube

e era liderado pelo Tadeu, figura bastante

respeitada e capaz de congregar muita gente

à sua volta. Era um grupo bastante ruidoso

e irreverente. O outro era os Ultra Boys, um

grupo formado essencialmente por jovens do

circuito underground espinhense que eram

apaixonados pelo movimento ultra e que

eram liderados pelo Pipa, que se destacaram

pelos primeiros shows pirotécnicos e faixas de

grande e belo recorte. Após um jogo fatídico

para o clube, estes dois grupos decidiram unir

forças e formar o ainda actual grupo ultra do

Sporting Clube de Espinho.

Os primeiros anos foram de grande euforia,

com bastante dinamismo na curva e na

própria cidade. Com o estereótipo de

violência que pairava sobre os ultras na

altura, os Desnorteados sempre tentaram

pautar as suas acções e a sua postura através

do respeito e da amizade. Sempre tentaram

fazer das tardes de domingo uma verdadeira

festa, repleta de partilha de valores da curva,

de momentos bem passados entre todos,

de aproximação a outros grupos com que

se cruzavam a fim de partilha de opiniões,

de valorização e crescimento do movimento

ultra, e nos anos 90 foi um dos grupos

que mais tentou impulsionar o mesmo.

Eram frequentes as grandes tochadas, as

coreografias, as enormes e vistosas faixas

e o apoio incessante durante todo o jogo.

Na própria cidade organizaram-se muitos

concertos e festas com o propósito de unir

ainda mais o grupo e por vezes trazer bandas e

ultras doutras terras. Com o desaparecimento

do Tadeu, o grupo ressentiu-se bastante

e teve na época seguinte uma quebra de

rendimento, mas após reunir forças voltou à

máxima força e até usou isso para organizar

anualmente um torneio de futebol de praia

em sua memória, com vários grupos ultras

nacionais. Chegou a haver também vários

convívios e futeboladas com outros grupos,

mas nas suas cidades.

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Como foi escolhido o nome?

O nome foi inspirado no vento dominante

(Nortada) que assola constantemente a

nossa cidade, e ao local que ocupavam

no velho campo d’Avenida, a ponta Norte.

Coincidência, ou não, resultou num nome

com 12 letras.

Como foram os primeiros anos e a década de

90 para os Desnorteados?


Como é que a vossa identidade foi evoluindo

com as dificuldades passadas ao longo dos

anos?

Desde sempre o grupo passou pelas mais

diversas adversidades, o que fez com que

os seus membros sempre tivessem que se

superar para conseguir com que este pudesse

crescer e manter-se activo por tantos anos. A

nossa identidade foi-se solidificando através

das amarguras, certos dissabores e dos

muitos sacrifícios que fomos encontrando

ao longo do percurso. Desde logo, na nossa

formação, os restantes sócios e adeptos em

geral sempre criticaram, sempre nos olharam

de lado, com um certo estereótipo inerente

às gentes mais novas e mais rebeldes. Já aí

houve a necessidade de tentar transformar

mentalidades e mostrar que o grupo se

definia pelo amor e respeito ao clube, e que

iria tentar ser um baluarte do mesmo. Depois,

sempre foi um grupo autossustentável, sem

depender de ajudas ou esmolas sorrateiras.

Sempre vincou que tudo o que se fizesse

seria fruto de muito esforço, muita luta e

muita criatividade. Em certas alturas, resistiu

graças à força e devoção de “meia dúzia”

que, bem comprometidos com este, tudo

fizeram para que a mística e a mentalidade

permanecessem. A carapaça foi ficando cada

vez mais rija, os ideais cada vez mais vincados

e a postura/atitude cada vez mais definidas.

Houve muitas circunstâncias que poderiam

ter extinguido o grupo, mas todas elas

serviram para este se fortalecer, se manter

coeso e se moldar aos tempos e sociedade,

sem perder a sua identidade. Tudo isso

criou uma identidade bem delineada, bem

identificável e imutável ao longo do tempo.

Qual foi o maior número de associados que

atingiram? Quantos sócios têm actualmente?

Em 2000 chegamos a ter cerca de 500 sócios.

Actualmente não temos sócios.

Como é que, hoje em dia, se organizam

internamente?

Como o próprio nome do grupo indica,

não podemos falar propriamente numa

organização. Temos alguém que não sendo

um líder oficial nem sequer presidente, visto

não haver eleições para algo do género, se

destaca em termos de coordenação pela

dedicação, disponibilidade e experiência

que foi tendo ao longo dos anos. Depois

há mais alguns elementos com mais anos

no grupo que ajudam nas decisões e /

ou acções. Fruto da boa mentalidade e

espírito de camaradagem que há na curva

presentemente, todos sabem os seus lugares,

todos sabem quem ouvir ou seguir.

Para ser membro dos Desnorteados é preciso

ser sócio do Espinho?

Não sendo uma obrigação, tentamos

sensibilizar todos os membros nesse sentido,

para que possam ser ainda mais fundamentais

no quotidiano do clube, contribuindo com

as cotas e tendo voz activa nas assembleias,

podendo fazer parte nas diversas votações

levadas a cabo pelo clube.

Que factores valorizam mais enquanto

grupo, tanto fora da bancada como dentro?

Amor e devoção pelo clube! O Espinho está

acima de tudo e de todos. Orgulho e respeito

pelo grupo e pela sua história. Mentalidade

ultra, resiliência, espírito de sacrifício e de

camaradagem, sentimento de partilha e de

preocupação para com os nossos. Saber

estar na curva, apoiar de início ao fim, elevar

o nosso nome, o do nosso clube e da nossa

cidade. Fora da bancada, o saber que há

toda uma possível família que, apesar de

desnorteada, se norteia pela amizade e

entreajuda. Valorizamos bastante quando há

álcool na bancada, quando fazemos os nossos

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convívios e quando não somos reprimidos nos

jogos e nos dão total liberdade para apoiar!

O grupo está aberto a novos membros? Em

caso afirmativo, de que forma procuram

recrutá-los?

Sim, estamos sempre receptivos a acolher

novos membros. Tal como em tudo na vida,

é uma selecção natural. Quem vem e ama

o clube, quem se sacrífica semana após

semana, quem sabe absorver todos os valores

do grupo, quem sabe estar e partilhar, vai

ficando e vai fazendo parte de nós. Não sendo

um grupo muito numeroso, conhecemos

todos os elementos e sabemos quem

aparece de novo. Com a presença constante

dessas pessoas, com o seu comportamento

e postura, decidimos se a tentamos integrar,

se lhe incutimos o gosto pelo nosso modo de

vida e pela maneira de viver o clube. Depois

os sacrifícios que a curva acarreta ditará a sua

continuidade...

De que forma explicam o que é ser

Desnorteado a um jovem que acabou de

entrar no vosso grupo?

Mais do que explicar, tentamos agir. Podemos

tentar transmitir os nossos valores, mas só

com as nossas acções e postura constantes

ele irá enraizar os nossos ideais. Tal como o

nosso lema diz: Podemos perder a cabeça,

mas nunca a Fé...ou seja, aconteça o que

acontecer, nós estaremos sempre lá. Um

Desnorteado nunca desistirá, nunca baixará

os braços, nunca abandonará nem se

calará. Ser Desnorteado é acima de tudo ser

resiliente...é amar e apoiar o Espinho seja em

que situação for.

O grupo possui núcleos? Qual a vossa opinião

acerca do papel dos núcleos e como é que os

mesmos funcionam?

Sim, possui alguns. Sempre foram bastante

importantes no nosso grupo e na nossa

história. Aquando da nossa fundação e nos

primeiros anos, houve alguns núcleos com

bastante criatividade, irreverência e carisma

próprio que ajudaram ao crescimento do

grupo. Núcleos como os Kumando Taínha

ou os Indios da Tabuaça eram bastante

respeitados pelo grande número de

elementos, pela força que tinham dentro do

grupo e pela dinâmica que tinham na própria

cidade. Actualmente temos alguns núcleos

que, apesar das suas diferenças, têm a perfeita

noção que fazem parte do mesmo grupo e

em que todos eles participam activamente

no bom funcionamento e desempenho do

mesmo. Têm a particularidade de atraírem

malta do mesmo local, da mesma faixa etária

e da mesma forma de estar na vida para o

seu seio, logo mais elementos para a curva.

Actualmente, funcionam à semelhança

do grupo em geral, havendo alguém que

lidera e que transmite ao seu núcleo todas

as acções e actividades. É usual fazerem

convívios apenas com os seus elementos,

mas são parte integrante de um todo, o qual

respeitam bastante. Conseguem agilizar

algumas deslocações, o seu material e certas

actividades extra curva.

Têm ou já tiveram uma fanzine própria? Que

opinião têm acerca das fanzines?

Já tivemos uma fanzine intitulada Nortada.

Somos bastante apologistas das “zines”. Nos

anos 90 a nossa saía regularmente e ainda

tínhamos alguns membros que colaboravam

com outras nacionais. Eram um bom veículo

de partilha de ideias, de moradas para

trocas de material, de informação sobre o

momento de cada grupo e do movimento

ultra internacional. Além disso, actualmente,

algumas delas servem como uma referência

para que os elementos tenham um maior

conhecimento dos ideais e valores do grupo,


assim como parte da sua história e de certas

peripécias de então.

As fanzines actuais, sendo em pequena

escala, são do nosso ponto de vista algo

bastante positivo, pois revelam que certos

ultras ainda mantêm vivo aquele velho

espírito e que trabalham de forma árdua na

valorização do movimento e das tradições

inerentes a este, sobretudo num mundo cada

vez mais desligado de leituras e consumos

prolongados...

Possuem alguma plataforma de comunicação

online? Que opinião têm acerca da

comunicação do grupo com o exterior?

Tínhamos uma página de Facebook sempre

actualizada mas que foi bloqueada. Neste

momento temos uma, mas que é mais

direccionada a dar ênfase a certos momentos

da nossa história, indo ao encontro de um site

que temos em jeito de time line. Como não

gostamos de nos expor muito, fazemos por

não ter muita informação nossa divulgada.

Tentamos com que as fotos e vídeos

divulgados sejam apenas os necessários para

o bem-estar do grupo. Não nos procurem na

net, mas sim nas curvas, é quase como um

lema. Tudo o que fazemos é com o propósito

de ser visto pelo universo alvi-negro. Se

isso chegar a outros lugares, pelo menos

que seja com respeito à nossa história e ao

movimento.

Fazem material para os membros com

regularidade? O que é que lançaram esta

época?

Não costumamos fazer com regularidade.

Esta época não fizemos nem lançamos nada.

Lançamos apenas quando achamos que está

na hora de fazer algo. Talvez o facto de não

termos estádio ou sede, e em virtude disso

termos de andar com o material às costas,

também nos demova um pouco. O verdadeiro

Desnorteado não precisa de indumentária

para ser identificado.

O que pensam acerca do registo dos grupos

junto da APCVD, popularmente conhecido

por “legalização”?

Somos totalmente contra. Como “Grupo

Desorganizado de Amigos” que somos, não

queremos ceder dados nem informações a

autoridades, entidades ou associações que

podem jogar com isso da forma que lhes

puder ser conveniente. Cedemos apenas os

dados estritamente necessários ao nosso

clube para sermos associados do mesmo.

Como é que o grupo resiste e se tem

sustentado?

Resiste através da mentalidade, resiliência e

espírito de sacrifício dos seus elementos. Temse

sustentado com a paixão e fervor clubístico

de todos. Não temos receitas por opção, não

temos sede, nem sócios, nem bilhetes, nem

material em grande quantidade. As despesas

que vamos tendo são suportadas por todos,

com rifas, alguns jogos tipo apostas de

resultados, entre outras artimanhas que não

33


34

nos tragam uma dinâmica empreendedora e

sim de mera carolice ultra.

Quais os piores momentos que tiveram na

vida do grupo?

Sem dúvida que foram todos os momentos

em que “perdemos” algum elemento. A

partida do Tadeu foi um grande murro no

estômago para o grupo, abalou bastante

todos os elementos e consequentemente a

estabilidade e dinâmica da curva. Era uma

referência para todos, era uma força e uma

inspiração para muitos. Anos mais tarde foi

a vez do Rafa, um miúdo incrível com uma

empatia enorme e que nos fez dar ainda mais

valor às amizades, momentos e partilhas

na curva face ao seu desaparecimento

repentino. A sua partida, com um mar de

gente e com cânticos e tochada, foi algo

que continua a arrepiar sempre que nos

vem à memória ou quando falamos disso.

Mais recentemente um membro da Nova

Guarda, que abalou bastante este núcleo.

Desportivamente, a primeira descida aos

distritais foi algo marcante, a perda do nosso

estádio foi algo bastante penoso e doloroso

devido às inúmeras vivências que lá tivemos.

A pandemia também foi desoladora, pois

não pudemos estar reunidos semana após

semana, como grupo, naquilo que mais

gostamos de fazer.

Por outro lado, quais os melhores momentos

que destacam?

As histórias mirabolantes com que nos fomos

deparando ao longo de todos estes anos e que

tantos e tantos km de estrada nos trouxeram.

É incrível como nos lembramos com sorrisos

rasgados e com saudosismo de peripécias na

curva, dos convívios, de algumas deslocações

mais do que propriamente com “o futebol”.

Ficam na memória as enormes deslocações

ao Restelo, ao Bonfim, os torneios de futebol

de praia, os jantares de aniversário, as

coreografias bem conseguidas e os momentos

da sua elaboração. Na deslocação do jogo da

última subida à segunda liga, em que ficamos

muitas horas à porta de um hospital por causa

de um elemento nosso, quando na cidade

já todos festejavam e até os jogadores já se

tinham juntado à festa... Horas mais tarde

lá chegamos e tínhamos um mar de gente à

nossa espera, incluindo os jogadores, quase

parecendo que nós é que éramos os heróis

da subida... até em cima do autocarro vinham

muitos de nós. Claro que todas as subidas

são belos momentos, mas muitas vezes são

apenas festas. De salientar que todos aqueles

momentos em que soubemos que fomos o

verdadeiro 12.º jogador e que tivemos um

apoio tremendo na curva, são e serão sempre

alguns dos melhores momentos.

Possuem uma amizade sobejamente

conhecida com a Mancha. Falem-nos um

pouco dela. Têm mais alguma amizade activa

no momento?

É uma amizade com muitos anos e que tem

sobrevivido com o tempo e com a distância

de patamares de divisões de ambos os

clubes. É frequente haver elementos nossos

nos jogos deles e vice-versa. Começou de

forma bem peculiar e ficou bem cimentada

face a isso, o que comprova a mentalidade

partilhada por ambos os grupos. Naquela

altura já havia uma boa relação, com muito

respeito e admiração. Houve um jogo em

Espinho, em que a MN se viu envolvida em

desacatos com outros adeptos locais, e o Pipa

e outros elementos nossos ao aperceberemse,

deitaram o portão que separava os dois

sectores abaixo. Quando todos pensavam

que eles também se iriam juntar a esses


adeptos para malhar na malta de Coimbra, os

nossos elementos pegaram nos elementos da

Mancha e levaram-nos para o nosso sector.

Desde aí, sempre que nos defrontamos

houve convívios antes dos jogos e até alguns

cortejos em conjunto até ao estádio. Não

temos mais nenhuma amizade, apenas boas

relações com alguns grupos.

Têm ou tiveram algum grupo como inimigo

ou, se preferirem, rival? Querem contar a

história?

Tivemos uma bem acesa e conhecida durante

alguns anos com um grupo corticeiro. Face

à realidade recente do mesmo, tem-se

desvanecido. Mas há sempre um sentimento

de repulsa quando nos defrontamos. A

história fica para quem a viveu... parte dela é

bem audível num cântico nosso.

O grupo define-se politicamente?

Não. É uma das regras sagradas do grupo,

não haver qualquer conexão a nenhum

partido, lado partidário ou cor política. Como

costumamos cantar em tempo de eleições ou

em acções relacionadas com a construção do

estádio municipal: “o meu partido é o SCE!”

Em processos de falência de vários clubes, há

malta dos grupos que transita para lugares

de trabalho nos seus clubes. Isso também se

sucedeu convosco. Nesse caso, acham que

prejudicou o grupo?

É algo natural. Quando os clubes se

encontram mesmo mal é que se vê quem

realmente os ama e se preocupa realmente

com eles sem interesses terceiros. Sendo

que os ultras vivem para o clube, estão

salientes de todas as adversidades com que

este passa ao longo dos anos e, estando

habituados a fazerem sacrifícios sem nada

em troca, é normal que sejam os primeiros

a não deixarem o clube extinguir-se ou ir

parar à mão de abutres. Connosco aconteceu

isso mesmo. O clube estava enterrado em

dívidas, com o estádio penhorado e surgiu a

possibilidade da entrada de uma SAD. Houve

um grupo de sócios, em que se incluíam três

ultras, que avançaram para uma candidatura.

Conseguiram vencer as eleições e trazer

novamente a mística ao clube. Naquele

momento em nada prejudicou o grupo e até

veio trazer uma maior proximidade e melhor

diálogo com a direcção.

Como é que vêm a situação do Espinho

actualmente? Os Desnorteados fazem parte

do dia a dia do clube?

Actualmente, e com muito desalento nosso, o

clube está de rastos. Tirando as modalidades,

que são autossustentáveis e nos têm dado

algumas alegrias e bastantes conquistas, o

futebol e o voleibol (modalidade outrora

de excelência local) estão à deriva. Fruto de

uma direção ausente, desinteressada, talvez

desmotivada e saturada, as últimas épocas

têm sido desastrosas, com o futebol a penar

na distrital, sem vislumbre de uma real subida

e sem equipas com a nossa mística. A isto

junta-se um cenário totalmente desolador,

um clube que não possui património, sem

estádio nem pavilhão, com um centro de

35


da pequena densidade populacional que a

cidade tem. Apesar de jogarmos sempre fora,

tentamos jogar sempre em casa. Continuamos

a pressionar a autarquia para que haja uma

solução definitiva para o estádio municipal.

