SCMedia News | Revista | Abril 2023
A revista dos profissionais de logística e supply chain.
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<strong>Abril</strong> <strong>2023</strong><br />
4,60€<br />
Mensal<br />
41<br />
RISCO:<br />
O INIMIGO INVISIVEL<br />
TOP 10<br />
AS EMPRESAS MAIS<br />
INCLUSIVAS DO MUNDO<br />
O COMPROMISSO<br />
SUSTENTÁVEL DA APPLE<br />
BURNOUT NA SUPPLY CHAIN<br />
Somos apenas humanos
Outsourcing Logístico<br />
Serviços<br />
Descarga e receção de mercadorias Conferência e arrumação Manipulações e<br />
Recondicionamento Etiquetagem Co-packing Kitting Picking e Embalamento<br />
Cross-docking Carregamento e Expedição de Mercadorias Carga e Descarga de Contentores<br />
Operações “One-shot” (campanhas) Controlo de Qualidade Realização de inventários<br />
Gestão de Devoluções Controlo e Manutenção de Suportes de Manuseamento<br />
Tratamento de Vasilhame e Resíduos<br />
Gesgrup, o parceiro Ideal.<br />
www.gesgrup.pt
SCM Supply Chain Magazine 3<br />
dora.assis@supplychainmagazine.pt<br />
Dora Assis<br />
EDITORIAL<br />
A CARGA DO TRABALHO<br />
“Ai que prazer<br />
Não cumprir um dever,<br />
Ter um livro para ler<br />
E não o fazer! (...)”<br />
Fernando Pessoa<br />
Ao contrário do que diz Fernando Pessoa no<br />
poema “Liberdade”, faça o favor de ler isto<br />
até ao fim, porque o assunto é sério e não se<br />
conhecem efeitos secundários adversos ao<br />
estar informado.<br />
Não há dúvida de que estes últimos anos<br />
têm sido difíceis e não nos têm dado folgas.<br />
Os impactos profundos e abrangentes da<br />
pandemia, com os confinamentos globais e<br />
as enormes perturbações, e subsequentes<br />
disrupções, na cadeia de abastecimento<br />
ameaçaram as economias, as empresas, os<br />
recursos e os meios de subsistência em todo<br />
o mundo.<br />
E, para aqueles que trabalham na supply<br />
chain, os desafios persistiram muito depois<br />
do pior ter passado. É que, enquanto o mundo<br />
se esforçava para sair da sombra do vírus,<br />
as pressões exercidas sobre a cadeia de<br />
abastecimento ameaçaram desencadear o seu<br />
colapso total, colocando o ónus diretamente<br />
sobre os ombros dos trabalhadores da cadeia<br />
de abastecimento, que se esforçaram por<br />
fazer com que as empresas - e as economias -<br />
voltassem a funcionar na anormalidade.<br />
O resultado? Equipas com excesso de<br />
trabalho, sobrecarregadas, pressionadas<br />
e a movimentarem-se em contextos e<br />
cenários, quantas vezes inéditos, e colocadas<br />
diariamente perante incertezas.<br />
Depois da “resiliência” foi o "burnout" que<br />
integrou o nosso vocabulário, mas, atenção,<br />
que é muito mais do que uma “buzzword”:<br />
é um facto, é real, é omnipresente e é uma<br />
ameaça, tanto para o trabalhador, como para<br />
a equipa, como um todo e enquanto grupo de<br />
trabalho.<br />
Por isso, nesta edição, o tema merece<br />
destaque num artigo de fundo que procurou<br />
ouvir várias partes envolvidas e olhar para o<br />
problema por diferentes óticas. Não é fácil<br />
pegar no tema, nem evitar o problema. Mas é<br />
possível.<br />
Ideias a reter? Talvez uma. A tecnologia pode<br />
ser a resposta. Não elimina o trabalho. Alivia,<br />
isso sim, a carga do trabalho e potencia o<br />
equilíbrio e a sustentabilidade entre a vida<br />
profissional e pessoal, desde que doseada.<br />
É que, contas feitas, não tenhamos dúvidas:<br />
“Somos apenas humanos”.
4<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
#22 #30 #38<br />
ÍNDICE<br />
FACTOS & NÚMEROS<br />
EUA lideram fornecimento de gás<br />
natural no 1.º trimestre 06<br />
LOGÍSTICA<br />
Fulfillment by FHB Group 08<br />
Risco: o inimigo invisível 14<br />
Quinas - Uma cerveja portuguesa, com<br />
certeza 16<br />
Tecnologia e sustentabilidade:<br />
combinação vencedora 22<br />
DS Smith -<br />
O papel do futuro sustentável 26<br />
PROCUREMENT<br />
NOS - Proatividade e eficiência com<br />
fornecedores 30<br />
Top 10 das empresas mais inclusivas do<br />
mundo 38<br />
O compromisso<br />
sustentável da Apple 44<br />
INTRALOGÍSTICA<br />
Armazém: o protagonista esquecido 48<br />
TECNOLOGIAS<br />
GoWizi 42
SCM Supply Chain Magazine 5<br />
#48<br />
#58<br />
TRANSPORTES<br />
Lowlow 60<br />
SEMPER 64<br />
CARREIRA<br />
Burnout 72<br />
#60<br />
FICHA TÉCNICA<br />
Sede editor, Administração e Redação_<br />
Al. Júlio Dinis, n.º 68 – São Francisco<br />
2890-307 Alcochete<br />
T: 210 499 074<br />
Direção Geral_<br />
Filipe Barros<br />
Diretora_<br />
Dora Assis<br />
Redação_<br />
Ana Paiva, Bruna Manguito,<br />
Fábio Santos<br />
Projeto gráfico_<br />
Maria João Carvalho<br />
Design Gráfico & Paginação _<br />
PAR Design<br />
Sales manager_<br />
Samantha Casas<br />
Marketing Digital_<br />
Catarina Santos<br />
Events Support_<br />
Katline Costa<br />
Impressão _<br />
VASP DPS<br />
MLP – Quinta do Grajal,<br />
Venda Seca<br />
2739-511 Agualva Cacém<br />
Tiragem _<br />
3 mil exemplares<br />
Propriedade_<br />
SC Media Unipessoal, Lda.<br />
Al. Júlio Dinis, n.º 68 – São Francisco<br />
2890-307 Alcochete<br />
T: 210 499 074<br />
E: geral@supplychainmagazine.pt<br />
W: supplychainmagazine.pt<br />
Estatuto Editorial _<br />
www.supplychainmagazine.pt/estatuto-editorial/<br />
Capital Social_<br />
100,00€<br />
Participações sociais_<br />
Susana Silva<br />
Administração_<br />
Filipe Barros<br />
Registo na ERC n.º _<br />
127322<br />
Depósito Legal n.º _<br />
458604/19<br />
Os artigos assinados apenas veiculam<br />
a posição dos seus autores.<br />
Interdita a reprodução de textos e<br />
imagens sem autorização expressa.