36

formação bastante precário, sem grande

promoção junto a entidades ou possíveis

patrocinadores locais, sem campanhas de

angariação de sócios ou direcionadas aos

actuais para a continuidade do seu apoio ou

fervor… Tentamos fazer parte sempre que

podemos: marcamos presença em todos os

momentos cruciais, em todas as assembleias,

em todas as eleições, somos uma constante

voz crítica e até de alerta, fazendo acções e

campanhas na cidade. De forma mais activa,

temos alguns elementos que colaboram em

várias modalidades.

Ao longo dos anos quais foram as maiores

referências (grupos ou outras) para os

Desnorteados?

Tivemos sempre como grandes referências as

nossas gentes. Quem lutou e fez muito pelo

clube, desde figuras deste aos seus fervorosos

adeptos. Em termos ultras, muitos dos grupos

italianos que se destacavam nos anos 80 e

90. O Pipa chegou a viajar várias vezes até

Itália para contactar com as suas realidades e

absorver a cultura ultra ao máximo.

Que mais nos podem contar acerca da

história e da actualidade dos Desnorteados?

Poderíamos contar tanto sobre a nossa

história, mas seriam precisos mais números

da fanzine para a relatar eheh! Face à

actualidade, o grupo continua a apoiar do

primeiro ao último minuto, em todos os

jogos, apesar do clube se arrastar nas divisões

inferiores há bastantes anos. Tentamos

manter o grupo coeso e levar o máximo de

elementos e adeptos aos estádios, apesar

Como veem o panorama ultra nacional?

O movimento ultra nacional, no nosso

entender, atravessa um momento algo

turbulento. Se por um lado muitos grupos

mantêm a sua mentalidade e máxima

força, por outro enfrentam cada vez mais

repressões e tentativas de os enfraquecer.

É bastante agradável ver que muitos grupos

antigos se mantêm activos e com os ideais

de sempre, e que tem havido alguns grupos

a aparecer, sobretudo nas divisões inferiores,

com bom número e uma boa mentalidade.

Mas também se tem assistido a alguns grupos

cederem a pressões e a perderem parte ou a

totalidade da sua identidade, por vezes indo

pelo caminho mais fácil ou simplesmente

desistindo de lutar. A actual conjuntura é

bastante prejudicial para o movimento:

os grupos enfrentam cada vez mais

adversidades, das mais variadas entidades,

onde as repressões são cada vez mais penosas

a nível individual. Mas os grupos não seriam

ultras se não estivessem dispostos a enfrentar

tudo isso com a mentalidade que lhes deveria

ser intrínseca. Continua a haver grupos

muito bons, com uma enorme mentalidade,

com valores incríveis e que os definem ou

os demarcam dos outros, e é graças a isso

que possuem tamanha longevidade. Mas

também há outros que por cá andam para

conquistas de visualizações, fruto de certas


modas, por interesses alheios, em nada

contribuindo para o movimento. Felizmente,

a história tende a encurtar a sua linha do

tempo. Visualizando o futebol, a sociedade, a

autoridade do país, o movimento até não está

num patamar assim tão mau. Pensamos que,

com as novas gerações, este perca fulgor para

outras “modas”.

O que significa para vocês a palavra Ultra?

Radical, diferente, irreverente, criativo,

resiliente, defensor de uma crença, pessoa

com um ideal bem vincado, que o faz ficar

ligado à curva sete dias por semana, adepto

que tem uma prioridade bem definida e que

se sacrifica e se desprende de tudo para

se dedicar a ela, tendendo a manter uma

relação que muitas vezes afecta todas as

outras. Alguém com um enorme sentimento

de partilha com os seus, alguém que defende

o seu clube, o seu grupo, os seus “irmãos” de

curva a todo o custo. É alguém que mesmo

sendo julgado, segmentado ou estereotipado,

mantém a sua postura, a sua forma de ser e o

seu modo de vida.

Quais as prioridades que identificam para

a luta dos ultras portugueses nos próximos

tempos? O que acham que deve ser feito?

Horários decentes, preços de bilhetes

acessíveis para a maioria dos adeptos,

menos repressão e consequentemente mais

liberdade para apoiar, leis mais rigorosas

que protejam os clubes das embrulhadas

das sociedades desportivas, um futebol que

possa ser novamente direccionado para os

fãs, com uma envolvência mais transparente,

mais familiar e sem almejar lucros a quem

nada acrescenta a este deporto que tanto

amamos. Pensamos que faz falta a realização

de algo em grande escala e com bastante

impacto, levado a cabo pela maioria dos

grupos numa demonstração de total união

em torno do movimento, talvez em forma

de manifestação conjunta. Numa escala

menor, talvez uma reedição das reuniões

realizadas recentemente com ideias e acções

bem definidas e com fortes possibilidades de

serem postas em prática com benefício para

o movimento.

Querem deixar uma mensagem para os

nossos leitores?

Se forem adeptos comuns, continuem a

apoiar os vossos clubes o melhor que sabem e

podem. Se forem ultras, continuem a resistir,

que se mantenham resilientes e criativos,

que nunca cedam a pressões, ordens e

supostas leis das vossas direcções, SAD’s,

autoridades, ligas, federações ou associações.

Mantenham-se informados das reais leis,

confrontem toda e qualquer autoridade nos

devidos locais, hajam em conjunto como um

verdadeiro grupo ultra largando os devaneios

inerentes a uma “claque”, mantenham o

velho estilo ultra bem vivo, valorizem sempre

o movimento e desfrutem dos valores que a

curva vos oferece.

37


NA PELE DE UM INTERDITO

38

Ao longo dos anos, aqueles que

seguem com mais atenção as incidências

do movimento de adeptos pela Europa,

habituaram-se a ouvir recorrentemente

os termos “diffida” e “banning orders”,

como sendo o pináculo da repressão sobre

os aficionados de futebol, sobretudo em

países como Itália e Inglaterra. A pretexto do

combate à violência, as sanções de interdição

em estádios foram-se generalizando nos

países já mencionados, bem como em vários

outros espalhados pelo velho continente.

A acção naturalmente gera reacção, e

como seria expectável começaram a fazerse

sentir os protestos contra a repressão e

o apoio àqueles que se viam sancionados

por estas medidas. A

expressão “Diffidati

con noi”, que se traduz

para português em

qualquer coisa como

“Interditos connosco”,

disseminou-se por todo

o movimento ultra e

foi, e é, uma forma

de demonstrar apoio

a todos os ultras que

estão proibidos de aceder ao interior dos

estádios.

Apesar deste tipo de mecanismo

ser já utilizado há bastante tempo noutras

latitudes, para os portugueses estas palavras

pouco mais representavam do que meros

chavões e sequelas de uma realidade distante.

A criação da APCVD, como consequência de

um endurecimento da repressão sobre o

movimento organizado de adeptos no nosso

país, veio, contudo, alterar esta situação,

normalizando-a e contribuindo assim para o

esmagamento do, já de si frágil, movimento

ultra português. A histeria mediática

criada por comentadores e jornalistas

sensacionalistas, que ignoram os factos e os

métodos científicos de análise de fenómenos

desta natureza, com vista a granjear maiores

audiências, deu aso a uma verdadeira caça

às bruxas, colocando as “claques” como o

inimigo público número um do estado e da

pretensa segurança dos cidadãos.

A partir daqui farei um relato

da minha experiência pessoal enquanto

adepto e ultra interdito de aceder a recintos

desportivos. A pena que agora cumpro é

relativa a um processo ocorrido no ano

de 2018, mas que por um conjunto de

circunstâncias mais ou menos esquisitas, só

começaria a “valer” a partir de fevereiro do

presente ano.

A minha

paixão pelo “jogo das

bancadas” há de ter

começado de forma

mais séria entre o final

da infância e o início da

adolescência, já depois

de ter solidificado o

amor pelo meu clube.

Passaram-se poucos

anos até que ingressei

oficialmente num dos grupos ultras que

apoiam o emblema do meu coração, e por lá

fiquei até aos dias de hoje. Mais de metade da

minha vida foi ali passada, portanto facilmente

compreenderão que as minhas vivências,

as minhas amizades e até a minha visão do

mundo e valores morais foram seriamente

condicionadas por este percurso. Durante

mais de década e meia fui presença assídua

em quase todos os jogos disputados pelo meu

clube em solo nacional, quer na condição de

visitado, quer como visitante, e desde que

comecei a trabalhar e adquiri independência

financeira, comecei a viajar também para fora

do país para apoiar a equipa, inclusivamente


nos jogos das competições europeias. Ser,

de um dia para o outro, impedido de fazer

aquilo que mais gosto, foi um golpe muito

duro e que mexeu muito com o meu estado

anímico. Para mim, ser ultra é, antes de tudo

mais, fazer todos os sacrifícios possíveis e

necessários para estar no estádio a cantar

durante 90 minutos. A transmissão televisiva

não ameniza em nada esse golpe, e ver os

companheiros partir a cada semana é sempre

doloroso. No entanto, há momentos em que

esse sentimento é ainda mais difícil de digerir,

e nestes meses passei por dois episódios que

são representativos disso.

Para além do futebol, o grupo que

integro acompanha, há bastantes anos, a

equipa de futsal do meu clube, e ao longo

do tempo foi-se desenvolvendo uma relação

entre o grupo e a secção que faz com que

sintamos cada vitória como sendo um bocado

nossa e também com que haja uma empatia

com os jogadores que há muito não se vive

com o plantel principal de futebol nesta

era de mercantilização do jogo. Já vivemos

épocas na segunda divisão, manutenções

na primeira garantidas a ferros na disputa

do play-out, derrotas em finais de Taças de

Portugal e da liga, mas este ano haveria de ser

diferente. Pela primeira vez conquistamos um

troféu em futsal, numa final four disputada

em Sines, com a rapaziada a viajar até à

Costa Alentejana na sexta e no sábado para

empurrar a equipa até à conquista do troféu.

Por tudo o que expressei anteriormente, foi

com um misto de sabores que vivi o dia da

conquista. A alegria da vitória contrastava

com a frustração de não ter podido lá estar,

contribuir com a minha voz durante os 40

minutos e poder festejar com companheiros

de bancada e jogadores. “Estive em todas

as que perdemos, inclusive durante o

confinamento derivado da COVID, em que

fui juntamente com uns 20 companheiros

até à porta do Pavilhão de Matosinhos

dar um ânimo à equipa antes de uma das

finais perdidas, e agora que finalmente

conseguimos, impediram-me de lá estar”.

Foi aquilo que me veio à cabeça quando vi

o capitão subir à bancada, para “entregar” a

taça à malta.

Outro momento difícil foi

naturalmente o dérbi contra o grande rival,

um jogo especial para qualquer adepto

fervoroso. Depois de um dia de convívio,

de um ambiente brutal de entusiasmo e

animação, ficar a ver as camionetas partirem

não é nada agradável, ainda para mais num

jogo que foi extraordinário, dentro e fora do

campo, talvez um dos melhores de sempre em

matéria de apoio vocal e pirotecnia, coroado

com uma vitória já na compensação com um

grande golo e que resultou na confirmação de

que ficamos de novo à frente do eterno rival

regional na classificação da liga.

Apesar destas frustrações, não

me passa pela cabeça a ideia de afastarme

ou desistir. Continuo da forma que

posso a participar na organização do grupo

e a incentivar os meus companheiros,

compreendendo que vivemos tempos

difíceis em que há um notório ataque

concertado à nossa forma apaixonada de

viver o futebol. Exige-se perseverança e

convicção a bem deste movimento, porque

ceder ou amedrontar-nos perante esta

ameaça existencial, é dar de bandeja a vitória

ao inimigo. E desenganem-se aqueles que

acham que o inimigo é o integrante da curva

de outro clube… Parafraseando o subtítulo de

uma saga de filmes que fez sucesso nos países

lusófonos, acordem meus amigos, porque “O

inimigo agora é outro”!

Por J. Sousa

39


MEMÓRIAS Da BANCADA

CD’S , K7’S E DVD’S

Diabos Vermelhos

2002

40


Super Dragões

2003

Directivo Ultras XXI

2002

41


Mancha Negra

2003

White Angels

2015

42


Super Dragões

2004

Red Boys

2007

43


Bracara Legion

2010

White Angels

2003

44


South Side

2016

Super Dragões

2006

45


Mancha Negra

2012

Supporting

2016

46


Super Dragões

2007

Supporting

2016

47


Juve Leo

2001

Diabos Vermelhos

2003

48


Directivo Ultras XXI

2017

49


Supporting

2021

Colectivo Ultras 95

2007

50


Directivo Ultras XXI

2005

Máfia Vermelha

2005

51


Máfia Vermelha

2006

Juve Leo

1986

52


Vários de Clubes

53


Pois é, o tempo a passa a correr e chegámos a mais um final de temporada da maioria das

competições desportivas. O quarto desde o começo da Cultura de Bancada. Como sempre,

inúmeros acontecimentos, com as grandes decisões a ocorrerem, desde a festa de troféus

conseguidos, subidas de divisões e outras emoções na luta pelos respectivos objectivos das

suas equipas. Aqui fica outro Resumo da

Bancada!

Sporting CP x SL Benfica | 06-04-2024

Quatro dias depois, Sporting e Benfica

voltariam a encontrar-se [recorde-se que

tinham jogado antes para a Taça de Portugal],

numa das partidas mais importantes e

decisivas da época. Mais de 48 milhares

de presentes, o que significou quase casa

cheia. Antes, houve um bom ambiente entre

os adeptos da casa à volta do recinto e um

habitual longo cortejo do público benfiquista,

mas com estes últimos a chegarem também

em turmas fora do mesmo.

No interior do estádio, o habitual espetáculo

fora das quatro linhas, com muitos cânticos e

incentivos à sua equipa. Não faltou pirotecnia

nos vários sectores dos grupos organizados,

com os da casa a ficarem iluminados de forma

esverdeada, enquanto o forasteiro pintou-se

como habitualmente com tochas encarnadas.

Quanto ao desafio em si, não faltou emoção

e muita felicidade para os da casa. Marcaram

logo a abrir, nos primeiros segundos, sendo

que o Benfica conseguiu empatar. Porém, já

no tempo de descontos da segunda parte,

o Sporting fez o 2-1 final, provocando uma

explosão de alegria com um golo que já

sabia a título nacional, pois os sportinguistas

alargaram a vantagem pontual que já tinham,

faltando poucas jornadas para o fim.

54


“O Elvas” CAD x Vitória FC | 07-04-2024

Encontro entre dois clubes históricos em

Elvas, num recinto que lembra os míticos

campos do futebol nacional e que contou

com uma excelente moldura humana. O

mais impressionante é que se jogava a última

jornada da fase regular do Campeonato de

Portugal, sendo que este embate não tinha

qualquer efeito prático, pois os vitorianos

já tinham assegurado o primeiro lugar e,

consequentemente, o acesso à fase de

promoção ao terceiro escalão nacional,

enquanto os da casa realizavam a derradeira

partida oficial da temporada, não tendo

qualquer hipóteses de subida ou descida.

Na entrada das formações, o público da casa

realizou uma coreografia com cartolinas e

plástico com as cores do clube, sendo que a

claque da casa, com o nome precisamente de

Juve Azul e Ouro, ainda abriu fumo amarelo.

Bom espetáculo no que ao ambiente diz

respeito, num domingo à tarde, com o

emblema do Sado a contar também com o

apoio de alguns elementos do Grupo 1910

e de outros sadinos em geral. A equipa

alentejana premiou os seus simpatizantes

com uma reviravolta já na parte final,

havendo depois uma boa sintonia final entre

os jogadores e os seus adeptos.

De realçar ainda uma confraternização

amigável, no exterior do recinto, entre as

gentes de ambos os clubes.

Varzim SC x Lusitânia de Lourosa FC | 07-04-

2024

Jogo que contou com uma boa moldura

humana nas bancadas, tanto do lado de

simpatizantes varzinistas como dos de

Lourosa, e que ficou marcado pela despedida

de Ricardo Nunes, histórico guarda-redes do

emblema poveiro, que decidiu fazer aqui a sua

última partida e candidatar-se à presidência

do clube, num momento particularmente

conturbado (que já abordámos na fanzine

recentemente).

Houve muita emoção e 90 minutos bem

disputados neste embate a contar para a

55


fase de promoção da Liga 3, com uma vitória

do Varzim por 4-3 (!), sendo que no final, tal

como já seria de esperar, houve um grande

momento de comunhão entre o capitão

Ricardo e os adeptos, principalmente com o

grupo Os De 1915.

FC Porto x Vitória SC | 07-04-2024

Tal como no clássico existente na véspera,

também aqui estas duas formações se

defrontaram pela segunda vez consecutiva,

depois de um jogo que ocorrera quatro

dias antes a contar para a Taça de Portugal.

Estiveram presentes cerca de 34 mil

espectadores num Domingo à noite, com

destaque para os muitos vitorianos que

compuseram grande parte do sector visitante

e que se fizeram ouvir na maioria do encontro.

Os simpatizantes do emblema vimaranense

foram brindados por uma vitória por 1-2, que

fez equilibrar ainda mais a luta pelo terceiro

lugar da tabela classificativa, motivando uma

grande festa no final.

SL Benfica x OC Barcelos | 11-04-2024

Partida a contar para a segunda mão dos

quartos-de-final da Liga dos Campeões de

Hóquei em Patins e o grupo Kaos Barcelense

fez questão de comparecer, como já tem sido

seu apanágio, mesmo que novamente a meio

da semana e a centenas de quilómetros de

sua casa. Cerca de 20 elementos empurram,

no sector visitante do Pavilhão da Luz, a

sua equipa para mais uma vitória (depois

de também ter vencido na primeira mão),

garantindo a passagem à ‘final four’ da

competição, que ocorrerá na cidade do Porto.

56

SL Benfica x Olympique de Marseille | 11-04-

2024

A pouco mais de uma semana deste

dia, surgiu uma notícia nos órgãos de

comunicação social que indicava a proibição

da deslocação de simpatizantes encarnados

até Marselha, que se iria desenrolar uma

semana após esta primeira mão deste

embate dos quartos-de-final da Liga Europa,


algo que se viria a confirmar a apenas

algumas horas desta partida na Luz. Como

resposta, o Benfica decidiu anular todos os

bilhetes vendidos para o sector visitante, o

que poderia originar obviamente uma grande

confusão entre os muitos marselheses que

viajaram até Lisboa. A verdade é que, entre

algumas reviravoltas neste assunto, ambas as

proibições desapareceram e estava dada “luz

verde” para a presença de forasteiros nos

dois lados.