6<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
FACTOS<br />
& NÚMEROS<br />
Energia<br />
EUA LIDERAM FORNECIMENTO DE GÁS NATURAL<br />
A PORTUGAL NO PRIMEIRO TRIMESTRE<br />
Segundo dados divulgados pela Adene -<br />
Agência para a Energia, os Estados Unidos<br />
lideraram o fornecimento de gás natural a<br />
Portugal no primeiro trimestre de <strong>2023</strong>, com<br />
uma quota de 46,3%.<br />
A Nigéria ficou em segundo lugar, com 31,9%<br />
do fornecimento, enquanto que o gás importado<br />
através das interligações com Espanha e Rússia<br />
ficaram em terceiro e quarto lugar, com quotas<br />
de 12,7% e 9,2%, respetivamente.<br />
A mudança na liderança do fornecimento de<br />
gás natural a Portugal ocorreu devido à crise<br />
energética na Europa, quando a Rússia invadiu<br />
a Ucrânia. Naquela altura, a Nigéria liderava o<br />
fornecimento de gás natural a Portugal, com<br />
uma quota de 56%, seguida pelos Estados<br />
Unidos com 32,9%, Rússia com 6,2% e Trinidad e<br />
Tobago com 4,9%.<br />
No ano passado, o Ministro do Ambiente<br />
e Ação Climática, Duarte Cordeiro, visitou a<br />
Nigéria juntamente com o Secretário de Estado<br />
da Energia, João Galamba, atualmente Ministro<br />
das Infraestruturas, tendo o governo nigeriano<br />
garantido que os contratos de fornecimento<br />
seriam cumpridos. No entanto, o governante<br />
admitiu o risco de incumprimento, o que poderia<br />
levar a alterações de preços daquela matériaprima<br />
em Portugal.<br />
Para evitar situações semelhantes no futuro,<br />
o governo português tem procurado diversificar<br />
os seus fornecedores de gás natural. Segundo<br />
dados da Redes Energéticas Nacionais (REN), o<br />
consumo de gás natural no primeiro trimestre<br />
de <strong>2023</strong> foi de 12.895 gigawatts-hora (GWh),<br />
menos 19,6% face ao período homólogo.<br />
O mercado elétrico representou cerca de<br />
33% do consumo, enquanto que o mercado<br />
convencional foi responsável por 67% do<br />
consumo. No mesmo período do ano passado, o<br />
mercado elétrico representava 44% e o mercado<br />
convencional 56%.<br />
Com a queda no consumo de gás natural em<br />
Portugal, a Entidade Reguladora dos Serviços<br />
Energéticos (ERSE) propôs um aumento de 2,4%<br />
no preço do gás natural. A proposta de aumento<br />
está atualmente em consulta pública. •
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charter expertise<br />
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8<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
LOGÍSTICA<br />
Fulfillment<br />
by FHB Group<br />
Entrevista: Fábio Santos<br />
“É IMPORTANTE<br />
ESTAR PREPARADO E<br />
REAGIR ÀS MUDANÇAS”<br />
O mundo tem passado por momentos conturbados.<br />
A guerra na Ucrânia já dura há mais de um ano<br />
e, entretanto, no dia 5 de maio, foi declarado<br />
o fim oficial da pandemia pela Organização<br />
Mundial da Saúde (OMS). Estes foram dois marcos<br />
importantes para a economia mundial, e que<br />
em muito mudaram a logística e a forma como<br />
o planeamento era feito. Com uma visão mais<br />
europeia, mas também global, Rastislav Tinák, da<br />
Fulfillment by FHB Group, conta-nos o impacto que<br />
sentiram neste último ano e como conseguiram<br />
antecipar aumentos nas suas operações.
SCM Supply Chain Magazine<br />
9<br />
Rastislav Tinák, Logística/fullfi i lment<br />
Durante a pandemia enfrentámos um<br />
aumento dos níveis de e-commerce, como nunca<br />
antes visto na maioria dos países, mas depois<br />
veio uma guerra, e a inflação dos preços tirou<br />
parte do orçamento de gastos dos clientes.<br />
Como reagiu o mercado de e-commerce durante<br />
este primeiro ano da guerra?<br />
> Rastislav Tinák - A pandemia foi um<br />
fenómeno interessante que contribuiu<br />
significativamente para o mercado de<br />
e-commerce e para a sua dinâmica de<br />
crescimento nos últimos anos. Mesmo antes<br />
da pandemia, o comércio eletrónico estava a<br />
crescer a um ritmo acelerado, e a pandemia<br />
forçou e convenceu os consumidores de que as<br />
compras online são uma opção conveniente.<br />
No entanto, a inflação também tem crescido<br />
significativamente durante a pandemia, e<br />
com a chegada da guerra na Ucrânia, várias<br />
restrições e outros fenómenos relacionados<br />
com a pandemia, a inflação tornou-se<br />
mais evidente. Isso acabou por afetar o<br />
comportamento de compra dos consumidores,<br />
pois eles continuaram a comprar online, mas<br />
tornaram-se mais conscientes das suas compras.<br />
Várias estatísticas pan-europeias e mundiais<br />
mostraram que a dinâmica de crescimento<br />
do mercado do comércio eletrónico abrandou<br />
ligeiramente, mas não parou nem inverteu.<br />
Apesar destes fenómenos e da diminuição<br />
da dinâmica de crescimento do mercado de<br />
e-commerce, temos observado uma tendência<br />
interessante na logística de e-commerce e,<br />
como tal, nas empresas de fulfillment 3PL.<br />
Cada vez mais lojas virtuais estão a voltar-se<br />
para os serviços das empresas de fulfillment e a<br />
terceirizar parte de sua logística ou até mesmo<br />
toda a sua logística para essas empresas. Temos<br />
notado significativamente esta tendência na<br />
nossa empresa, onde conseguimos manter a<br />
nossa dinâmica de crescimento apesar
10<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
de tudo, e temos vivido um ano recorde no<br />
número de envios processados na Fulfillment by<br />