Quase 54 mil espectadores estiveram no

recinto para este desafio, que teve o condão de

trazer novos episódios polémicos envolvendo

adeptos. Um policiamento acima do normal

no topo sul fez com que os No Name Boys

abandonassem o sector, deixando-o vazio

pouco depois do início. Também na bancada

norte, junto da zona onde ficam os Diabos

Vermelhos, houve algumas movimentações

nas bancadas que obrigaram a um reforço

ainda maior de policiamento.

Os NN acabaram por regressar na segunda

parte, melhorando o ambiente no estádio,

que estava a ser praticamente dominado

pela falange azul e branca, sendo que ainda

proporcionaram (mais um) espetáculo

pirotécnico num encontro europeu.

O Benfica venceu 2-1, tendo estado a vencer

por dois golos, o que fez com que o golo do

Marselha, motivasse muito os seus apoiantes,

ainda que intranquilizasse o público da casa,

que acabou com alguns assobios à sua equipa.

Gil Vicente FC x Sporting CP | 12-04-2024

Mais de 11 mil presentes, a grande maioria

simpatizantes sportinguistas, o que é

sinónimo de casa quase cheia no Estádio

Cidade de Barcelos. Nesta 6.ª feira à noite

houve mais uma empolgada falange de apoio

leonina que empurrou a sua equipa para uma

nova (confortável) vitória, por 0-4, ficando

cada vez mais próxima do título.

No regresso do autocarro houve muita

pirotecnia, em clima de festa, em vários

pontos da passagem pela auto-estrada.

57


SC Braga “B” x Varzim SC | 13-04-2024

Um encontro peculiar nesta segunda fase da

Liga 3, de acesso à subida de divisão, uma vez

que a equipa secundária bracarense realiza

as suas partidas no Complexo Desportivo

de Fão, o que significa que se trata de uma

deslocação mais curta para os poveiros do que

para alguém vindo de Braga. Os escassos 20

quilómetros que separam a Póvoa de Varzim

da localidade de Fão naturalmente fizeram

com que os fiéis simpatizantes varzinistas se

deslocassem em massa, lotando um sector

visitante que não é propriamente muito

grande, criando um bom ambiente.

Os arsenalistas venceram por 2-1,

confirmando a tendência de luta pela

promoção, ao contrário do Varzim, que não

conseguiu superar as expectativas e dar uma

esperança maior aos seus adeptos.

Vitória SC X SC Farense | 13-04-2024

Num Sábado à tarde, ambiente digno de

registo em Guimarães. Motivados pelo

momento de forma da sua equipa, muitos

vitorianos receberam o autocarro da sua

formação na chegada ao estádio, de forma

a dar um incentivo extra. Dentro do recinto,

cerca de 20 mil espectadores estiveram

presentes, com o habitual bom apoio, sendo

que a presença da falange farense no sector

visitante contribuiu para melhorar a festa.

Curiosamente, foi o próprio Farense que cedo

se adiantou no marcador. A sua vantagem

causou incerteza durante praticamente todo

o desafio, acabando o Vitória por empatar

mesmo a acabar, para alívio dos da casa.

SC Espinho x CF União de Lamas | 14-04-

2024

Um dos melhores dérbis do distrito aveirense

a ter lugar numa bela tarde de Domingo, em

Nogueira da Regedoura, em mais uma casa

emprestada ao Espinho que, como é sabido,

continua sem recinto desde a demolição

do seu mítico estádio. Esse facto serviu

para ser um dos motivos de destaque nas

picardias entre rivais, pois os lamacenses

58


não perdem a oportunidade de provocar os

seus rivais, apelidando-os de “sem abrigo”.

Isso levou a que os Desnorteados, grupo

do emblema espinhense, abrisse a seguinte

mensagem: “Antes ser sem abrigo do que ter

desaparecido!” - uma alusão aos Papa Tintos,

claque do Lamas, não ter tido uma história de

apoio sem interrupções.

Muita gente esteve no Parque de Jogos

Joaquim Domingos Maia, numa moldura

humana a fazer lembrar outros tempos do

futebol nacional - até pelas condições do

recinto em questão - que viu a formação

rubro-negra vencer e a ficar a apenas um

pequeno passo de garantir a promoção ao

Campeonato de Portugal.

FC Famalicão x Sporting CP | 16-04-2024

Uma partida que estava prevista acontecer

no dia 3 de Fevereiro (e que fora das

quatro linhas aí começou, a bem dizer),

mais concretamente no tal fim-de-semana

que ficou marcado em Portugal pela greve

dos polícias em determinados encontros.

Nessa tarde de sábado, os espectadores

deslocaram-se até às imediações do estádio,

pois não faziam ideia que o jogo não iria ser

realizado, sendo que existiram confrontos

entre adeptos de ambos os conjuntos,

levando mesmo a que um famalicense ficasse

ferido e fosse transportado para o hospital.

Entre o calendário apertado do emblema

leonino e uma paragem para compromissos

das selecções pelo meio, apenas foi possível

arranjar espaço para este embate se realizar

nesta 3.ª feira nocturna, a meio de Abril. Ainda

assim, nada impediu que houvesse a melhor

casa da época, com cerca de cinco milhares

de presentes. Os sportinguistas criaram

mais um excelente ambiente, apoiando

incessantemente o seu conjunto durante

praticamente todo o duelo, conseguindo uma

sofrida vitória que os aproximou ainda mais

do título nacional.

Já durante a madrugada, houve uma recepção

com muita festa e pirotecnia ao autocarro na

chegada a Alvalade.

59


FC Porto x Vitória SC | 17-04-2024

Segunda mão das meias-finais da Taça, sendo

que o destaque vai para a invasão vitoriana

até ao Dragão, aproveitando este embate

para se converter no clube que mais público

forasteiro levou esta época àquele estádio,

com mais de três milhares de presentes

nesta 4.ª feira à noite, mesmo partindo

em desvantagem por causa da derrota na

primeira mão. Cerca de quatro dezenas de

autocarros encheram nesta deslocação e,

sem grande surpresa, o empolgamento foi

grande e foram os que mais se fizeram ouvir,

entre os cerca de 30 mil espectadores que

estiveram no recinto.

O Vitória abriu o marcador praticamente no

início do jogo, igualando a eliminatória, o que

motivou ainda mais os seus simpatizantes.

De qualquer maneira, o Porto deu a volta

e conseguiu um novo triunfo, garantindo a

passagem ao Jamor. No final, os habituais

cumprimentos e festejos pelo resultado,

entre o público da casa e a equipa, havendo

também espaço para um bom momento de

comunhão entre os jogadores visitantes e os

muitos vitorianos.

60

Olympique de Marseille x SL Benfica | 18-04-

2024

Cerca de 1.600 benfiquistas estiveram

presentes no mítico Vélodrome. Um

número abaixo do que costumam levar em

deslocações a solo francês, sendo que as

confusões e indefinições acerca da permissão

da deslocação também podem ter tido algum

efeito.

Um ambiente sempre complicado por

parte dos marselheses, com as habituais

coreografias, muito apoio, mensagens (sendo

uma delas a criticar precisamente o assunto

da possível proibição, exibida pelos Fanatics

Marseille) e hostilidade ao adversário. Ainda

assim, os benfiquistas iam incentivando e

tentando fazerem-se ouvir.

O Marselha conseguiu a passagem no

desempate por grandes penalidades, depois

de ter empatado a eliminatória, através de um


golo já na parte final do tempo regulamentar.

Houve, portanto, uma explosão de alegria

entre o público da casa e tristeza entre os

visitantes.

SC Braga x FC Vizela | 20-04-2024

Perto de 13 mil espectadores assistiram

à vitória sofrida por 2-1 do Braga sobre o

Vizela. O destaque vai para a homenagem

dos ultras braguistas, pela morte de Gustavo

Duarte, ao treinador Rui Duarte e ao jogador

da formação Afonso Durte, respectivamente

pai e irmão de Gustavo, que tinha 23 anos.

Precisamente ao minuto 23 do encontro,

levantaram a seguinte mensagem: “Nenhum

guerreiro caminhará sozinho. Força, mister e

Afonso!”.

De referir que a Força Azul, grupo do Vizela,

anunciou, dois dias antes, o boicote a todas

as partidas até final da época, como forma de

protesto contra a sua SAD.

Sporting CP x Vitória SC | 21-04-2024

Mais de 46 mil espectadores, nesta que

foi uma das melhores casas da época

em Alvalade. A Juventude Leonina deu o

mote com a mensagem “... eu quero ser

campeão outra vez!” e um bom espectáculo

pirotécnico, houve muito apoio, sendo que a

vitória tranquila por 3-0 assim ajudou.

De qualquer maneira, neste Domingo à noite,

as várias centenas de vitorianos presentes no

sector visitante ainda se conseguiram fazer

ouvir.

SC Farense x SL Benfica | 22-04-2024

Mais uma enchente no São Luís perante

um dos três clubes de maior dimensão em

Portugal. Numa 2.ª feira à noite, mais de seis

milhares de espectadores criaram um bom

ambiente de parte a parte, com os South Side

Boys a comandarem o público da casa, de

um lado, e os grupos encarnados, do outro,

localizados na bancada nascente do recinto,

a também se fazerem ouvir, criando um bom

duelo fora das quatro linhas.

Dentro de campo o Benfica venceu, mas

61


deu-se mais um episódio da contestação

encarnada à sua equipa, pela época

decepcionante. No final do encontro, quando

os jogadores se iam encaminhando para o

túnel, muitos adeptos seus aproximaram-se

dessa zona, entoando insultos e chegando

mesmo a atirar objectos.

Acções contra a repressão | 25-04-2024

Este ano cumpriram-se 50 anos do 25 de

Abril, um acontecimento marcante no

panorama histórico nacional. Como já é

mais do que sabido, os adeptos portugueses

vivem um autêntico clima repressivo, com

regras mais apertadas do que nunca e leis

persecutórias e discriminatórias sobre os

mesmos. A Associação Portuguesa da Defesa

do Adepto (APDA) não deixou de emitir uma

mensagem em vídeo, referindo este problema

existente, que podem ver em vídeo nas suas

redes sociais. Também os ultras leixonenses

deixaram as seguintes mensagens nas ruas:

“Após 50 anos de liberdade... A opressão

aos ultras é prioridade!” e “A 1x1 metro a

bandeira é condicionada, e a liberdade de

expressão é negada”.

CD Paços de Brandão x CF União de Lamas |

27-04-2024

Um Sábado que ficou marcado pela subida

do Lamas ao Campeonato de Portugal, o

quarto escalão nacional. Muita gente fez a

curta deslocação até ao Estádio Dona Zulmira

Sá e Silva, em Paços de Brandão, ao bom

estilo do futebol popular, fazendo recordar o

antigamente, seja pelas condições do recinto

ou pela muita festa em si, que culminou

numa invasão de campo, após um empate,

neste embate entre primeiro e segundo

classificados do campeonato distrital

aveirense.

Também na cidade de Lamas houve, neste

dia, muita festa entre a equipa e os seus

simpatizantes.

62


‘Final Four’ da Taça de Portugal de Hóquei

em Patins

O Pavilhão Municipal de Barcelos recebeu

as decisões da Taça, em hóquei em patins,

tendo o destaque sido, sem grande surpresa,

o público da casa, que criou excelentes

ambientes, tanto no Sábado como no

Domingo, graças ao fervoroso apoio do Kaos

Barcelense. No primeiro dia, eliminaram o

Benfica, motivando uma grande festa entre

equipa e simpatizantes presentes. No dia

seguinte, perderam a final por 3-2 frente

ao FC Porto, não conseguindo aproveitar

o factor casa, apesar de também terem

proporcionado um bom espetáculo.

SL Benfica x SC Braga | 27-04-2024

Novo encontro do Benfica, nova contestação

dos seus adeptos, nomeadamente dos No

Name Boys. Mais de 55 mil neste final de

tarde de Sábado, em que o Benfica venceu

por 3-1, apesar de até ter começado a perder,

mas que mesmo assim não impediu um clima

tenso.

Ainda na primeira parte, quando o Braga

vencia, os No Name atiraram uma série

de tochas para o relvado, interrompendo

momentaneamente a partida, enquanto

exibiam a mensagem “Presidente, o nosso

amor não tem limite”. Houve simultaneamente

muitos insultos em direcção ao treinador

Roger Schmidt.

Nota, ainda, para algumas centenas de ultras

braguistas presentes no sector visitante, a

maioria pertencentes aos seus grupos ultras,

que foram apoiando de forma regular e se

fizeram ouvir várias vezes.

Vitória SC x Boavista FC | 27-04-2024

Mais de 16 mil espectadores em Guimarães

para este clássico do futebol nacional,

realizado numa noite de Sábado. Actualmente

diferem no que toca aos seus objectivos, com

o emblema vimaranense a já ter assegurado o

acesso às competições europeias da próxima

época, enquanto os boavisteiros pretendem

alcançar a manutenção. Nem por isso a

63


rivalidade esmorece, com muitas picardias de

parte a parte e um bom ambiente no recinto,

com os boavisteiros presentes no sector

visitante a também terem sido bastante

audíveis.

A partida terminou com uma vitória pela

margem mínima por parte dos da casa, que

valeu novo momento de festejos entre a sua

equipa e o público. Do lado axadrezado, o seu

público valorizou o esforço dos seus jogadores

e teve um bom momento de comunhão final

com eles.

SC Braga “B” x Académica de Coimbra | 28-

04-2024

Destaque para a intensa procura de ingressos

por parte do público academista, neste

encontro de importância máxima na luta pela

subida à segunda liga. Tal como já referimos

anteriormente, o sector visitante em Fão não

é de grandes dimensões e, por isso, muitos

simpatizantes do clube de Coimbra não

conseguiram o tão desejado bilhete.

Como esperado, o sector ficou a abarrotar

neste Domingo matinal, numa partida

bastante emotiva, que terminou com um

empate a uma bola, tendo os dois golos sido

feitos através de penáltis depois do minuto

90!

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FC Porto x Sporting CP | 28-04-2024

Clássico de muitas emoções, entre dois

clubes que passam por contextos diferentes.

O Sporting muito próximo do título de

campeão nacional, com os seus adeptos a

aproveitarem cada momento para criar bons

incentivos, como foi o caso tanto da saída da

equipa em Alvalade, na véspera, como da

própria chegada ao hotel, em Vila Nova de

Gaia. Não faltaram cânticos e pirotecnia em

ambos os lados.

Já o Porto viveu, um dia antes, as eleições

do clube, que culminaram na saída de Pinto

da Costa, 42 anos depois, para a eleição

de André Villas-Boas. Para além disso,

desportivamente vai tentando assegurar o

terceiro lugar, uma realidade aquém do que


os portistas inicialmente idealizavam.

Por isso, houve estados de espírito distintos

nas bancadas, entre os cerca de 45 mil

espectadores presentes. No que toca aos

da casa, foi uma partida que teve como foco

as homenagens a Pinto da Costa, ouvindose

cânticos com o seu nome ainda antes

do início da partida. Pouco depois do jogo

começar, houve uma coreografia de grandes

dimensões aberta com a sua imagem na

bancada sul, por parte dos Super Dragões.

Depois do minuto 42, houve um aplauso

por parte dos sócios azuis e brancos e uma

grande tochada do Colectivo 95.

Relativamente aos sportinguistas, que lotaram

o sector visitante, tiveram um bom nível de

apoio, com muita pirotecnia, destacandose

nesta parte um grande espetáculo

pirotécnico, onde houve inclusivamente fogo

de artifício.

O Porto até esteve a vencer durante a maior

parte do tempo, mas dois golos de rajada por

parte do goleador sueco Gyökeres, perto do

final, empataram a duas bolas este encontro,

para gáudio dos simpatizantes verdes e

brancos presentes no sector visitante.

CF Estrela da Amadora x SC Farense | 29-04-

2024

A fechar a 31.ª jornada houve encontro entre

dois conjuntos que lutam pela manutenção,

numa 2.ª feira à noite, contando com uma

boa afluência, estando mais de cinco milhares

de espectadores presentes na Reboleira. O

destaque vai para a boa deslocação realizada

pelos South Side Boys e simpatizantes

farenses em geral, que foram premiados

com uma importante e excelente vitória,

por 0-3, ficando quase com a permanência

no principal escalão garantida, motivando

uma grande festa entre a equipa e o público

forasteiro.

Sportinguistas presentes na Arménia

Este ano, para desagrado das equipas e dos

adeptos, a ‘Final-four’ da Liga dos Campeões

de Futsal realizou-se na cidade arménia de

65


Yerevan. A Península Ibérica levava as quatro

formações, duas portuguesas e outras duas

espanholas, confirmando a sua hegemonia

nesta modalidade no continente europeu.

Com todas as dificuldades logísticas que

esta deslocação acarretava, uma dúzia de

elementos da Juventude Leonina realizaram

a longa viagem, aos quais se juntaram outros

simpatizantes verde e brancos na bancada,

nos dois jogos que realizaram. Acabaram por

perder em ambos - com o Barcelona e contra

o Benfica - ficando em quarto lugar na maior

prova europeia de clubes de futsal, o que não

tirou brilho a este histórico apoio.

De salientar, ainda, que os ultras realizaram

este registo numa altura em que o Sporting

se viria a sagrar campeão nacional de futebol,

preterindo esse momento por esta aventura

notável.

Moreirense FC x FC Vizela | 03-05-2024

Como referimos anteriormente, a Força

Azul anunciou um boicote nesta recta

final da temporada, em protesto contra a

SAD. Curiosamente, o Vizela jogava agora

em casa do grande rival, nesta partida

inaugural da antepenúltima jornada, ficando

matematicamente despromovido em caso

de resultado negativo. A claque vizelense,

apesar de faltar ao jogo, quis apimentar nessa

semana, nas imediações do reduto rival,

através de tarjas insultuosas ao Moreirense e

aos Green Devils. Estes últimos responderam

com a seguinte mensagem: “A vossa queda

será abismal, da segunda à distrital”.