FHB Group. É claro que nada acontece de forma<br />
independente e, mesmo com os acontecimentos<br />
atuais no mundo, fortalecemos o nosso<br />
departamento de vendas, desenvolvemos<br />
ainda mais a automação dos nossos armazéns<br />
e expandimos as nossas capacidades de<br />
armazenamento e de pessoas. Tudo isto<br />
permitiu-nos continuar a crescer e a processar<br />
encomendas ao nosso ritmo normal, sem<br />
demoras ou outras complicações.<br />
Esperamos que esta tendência de interesse<br />
das lojas eletrónicas no processamento<br />
logístico de terceiros continue nos próximos<br />
tempos. Muitas lojas virtuais estão atualmente<br />
interessadas em serviços de cross-docking, ou<br />
seja, distribuição instantânea de mercadorias<br />
sem a necessidade de armazenamento. O nosso<br />
sistema de informação de última geração, bem<br />
como a capacidade adequada e a nossa rede<br />
de transportes, permitiram-nos oferecer este<br />
serviço plenamente durante muitos anos. É<br />
claro que as situações evoluem, e a inflação<br />
ainda não teve a palavra final. No entanto, é<br />
essencial estar preparado com antecedência,<br />
e esse é o nosso objetivo - tentar prever<br />
tendências, continuar a crescer, melhorar<br />
os nossos serviços, aumentar a automação<br />
e muitos outros fatores que nos tornam a<br />
empresa líder em abastecimento na Europa<br />
Central e Oriental.<br />
Sabendo que chegam a 220 países, pode<br />
partilhar alguns dados dos mercados mais<br />
impactados?<br />
> É muito difícil determinar quais os países<br />
que estão bem e quais não estão. O problema<br />
é que temos diferentes clientes de comércio<br />
eletrónico que vendem para determinadas<br />
partes da Europa ou para países específicos em<br />
todo o mundo. E à medida que o número de<br />
clientes cresce ou muda, o número de remessas<br />
entregues em diferentes países também varia.<br />
No entanto, uma visão anual pode indicar<br />
certas tendências. Por exemplo, vemos<br />
um aumento interessante nos envios para<br />
França, onde entregámos cerca de 73% mais<br />
encomendas no ano passado. O mesmo vale para
SCM Supply Chain Magazine 11<br />
a Itália, onde tivemos uma taxa de crescimento<br />
de mais de 34%. Há também uma mudança<br />
interessante nos países Balcãs, onde países como<br />
a Roménia e a Eslovénia registaram aumentos<br />
que variam entre 35% e 42%.<br />
Por outro lado, há também países onde vemos<br />
uma ligeira diminuição no número de embarques,<br />
que pode ser causada por vários motivos. Estas<br />
razões podem incluir mudanças na estratégia<br />
de vendas dos nossos clientes, tais como o<br />
desempenho das suas vendas em determinados<br />
países, ou se continuam a vender num<br />
determinado país ou não. Países como a Polónia<br />
ou a Croácia enquadram-se nesta categoria.<br />
No entanto, para a Croácia, será interessante<br />
ver como as lojas virtuais reagem à chegada do<br />
euro este ano, bem como o poder de compra da<br />
população local.<br />
O referido cross-docking, que é a distribuição<br />
imediata de mercadorias sem necessidade de<br />
armazenagem, e a maior procura por este serviço<br />
são também razões para o aumento dos envios<br />
entregues. Isto é, naturalmente, também em<br />
combinação com as nossas soluções de envio<br />
para clientes de comércio eletrónico, onde temos<br />
visto um aumento significativo ano após ano<br />
nos envios para os EUA. As nossas soluções de<br />
abastecimento e distribuição correspondem às<br />
necessidades de clientes de e-commerce de todo<br />
o mundo, resultando num aumento de envios<br />
para vários cantos do mundo, e não apenas na<br />
Europa.<br />
Entregamos realmente em qualquer lugar,<br />
e em Portugal, por exemplo, temos visto um<br />
aumento de mais de 44% no volume de envios<br />
entregues. No entanto, é importante notar que<br />
estes números não refletem necessariamente<br />
o poder de compra atual dos clientes em cada<br />
país, uma vez que a nossa carteira de clientes é<br />
diversificada e está em constante mudança.<br />
Como foram os resultados da(s) época(s)<br />
alta(s) durante o último ano?<br />
> A maior surpresa do ano passado foram,<br />
sem dúvida, os picos, especialmente a principal<br />
época de compras durante o Natal. Como tem<br />
sido hábito desde o início da pandemia, a época<br />
natalícia é mais longa e intensa. A sua duração<br />
é aproximadamente de setembro até ao final de<br />
dezembro.<br />
Dada a inflação muito elevada, esperavase<br />
que a dinâmica de crescimento durante<br />
o Natal fosse significativamente mais baixa<br />
do que nos últimos anos, mas verificouse<br />
o contrário. Durante a época natalícia,<br />
registámos números recordes, quer em termos<br />
do número de envios processados num mês,<br />
quer mesmo num dia. Este elevado volume<br />
de encomendas foi um grande teste, mas para<br />
o qual estávamos preparados previamente,<br />
como em todos os anos anteriores. No início<br />
da época natalícia, lançámos um classificador<br />
automático de encomendas no nosso armazém<br />
principal, que pode separar vários milhares de<br />
embalagens por hora, dependendo do país de<br />
entrega. Em combinação com a embalagem
C<br />
12<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
manual e mecânica através da nossa linha de<br />
embalagem totalmente automatizada, trouxe<br />
uma aceleração significativa do processamento<br />
de pedidos, que provou ser eficaz durante este<br />
pico sazonal.<br />
No final, avaliamos a época natalícia de forma<br />
muito positiva, o que também se reflete no<br />
aumento homólogo dos envios processados<br />
durante este período em quase 53%.<br />
Sentiram necessidade de adaptar as vossas<br />
operações à situação?<br />
> É claro que a adaptação às novas situações<br />
de mercado, tendências e dinâmicas de<br />
crescimento é uma característica importante<br />
para ter sucesso na logística do e-commerce e<br />
destacarmo-nos da concorrência. Em relação ao<br />
crescimento de clientes e, portanto, ao número<br />
de envios processados, preparámo-nos para isso<br />
com antecedência. Por exemplo, somos líderes no<br />
mercado de fulfillment, temos uma certa dinâmica<br />
de crescimento e planeamos continuar a avançar,<br />
e é por isso que planeamos várias coisas, como<br />
aumentar a automação, expandir armazéns e a<br />
nossa frota de transporte, às vezes até anos de<br />
antecedência. Preparámo-nos antecipadamente<br />
para o aumento do número de encomendas,<br />
especialmente durante picos sazonais, por<br />
exemplo, reforçando as capacidades de pessoal e<br />
tomando medidas semelhantes.<br />
Por outro lado, há situações que não é<br />
possível prever com anos de antecedência, às<br />
vezes nem meses. No entanto, é importante<br />
estar preparado e reagir às mudanças porque, se<br />
não tiver uma gestão de crise adequada, perderá<br />
a confiança do cliente e sairá do negócio.<br />
Portanto, mesmo com a chegada da pandemia,<br />
inflação alta e guerra na Ucrânia, conseguimos<br />
reagir rapidamente e manter o funcionamento<br />
dos nossos processos ao mais alto nível. Por<br />
exemplo, com a chegada da inflação elevada,<br />
o preço das embalagens, que são artigos<br />
necessários e fazem parte do processo de<br />
embalagem, aumentou significativamente.<br />
Portanto, alocámos espaço e começámos a<br />
fazer stock de mais caixas, dependendo da<br />
evolução dos preços. Monitorizar os preços de<br />
mercado, e posteriormente avaliá-los, é uma<br />
parte importante da mitigação do aumento dos<br />
custos operacionais.<br />
E há muitos outros fatores, como energia<br />
cara, combustíveis, gás ou outros componentes.<br />
Muitas empresas de fulfillment que são<br />
incapazes de reagir com rapidez, posteriormente<br />
fecham as portas, têm de interromper inovações<br />
ou, nalguns casos, até mesmo utilizar os<br />
pagamentos em dinheiro dos seus clientes<br />
indevidamente. E isso já é um grande problema.<br />
Tais situações não nos ameaçam porque temos<br />
antecedentes e experiência suficientes para<br />
suportar a pressão inflacionista sobre o mercado.<br />
A guerra na Ucrânia teve algum impacto na<br />
Fulfillment by FHB Group?<br />
> A nossa principal rede de transportes<br />
é rodoviária, utilizando viaturas de vários<br />
tamanhos. E é claro que, nalguns casos, também<br />
utilizamos o transporte aéreo. No entanto, em<br />
relação à guerra na Ucrânia, ela está a ocorrer<br />
exclusivamente na Ucrânia, portanto, não há<br />
impacto militar no centro da Europa. E uma vez<br />
que fazemos parte da NATO, tais intervenções<br />
estão atualmente fora de questão.<br />
Por conseguinte, não temos experiência<br />
com atrasos causados pela guerra na Ucrânia.<br />
No passado, houve problemas, por exemplo,<br />
com o transporte marítimo, que foi atrasado<br />
devido à pandemia, onde vários lockdowns<br />
interromperam a cadeia de abastecimento,<br />
o que resultou em preços altos para esse<br />
transporte. No entanto, mesmo este problema<br />
já está praticamente resolvido e, atualmente,<br />
tanto o armazenamento como a entrega<br />
prosseguem sem quaisquer problemas. •<br />
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MARÍTIMO<br />
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LOGÍSTICA<br />
www
14<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
LOGÍSTICA<br />
Estudo WTW<br />
Texto: Ana Paiva<br />
RISCO: O<br />
INIMIGO<br />
INVISÍVEL<br />
Quem gere cadeias de abastecimento<br />
está bem familiarizado com o<br />
conceito de “risco”. Pode surgir, ou<br />
não, mas nunca deve ser esquecido.<br />
Um contratempo gerado por uma<br />
falha de gestão de risco, pode causar<br />
um impacto negativo significativo.<br />
Em tempos tão adversos repletos<br />
de desafios, este conceito ainda é<br />
encarado como um grande obstáculo<br />
nas cadeias de abastecimento.<br />
Um estudo da WTW, empresa especializada<br />
em consultoria, corretagem e soluções,<br />
avança que 79% das empresas globais do<br />
setor alimentar e de bebidas aponta a falta<br />
de soluções de seguros como um dos maiores<br />
desafios na abordagem aos riscos da cadeia<br />
de abastecimento, nos últimos três a cinco<br />
anos. Exemplo disso é o facto de apenas 30%<br />
das empresas considerar que tem seguros<br />
suficientes para cobrir o impacto de condições<br />
meteorológicas na sua cadeia de abastecimento.<br />
Além disto, as empresas também estão a<br />
enfrentar obstáculos na obtenção de dados<br />
que precisam para alcançar plena visibilidade<br />
dos riscos da sua cadeia de abastecimento,<br />
sendo que 78% indicaram não dispor de<br />
dados e conhecimentos necessários para<br />
compreenderem os seus riscos. Por sua vez, 76%<br />
apontaram as preocupações dos fornecedores<br />
sobre a titularidade dos conhecimentos e a<br />
propriedade intelectual como impedimentos à<br />
transparência.