Na noite do encontro, que se realizou numa

6.ª feira à noite, cerca de dois milhares

de cónegos assistiram mesmo, para sua

felicidade, à confirmação da despromoção

do Vizela, depois de uma vitória pela margem

mínima.

Rio Ave FC x Vitória SC | 04-05-2024

As idas do emblema vimaranense a Vila do

Conde costumam ser sinónimo de invasão e

esta não foi excepção. O sector visitante do

Estádio dos Arcos esteve completamente a

66


abarrotar, com muitos vitorianos empolgados

por uma possível ida da sua equipa à Liga

Europa. Não faltaram, portanto, cânticos

durante todo o encontro, em mais um recital

dado pelos seus simpatizantes. Infelizmente

para eles, o Rio Ave conseguiu os três pontos,

para festa do público da casa.

Sporting CP x Portimonense SC | 04-05-2024

Casa cheia em Alvalade para um encontro

que já cheirava a título, apesar de

matematicamente ainda não ser possível.

Clima de festa com uma enorme recepção

ao autocarro da equipa verde e branca antes

do jogo. Durante a partida, várias tochadas

e mensagens de incentivo nas bancadas das

claques, em mais um dia de festa por uma

nova confortável vitória.

CF União de Lamas x CD Estarreja | 05-05-

2024

Como referimos antes, o Lamas conseguiu a

promoção ao Campeonato de Portugal. Por

isso, a sua claque - os Papa Tintos - aproveitou

para realizar uma coreografia em forma de

agradecimento à sua equipa pela época

bem sucedida, com a mensagem “Obrigado

campeões”. Houve também fumo e muitos

cânticos nesta partida.

FC Famalicão x SL Benfica | 05-05-2024

Encontro num Domingo à noite que tinha

como atracção principal o facto de se verificar

se o Benfica conseguiria ou não uma vitória, de

maneira a saber se o rival Sporting se sagraria

campeão nacional. A casa esteve muito bem

composta, com quase cinco milhares de

espectadores, e a falange benfiquista até

estava bastante audível durante a maioria da

partida. Porém, já na parte final, o Famalicão

fez dois golos e conseguiu uma vitória, para

gáudio do público da casa. Nessa altura,

houve mais um episódio de contestação

encarnada, com tochas atiradas do exterior

do recinto que caíram dentro do relvado e

interromperam momentaneamente o duelo.

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Sporting CP campeão nacional

Em consequência do registo anterior, o

Sporting acabou por se sagrar campeão.

Para muitos, o facto de ter sido sem jogar

e num Domingo à noite impediu festejos

como desejariam, mas nem por isso a festa

deixou de ser impressionante. O Marquês

pintou-se de verde e branco, houve imensa

pirotecnia (registando-se imagens incríveis),

um concerto dos Supporting que levou a

multidão à loucura e muitos cânticos.

A festa sportinguista teve continuação no

resto do campeonato, com destaque especial

para o último jogo do campeonato, em

casa, frente ao Chaves, dois fins-de-semana

depois, onde se registou nova casa cheia

em Alvalade, com muita pirotecnia e ainda

uma coreografia do Directivo Ultras XXI, de

maneira a festejar também o 22.º aniversário

do grupo.

‘Final Four’ da Liga dos Campeões de Hóquei

em Patins

Realizou-se na cidade do Porto, mais

concretamente no Pavilhão Rosa Mota, a ‘final

four’ da Champions de hóquei, que contou

exclusivamente com formações portuguesas:

FC Porto, Sporting, Oliveirense e Óquei de

Barcelos. Os destaques vão essencialmente

para o grande apoio dos barcelenses no

Sábado, contra a Oliveirense, mas que

terminou com um resultado favorável aos

de Oliveira de Azeméis, impedindo que no

dia seguinte houvesse novo espectáculo

da claque Kaos Barcelense e restantes

simpatizantes do clube. Porém, a final contou

com a presença dos ultras leoninos, que

deram um bom recital e ajudaram o seu

conjunto a sagrar-se campeão europeu da

modalidade.

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GD Estoril Praia x Sporting CP | 11-05-2024

Primeiro encontro do Sporting depois da

conquista do campeonato, levando muita

gente até à Amoreira. Porém, o destaque fora

das quatro linhas vai para o facto das claques

Juventude Leonina, Directivo Ultras XXI e


Torcida Verde terem boicotado a partida,

apoiando fora do reduto, pelo facto de não

concordarem com a política de bilhética do

clube leonino.

Vitória SC x SC Braga | 11-05-2024

O dérbi do Minho dispensa apresentações

e este não desiludiu, antes pelo contrário,

pois teve um dos melhores ambientes do

passado recente, contando com mais de 25

mil espectadores, muitas emoções (até pelo

contexto desportivo) e imensa pirotecnia

nos vários sectores. Os White Angels, por

exemplo, voltaram a esmerar-se numa

tochada a abrir o encontro. Desta vez quem

sorriu com um golo nos instantes finais foi o

Braga, vencendo por 2-3, e provocando uma

enorme explosão de alegria entre os seus.

A partida teve direito a uma publicação

especial, que podem ler neste número da

fanzine.

SL Benfica x FC Arouca | 12-05-2024

Novo episódio da saga de contestação

dos No Name Boys contra o seu treinador.

Ao seu estilo, interromperam outra vez o

encontro com tochas, enquanto expunham

uma tarja contra Roger Schmidt. A partida

teve também a particularidade de ter

servido como despedida de Rafa do clube,

tendo sido ovacionado pelos quase 50 mil

espectadores presentes, que também viram

o seu Benfica vencer de forma tranquila, por

uns expressivos 5-0.

FC Porto x Boavista FC | 12-05-2024

Fim-de-semana marcado por buscas no

Dragão, mais concretamente pela investigação

judicial aos bilhetes cedidos pelo clube azul

e branco aos Super Dragões. Isso resultou

no cancelamento dos ingressos da claque

para este dérbi e, por conseguinte, do facto

histórico da ausência da claque a um embate

em casa do seu clube. Por causa disso, os

boavisteiros, que se deslocaram com cerca

de 1.500 elementos ao reduto do rival (num

cortejo desde o antigo campo do Salgueiros),

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fizeram-se ouvir com mais expressividade na

maior parte do encontro, sendo que o apoio

da casa era comandado pelo Colectivo 95.

Foi um jogo muito mais imprevisível do que a

maioria esperava, com o Porto a ter alcançado

uma vitória muito sofrida, por 2-1, com o golo

decisivo a ser feito ao 98.º minuto, para festa

dos da casa e desilusão dos forasteiros, que

com o empate alcançavam a manutenção.

SC Farense x Portimonense SC | 18-05-2024

Foi uma última jornada do campeonato de

emoções fortes na luta pela manutenção

no principal escalão do nosso futebol.

Portimonense, Estrela da Amadora e Boavista

tinham os jogos à mesma hora, sendo que a

única equipa que não dependia de si própria

para evitar o play-off era a de Portimão, que

jogava precisamente o dérbi algarvio, no São

Luís. Não foi então de estranhar que quase

seis milhares de espectadores criassem um

excelente ambiente.

Os South Side Boys com o seu habitual bom

apoio e várias centenas de simpatizantes do

Portimonense, empolgados pelo resultado

positivo, também se fizeram ouvir. A questão

é que, no final, houve um golo do Boavista

que foi um enorme “balde de água fria” para

os portimonenses, que viram mesmo os

seus rivais na bancada a entoarem o nome

do emblema axadrezado, como forma de

provocação.

Boavista FC x FC Vizela | 18-05-2024

Ao Boavista bastava um empate contra o

já despromovido Vizela ou um resultado

negativo em qualquer um dos outros dois

campos. Porém, aquilo que se previa como

uma tarefa simples, complicou-se bastante,

com os axadrezados a entrarem no minuto 90

a perder e a saberem que os dois adversários

directos estavam a vencer. A verdade é que,

através de uma grande penalidade no último

lance da partida, a grande apreensão dos

cerca de 20 mil presentes transformou-se

numa enorme explosão de alegria, havendo

ainda espaço, à posteriori, para uma

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tradicional invasão de campo que permitiu

aos seus adeptos fazerem a festa com os

próprios jogadores.

Nota ainda para o facto dos Panteras Negras

terem aberto uma coreografia a assinalar

o 40.º aniversário do histórico grupo do

panorama nacional.

SC Braga x FC Porto | 18-05-2024

Última jornada com direito a um jogo de

elevado nível para decidir quem ficaria na

terceira posição da tabela classificativa. Mais

de 23 mil espectadores estiveram presentes,

animando bastante o ambiente. No primeiro

anel da bancada nascente houve uma

coreografia com a mensagem “Até ao último

segundo, até à última gota de suor!”, como

forma de inspiração para os seus jogadores,

que necessitavam de vencer para ultrapassar

o seu adversário. Os ultras arsenalistas, para

além do habitual apoio, ainda realizaram uma

boa tochada no seu sector.

Relativamente aos azuis e brancos, os

mesmos foram bastante audíveis, acabando

por ficar a sorrir depois de um triunfo pela

margem mínima, garantindo a presença na

fase de grupos da Liga Europa da própria

temporada, antes da ida ao Jamor.

Lusitânia de Lourosa FC x FC Alverca | 19-05-

2024

Emoções fortes na última jornada da fase de

Apuramento de Campeão da Liga 3. O reduto

do Lourosa encheu para o embate com o já

promovido Alverca, na tentativa de ajudar o

seu conjunto a ainda conseguir um lugar no

play-off contra um adversário da Segunda

Liga. Numa tarde de Domingo, viveu-se um

ambiente incrível naquela localidade do

distrito aveirense, pois a combinação da

sua vitória por 3-2 com um surpreendente

empate caseiro da formação secundária do

Braga frente ao Atlético serviu para garantir o

terceiro lugar da tabela, galvanizando imenso

os simpatizantes dos leões de Lourosa.

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Amarante FC x Pevidém SC | 19-05-2024

Numa fase crucial das decisões sobre quem

sobe do Campeonato de Portugal até à Liga 3,

a Federação decidiu, de uma forma ridícula,

castigar os amarantinos com este encontro

à porta fechada, por alegado apoio da sua

direcção a um Grupo Organizado de Adeptos

na temporada anterior.

A verdade é que os simpatizantes do

Amarante decidiram marcar presença nas

imediações do recinto, incentivando lá e

festejando a importante vitória com os seus

jogadores após a partida.

UD Santarém x Vitória FC | 19-05-2024

O histórico emblema sadino garantiu a

promoção ao terceiro escalão nacional,

depois de um empate no terreno do

Santarém. Para além da festa feita nesta

partida de Domingo à tarde, houve ainda

uma celebração organizada no interior do

Estádio do Bonfim, com muitos adeptos a

ovacionarem a sua equipa, já durante a noite.

Sporting CP x FC Porto | 26-05-2024

Clássico na final da prova rainha portuguesa,

obviamente com casa cheia. O espírito de

festa do Jamor foi manchado por incidentes

envolvendo adeptos portistas e a polícia, com

várias imagens lamentáveis da actuação das

autoridades, tanto antes como durante a

partida.

Foi um bom duelo de apoio entre os dois

lados. Os sportinguistas estavam claramente

motivados pela parte desportiva conseguida

até então. “Aqueceram” bem com um

concerto dos Supporting antes, começaram

a ganhar e parecia estar tudo favorável para

os verde e brancos, mas rapidamente viram

o Porto a empatar, ficar em superioridade

numérica em campo e acabar por vencer já

durante o prolongamento, levando o troféu

para a Invicta. Isto fez com que a festa fosse

dos dragões, que ainda tiveram o registo de

uma bela tochada dos Porto Casuals.

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QUANDO OS PÉS DESCALÇOS BATERAM OS

“MESTRES” INGLESES

O futebol africano é hoje em dia

uma realidade completamente afirmada e

reconhecida; os grandes clubes europeus são

repletos de jogadores originários de África

como também há seleções que conseguiram

vitórias e títulos até há pouco tempo. Um

exemplo para todos: Quem não se lembra da

emblemática seleção dos anos 90 da Nigéria

(medalha de ouro aos jogos olímpicos em

1996, eliminada nos oitavos no mundial 1994

e vencedor da Copa de África no mesmo

ano)? Só que a história e a lenda dos Green

Eagles vem de muitas décadas atrás: é esta

epopeia que hoje queremos contar.

Em 1949, 18 jogadores de futebol

nigerianos viajaram para o Reino Unido para

disputar nove jogos amigáveis contra clubes

amadores ingleses. O objetivo desta viagem

foi testar o nível técnico nigeriano contra

adversários de boa qualidade e veladamente

mostrar a bondade da “assimilação colonial”

inglesa. Se por um lado o evento foi utilizado

por este motivo, por outro não diminui o

grande impacto e influência que teve nos

anos a seguir sobre todo o movimento

futebolístico africano.

Foi a primeira viagem de uma

equipa da África Ocidental para a Europa.

Chegaram, vindo de duas semanas de viagem

desde Lagos até Liverpool, no dia 29 de agosto

de 1949. Durante a viagem mantiveramse

em forma correndo e fazendo exercícios

todas as manhãs e noites, e na carga do navio

estavam alimentos nigerianos (arroz, óleo

de palma, camarão seco, inhame, presunto,

carneiro e pimenta vermelha) para sustentar

os jogadores enquanto estivessem no Reino

Unido. Aliás, os organizadores da viagem

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contrataram quatro mulheres nigerianas,

esposas de funcionários do governo nigeriano

a viver em Londres, para ajudar a preparar

refeições para os jogadores durante a sua

estadia na cidade, uma vez que os jogadores

não gostavam muito da comida inglesa.

Dois dias depois da chegada,

disputaram o primeiro jogo contra o Marine

Crosby FC. Qual o espanto dos adversários

e do público em perceber que os jogadores

nigerianos não tinham chuteiras e jogariam

de pés descalços (alguns tinham umas ligas

nos joelhos). Os jogadores atraíram a atenção

da imprensa. Havia algo de misterioso numa

equipa de jogadores de futebol negros

descalços que capturou a imaginação do

público inglês. Bom, tudo isto (pés descalços,

sem chuteiras) não impediu o “milagre”: a

equipa nigeriana venceu os ingleses por 5-2,

colocando em delírio os 6000 espectadores

presentes (entre os quais muitos africanos

ocidentais emigrantes). Foi uma vitória que

marcou uma era no futebol africano!

A turné continuou nas semanas

seguintes com mais 8 jogos e resultados

alternados: mais uma vitória, 2 empates e 5

derrotas. Curiosidade: em todas as derrotas

os jogadores calçaram chuteiras…

Outra curiosidade: O último jogo

da turné, contra o South Liverpool Football

Club, foi disputado sob holofotes, tendo esse

clube inglês sido um dos primeiros do país

a ter holofotes permanentes. As bolas da

partida tiveram que ser pintadas de branco

para torná-las visíveis para os jogadores

e espectadores durante a partida. Outros

tempos…

Para memória futura queremos

deixar aqui os nomes dos 18 heróis e a

repectiva equipa: Sam Ibiam (Port Harcourt),

Isaac Akioye (Hercules, Ibadan) Justin

Onwudiwe (Lagos Railway), Olisa Chukwura

(Abeokuta), ATB Ottun (Lagos Marines),

Isiaku Shittu (Lagos UAC), John Dankaro

(Jos), Hope Lawson (Lagos Marine), Dan

Anyiam (Lagos UAC), Okoronkwo Kanu (Land

& Survey) Mesembe Otu (Lagos Marine),

Peter Anieke (Lagos Railway), Sokari Dokubo

(Lagos Railway), Godwin Anosike (Lagos

Railway), Tesilim Balogun (Lagos Railway),

Titus Okere (Lagos Railway), Etim Henshaw –

o capitão (Lagos Marine) e Edet Ben (Lagos

Marine). Treze dos dezoito jogadores eram da

Liga de Lagos e Distrital, dois das Províncias

Ocidentais, dois das Províncias Orientais e

um das Províncias do Norte. Um resultado

significativo desta viagem ao Reino Unido

de 1949 foi que ela abriu as portas para a

migração de jogadores de futebol nigerianos

para o país. Alguns membros da turné de

1949 fizeram parte da primeira geração de

jogadores de futebol nigerianos a jogar em

clubes ingleses: lembramos aqui Tesilimi

Balogun, que teve uma honrosa carreira

no Peterborough United e no Queen’s Park

Rangers, e que se tornou uma lenda no

seu país de origem que até foi erguida uma

estátua em frente ao estádio em Lagos, que

tem o seu nome, para homenageá-lo.

Por Eupremio Scarpa

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BOLA DE NOTAS

A 777 Partners apresenta-se como

“uma plataforma de investimento alternativa

que ajuda empreendedores ousados a

transformarem visões em valor duradouro”.

Este consórcio, sediado nos EUA, é accionista

em clubes de futebol (Sevilla - 15%; Genoa

- 99,9%; Standard Liège - 99,7%; Red Star FC

- 100%; Vasco da Gama - 70%; Melbourne

Victory - 70%; Hertha Berlin - 64,7%) e de

basquetebol, e detém também os direitos

de distribuição comercial internacional das

ligas de futebol argentina e brasileira e 45%

da liga de basquetebol britânica, das seleções

nacionais de futebol do Chile e do Peru e das

principais ligas europeias de futebol feminino.

Além disso, é ainda detentor de companhias

aéreas e empresas de fintech. Porém, várias

das empresas do portfólio da 777 Partners

acusam-na de não pagar dívidas, atuando

sob a visão de que “aumentamos o valor dos

nossos direitos fortalecendo os plantéis das

equipas com novos talentos e fortalecendo

o seu potencial de ganhos através do

desenvolvimento de talentos e produtos,

patrocínios, merchandising, publicidade,

estratégia de distribuição, NFTs, abordagem

Web3, monetização de dados, desportos

de fantasia e videojogos. Acedemos a um

mercado vasto e subdesenvolvido, com

enorme apetite dos consumidores por

conteúdos desportivos. Aplicamos equipas

e tecnologia de ponta para permitir avanços

na criação e distribuição de conteúdo digital.

Trabalhamos incansavelmente para criar

uma experiência de mídia que atinja todos

os pontos de contato do consumidor (...)

aumentando drasticamente o valor dos ativos

de nossas equipas”. O objectivo é claro: gerar

lucro financeiro.

Falamos então de um grupo

multi-clubes/multipropriedade que detém

a maioria do capital de seis clubes e é

accionista minoritário de outro, aquisições

estas realizadas em apenas 18 meses. Além

disso, o consórcio “conquistou” acusações

de fraude, de oferta de empréstimos ilegais

e falta de pagamento de contas que totalizam

centenas de milhares de dólares. Contase

que o 777 apresenta como garantias

supostos fundos que não lhe pertencem

ou não existem, estando já envolvido em

insolvências e, neste momento, estão

também em curso vários processos judiciais

contra o grupo nos EUA. O desempenho de

vários dos seus clubes está bem abaixo dos

seus pergaminhos e cada vez mais adeptos

desses símbolos estão insatisfeitos. São

diversas as razões para tal, como a perda

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de independência, de identidade, valores e

princípios, como a falta de transparência, o

conflito de interesses na gestão financeira e

desportiva e incompetência dos dirigentes. É

público que o modus operandi deste grupo

não foge ao da maioria, uma vez que um

dirigente do Red Star disse abertamente que

“se um dia tivermos um avançado que está a

jogar bem por nós e é um grande talento, um

clube como o Standard pode dizer que o quer.

Discutiremos, mas será uma troca”.

Nos últimos tempos, numa visita

ao Stade Bauer, casa do francês Red Star, vi

muitos autocolantes contra a 777 Partners

e a Tribune Rino Della Negra continua os

protestos que iniciou ainda antes da venda

do clube a estes em 2022, não baixando a

guarda apesar de terem subido à segunda

liga nacional esta temporada. Importa referir

que falamos de um emblema oriundo de

Saint-Ouen, subúrbio parisiense que é a zona

com maior pobreza na França continental

e que, em 2023, com o clube a actuar na

terceira divisão, o preço dos bilhetes anuais

aumentou 83%, chegando a ser superior ao de

clubes da primeira liga. Isto escalou a tensão

entre adeptos e direcção, a qual acabou

por recuar nas suas intenções, face aos

constantes protestos sob os lemas “777 não

são bem-vindos” e “rua 777”. Para o último

jogo desta época de sucesso desportivo, a

TRDN organizou um cortejo no qual pedem a

saída da 777, de Patrice Haddad (presidente

do clube que o vendeu) e a entrada de um

novo investidor, tendo aproveitado o início

da segunda parte para apresentarem a

coreografia “multipropriedade e aqueles

que pisam os nossos valores - rua 777”.

Festi’Bauer é um evento organizado pelos

ultras que serve de reunião dos adeptos e

de homenagem ao médico e combatente da

Resistência Francesa Jean-Claude Bauer, no

qual este ano estiveram em debate os efeitos

que as multipropriedades provocam nos

clubes. Ambos os eventos foram publicitados

com cartazes em forma de notas de dólares

com a cara de Josh Wander e inscrições como

“Falsificações Unidas da Flórida” e “Não

confiamos no Josh”.

Em Setembro passado, o accionista

maioritário do Everton, Farhad Moshiri,

acordou vender 94,1% à 777 por 685 milhões

de dólares, um negócio que teve a aprovação

da Financial Conduct Authority e da Football

Association, encontrando a reprovação da

Premier League. Tal reprovação tem arrastado

a concretização da transacção até hoje,

tendo a PL solicitado provas de que detêm

os fundos necessários para a compra das

acções, completar a construção de um novo

estádio e atender aos custos operacionais,

não havendo resposta por parte dos supostos

investidores. Por isso, agora procura-se um

novo comprador dos toffees.

Ainda antes da venda do clube,

ultras do Hertha posicionaram-se desde

logo contra o negócio, exigindo a aplicação

do modelo 50+1: “777 só no casino. Somos

contra os investidores”. Também no Brasil se

sentem as repercussões da gestão danosa

da 777 Partners, com o Vasco da Gama a

revelar ter ordenados em atraso. Ainda em

2023, a Força Jovem liderou um movimento

de contestação, levando a cabo protestos em

frente às sedes da empresa no Rio de Janeiro

e em Miami. O mesmo acontece ao Standard

de Liège, clube que pediu a apreensão dos

activos do consórcio. O clube foi comprado

há cerca de dois anos e os Hell Side, Ultras

Inferno e Publik Hysterik Kaos têm composto

um tridente que ecoa a voz da revolta, pelo

menos desde 2023. Antes do jogo St. Liège

vs Westerlo, agendado para 10 de maio, os

grupos em comunicado apelaram à união e

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presença dos adeptos neste momento que

consideram sombrio, comunicando que iam

realizar diversas acções de protesto para

aquela partida e encorajando investidores

locais a apresentarem-se como solução para

o clube. Neste comunicado disseram ainda

que “Esta sociedade mafiosa, que consiste

em fazer circular fluxos financeiros de uma

empresa para outra sem nunca investir

no seu bom funcionamento, está hoje

encurralada pelas suas acções fraudulentas e

o resultado é implacável! Estes bandidos têm

julgamentos em todos os lados do Atlântico e

o nosso clube corre perigo de sobrevivência.

Já é assim há algum tempo, mas ainda

mais hoje: funcionários, fornecedores,

jogadores e staff não têm sido remunerados

e certamente não o serão por algum tempo.

Neste momento, a falência ameaça-nos mais

do que nunca!”. Contudo, ninguém esperava

que o protesto fosse feito nestes moldes:

horas antes da partida, os grupos de apoio

reuniram-se à porta do centro de estágio,

de onda partiria a equipa rumo ao estádio,

não permitindo que o autocarro saísse e

recusando negociações com os dirigentes,

originando o adiamento do jogo por falta

de comparência da sua equipa. Na semana

seguinte mantiveram a sua posição, com

novo comunicado conjunto a criticar a 777

e os dirigentes belgas do Standard, voltando

a acusar o consórcio de ser uma sociedade

fraudulenta, ultra-endividada e de ser tóxico

para o futebol, abordando o protesto do fimde-semana

antecedente: “Muito mais do que

o pior registo desportivo da nossa história,

é a falência que nos espera. Este foi o nosso

discurso aos jogadores durante o treino do

dia anterior. Os jogadores compreenderam a

mensagem e, de comum acordo, decidiram

seguir-nos nesta abordagem de não disputar

o jogo. Tivemos que tomar esta atitude forte:

impedir que a partida começasse para acabar

com a era da 777, para que vendessem o

clube o mais rápido possível. Não estamos

orgulhosos, mas tivemos de fazê-lo!

Embora a direção do clube, sob a

liderança de Pierre Locht, tente esconder a

verdade, foi comunicado aos jogadores e à

equipa técnica na manhã de quarta-feira que

não seriam mais remunerados por tempo

indeterminado. Essa é a realidade! Ele não é

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o único. Dirigimo-nos também ao Sr. Javaux,

membro do Conselho de Administração

do Standard de Liège, mas que até hoje

permaneceu em completo silêncio. (...)

Parece agora que os salários serão pagos

através de uma das companhias de seguros

dos 777 Partners. Essa mesma empresa

estaria pronta para comprar novamente o

nosso clube. Outra montagem nesta galáxia,

na qual não confiamos.

Este modelo de timeshare

confirmou todos os receios que tínhamos

de passar para segundo plano, esvaziando o

clube da sua identidade e dos seus valores.

(...) Outras ações ainda acontecerão até

ao final da temporada, mas é claro que os

últimos jogos terão de acontecer! Estando

o nosso clube num limbo total, convidamos

todos os detentores de lugar/bilhete anual

a aguardarem até ao último momento

para se inscreverem novamente, ou seja,

até 6 de julho. Não gostaríamos que os

fundos arrecadados com esta campanha

de subscrição fossem utilizados para cobrir

outras dívidas pertencentes à 777 Partners.

Queremos uma garantia de que o dinheiro

que damos ao Standard permanecerá lá!

Quanto à revenda do clube, é

inevitável! Nós, adeptos, queremos envolvernos

nessa operação para evitar ao máximo

que esse tipo de cenário se repita. Numa

altura em que o futebol moderno recebe

investidores estrangeiros de todos os lados, é

fundamental garantir raízes locais dentro do

clube! O Royal Standard de Liège é um clube

histórico e não pode acabar! Continuaremos

como garantes da identidade e do ADN do

clube.”

A 17 de Maio, surge um comunicado

contra a 777 e o modelo de multipropriedade,

subscrito pela Força Jovem e Guerreiros do

Almirante (Vasco da Gama), Tribune Rino

Della Negra (Red Star), os grupos organizados

do Hertha Berlin, North Terrace (Melbourne

City), Ultras Inferno e Publik Hysterik Kaos

(Standard Liège) e Biris Norte (Sevilla). Além

de frisarem que a 777 Partners é “uma

sociedade fraudulenta, ultra-endividada e

um agente tóxico para o futebol”, alegaram

ser “urgente que a 777 saia imediatamente

dos nossos clubes”. Acrescentaram ainda que

“mais do que nunca, a multipropriedade de

clubes surge como algo propício ao controlo

do Futebol por entidades nefastas (...),

devendo ser combatida pelos adeptos de

todo o mundo”.

O que será dos clubes que são

“geridos” pela 777? Chegamos a um ponto

em que somos obrigados a questionar a

FIFA, a UEFA, bem como as ligas nacionais e

os clubes sobre o que mais será preciso para

se criarem barreiras ao excessivo negócio

em torno do futebol e limitar a aquisição de

diversos clubes por parte de uma empresa,

terminando com as multipropriedades

e este atentado à verdade desportiva, à

transparência financeira, à identidade e

independência de símbolos que foram

desenhados sob inspiração de um ideal

contrário a todo o conflito de interesses que

este tipo de negócio constitui.

Por L. Cruz

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GLASGOW AWAY

Glasgow, a cidade mais populosa

da Escócia, não seria a minha primeira

escolha para uma viagem de lazer. Talvez

pelos seus escassos dias soalheiros aos quais

estou habituado por Lisboa ou talvez pelas

dificuldades que o Brexit colocou à nossa

livre deslocação. No entanto, as viagens de

trabalho não têm necessariamente isso em

consideração na hora de nos fazer viajar. Foi

assim que dei por mim em terras escocesas

no final de março. E foi assim também que

decidi desviar-me nas horas vagas para aquilo

muito interessa a tantos de nós: a cultura de

bancada.

Acabado de aterrar, pouco depois

de ter entrado no clássico bus de dois pisos

que nos leva ao centro da cidade, reparo

ainda em estrada naquilo que tanto marca

a história do futebol por aqui: a rivalidade

quase ancestral entre Rangers e Celtic. Se de

um lado da estrada encontrava diferentes tags

com referências ao clube verde e branco, do

outro lado logo se reparava que tinha tentado

superar o que os rivais tinham feito – tanto

assim é que denoto num grande e formidável

graffiti feito pelos Union Bears do Rangers no

alto de um prédio, a escassos metros dos tags

que antes tinha avistado.

Infelizmente, o jogo de vida ou de

morte entre os tradicionalmente opostos

católicos e protestantes (o Old Firm Derby)

não estaria disponível, nem um outro

qualquer semelhante. Por sorte, apesar de

não existir uma partida que mais me apraz –

do campeonato de clubes –, reparo que está

marcado um jogo amigável entre as seleções

da Escócia e da Irlanda do Norte no histórico

Hampden Park. A app criada em exclusivo

pelos gestores do recinto desportivo, hoje

em dia utilizado pela Federação Escocesa

(ainda que historicamente associado ao clube

Queen’s Park), ajuda-me a adquirir um bilhete

para a East Stand do dito. Vem-me à cabeça

o jogo amigável que a equipa de Portugal

proporcionou com a Escócia, em junho de

1966, em vésperas do histórico Campeonato

do Mundo de ’66. Sei que li algures sobre

isso há algum tempo. Nesse encontro, num

Hampden que não chegou às 30 mil pessoas,

a vitória ficou do lado português, graças

ao golo solitário de Torres aos 70 minutos

– segundo o Diário de Lisboa, de 19 de

junho, essa era uma vitória que servia para

“reforçar-lhe o moral, quando deste tanto

precisa na emergência”. Ora, também eu

precisava exatamente dessa motivação para

ficar pessoalmente entusiasmado para um

jogo do calibre já descrito. Mais empolgado

fiquei quando encontrei no Arquivo digital

do Município de Lisboa, durante as minhas

deambulações noturnas de nerd, uma

fotografia precisamente de Torres, ‘O Bom

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Gigante’, no campo do Chedle-Rovers, em

preparação para o Mundial, rodeado de

jovens adeptos, vestido com um esplêndido

fato de treino das Quinas e calçado com

umas icónicas Adidas azuis. A decisão estava

tomada!

No dia seguinte, para lá do trabalho

que tento despachar em meia dúzia de

horas, a minha mente já só mantém o foco

naquele que seria o trajeto a adotar no

final da tarde. Decido tomar as ruas que

partem da zona universitária, levando-me

à Glasgow Central e, daí, à zona de Mount

Florida, e, pelo caminho, vejo dezenas de

adeptos, tanto da casa como dos forasteiros,

divididos entre vários grupos de amigos, na

sua habitual pândega. Chegado à Estação

Central, o burburinho vai aumentando até se

tornar num ensurdecedor festival de cantares

que, ao longe, não consigo distinguir. Mais

perto, apercebo-me que, na verdade, não

são apenas os escoceses que fazem a festa;

também os norte-irlandeses fazem-se sentir

na mesma gare onde todos esperamos pelo

transporte. A pouca polícia tenta garantir

que tudo corre bem, mas os adeptos não

estão muito interessados na sua ajuda –

eles próprios tratam de garantir o espaço e

a segurança de uns e outros, mesmo sem

abdicarem do exercício ritual que envolve

provocações mútuas. No apertado espaço

interior da carruagem, dado a imensidão de

gente que toma o comboio, os adeptos de um

e outro lado vão trocando cânticos repletos

de ironia. Se os escoceses vociferavam “small

part of Ireland, you are just a small part of

Ireland”, os norte-irlandeses respondiam com

um “small part of England, you are just a small

part of England”. No final, mesmo antes de

chegarmos ao destino, todos eles terminam

a cantar o hino do Reino Unido em uníssono.

Já perto do estádio, encontramos banquinhas

muito concorridas onde se vendem pins

raros e as habituais roulotes de comida –

aqui não se servem bifanas ou torresmos,

mas sim as famosas scotch pies recheadas

de carne e aprimoradas com pimenta preta.

Cá fora ainda, o movimento era considerável

e todos os passos eram coordenados bem

de perto pela polícia escocesa, alguns deles

montados nos seus ‘colegas’ cavalos. Depois

de uma longa fila, lá conseguimos aceder ao

Hampden.

A primeira coisa que reparo é que a

sua disposição arquitetónica – um só grande

piso desnivelado num recinto oval bem

coberto – mais do que dar a impressão que

o estádio está a abarrotar (o que estava longe

da verdade), permite uma imersão diferente

graças à acústica. Talvez assim entenda

melhor o mito em torno do ‘hampden roar’ e

o porquê da expressão ‘what’s the hampden?’

se ter tornado tão popular entre os escoceses.

E, estando presente, só posso dificilmente

imaginar os quase 130 mil espetadores que

lotaram este mesmo recinto na final da Taça

dos Campeões Europeus de 1960, que opôs

Real Madrid e Eintracth Frankfurt. Afinal de

contas, depois das sucessivas reduções da

capacidade do estádio durante os anos ’70

e ’90, a primeira provocada pelo Safety of

Sports Grounds Act de 1975 e a segunda

motivada pelo investimento estatal que

transformou radicalmente vários estádios no

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Reino Unido, hoje em dia a capacidade não

passa dos cerca 51 mil, sendo que este jogo

em particular não esgotou. Entretanto, lá tive

que me sentar depois de um steward ter feito

questão de me levar ao lugar destinado, de

forma simpática, um gesto que me pareceu

recorrente por aqui.

Voltando à partida, os da casa

fazem-se ouvir em vários momentos até

ao golo solitário de Conor Bradley, perto da

meia-hora de jogo, que daria a vitória aos

forasteiros. Daí em diante, a festa pertence

apenas aos norte-irlandeses, colocados na

zona oposta onde me encontro. O futebol

aborrecido entre as duas seleções era no meu

setor apenas ali e acolá motivo de atenção e

de ânimo. Um desses momentos é quando

um dos jogadores escoceses varre o seu

adversário numa entrada que, assim creio,

só não lhe valeu o cartão vermelho porque

isto era um amigável. Contudo, o jogo não

dava para mais e o frio gélido não ajudava. Os

únicos que não pareciam muito preocupados

sobre o desenrolar da partida eram os mais

jovens. Observei vários grupos de crianças e

de adolescentes, bem vestidos com as suas

Stone Islands ou com os seus North Face de

tamanho XXS, muito mais interessados em

garantir que a noite fora de casa a um dia da

semana valeria a pena. Mal se dá o apito final,

faço-me rapidamente ao caminho, imitando a

multidão presente.

No dia seguinte, com umas horas

por aproveitar, decido perceber, entre a

moda e a literatura, o que posso afinal levar

desta cidade cinzenta para Lisboa. Após uma

rápida pesquisa, apercebo-me que tenho

duas lojas interessantes perto de mim:

a Bocca 10 e a 80’s Casual Classics! Se a

primeira se concentra sobre os dois grandes

da cidade, sobretudo com tees que fazem

referência à Taça dos Campeões Europeus

ganha pelo Celtic em 1967 no Jamor e à

Taça das Taças arrecadada pelo Rangers em

1972 no Camp Nou, a segunda abrange tudo

aquilo que muitos de nós tanto adoramos

nesta cultura. Dos vinis às fanzines, passando

pelas diferentes marcas tão conhecidas nas

bancadas. A Weekend Offender dominava a

loja, mas poderíamos ainda encontrar peças

da Lyle & Scott, Ellesse, Sergio Tacchini,

Barbour, Aquascutum, Fila e Diadora. Um

paraíso que, quanto a mim, é adocicado pela

compra de um pequeno livro intitulado The

Little Book of Casuals – Football Fashion from

the 1980s.