SCM Supply Chain Magazine 15<br />
Os inquiridos afirmaram ainda que as suas<br />
perdas relacionadas especificamente com<br />
os riscos da cadeia de abastecimento foram<br />
superiores ao esperado nos últimos dois anos,<br />
em comparação com os 65% verificados nos<br />
outros setores.<br />
Tendo em conta desafios que foram surgindo<br />
nos últimos tempos, como a pandemia e a<br />
guerra entre a Ucrânia e a Rússia, as empresas<br />
motivaram-se a aumentar a sua resiliência<br />
contra desafios futuros. Assim, 68% indica ter<br />
aplicado melhorias na abordagem à gestão<br />
da cadeia de abastecimento em resposta à<br />
pandemia, enquanto outros 20% dizem ter<br />
transformado completamente a sua abordagem.<br />
Luís Teixeira, risk & broking sales lead<br />
na WTW Portugal, afirma que “este setor é<br />
crítico para as sociedades. Uma disrupção nas<br />
cadeias de abastecimento, desde as colheitas,<br />
passando pelo transporte até às fábricas onde<br />
são transformados os produtos, pode alterar de<br />
forma significativa os padrões de consumo e<br />
inflacionar os preços dos alimentos e bebidas.<br />
É crucial que as empresas tenham acesso a<br />
ferramentas de gestão de risco ajustadas à<br />
complexidade deste setor”.<br />
Por sua vez, Sue Newton, diretora, GB<br />
food & drink practice leader na WTW, indica<br />
que “o setor alimentar e de bebidas esteve<br />
sempre exposto a perturbações na cadeia de<br />
abastecimento, mas é provável que a indústria<br />
enfrente desafios cada vez mais difíceis no<br />
futuro, desde a logística contínua e a escassez<br />
de matérias-primas até aos impactos a longo<br />
prazo das alterações climáticas na agricultura<br />
e à crescente competição pela terra e pelos<br />
recursos naturais”. Salienta ainda a importância<br />
de as empresas utilizarem estratégias<br />
para lidarem com o risco. “A utilização de<br />
ferramentas que mapeiam a cadeia de<br />
abastecimento pode ajudar as empresas a<br />
começar a compreender onde estão as lacunas<br />
de informação e a começar a preenchê-las.<br />
Um terço das empresas do setor afirmou que a<br />
utilização de software de cartografia da cadeia<br />
de abastecimento estava entre as medidas que<br />
teriam um impacto benéfico na gestão dos<br />
riscos”. •
16<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
LOGÍSTICA<br />
Quinas
SCM Supply Chain Magazine 17<br />
Texto: Ana Paiva<br />
É UMA CERVEJA<br />
PORTUGUESA,<br />
COM CERTEZA<br />
Portugal é um país recheado de<br />
produtos típicos, e a cerveja é um<br />
deles. Bastante acarinhada no nosso<br />
país, raramente se encontra fora da<br />
mesa dos portugueses. Convívios<br />
e celebrações nada são sem que se<br />
oiça o bater das garrafas enquanto<br />
se brinda. Todos sabemos isso. Com a<br />
visão de criar um produto tão adorado,<br />
e de homenagear Portugal, nasceu<br />
a marca de cerveja Quinas, que tem<br />
crescido significativamente ao longo<br />
dos últimos anos, tendo já alcançado<br />
mercados de 30 países. Não fosse<br />
Portugal um país de conquistadores.<br />
Quando ouvimos a palavra “quinas” é<br />
quase impossível não pensarmos em<br />
Portugal. Está presente no brasão do<br />
nosso país, representando os cinco reis<br />
mouros derrotados por D. Afonso Henriques<br />
na batalha de Ourique, em 1139. Assim, pode<br />
dizer-se que é uma palavra intrinsecamente<br />
ligada à nossa história.<br />
“A marca Quinas talvez seja o nome mais<br />
português de todas as cervejas portuguesas”,<br />
afirma Sérgio Duarte, diretor-geral da Domus<br />
Capital, empresa detentora da Quinas, a<br />
propósito da criação da marca, que nasceu<br />
em 2018. Explica que sempre estiveram<br />
atentos aos mercados externos e esforçaramse<br />
em manter uma relação “estreita” com<br />
vários países recetores de produtos de<br />
origem portuguesa. Aliado a isto, a Domus<br />
Capital “sentiu que existia a oportunidade<br />
única de lançar uma marca de cerveja que<br />
representasse bem o espírito português e<br />
se afirmasse como alternativa aos grupos<br />
cervejeiros nacionais existentes”, acrescenta.
18<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
O conceito da marca passa pela criação<br />
de uma homenagem ao país, que se reflete<br />
em algumas das edições especiais do<br />
produto, que ligam Portugal de norte a sul:<br />
A ´Quinas Tripeira’, faz alusão ao rio Douro;<br />
a ‘Quinas Briosa’, homenageia a cidade de<br />
Coimbra; a ‘Quinas Pérola’, representa a<br />
ilha da Madeira; a ‘Quinas Conquistadora’,<br />
remete à cidade de Guimarães; ou a<br />
‘Quinas Olisipo’, que tem o primeiro nome<br />
da cidade de Lisboa. “A decisão foi clara:<br />
levar Portugal numa garrafa, sob o nome<br />
Quinas, e com a assinatura ‘Portuguesa<br />
com certeza’”.<br />
PRODUÇÃO E LOGÍSTICA<br />
O processo de produção de uma cerveja<br />
Quinas, que acontece nas fábricas localizadas<br />
em Estarreja, Ílhavo, Oliveira de Azeméis e<br />
Santarém, é constituído por várias etapas até<br />
chegar ao consumidor final.<br />
as enzimas. A esta ação denomina-se<br />
“brassagem”, que faz extração dos açúcares<br />
que existem nos cereais.<br />
FILTRAGEM<br />
Filtram-se todas as cascas dos cereais de<br />
modo a obter um líquido próximo da cor<br />
final. Este líquido segue para a caldeira em<br />
ebulição (o chamado mosto) e aqui, quando<br />
ocorre a fermentação, nasce a cerveja Quinas.<br />
MOAGEM<br />
Após a seleção da receita que se vai produzir<br />
e do tipo de cereal a utilizar, é colocado no<br />
moinho para iniciar o processo de moagem.<br />
ARREFECIMENTO<br />
A temperatura do mosto desce e surgem<br />
as leveduras que são os agentes Quinas<br />
responsáveis pela existência da cerveja. Esta<br />
temperatura de arrefecimento varia de receita<br />
para receita.<br />
BRASSAGEM E EMPASTAGEM<br />
Junta-se água ao malte moído, a uma<br />
temperatura regulada de forma a ativar<br />
FERMENTAÇÃO<br />
Junta-se a levedura, que vai fermentar e<br />
transformar os açúcares em álcool e em CO2.<br />
A fermentação ocorre durante mais de um dia<br />
e varia de cerveja para cerveja.