Para terminar esta viagem, dirijo-me

por último à Calton Books, por estas bandas


conhecida como the best radical bookshop

in the world. Não estava com expectativas

informadas, mas de qualquer forma essas

hipotéticas expectativas não fariam jus ao

que aqui encontrei, especialmente tendo

em conta as imensas ligações que por aqui

se faz ao mundo da bola. Logo de entrada,

somos esclarecidos quanto à solidariedade

para com o povo palestiniano através dos

imensos cachecóis pendurados à venda.

Depois de alguma procura, deparei-me com

uma outra peça à qual não poderia resistir:

o primeiro número da fanzine Levelling the

Score, coordenada pela FLAF (Football Lads

& Lasses Against Fascism), com uma capa a

preto e amarelo a fazer tanto referência visual

à marca Fila como ao icónico pontapé de Eric

Cantona a um xenófobo adepto adversário.

Em conversa com o dono da loja, um senhor

de meia-idade com raízes familiares na

Irlanda e simpatizante do Rangers, este

revela-me que, em bom rigor, faz parte

da FLAF e que acabo de lhe levar o último

número disponível. Segundo me conta, o

segundo número da fanzine só vai sair daqui

a uns meses e convence-me ainda mais

dos tópicos aí tratados – das comunidades

adeptas do Stella Rossa, do Clapton CFC e

do FC United of Manchester ao trabalho de

ativistas boleiros, como é o caso dos Leeds

Anti-Raids Action. Despeço-me e vou de alma

(e de mala!) cheia. Porque, afinal, os jogos

aborrecidos são sempre o menos importante.

Por Daniel Freire Santos

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UMA MARATONA INTERNACIONAL

A aventura começou na véspera

do derby de Roma, viajei de madrugada do

Porto para Lisboa e por lá fiquei até ao final

da tarde. O voo rumo à Cidade Eterna atrasou

e já me aguardavam com alguma impaciência

no aeroporto. Após um check-in relâmpago

no local de estadia, dirigimo-nos à Sede dos

Ultras Lázio, onde ultimavam os estandartes

para a coreografia do dia seguinte, ou no

caso, do próprio dia, visto já passar da meianoite.

Conhecia alguns pormenores da Sede

através de fotografias, mas presencialmente

pude comprovar que é bastante diferente do

que pensava. Sendo os Laziali historicamente

bastante atentos à questão estética,

imaginava a sua Sede bastante estilizada, em

jeito de boutique, mas nada disso. Pinturas

manuais, tudo muito cru, o essencial está

lá, mas não é um bar para socializar ou um

hostel para pernoitar. Ali é para trabalhar e

formar Grupo!

Já pela madrugada dentro alguma

malta foi descansar, eu incluído, uma vez que

um par de horas mais tarde (literalmente)

era hora de concentrar, novamente, na Sede.

Ainda me questiono como acordei, pois nem

de adormecer me recordo, muito menos de

ouvir o despertador, no entanto pelas 7h lá

estávamos. Algumas dezenas de Ultras Laziali,

uns quantos deles figurões históricos, estavam

ali a coordenar os materiais que faltavam

transportar para o estádio. Também por lá, um

grupo considerável de Ultras do Málaga, uma

das mais recentes amizades dos Ultras Lázio.

Seguimos caminho para as imediações da

entrada da Curva Nord do Olímpico de Roma e

ali estaríamos umas 120/130 pessoas. Muito

curioso ver as várias gerações ali presentes

e observar os comportamentos/dinâmicas.

Neste particular, mesmo estando Itália sob

uma repressão fortíssima e que já dura há

bastantes anos, estamos a anos luz deles. Por

ali ficamos pouco mais de uma hora, ambiente

algo tenso, mas sempre com algumas

gargalhadas e malta mais extrovertida que ia

desanuviando o ambiente. Neste entretanto,

ia havendo algumas comunicações por

parte de um dos responsáveis que ia dando

conta das possíveis movimentações do

lado Romanista. Para quem não tem ideia,

obviamente que na entrada da Curva Sud

do Olímpico estaria igualmente um Grupo

a ultimar as suas coreografias e a aguardar

por uma possibilidade para confrontar-se

com os Laziali. Nos dois derbies anteriores,

primeiro por parte dos Laziali e depois por

parte dos Romanisti, houve uma investida

em zona neutra, em busca de confronto,

confronto esse que, quase há duas décadas

não ocorria. Naturalmente refiro-me a

confrontos em números consideráveis e de

grande escala. Apesar de optimistas que este

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seria o dia em que iria acontecer, alguma

dezenas de Laziali não se mobilizaram para

a zona neutra, estaríamos uns 80/90 e bem

preparados para uma batalha, diga-se. Com o

avançar da hora, quer Digos, quer Carabinieri,

já estavam na avenida adiante de nós e que

nos separava do local onde os Romanisti

poderiam aparecer. Já um pouco cansados

de esperar e com a esperança a desvanecer,

alguma malta mais radical já ponderava

avançar até ao lado deles, no entanto isto

seria diffida ou agravamento da diffida (sim,

muita malta com diffida não fica em casa,

continua a viver o Grupo intensamente)

pela certa e um dos responsáveis teve de se

impor e meter alguma água na fervura. Meio

que desanimados começamos, devagar, a

dirigir-nos para o carro e eis que se começam

a ouvir berros! Eram eles, os Romanisti

também apareceram e em grande número

(certamente mais uns 30 do que nós), bloco

escuro, coeso, todos em marcha, bastante

imponente! Mas a malta da Lázio não tem

fama de ser violenta por acaso e avançou a

todo o gás para cima deles, sem hesitações.

Nos minutos que se seguem não há palavras

que possam descrever o que se vive,

adrenalina no máximo, fumo intenso, bombas

a rebentarem consecutivamente, tochas,

garrafas, paus, ferramentas, pedras, tudo pelo

ar! O confronto foi intenso, com momentos

de superioridade e feridos para ambas as

partes. Os efeitos do gás lacrimogéneo já não

eram suportáveis e fomos forçados a recuar

85


86

e poucos instantes depois a sair dali para

evitar mais identificações ou detenções. O

tão desejado confronto aconteceu, o maior

em quase duas décadas e para muita daquela

malta, o maior que tinham vivido contra os

maiores e mais odiados rivais.

Juntamente com a malta que me

é mais próxima, foi momento de reunir num

dos Rione históricos Romanos, por toda a

Itália designam-se por Quartiere (bairro),

excepto dentro dos muros de Roma, local

onde têm a designação de Rione. Enquanto

tomávamos o pequeno-almoço e de forma

comedida, íamos partilhando algumas

curiosidades, uma coisa que apreciei bastante

foi que, contrariamente ao que acontece por

cá, ali ninguém gosta de espalhafato, nem se

acha maior que ninguém, não presenciei uma

única pessoa a dizer que fez isto ou aquilo,

mentalidades… Entretanto começavam a

surgir as primeiras filmagens dos confrontos,

assim como fotos das apreensões feitas no

rescaldo, por parte da polícia, um misto de

gargalhadas e surrealismo.

Apesar de ainda ser cedo, o tempo

não parava e estava na hora de seguir até

à zona dos bares próxima de Ponte Milvio,

local onde a malta da Lázio se reúne antes

dos jogos. Por ali ficamos umas boas horas

e tive o prazer de ver em pessoa, gente com

muitos anos de militância no movimento.

Pessoalmente esperava um ambiente mais

tenso nas ruas, nas horas que antecederam o

jogo, mas o que havia para acontecer, já tinha

acontecido de manhã e entre fumos, tochas,

frases e cânticos anti-Roma, dos milhares que

ali pairavam, a corda do Grupo é bem selecta

e pouco dada a espectáculos. Apesar de

ainda faltarem umas horas para o jogo, era o

momento de nos despedirmos dos diffidati e

rumar ao estádio, pois a entrada para o derby

é um espectáculo dentro do espectáculo.

Sem entrar em grandes pormenores, tive a

sorte de entrar com um Top Boy e de tudo

ter corrido bem, mas há centenas de pessoas

a tentarem entrar desesperadamente na

Curva, com bilhetes para outras bancadas. Os

portões paralelos aos torniquetes parecem

saídos de um cenário de guerra, onde vão

distribuir bens alimentares, surreal! Já dentro

e após uma passagem pelo bar, foi tempo

de tirar o pulso às bancadas do Olímpico. Já

havia tido o prazer de lá estar a ver o meu

Clube e a imponência deste estádio é de tirar

o fôlego. Num dia de derby, a jogar fora e

já com as bancadas bastante compostas, as

sensações, naturalmente, não ficam nada

aquém. Aqui a tensão já é palpável, a espaços

lá saía uma assobiadela monumental seguida

de um cântico, sempre

que se ouvia o speaker

ou que tocava uma

música afecta à Roma.

Com o

jogo a aproximar-se

a coreografia estava

praticamente pronta

a ser exibida, neste

particular os Laziali

costumam estar uns

furos acima dos rivais,

o que lhes dá motivos

para dar gozo nos

dias que se seguem

ao derby. Centenas

de estandartes

espalhados pela

Curva Nord, tudo

handmade, com

motivos e expressões

típicas dos Laziali ao

longo dos anos, uma

tela gigante com uma

criança equipada à Lazio e a escrita “W la

Lazio”, feita com cartolinas azuis e brancas.

Talvez o espectáculo coreográfico menos

aparatoso dos últimos anos, mas só quem

vive um Grupo e participa nestas actividades,

sabe e entende o quão difícil e especial é

fazer algo assim, mais ainda com a mensagem

subliminar existente nesta coreografia.

Ao intervalo todos os Grupos

retiraram faixas e panos, uma vez que tinham

sido detidos alguns elementos presentes


nos confrontos dessa manhã e como tal,

impedidos de ir ao jogo. Até me admiro por

não terem tentado esvaziar a curva. Percorri

a Curva praticamente de lés-a-lés durante

o jogo, infelizmente não celebrei um golo,

houve um mas foi invalidado e pude fazer

uma apreciação o mais isenta possível do

tifo vocal da Curva da Lázio. Sendo bastante

exigente neste quesito, admito que esperava

mais, ainda por cima jogando fora e estando

presente na Curva gente de outros pontos

como a Tribuna Tevere. As dinâmicas na

Curva Nord são

complexas e apesar

de já não existirem

os Irriducibili, pareceme

haver ainda uma

sombra bastante

grande do que este

Grupo e a sua figura

de proa foram no

movimento. Ter uma

personalidade tão

vincada e um culto

de líder tão grande

deixam marcas

indeléveis e mesmo

com muita gente

capaz a levar o novo

Grupo para a frente,

há um peso histórico

difícil de suprir e que

ora gerará fracções,

ora gerará um certo

desencantamento.

Estou certo que as

novas gerações, aos poucos, poderão levar

a Curva a outros níveis, vi gente com uma

dinâmica incrível e muito apaixonada por

aquilo que representa ser Ultra. É esperar

que se consigam manter e não sejam vitimas

da repressão ou de outras situações nefastas,

as quais volta e meia pairam neste meio.

Finda a partida e com uma derrota

por 1-0 frente aos maiores rivais, a equipa foi

prontamente despachada para os balneários

pela Curva e o ambiente não podia ser de

festa, arrumou-se o que havia para arrumar,

agrupou-se até ser altura de retornar a Ponte

Milvio e por aí se ficou a comer, beber e

desanuviar um pouco antes de regressar a

casa. Não havia corpo, nem espírito para

festas, os níveis de dopamina estavam no

casco, aquela malta vive o derby como se

fosse a última coisa que vão viver na vida.

Privação de sono, de alimentação decente,

muito trabalho, tensão constante, tudo o que

não seja a Lázio e o seu Grupo ficam para

segundo plano.

Nos dias que se seguiram passei

belos momentos, os quais guardarei e

agradecerei para sempre, com pessoas

espectaculares e que me fizeram sentir como

um dos seus.

O relaxamento de quem tem tudo

sob controlo numa manhã de Segunda-feira,

foi rapidamente substituído pela adrenalina

de quem tinha percebido que precisava de

fazer o check-in de um voo para Manchester

e… tinha deixado o passaporte no Porto!

No espaço de uma hora tive de fazer um

replaneamento de viagens e de gastos para

conseguir cumprir todo o itinerário que

tinha delineado. Com mais ajuste, menos

ajuste, alguma correria e mais uma ou outra

peripécia pelo meio, lá voei de volta para o

Porto e como o Leeds x Sunderland seria na

Terça-feira à noite, lá me safei. No entanto,

o plano do dia seguinte seria no limite, tinha

uma escala para fazer em Munique e um

comboio para apanhar em Manchester e

para ambos tinha uma margem a rondar uma

hora. Tenso! Até me sentar no comboio em

Manchester não houve grande relaxamento,

mas assim que o consegui, percebi que ia

conseguir estar em Elland Road a tempo

do jogo e fiz questão de retribuir todo o

“carinho” que os meus amigos me foram

dando desde que souberam da peripécia (sou

pródigo neste tipo de situações), mas lá me

vou safando.

Da estação tive de parar

rapidamente onde iria pernoitar, para deixar

a mochila, uma vez que não há bengaleiros

87


e desde os atentados, muita coisa mudou

a nível de permissividade. Pouco depois

chegava a Elland Road e estava um dia

tipicamente Britânico, cinzento, a chuviscar,

um vento de levar povo pelo ar, tudo normal.

Foi sacar umas fotos nas imediações para

recuerdo, comprar um cachecol à maneira

e entrar no estádio. Torniquetes daqueles

de partir ossos e aí estava eu na Don Revie

Stand (ex-KOP). Estádio lotado, com grande

atmosfera, instantes antes de entrarem as

equipas. À terceira lá fui em definitivo para

o meu lugar, tinha tentado dois spots que

me pareciam mais porreiros, mas a malta

não facilita nestas coisas e lá fui eu para o

lugar que me estava designado. Entrada das

equipas, cachecóis abertos e soa o Marching

on together, hino do Leeds United. Foi

cantado a plenos pulmões e não desiludiu.

O sector visitante estava à pinha, a malta do

Sunderland (uns 3000/3500 certamente), em

especial na primeira parte, fez muito barulho

e apoiou constantemente a sua equipa. Jogo

algo morno, o Leeds tinha conseguido uma

escalada impressionante até ao primeiro lugar,

mas já tinha vacilado duas jornadas antes e

começava a dar sinais de intranquilidade.

Garganta seca, a sede apertava e não podia

esperar pelo intervalo, caso contrário não me

ia safar. Lá fui até à sala onde podem servir

cerveja com álcool e por lá vi os últimos

minutos da primeira parte, ao sabor de uma

bela Guinness. Passado o intervalo e com

o Leeds a atacar para o lado contrário, foi

quando na North Stand começaram a puxar

dos galões, grande apoio! Muitos cânticos

históricos e em especial até perto dos 70

minutos deu gosto. A partir daqui e apesar

do Leeds decidir muitos jogos nos últimos

minutos, começou a pairar o fantasma de um

resultado negativo e o apoio ressentiu-se. O

feeling tinha razão de ser e o resultado foi um

0-0, com este empate o Leeds passava para

3º e ficava dependente de uma escorregadela

do Ipswich ou do Leicester nas últimas

jornadas. Apesar de, mais uma vez, não me

ter sido possível festejar um golo, Elland Road

foi o melhor estádio onde estive em Inglaterra

e voltarei, certamente, para outras aventuras.

Mesmo não se jogando a Premier League, as

regras são apertadas e o próprio povo não

vacila lá muito. No entanto, em Leeds ainda

privilegiam os adeptos e é notório no tipo de

pessoas que vão ao estádio. Considero-me

exigente e em Leeds nada me desapontou.

No final e debaixo de um tempo maravilhoso,

88


lá fui até ao pub que está na parte externa

do estádio e bebi mais uma bela cervejola,

enquanto apreciava o povo local e os seus

costumes, uma última vez. Não acabei sem

um hamburger de roulotte e uma caminhada

até ao spot onde iria pernoitar.

No dia seguinte, pela manhã, fui

fazer a visita guiada ao estádio e se houvesse

dúvidas, ficariam esclarecidas, o Leeds é

um Clube com história, mas permanece um

Clube humilde e muito direccionado para

o seu povo. Terminei o passeio a almoçar

nas imediações, no histórico pub The Old

Peacock, fundado a 1842 e intrinsecamente

ligado à história do Leeds United e dos seus

adeptos.

Estava na hora de seguir para

Manchester, cidade que já vou conhecendo

e que tem alguns dos meus artistas favoritos

da cena musical. Além de ser um hub de

ligação a Leeds e Liverpool, cidade para

onde seguiria na manhã seguinte, tem uma

noite interessante, com belos spots para

comer e beber, além de que aproveitei para

me encontrar com um velho Amigo e matar

saudades.

Manhã seguinte e com menos sono

do que seria ideal, lá fui para Liverpool, fazer

a visita guiada a Anfield Road. Neste mesmo

dia iria acontecer o Liverpool x Atalanta

para a primeira mão dos Quartos-de-final

da Liga Europa, pelo que a visita nestes dias

é um pouco mais limitada, por imposições

da UEFA. Apesar do scouse accent, foi-me

possível entender praticamente tudo, mesmo

o sentido de humor característico dos locais,

diria mesmo que o guided tour foi o ponto alto

da minha passagem por Liverpool. Terminada

a experiência, rumei ao centro, o qual se

encontrava com bastante gente da Atalanta.