SCM Supply Chain Magazine 19<br />
limpando as partículas suspensas. Nesta fase<br />
chega-se à cor final da cerveja.<br />
MATURAÇÃO<br />
Esta é a fase de estabilização da Quinas, onde<br />
se afina o sabor.<br />
ENCHIMENTO<br />
A cerveja é engarrafada para que possa<br />
chegar aos consumidores finais.<br />
FILTRAÇÃO FINAL<br />
É o momento em que a cerveja é clarificada,<br />
Assim que o processo de produção está<br />
concluído, registam-se as validades e os<br />
lotes, e as cervejas seguem para os armazéns<br />
de expedição consoante a fábrica onde foram<br />
produzidas. A nível de armazenagem,
20<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
a Quinas detem um espaço central em Alfena,<br />
com cerca de 3.000 metros quadrados, um<br />
em Estarreja com cerca de 6.000 metros<br />
quadrados, e outro em Ílhavo, com 4.000<br />
metros quadrados.<br />
PORTUGAL ALÉM-FRONTEIRAS<br />
A grande distribuição da cerveja Quinas<br />
a nível nacional, entregue à Vinalda, ocorre<br />
no canal off-trade e na rede de cash and<br />
carry, que tem como objetivo levar o produto<br />
a mais de 2.000 superfícies comerciais.<br />
Por sua vez, no canal horeca, a marca tem<br />
distribuidores próprios. O transporte, em<br />
Portugal e na Europa, é efetuado através<br />
de meios terrestres. Já para os mercados<br />
externos onde estão presentes, utilizam<br />
contentores normais ou com temperatura<br />
regulada, dependendo do tipo de cerveja a<br />
ser transportado.<br />
Atualmente, as exportações desta cerveja<br />
portuguesa representam cerca de 60% das<br />
vendas do grupo, e está presente em mais<br />
de 30 mercados, como Macau, Brasil, Cabo<br />
Verde, São Tomé e Príncipe, Costa do Marfim,<br />
França, Bélgica, Canadá, Estados Unidos,<br />
Cuba Marrocos ou Singapura.<br />
Ainda assim, o desafio da empresa para este<br />
ano, no panorama internacional, é concluir<br />
as negociações com o mercado chinês. “A<br />
China pode ser um grande mercado para a<br />
Quinas, mas o que pretendemos, neste país, é<br />
criar marca e não só vender cerveja”, explica<br />
Sérgio Duarte, acrescentando que “temos<br />
como objetivo ser a cerveja portuguesa<br />
de referência nos mercados onde estamos<br />
presentes. Certamente que o mercado chinês<br />
será fundamental para alcançar este objetivo”.<br />
Em tom de visão para o futuro, o diretorgeral<br />
refere que, a curto-médio prazo, a meta<br />
consiste em “ser a cerveja nacional número<br />
dois nos mercados internacionais e a terceira<br />
marca de cerveja mais vendida em Portugal”.<br />
Falando em investimentos concretos, estão<br />
em vista a aquisição e renovação de unidades<br />
de produção na ordem de oito milhões de<br />
euros, de acordo com Sérgio Duarte. •
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22<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
LOGÍSTICA<br />
IBM e CGF<br />
Texto: Bruna Manguito<br />
TECNOLOGIA E<br />
SUSTENTABILIDADE:<br />
UMA COMBINAÇÃO<br />
VENCEDORA<br />
A IBM e o The Consumer Goods Forum (CGF)<br />
realizaram o estudo “Redesenhar os valores<br />
da marca: o objetivo e o benefício convergem<br />
no centro das operações”, que reporta que<br />
as empresas europeias do setor de bens de<br />
consumo estão a aumentar, em 34%, os seus<br />
orçamentos de tecnologia com o objetivo<br />
de alinhar a sustentabilidade com as suas<br />
operações e impulsionar o seu crescimento.<br />
Oestudo, que envolveu entrevistas com<br />
1.800 executivos de empresas de bens<br />
de consumo em 23 países, revelou que as<br />
empresas estão a integrar a sustentabilidade<br />
nas suas operações, recalibrando a medição<br />
e a comunicação das suas metas de<br />
sustentabilidade, bem como a aumentar<br />
os seus investimentos em tecnologia como<br />
forma de alcançar essas metas.<br />
Entre as principais conclusões, destacase<br />
a integração da sustentabilidade e das<br />
operações, com 61% dos líderes de bens de<br />
consumo a alinharem propositadamente as<br />
suas metas, tanto de sustentabilidade como<br />
operacionais, para otimizar investimentos<br />
e esforços. Por sua vez, 69% dos líderes<br />
europeus (77% a nível global) concordam<br />
que os investimentos em sustentabilidade<br />
irão acelerar o crescimento dos seus<br />
negócios. Esta integração estratégica tem<br />
resultado em iniciativas como embalagens<br />
sustentáveis, processos de produção<br />
energeticamente eficientes e fornecimento<br />
ético de materiais.
SCM Supply Chain Magazine 23<br />
Destaca-se ainda a recalibração<br />
da medição e comunicação da<br />
sustentabilidade. Quase 80% dos líderes<br />
europeus (74% a nível mundial) concordam<br />
com a necessidade de recalibrar a forma<br />
como medem e reportam as suas metas<br />
de sustentabilidade. No entanto, muitas<br />
empresas não possuem capacidade para<br />
monitorizar e medir o progresso de forma<br />
adequada, com 68% dos líderes europeus<br />
(61% a nível mundial) a indicar que<br />
enfrentam desafios na recolha, análise e<br />
interpretação de dados de sustentabilidade.<br />
Ruediger Hagedorn, CGF end-to-end<br />
value chain director, revela em comunicado<br />
que “os consumidores estão a considerar<br />
recompensar as empresas que estão<br />
focadas na sustentabilidade e as empresas<br />
de bens de consumo estão atentas a<br />
isso. Ao unir a sustentabilidade com a<br />
eficiência operacional, as empresas estão<br />
a redesenhar proativamente a sua cadeia<br />
de abastecimento e operações de produção<br />
para impulsionar o crescimento e mitigar<br />
riscos. Este estudo fornece informações<br />
valiosas para a tomada de decisões globais<br />
ao nível da gestão, visando preparar o<br />
setor de bens de consumo para um futuro<br />
mais sustentável”.<br />
O aumento dos investimentos<br />
em tecnologia para impulsionar a<br />
sustentabilidade também é destacado<br />
pelo estudo. As empresas europeias do<br />
setor de bens de consumo pretendem<br />
aumentar em 39% (34% a nível global)<br />
os seus orçamentos de tecnologia nos<br />
próximos três anos, como uma forma<br />
de operacionalizar a sustentabilidade.<br />
Estes investimentos têm sido<br />
direcionados para áreas como eficiência<br />
energética, rastreabilidade da cadeia de<br />
abastecimento, inovação de produtos, ou<br />
embalagens sustentáveis.<br />
E todas as empresas querem tirar partido<br />
da tecnologia para operacionalizar a<br />
sustentabilidade. Os líderes consideram<br />
várias tecnologias avançadas, como<br />
automação (71%), analítica (69%),
24<br />
ABRIL <strong>2023</strong>
SCM Supply Chain Magazine 25<br />
Inteligência Artificial (55%), e fluxos de<br />
trabalho inteligentes (44%). Enquanto<br />
renovam as suas operações da cadeia de<br />
abastecimento, 67% apontam o uso de<br />
analítica preditiva e prescritiva, e deteção<br />
de procura alimentada por IA (69%) para<br />
melhorar a gestão de stock e eliminar<br />
o excesso do mesmo. Estão também a<br />
aplicar fluxos de trabalho suportados por<br />
IA (70%) e a começar a adotar a tecnologia<br />
emergente de digital twins (26%) para<br />
impulsionar a eficiência.<br />
Além disso, o estudo enfatiza ainda a<br />
importância de unir a sustentabilidade com<br />
a eficiência operacional, permitindo que as<br />
empresas de bens de consumo redesenhem as<br />
suas cadeias de abastecimento e operações<br />
de produção de forma proativa para<br />
impulsionar o crescimento e mitigar riscos.<br />
“No mundo de hoje, os consumidores<br />
procuram ativamente marcas que reflitam<br />
os seus valores, tornando a integração<br />
da sustentabilidade um diferencial<br />
importante para as empresas de bens de<br />
consumo e para os seus distribuidores”,<br />
afirma Luq Niazi, global managing<br />
partner for Industries, da IBM. Acrescenta<br />
ainda que “a incorporação significativa<br />
da sustentabilidade nas operações da<br />
marca só pode ser alcançada através de<br />
uma combinação robusta de processos<br />
de negócio, tecnologia, parcerias com<br />
ecossistemas e colaboração C-suite<br />
nas áreas de produção, tecnologia,<br />
operações, cadeias de abastecimento e<br />
sustentabilidade”. •
26<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
Texto: Bruna Manguito<br />
O PAPEL DO FUTURO<br />
SUSTENTÁVEL<br />
LOGÍSTICA<br />
Investimento<br />
A fábrica de papel de Viana do Castelo,<br />
pertencente à DS Smith, anunciou um<br />
pacote plurianual de investimentos de<br />
145 milhões de euros para fortalecer a<br />
sua posição na Europa. À Supply Chain<br />
Magazine, Mário Amaral, diretor da<br />
fábrica, revelou os planos de expansão e as<br />
melhorias operacionais que impulsionarão<br />
a eficiência e os índices ambientais da<br />
unidade.