Por lá almocei e bebi uns copos, os pubs

estavam animados e o pessoal da Atalanta,

mesmo a malta do Grupo que comanda a

curva, todos muito ordeiros. Saí com alguma

antecedência para apanhar um autocarro

para o estádio e tive alguma dificuldade, não

estivesse a chover por esta altura e tinha

arriscado a caminhada. Por sorte lá me safei

e cheguei mais do que a tempo de ir a vários

pubs, todos nas imediações do estádio, cada

um com a sua especificidade, mas nenhum

me encheu as medidas. Já mais do que bem

bebido, lá me aventurei a entrar na famosa

The KOP Stand de Anfield Road. Tive de fazer

um bom malabarismo à Portuguesa com o

bilhete que tinha comprado numa plataforma

89


e gostava de dizer que valeu cada cêntimo

dos muito pagos por ele. Apesar de não ter

qualquer arrependimento, Anfield Road foi

a minha primeira deslocação Europeia para

seguir o meu Clube, no já algo longínquo

ano de 2007 e como tal, tinha uma magia

especial para mim. Desta feita, ainda mais

pois ia estar na mítica KOP, sem ilusões, sei

bem o que foi o futebol e o que é o futebol,

mas esperava manifestamente mais. Muita

gente prefere fazer o que fizeram para que

conseguisse o meu bilhete, ou seja, vendem

os seus lugares em plataformas paralelas

e com isso conseguem fazer autênticas

fortunas. Se por um lado, sem isso, não teria

a possibilidade de ir ao jogo, por outro, um

exacerbar desta actividade leva a uma perda

considerável daquilo que é o ambiente

genuíno destas bancadas e foi exactamente

isso que aconteceu. Ambiente absolutamente

miserável nas bancadas e a pior exibição da

época por parte do Liverpool, que deste jogo

em diante caiu de uma forma descontrolada

a nível exibicional. Se quisesse romantizar um

pouco, poderia dizer que estava com o pé

frio, chegaram-me pedidos de alguns amigos

para ir ver outros jogos, tal o mau agoiro que

a minha presença representava. De positivo,

porque há sempre algo de positivo, o festival

dos Bergamaschi nas bancadas de Anfield

Road. Vitória histórica (0-3) e um apoio

daqueles! Desde que as históricas figuras

decidiram pôr término à velha Curva Nord,

que olhava um pouco desconfiado para a

nova realidade do movimento em Bergamo,

a bem da verdade ainda olho, mas está-lhes

no sangue saberem apoiar a sua equipa e até

ao fim desta época fizeram-no bastante bem.

Veremos como serão os próximos anos…

Aguentei no estádio a ver o

espectáculo Atalantini até ao limite, pois

tinha hora agendada para um uber não muito

longe e dava margem. Claro que não seria

uma aventura minha, se não tivesse mais uns

sustos. Fora do estádio, fruto do aglomerado

de povo, não havia internet, ou seja, não tinha

como saber onde estava o meu uber. Lá fui

meio aflito e com cada vez menos bateria, a

um pub próximo e que tinha wi-fi e ao fim de

uns instantes, consegui saber do uber, mas os

percalços não ficavam por aqui. Várias ruas,

habitualmente abertas, estavam fechadas e

como tal, o trânsito estava absolutamente

caótico o que me fez ponderar sair do uber

e correr quase 4 kms! Tudo isto porque tinha

deixado a minha bagagem, essa manhã, na

90


estação e tinha de a levantar até às 22:45h.

Fui aguentando e explicando ao motorista

a necessidade que tinha em chegar até

determinada hora e tive a sorte de ele forçar

um par de semáforos. Cheguei 1 minuto

depois da hora e a porta já estava fechada,

o funcionário fez-me esse sinal, mas deve ter

percebido pela minha expressão que me tinha

esfalfado para chegar ali e que a mochila fazia

mesmo falta e mais uma vez, lá me safei. Ao

final de 10 minutos ali plantado, abriu-me a

porta. Cerca de uma hora mais tarde lá segui

no comboio para o aeroporto de Manchester,

de onde iria levantar voo às primeiras horas

da manhã com destino a… Roma. Sim, voltei a

Roma para mais um jogo.

Em contraste com Inglaterra, Roma

estava solarenga e quente. Nesse dia jogarse-ia

o Lázio x Salernitana, jogo com pouco

interesse a nível de calendário, mas que

me permitira viver uma experiência extra

derby onde tudo está multiplicado por mil

e também ver uma tiffoseria muito decente

do lado oposto. A nível de locais a ir antes do

jogo, foi em tudo semelhante, infelizmente

o jogo foi a um dia de semana e como tal,

as pessoas aparecem mais perto do final da

tarde nos arredores de Ponte Milvio. Também

infelizmente, trasferta vetada aos tiffosi

Salernitani o que condicionou o ambiente de

estádio. Do lado da Lazio, os Ultras estavam

em protesto depois da derrota no derby e iam

passar a primeira parte em silêncio ou apenas

a entoar cânticos de descontentamento

com a equipa e em especial com Lotito

o tão odiado Presidente. Acabou por ser

assim todo o jogo, apesar de terem goleado

(finalmente não aportava azar), passaram o

jogo a insultar e fazer uso da goliardia para

com os jogadores e justiça seja feita, até teve

momentos melhores que o próprio derby.

No final voltaram a mandar os jogadores

recambiados para o balneário. Terminado

o jogo, jantamos uma última vez por Ponte

Milvio, bebemos uns copos e deu para rir

um pouco das peripécias que tinha vivido.

Terminei a minha aventura, um par de dias

mais tarde, uma vez mais, muito bem regado

e em óptima companhia!

Por Sérgio P.

91


Recentemente, a 12 de maio, o

Vitória Sport Clube voltou a defrontar o seu

eterno rival. Desta vez foi a nossa vez de

abrir a fronteira para receber a caravana que

se deslocou desde o deserto marroquino

para visitar o Berço de Portugal. Aproveito

a alfinetada anterior para mencionar que,

ao contrário do que sucedeu na primeira

volta do campeonato, desta vez não houve a

desejada picardia nos dias que antecederam

o jogo.

Não é novidade para ninguém

que este tipo de jogos são vividos como

verdadeiras finais, onde os adeptos de

ambos os clubes fazem de tudo para estarem

presentes ao lado da sua equipa. Porém, hoje

em dia, já não são apenas os adeptos das

duas equipas que tentam estar presentes.

Este jogo tornou-se numa referência para

os adeptos portugueses, mas também é

procurado por adeptos de várias partes da

Europa.

Para ver este confronto histórico

estiverem presentes 25224 adeptos no

Estádio D. Afonso Henriques, dos quais pouco

mais de 1500 eram afectos ao clube visitante.

Como adepto do clube da casa, penso

que vale a pena dizer que é um número

pequeno, mas sei que não havia mais bilhetes

disponíveis. Isto é o espelho e consequência

da posição que o Braga implementou,

disponibilizando apenas 5% dos bilhetes aos

clubes visitantes e depois, no seu turno, esses

clubes reagem da mesma forma. Para o ano

muito provavelmente será igual, até que haja

coragem e vontade para travar este ciclo.

Sobre o pré jogo o habitual, muita

gente na rua, nos cafés e um pouco por

toda a parte. É dia de batalha e a cidade de

Guimarães veste-se de preto e branco para

apoiar o emblema da terra. Ainda sobre

esta parte, dou nota de mais uma vez a PSP

impedir os adeptos da casa de receber a

equipa do Vitória, afastando-os vários metros

sem se perceber o porquê.

O jogo começou com um show

92


de pirotecnia dos White Angels, ocupando

praticamente toda a frente da bancada sul

e também por cima de duas das entradas.

O maior destaque vai para os dois ultras

munidos de “baterias” que disparavam muitas

dezenas de foguetes. Na bancada nascente

foi apresentado um tifo, criado pelos Insane

Guys e Gruppo 1922. Consistia num mosaico

que formava uma bandeira de fundo branco

com uma cruz preta. Pouco depois, viramos

a face da folha e surgiu a bandeira e a cruz

com as cores invertidas. Foi algo pequeno

e muito simples, mas, tendo em conta as

condicionantes impostas pela Lei e que foi

tudo preparado em meia hora, acho que foi

uma boa “memória”.

Ao longo do jogo continuaram as

sessões de pirotecnia em todos os grupos.

Penso que foi o derby, entre estas equipas,

com mais pirotecnia até hoje. Sobre o

apoio é muito subjectivo estar a avaliar,

principalmente para quem está inserido

num grupo, pois limita a percepção que

temos dos outros grupos. Claro que posso

dizer que os grupos da nascente, onde me

situo, estiveram bastante activos e com bons

momentos. O Estádio D. Afonso Henriques

enriquece o derby, pois aqui é possível ver

todas as bancadas e todos os adeptos, ao

contrário do que acontece em Braga, o que é

um pormenor muito importante.

No final o resultado foi desfavorável

para o meu Vitória, com um golo dos visitantes

aos 93 minutos que fixou o marcador em 2 - 3.

Em jeito de reflexão, nos tempos que

correm, com as proibições que existem, é

muito saudável ver um tifo feito de forma

independente. A isto, associo as várias

93


94

tochadas de todos os grupos, os panos com

os símbolos principais de vários grupos e a

faixa, dividida por letras, da Bracara Legion.

Também podia dizer que havia muitos panos

e bandeiras dentro da medida imposta de 1

metro por 1 metro mas, sem lhes tirar valor,

é mais importante destacar os elementos do

passado Ultra que estiveram presente em

Guimarães. Elementos que, contra muitas

leis, muitas vontades, muita repressão e

censura, os Ultras teimam em não abdicar.

É bom quando nos sabemos adaptar às

realidades impostas pelo Estado mas, quem

vive o compromisso, sabe que adaptar não é

conformar.

Termino dizendo que, para além

dos pontos já falados que vão encher os

bolsos da Liga com o dinheiro das multas,

este foi um jogo que decorreu sem incidentes

entre adeptos das duas equipas.

Por J. Lobo

“Il derby per i tifosi è una questione di vita o

di morte”

A tão esperada semana estava

finalmente à vista. Se a ânsia por uma batalha

com os “Nuestros Hermanos” não bastasse

por si só, as condicionantes desportivas

provenientes do desenrolar do campeonato,

que não passam de um fator secundário,

prometiam elevá-lo para um patamar ainda

maior.

À entrada para a 33ª jornada, a

tabela classificativa apimentou o derby, uma

vez que as duas equipas iam disputar entre

si o 4º lugar no campeonato, mantendo

viva a esperança de ainda poder alcançar o

pódio. Se efetivamente o derby nunca se irá

basear numa posição classificativa sendo

sempre o embate mais intenso do ano,

imaginem adicionar o fator classificativo em

cima. Uma vitória em Guimarães, não só

eliminava as esperanças do nosso eterno rival

atingir o 4º lugar e assim podendo terminar

o campeonato à nossa frente, naquela que

foi provavelmente a sua melhor época nos

últimos anos, como ainda nos possibilitava

de sonhar com a chegada ao pódio na última

jornada em casa.

Posto tudo isto, aquilo que se iria

disputar dentro das 4 linhas era gasolina

extra para aquele que iria ser o último derby

do Minho da época desportiva. Mas falemos

agora do verdadeiro futebol, as bancadas.

O Sporting Clube de Braga abriu as

bilheteiras para o jogo sexta-feira dia 3, sendo

que em apenas 2 horas após a abertura a

massa associativa bracarense esgotou os

cerca de 1100 bilhetes disponibilizados. O

embate contra o nosso rival a combinar com

os fatores do jogo ser disputado a um sábado

assim como a luta pela posição classificativa

provocava uma alta expectativa em todos

os bracarenses que prometiam mais uma

grande invasão.

Estranhamente, ou não, a semana

que antecedeu o derby acabou por ser calma,

sem grandes registos, apenas à espera de


eventualmente alguém sentir o dever de

alguma resposta ou que surgissem iluminados

com o seu atrevimento momentâneo que

depois se esbarram com a realidade, espera

essa, diga-se semelhante, como andar numa

rotunda às voltas, isto se conseguirmos

sequer chegar à rotunda claro. A verdade

é que provavelmente não havia registo

fotográfico com uma pose digna o suficiente

de uma partilha.

Os preparativos para a transferta a

Espanha foram intensos. Muito planeamento

e aprimoramento de detalhes com o objetivo

de termos a organização delineada para que

tudo corra na perfeição em prol do nosso

Grupo e da nossa missão: elevar e servir o

Sporting Clube de Braga.

Chega por fim o dia, e já nas

primeiras horas da tarde, o habitual

aquecimento, com a cerveja e os cânticos a

acompanhar, começaram a criar o ambiente

de derby, que se iria prolongar com grande

intensidade até à chegada a Guimarães.

Uma vez no setor visitante,

começamos, com a colaboração e espírito

digno de um Grupo Ultra, a pôr o planeamento

em prática, exibindo na rede instalada no

setor visitante, a nossa faixa principal recriada

em 8 peças de plástico 1x1.

Desde o primeiro rolar da bola, a

curva bracarense fez-se ouvir alto e em bom

som e se o golo caseiro não calou as nossas

vozes, o empate ainda antes do intervalo

contribuiu para uma prestação de bancada

ainda mais efusiva.

Na entrada para os segundos 45

minutos, há que salientar o acender das

velas realizado pouco depois do minuto 65.

A simbiose entre a faixa improvisada, o apoio

vocal mais as tradicionais velas acendidas na

primeira fileira atrás das letras, que formavam

a faixa, em conjunto com as restantes

espalhadas pelo setor ocupado pelo Grupo

com duas tarjas expostas no centro que juntas

formavam “GUIMARÃES MERDA” tornaram

aquele momento e aquelas imagens num

expoente máximo do que é ser Ultrá. Uma

imagem representativa do que constitui os

ULTRAS BRACARA LEGION 2003. A vontade

de tifar na bancada aliada à organização e

colaboração de todos os membros conseguese

o melhor dos resultados. Afinal de contas,

nos tempos mais oprimidos que já se viveu

pelas bancadas portuguesas, quando o

espírito Ultra se sobrepõe às adversidades

criadas e às desculpas de quem sobrevive

agarrado a elas, o resultado fica à vista de

todos. É como nos identificamos como Grupo

Ultra, e daí a designação usada… somos ultras

não “claqueiros”. Que seja sempre assim,

viver para servir o Sporting Clube de Braga e

nunca para nos servirmos dele.

Como se não bastasse a prestação

de bancada por terras espanholas estar a ser

notável, como habitual, eis que aos 75 minutos

surge o segundo golo. Ora, entre todos os

bracarenses a opinião foi consensual. A forma

como, após toda aquela expectativa criada

devido à confirmação da legalidade do golo

pelo VAR, aqueles 11 jogadores mais o banco

tiveram a reação espontânea de “desatar” a

correr para o setor visitante expelindo toda

aquela garra e euforia de estar por cima do

nosso eterno inimigo foi algo que já não era

vivenciado à muito tempo e do qual não só

tínhamos nostalgia, como nos identificamos

a 200%. Só assim faz sentido! No entanto, a

loucura viria a esfriar instantes depois após o

empate dos da casa.

Se todo aquele cenário desde o

aquecimento antes do jogo, o festival de

bancada durante o mesmo, e a intensidade

dentro do campo já tornava este derby num

dos melhores já presenciados pessoalmente,

95


o golo da vitória marcado nos descontos foi o

descalabro total! Aquele descontrolo de nem

se saber como e para onde festejar…

Vencer era o cenário ideal, mas

que adjetivação se pode arranjar para uma

vitória no derby fora de portas, com um golo

nos descontos, após mais um festival de

bancada e que elimina todas as hipóteses do

nosso eterno rival ficar à nossa frente, bem

como mantendo em aberto o terceiro posto?

Impagável!

Ganhar o jogo, forte apoio vocal

dos grupos bracarenses assim como dos

associados, pirotecnia, tifo de bancada e

militância no seio do grupo, em suma, o

significado de um dia perfeito.

O derby de dia 11 de maio ficou

assim marcado por mais um recital do que é

ser Ultra e da forma como nós bem gostamos,

sem a necessidade de dependência e sustento

de todos esses holofotes e mediatismos.

Andar à procura da reputação fornecida por

todos os brochistas que passeiam nos dias

de hoje na esfera do movimento e do futebol

passa-nos ao lado. Trata-se de seguir uma

causa e cumprir o nosso dever até porque

não sabemos nem queremos estar de outra

forma. Sabemos que não se pode respeitar

e admirar o que se desconhece, mas temos

a certeza que há quem entenda a nossa

postura.

O derby é uma questão de vida ou

de morte, e este foi sem dúvida dos melhores

da minha vida!

Num estado social ineficaz e incapaz

em todas as suas componentes, os Ultras são

o bode expiatório de uma manobra ilusionista

em nome de uma falsa causa.

Se não venceram em tempos pela

força tentam agora pela força e pelo cansaço.

Quando tentas oprimir a força de um

movimento, acabas por estimulá-lo.

Jamais vencerão!

Eis o último bastião do futebol popular

Liberdade para apoiar,

Liberdade aos Ultras!

Por João. C

96


Nem sempre acontece, no caso

até nem acontecia há 5 anos, mas a final do

Jamor é o melhor dia futebolístico do ano sem

qualquer dúvida… sem hipótese de discussão

até.

Saída de casa bem cedo, às sete

da manhã, rumo à mata. Não só para estar

presente e viver este dia por completo, mas

também porque o soundcheck está marcado

para as nove horas em ponto. À semelhança

de 2019, os Supporting (banda de rock

and roll dedicada ao Sporting), vão dar um

concerto de cerca de 1 hora por volta das

15:00 na fan zone Sporting. Se este dia já por

si só é especial, imaginem ir cantar para 3 ou

4 milhares de adeptos do teu clube, músicas

que tu e os teus colegas de banda fizeram.

No meu top de coisas extraordinárias que

imaginava em criança… à frente disto, só

jogar pelo Sporting.

Feito o soundcheck é hora de ir ter

com a minha malta, que eram só uns 300,

divididos em 2 organizações lado a lado.

O habitual porco no espeto, os infindáveis

copos de cerveja (hoje menos porque senão

esqueço-me das letras hahaha), os brindes,

as gargalhadas, a música, os cânticos, enfim…

o Jamor!

14:23, hora de ir para o backstage.

Não sem antes aquecer a garganta com a

bela da poncha, oferecida por um amigo

Madeirense. Preparar tudo para que nada

falhe, afinar instrumentos, dar uma mija,

beber uma água para diluir e esperar que o

Virgul termine a sua atuação para entrarmos

nós em palco, e finalizar em apoteose a

animação na fan zone.

Um mar de gente nos esperava,

gente que sabe as músicas de cor, gente que

depois de uma manhã inteira na mata, àquela

hora já estava em altas… a tua gente, ali à tua

frente.

O concerto correu muito bem e

teve direito a tudo: invasões de palco, tochas

no palco, tochas, fumos, petardos e fogo de

artificio na plateia, crowdsurf do vocalista

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e muito cântico à capela para além das 10

malhas que tocámos.