SCM Supply Chain Magazine 27<br />
Afábrica de papel de Viana do Castelo<br />
desempenha um papel crucial na cadeia<br />
logística da DS Smith, como destaca Mário<br />
Amaral, diretor da fábrica de papel de Viana do<br />
Castelo: “Nós não produzimos caixas de cartão<br />
canelado, nós produzimos papel que depois<br />
vai ser distribuído às fábricas do grupo onde<br />
se vai produzir a prancha de cartão canelado e<br />
as caixas de cartão canelado. Portanto, o que<br />
produzimos é papel para embalagem”. Com<br />
uma capacidade de produção anual de 400 mil<br />
toneladas, a fábrica de Viana do Castelo lida<br />
diariamente com um impressionante fluxo de<br />
materiais ao longo da sua cadeia produtiva, o<br />
que exige uma gestão logística ágil e eficaz.<br />
“Em 24 horas produzimos uma folha de papel<br />
com 6,4 metros de largura que, se estendida,<br />
cobriria a distância do norte de Portugal a<br />
Marrocos, ou seja, por minuto produzimos uma<br />
folha de papel com cerca de um quilómetro<br />
de comprimento. Somos uma grande unidade<br />
industrial e reconhecida pelos nossos pares<br />
como uma das mais eficientes da Europa”,<br />
garante o responsável. Dentro do pacote<br />
plurianual de investimentos de 145 milhões de<br />
euros da DS Smith, que incluirá a reconstrução<br />
da atual máquina de papel e a instalação de<br />
uma nova caldeira de recuperação topo de<br />
gama na fábrica de papel de Viana do Castelo,<br />
destacam-se, ainda, melhorias “nas operações<br />
de carga dos camiões. Vamos instalar<br />
equipamentos que vão possibilitar melhorar<br />
essa operação e também algum controlo ao<br />
nível de sistemas informáticos”, declara Mário<br />
Amaral. Embora a logística não seja o foco<br />
principal do investimento, o diretor enfatiza<br />
que essas melhorias e ações relacionadas à<br />
distribuição, transporte e operações logísticas<br />
contribuirão indiretamente para a otimização<br />
da cadeia de abastecimento: “Por arrastamento,<br />
há melhorias que serão introduzidas na
28<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
Mário Amaral, diretor de fábrica<br />
cadeia logística”. Essas medidas têm como<br />
objetivo aumentar a eficiência operacional,<br />
reduzir custos e encurtar prazos de entrega,<br />
resultando numa resposta mais ágil e<br />
satisfatória às demandas dos clientes. Além<br />
disso, aprimorar a logística está alinhado com o<br />
compromisso da empresa em oferecer soluções<br />
de embalagens mais sustentáveis.<br />
COMPROMISSO<br />
COM A SUSTENTABILIDADE<br />
De acordo com Mário Amaral, a fábrica<br />
de papel de Viana do Castelo serve<br />
maioritariamente “o mercado da Península<br />
Ibérica, com grande peso no setor agrícola<br />
espanhol. Produzimos papel para produzir<br />
caixas de cartão canelado para o setor agrícola.<br />
Segundo grande mercado, a Alemanha,<br />
produzimos papel para produzir caixas de cartão<br />
canelado para a indústria alemã, sobretudo, com<br />
grande peso no setor automóvel”. No entanto,<br />
além de atender às demandas do mercado, a<br />
DS Smith também está comprometida com a<br />
sustentabilidade e o impacto ambiental das<br />
suas operações. Segundo o diretor da fábrica, o<br />
“aumento de produção de 8% vai ser garantido<br />
à custa do aumento, precisamente, do papel<br />
recuperado, nós não vamos suportar o aumento<br />
de produção com madeira, mas vamos suportá-lo<br />
com o aumento do consumo de papel reciclado".<br />
Desta forma, a empresa estará preparada<br />
para responder às pressões e necessidades<br />
dos clientes como da própria cadeia de<br />
abastecimento, reforçando o seu compromisso<br />
com a circularidade, “o que significa que as<br />
caixas que lançamos no mercado, vamos depois<br />
ter que as recolher para tornar a produzir novas<br />
caixas à custa das caixas que já foram utilizadas”,<br />
contribuindo para a redução do desperdício e a<br />
preservação dos recursos naturais. Ademais, a DS<br />
Smith está focada na descarbonização das suas<br />
operações: “Nós temos um forte compromisso<br />
com o projeto Paris, aderimos ao projeto Paris<br />
e ele está a ser monitorado por entidades
SCM Supply Chain Magazine 29<br />
oficiais e o nosso compromisso é chegar a 2050,<br />
naturalmente, com zero emissões de CO2 e<br />
chegar a 2030, que é já amanhã, reduzindo 46%<br />
das nossas emissões de CO2 tendo por base o<br />
ano de 2019”, declarou. Através de investimentos<br />
ambientais e do aumento da produção de papel<br />
reciclado, a empresa prevê uma redução de<br />
10.000 toneladas de CO2 por ano a partir de<br />
outubro. Outra estratégia importante adotada<br />
pela DS Smith é a substituição de embalagens<br />
de plástico prejudiciais ao meio ambiente por<br />
embalagens de cartão canelado. O responsável<br />
revelou que “o grupo definiu em 2020 contribuir<br />
para eliminar das prateleiras dos supermercados<br />
até 2025, 1 bilhão de caixas de plástico. (…)<br />
Até à data já conseguimos tirar das prateleiras<br />
dos supermercados 200 milhões de caixas de<br />
embalagens de plástico e substituí-las por caixas<br />
de cartão canelado".<br />
EVOLUÇÃO E TENDÊNCIAS<br />
DE MERCADO<br />
Quando questionado sobre as tendências do<br />
mercado e as necessidades dos clientes, Mário<br />
Amaral respondeu prontamente que existem<br />
“duas vertentes claras, a primeira a questão<br />