Aproveitei a ocasião para falar

sobre a medida ridícula de impedir que se

entre com tubos de bandeiras e estandartes

nos estádios, dando até o exemplo da final da

Liga Europa em Dublin, onde o estádio estava

cheio de bandeiras de ambos os adeptos.

Falei também sobre a possibilidade de a

UEFA já permitir “safe standing” nos estádios

portugueses e desafiei a direção do Sporting

a implementar no estádio de Alvalade.

Findo o concerto, hora de rumar à

curva norte do estádio Nacional. O percurso

foi um pouco demorado devido aos inúmeros

“drink points” no caminho até à entrada.

Nada a assinalar em relação a coreografias de

ambas as “tifoserias” (o pano da norte foi o

SCP que o fez, por isso não conta).

Relativamente ao apoio, do meu

lado houve 4 ou 5 muito bons momentos,

com alguns cânticos a prolongarem-se por

mais de 10 minutos, o que não é fácil naquele

estádio. O resto do tempo foi final da taça a

ser final da taça. Fui a todas as finais da taça

onde o SCP esteve presente desde 1987, e

poucas vezes houve bons apoios neste jogo

da parte dos adeptos do Sporting - acredito

que nos outros clubes é igual.

Do lado do Porto, sinceramente só

ouvi algo forte depois dos golos e nos últimos

minutos da partida.

Final do jogo regresso a casa com

azia moderada, mas incomparavelmente

menor que a felicidade que é viver o

Jamor um dia inteiro. O resultado neste dia

especial… nunca foi, nunca é e nunca será o

mais importante.

Por Pedro Marques (Tantum)

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TAÇA DE PORTUGAL: A FESTA DO DRAGÃO

INDOMÁVEL NO JAMOR

Chegámos ao fim da temporada

23/24 e, como de costume, esta também

terminou com a prova Rainha: a final da Taça

de Portugal. O dia começou, como sempre,

no parque do Vale do Rio Jamor, marcado pela

diversão, “comes e bebes” e por um grande

clima de festa que tipicamente já caracteriza

este dia, culminando depois no espetacular

cenário do monumental Estádio Nacional.

Do ponto de vista desportivo, as

expectativas para uma grande final estavam

todas presentes e foram amplamente

cumpridas. Os finalistas Sporting e Porto

chegaram a este evento com estados

de espírito diferentes. Do lado verde e

desproporcional da polícia também provocou

reações exaltadas por parte dos adeptos,

com lançamento de objetos contra as forças

de segurança, uma reação compreensível

devido ao cansaço de suportar abusos de

poder injustificados que, infelizmente, são

amplificados pelo silêncio mediático culposo,

em alguns casos, e em outros por uma

narrativa distorcida dos factos.

Voltando ao aspecto desportivo,

iniciado o jogo, o espetáculo nas bancadas

apresentou-nos a coreografia “We are

our legacy” com a imagem de um jogador

mostrando o símbolo dos leões. Do outro

lado, além do triunfo das bandeiras, os Super

Dragões lembravam com uma faixa o seu líder

“Macaco”, atualmente preso, ao passo que o

Colectivo se apresentava na parte inferior

branco, voava-se nas asas do entusiasmo

por terem alcançado o inesperado triunfo

no campeonato. Enquanto do outro lado,

os azuis e brancos, após uma temporada

conturbada dentro e fora de campo, tinham

a sua última chance de conquistar um título.

Pouco antes do início do jogo e

durante bom pedaço da primeira parte, é

necessário destacar a conduta desagradável

da polícia, com excessos que resultaram no

ferimento de adeptos dentro e fora do estádio.

O clima e o comportamento dos adeptos,

embora com alguns exageros isolados,

dentro e fora do estádio não justificavam tal

intervenção policial caracterizada pelo uso

indiscriminado de balas de borracha,

cassetetes e gás lacrimogéneo. A atuação

direita da curva com bandeirinhas azuis e

brancas. É sempre importante lembrar que a

festa da taça é emocionante, mas não seria

a mesma coisa sem a presença numerosa

dos ultras nas bancadas. A primeira parte foi

bastante quente e pôde escutar-se um bom

apoio vocal das bancadas com uma ligeira

superioridade sportinguista, compreendida

pelo crescente entusiasmo com o golo de

St. Juste aos 20 minutos. Na curva verde

e branca, tochas e potes de fumo foram

acesos. A resposta do Porto não demorou e

com o empate de Evanilson, a curva portista

respondeu a plenos pulmões nas bancadas,

num sobressalto de confiança renovada.

O apoio aumentou com a expulsão de St.

Juste aos 30 minutos e prolongou-se até

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enquanto os sportinguistas retornaram

rápida e tristemente às suas casas. Nenhum

domínio nacional para o Sporting, portanto,

o que reduz em parte uma temporada sólida

e bem-sucedida, enquanto o Dragão, apesar

das feridas dentro e fora de campo num ano

atípico para o clube azul e branco, mostrouse

indomável e, mais uma vez, conseguiu

triunfar contra todas as adversidades.

ao intervalo. No retorno ao balneário das

equipas, a curva do Sporting fez-se ouvir

devido ao momento de dificuldade causado

pela inferioridade numérica em campo. Fora

uma boa primeira parte nas bancadas, pese

o cansaço e o dia de farra se fizessem sentir.

Após o intervalo, a temperatura atmosférica

desceu lentamente, mas no campo e nas

bancadas, subiu cada vez mais. Na segunda

parte, uma tochada consistente dos Casuais

e Colectivo emoldurou a pressão constante

dos azuis e brancos em campo. De ambos os

lados, apenas alguns bradavam-se clamores

nos momentos de perigo porque a tensão

predominava, mas o resultado não mudou.

Seguiram-se os prolongamentos e a igualdade

foi quebrada por um penálti para o Porto,

convertido por Taremi, que levou ao êxtase o

mar azul nas bancadas do Estádio Nacional.

O resultado não mudou e a vitória sorriu ao

Porto, com festa nas bancadas com os Super

Dragões e o Colectivo entoando cânticos

antes e depois da entrega da taça.

Para os portistas, a viagem de volta

para o Porto, apesar dos muitos quilómetros,

foi alegre e doce pela conquista do troféu,

Por Guido Bruno

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DJUGARDEN X HAMMARBY

Viajar sem ir à bola é pecado.

Como é habitual nas minhas viagens pelo

estrangeiro, depois de marcar voos, a primeira

coisa que faço é ir ver que bola é que se pode

encaixar nesses dias. Nem a propósito, fui

a Estocolmo em fim de semana de derby

Djurgarden x Hammarby, que todos nós que

acompanhamos a cena Ultra já sabemos que

é quentinho.

Quente estava também o tempo. Dia

de sol em Estocolmo, 27 graus, quase parecia

Portugal, um gajo até fica mal habituado a

pensar que aquilo é sempre assim, quase

esquecendo momentaneamente que durante

2/3 do ano eles mal veem o sol.

Indo ao que importa, falei com um

amigo meu residente na cidade para ver se

conseguíamos bilhete (nem que fosse só para

mim), e acabámos por conseguir para os dois.

Não porque seja fácil, mas sim porque ao fim

de alguns contactos houve uma malta que

desistiu de ir e acabámos por ficar com esses

bilhetes. A noite de Sábado foi forte, então já

não nos levantámos muito cedo no Domingo;

com o jogo às 14h queria chegar pelas 11h

ao estádio - cheguei às 12h30, foi quase.

Mas ainda deu para sentir bem o ambiente.

Fomos para uns bares numa das ruas centrais

adjacentes ao estádio, muita cerveja e não só,

muitos cânticos, malta a meter-se connosco

para saber de onde éramos e afins (tudo na

paz), beber mais, um petardo e uma tochada

aqui ou ali, e alguns pequenos grupos a

passar de um lado para o outro à procura

de problemas. Ali era difícil haver mocada

porque era uma zona bastante vigiada, mas

deu-me a sensação que não muito longe a

coisa aqueceu, dado o barulho das sirenes.

Entretanto entrámos. Álcool com

limite de 3.5% à venda (inclusive cerveja que

tem menor teor de álcool de propósito para

cumprir as regras suecas), o que sempre deu

para não passar sede lá dentro. Curiosamente,

apesar de estarmos na central, fomos calhar

precisamente na zona da Sektion Stim, um

subgrupo que costuma ficar ali na zona.

Não houve qualquer problema por estarmos

ao pé deles e deu para curtir o ambiente a

fundo. Logo à entrada das equipas, fumos

azuis do Djurgarden por todo o lado e uma

coreografia por todo o topo; do lado do

Hammarby, bandeiras verdes e brancas

por toda a bancada que ocupavam. Referir

apenas que, uma vez que ambos partilham

o estádio, os grupos Ultra ficam nos mesmos

setores quando jogam em casa e “fora”.

O jogo começou e, em termos vocais,

clara vantagem por parte do Hammarby.

Sobrepunham-se de forma clara aos ultras do

Djurgarden, que só se equiparavam quando

o pessoal da central onde eu estava (e em

cima) se juntava a cantar. Ambiente muito

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forte nos primeiros minutos (ao contrário

do futebol, que na maior parte do tempo

foi sofrível), e por volta dos 10 minutos, os

hooligans do Djurgarden (DY/DFG) ergueram

umas faixas para os hooligans do Hammarby

(KGB/YG). Uns insultos em sueco que diziam

algo tipo “Continuaremos a ser os vossos

donos”, uma faixa a dizer “YG NO SHOW”, e

uma mensagem a seguir a dizer “KGB/YG =

Cães dos BFB”, “Que vergonha para vocês,

suas putas”, talvez fazendo alusão a alguma

luta em que os YG não terão aparecido. Ao

mesmo tempo, na zona mais central do topo,

onde fica o capo dos Ultras, uma pequena

tochada.

Paralelamente a isto, uns minutos

depois surgiu o primeiro golo do Hammarby,

de penalty, e foi a loucura total no topo

Norte, com tochas e fumos verdes e brancos

a aparecerem em algumas zonas na bancada.

Se já estavam fortes antes, imaginem depois

do golo. Não se calaram mais, foi domínio

total na bancada até final do jogo. Mais ainda

porque o segundo golo apareceu passado

pouco tempo (um belo livre direto, em que o

GR do Djurgarden pareceu estar a dormir), e

isso desanimou muito o pessoal do Djurgarden

na central. Os Ultras ainda tentaram animar

o estádio, mas tirando o início da segunda

parte, o resto dos adeptos passou a aderir

pouco aos cânticos e a vantagem dos Ultras

do Hammarby foi esmagadora. Eu estava

localizado na central mais do lado dos Ultras

do Djurgarden e só se ouvia o pessoal do

Hammbary.

O tempo foi passando, uma tocha ou outra a

aparecer pelas bancadas, até que chegou o

grande momento do jogo fora da bancada: já

perto do final e a ganhar por 0-3, os Ultras

do Hammarby ergueram uma coregorafia

enorme com o Kenta a fazer um pirete aos

adeptos do Djurgarden e tochas por toda a

bancada, como é possível ver nas imagens.

O Kenta é uma personagem das ruas de

Estocolmo, que criou uma música chamada

“Just idag är jag stark“ (cujo significado em

português é algo do género “Hoje sinto-me

forte”), frase essa que vi pelo menos dois

adeptos terem tatuada na pele, e que foi

adotada como hino do Hammarby.

No final, tempo para comer e beber

mais uns canecos, muita polícia a passar de

um lado para o outro, mas insuficiente para

evitar uma luta de rua rápida (e com poucos

elementos) que presenciei na zona em que

estive a comer. Ainda assim, atuaram rápido

e o pessoal dispersou a partir daí.

No geral, recomendo a quem

conseguir ir a Estocolmo dar um salto à bola,

porque vale realmente a pena pelo espetáculo

fora de campo. Preparem é a carteira, que a

cidade é tão bonita quanto cara.

Por N. Oliveira


CULTURA

DE ADEPTO

Por P. Alves

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Gradinata Sud e Gradinata Nord

Internacional

Gradinata Sud e Gradinata Nord

Autor: Roberto Martinelli (Sud) e Studio Uno (Nord)

Equipa: Sampdoria (Sud) e Génoa (Nord)

Ano: 2007 (Sud) e 2008 (Nord)

Páginas: 240 (Sud) e 220 (Nord)

Preço: 19.90€

Desta vez trazemos ao mesmo tempo dois livros… um autêntico Derby della Lanterna. Gradinata

Sud e Gradinata Nord. Através de uma iniciativa da editora FFE, foi decidido fazer quase ao

mesmo tempo dois livros dedicados às claques dos dois principais clubes de Génoa.

Apresentado o mesmo grafismo, ambos os livros dedicam o seu espaço a mostrar fotos, com

algumas explicações, dos principais jogos realizados pelos clubes, com foco para as claques de

ambas as bancadas.

Relativamente aos grupos da Sampdoria, o livro Gradinata Sud dedica 8 capítulos, focando-se

no desempenho da Sul entre os anos 2002 a 2007.

No que diz aos grupos da Génoa, o livro Gradinata Nord dedica apenas 5 capítulos, no entanto

é mais extenso a nível histórico uma vez que abrange a actividade da Curva Nord, desde as

origens da Fossa Dei Griffoni até aos tempos actuais.

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Com a época desportiva 23/24

perto do final, no que a futebol diz respeito,

restam poucos jogos para a mesma terminar.

No entanto, esta fase final é sempre

empolgante, porque com ela traz sempre

jogos decisivos, o que acaba por arrastar

ainda mais adeptos aos estádios. Seja para

ser campeão, para não descer ou subir de

divisão.

No passado 26 de maio, fui até

Lourosa assistir ao derby de Santa Maria da

Feira, entre o Lourosa e o Feirense. Derby

esse que já não era jogado de forma oficial

desde a época 85/86.

Na semana que antecedeu o jogo

fui procurando alguma informação e, à

medida que o dia se ia aproximando, fui-me

apercebendo que ia encontrar um excelente

ambiente para lá das 4 linhas e, sinceramente,

era mesmo isso que eu ia à procura.

Segundo algumas páginas que fui

seguindo nas redes sociais, falava-se em 8

mil adeptos, sendo que nestes já estariam

incluídos os cerca de 250 adeptos visitantes.

Na chegada a Lourosa, por volta das 9h30,

uma hora e meia antes do jogo, já sentia o

frenesim nas ruas adjacentes ao estádio, com

a GNR, com um forte dispositivo, a controlar

quem chegava.

Estacionamos o carro e, quando

nos dirigimos para o estádio, apercebemonos

que o autocarro que trazia os jogadores

do Feirense estava mesmo ao nosso lado.

Porreiro, pensei eu - vou já perceber como

será a recepção ao mesmo. Como as ruas

eram um bocado apertadas e o trânsito já se

fazia sentir, o mesmo foi em marcha lenta.

Já não ia ali assistir a um jogo há bastante

tempo e, à medida que ia andando, via-se

cada vez mais povo nas ruas, adeptos do

Lourosa trajados a rigor. A rivalidade sentese,

mas também logo me apercebi que não

há grande animosidade. O autocarro passou

mesmo em frente ao café onde o grupo de

apoio ao Lourosa se costuma concentrar, ou

pelo menos um dos grupos, e os mesmos

ali presentes deixaram passar sem uma

única provocação. A bem da verdade é que

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por muita rivalidade que haja, a malta mais

jovem (dos 40 anos para baixo) nunca teve

oportunidade de assistir a este jogo de forma

oficial, o que acaba também por esfriar as

coisas.

Entramos cedo no estádio e, antes

de os jogadores entrarem para aquecimento,

o estádio já estava bem composto. O Lourosa

tinha deixado umas bandeiras amarelas

pequenas para dar cor e vida ao mesmo, e

a claque do Lourosa já se posicionava e já

ensaiavam cânticos. O grupo visitante chegou

e abriram um pote de fumo à saída do

autocarro e, à medida que iam entrando, iam

também abrindo os panos e a faixa principal

da Civitas Fortissima, e com eles também

trouxeram uns estandartes, material cada vez

menos visto nos estádios e que dá um aspeto

visual que gosto de ver.

O jogo aproximava-se do seu início

e o estádio cada vez mais ficava apertado

para tanta gente. O speaker ia dando uma

ajuda para que a coreografia de bandeiras

surtisse o efeito pretendido e a Armada

Lusitana, a claque da casa, ia puxando pelos

restantes adeptos para empurrar o Lourosa

ao resultado desejado. Os visitantes fizeramse

notar na sua chegada com alguns cânticos.

Na entrada das equipas, a Armada levanta

um lençol engraçado com uma imagem

estampada do castelo de Santa Maria da Feira

com uns leões (símbolo do Lusitânia) a fazer

de guardas, com uma frase na parte de cima

onde se lia “À conquista de um novo reinado”.

Do lado azul dos fogaceiros, uma cachecolada

à antiga que deu um efeito visual muito

bom - um bonito recurso para embelezar o

momento.

Começa o jogo e os dois grupos a

fazerem-se ouvir. Do lado dos amarelos, o

capo com um megafone a ajudar. Do lado dos

azuis, capo no muro a puxar pelo seu grupo

“à capela”. Com o desenrolar do jogo e a

ansiedade a tomar conta dos adeptos, roía-se

mais as unhas do que se cantava. No entanto,

o grupo da casa cantou o jogo todo, embora

sem grande força, só mesmo fazendo-se

ouvir a espaços. Depois de marcarem golo

que lhes daria a vitória, fizeram-se ouvir

mais qualquer coisa, mas sem ser um apoio

brutal. Do lado visitante, cantaram também a

espaços e de vez em quando lá se via algum

movimento na bancada. No entanto, onde

nos encontrávamos, pouco se ouviam.

Com o final do jogo, alegria de uns e tristeza

de outros. No entanto, ainda faltam 90m e

muito por decidir.

Na saída dos adeptos, uma

provocação ou outra de um lado e do outro,

com a polícia a controlar tudo e todos.

Foi um bom derby, com a rivalidade a fazer-se

sentir, sem exageros.

Nota para um adepto, na bancada

ao lado da claque do Lourosa com 2

cachecóis, 1 em cada braço e dos 2 clubes, o

que demonstra que pode haver rivalidade e

espaço para gostar dos clubes da sua cidade

(provavelmente).

Por J. Costa

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