ambiental e de sustentabilidade que temos de<br />
dar resposta, fazer caixas com menor pegada<br />
ambiental e mais sustentáveis e a segunda tirar<br />
proveito de todo o potencial que ainda existe<br />
decorrente do comércio eletrónico”. “Quando as<br />
coisas chegam a sua casa chegam embaladas<br />
numa caixa de cartão e isso é uma tendência<br />
que veio para ficar e traz alguns desafios<br />
porque os nossos clientes que estão do lado<br />
de lá são muito mais exigentes em termos de<br />
cumprimento de prazos e sobretudo just in time”,<br />
aponta o diretor. Contudo, indica que existe<br />
uma mudança nos circuitos de recolha de papel<br />
usado, “agora já não são os grandes armazéns a<br />
fornecer as caixas mas é o consumidor individual.<br />
E essas pessoas, nós, temos de ter o cuidado<br />
de depois segregar essas caixas quando vamos<br />
colocá-las no ecoponto. E, depois dos circuitos,<br />
as entidades municipais vão ter de ter o cuidado<br />
de recolher essas caixas e não as separar, por<br />
exemplo, com os jornais e papéis de revistas<br />
porque esse papel não é passível de ser utilizado<br />
para produzir caixas de cartão canelado”. Não<br />
obstante, Mário Amaral, sente-se otimista<br />
em relação ao futuro tanto do setor como da<br />
empresa já que a matéria-prima utilizada pela<br />
fábrica, a madeira de pinho, “é biodegradável e<br />
renovável, lá está, para a circularidade quando<br />
não puder já ser reutilizável é biodegradável,<br />
zero impactos para o ambiente. Sobretudo o<br />
nosso produto faz mover a economia porque sem<br />
caixas de cartão não havia transporte". •
30<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
PROCUREMENT<br />
NOS SGPS
SCM Supply Chain Magazine 31<br />
Texto: Fábio Santos<br />
Fotografias: Fábio Santos<br />
PROATIVIDADE E<br />
ENVOLVÊNCIA COM<br />
OS FORNECEDORES<br />
A 13ª edição dos EIPM-Peter Kraljic<br />
Awards aconteceu a 15 de dezembro de<br />
2022, num evento presencial em Paris,<br />
após dois anos de celebrações virtuais.<br />
Nessa edição foram distinguidas três<br />
empresas portuguesas, em diferentes<br />
categorias, entre as quais a NOS<br />
SGPS, com o prémio de Impactful<br />
Business Orientation, pelo efeito que a<br />
empresa tem ao nível das iniciativas de<br />
parceria e de suporte a outros negócios<br />
parceiros.<br />
Ocontacto entre a NOS SGPS e o EIPM<br />
começou ainda antes da pandemia,<br />
quando o setor de procurement da<br />
tecnológica portuguesa estava a fazer uma<br />
aposta a médio-longo prazo na formação<br />
das suas equipas, procurando dotar os seus<br />
negociadores de capacidades que lhes<br />
permitissem atingir o grau de gestores de<br />
categoria. À data, foi feita uma análise ao<br />
mercado ao nível das formações, e optaram<br />
pelo instituto. Fizeram uma avaliação de<br />
competências aos seus negociadores para<br />
perceberem as qualidades das equipas, e<br />
onde queriam chegar, seguindo-se um fitgap<br />
de conteúdos que deveriam endereçar<br />
individualmente para fazerem essa passagem<br />
de categoria.<br />
Diogo Serras Pereira, diretor de compras da<br />
NOS SGPS, conta que a partir daí começaram<br />
a trocar várias impressões com o EIPM, e<br />
que inclusive já eram para ter concorrido no<br />
ano passado. “É uma questão bastante mais<br />
trabalhosa do que eu estava à espera. Têm um<br />
inquérito muito extenso que cobre muitas
32<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
áreas, e depois entrevistas durante um dia<br />
inteiro, ou duas manhãs, com pessoas que<br />
realmente dominam o assunto e que fazem<br />
várias questões, mas também nos deram<br />
conselhos muito pertinentes”, comenta o<br />
responsável. “Deram-nos umas luzes para<br />
caminhos futuros bastante interessantes,<br />
identificaram temas onde poderíamos<br />
desenvolver mais, mas também ficaram bem<br />
impressionados com parte do trabalho que<br />
nós tínhamos feito”.<br />
Para o concurso, é feita uma análise ao<br />
modelo operativo das concorrentes, primeiro<br />
através de perguntas, para perceberem como<br />
funcionam, e depois através de uma análise<br />
presencial para comprovar que os processos<br />
realmente são feitos de determinada maneira,<br />
bem como os resultados. “Isto toca todas<br />
as áreas, desde eficiência, sustentabilidade,<br />
análise de risco de fornecedores, programa de<br />
relação com fornecedores… e depois pedemnos<br />
exemplos práticos e vêm confirmar que<br />
tudo o que dizemos”, explica.<br />
No final de março, partilharam inclusive a<br />
experiência da NOS SGPS numa formação,<br />
enquanto convidados pelo instituto. “Espero<br />
conseguir formar a equipa em mais módulos,<br />
porque parece-me bastante objetivo e<br />
interessante para a nossa área”, defende o<br />
responsável.<br />
UM GRANDE PLANO ESTRATÉGICO<br />
Há cerca de quatro anos, a NOS SGPG<br />
avançou com um grande plano estratégico<br />
para a área de procurement, do que<br />
queriam que ela fosse, de onde vinha, e<br />
onde queriam que chegasse. “O nosso<br />
grande objetivo era passar de uma equipa,<br />
ou de uma função, mais funcional, em que<br />
reativamente recebíamos pedidos das áreas<br />
internas de clientes, e depois respondíamos<br />
com concursos, como a área tradicional de<br />
procurement faz nos primeiros estágios, para<br />
um estágio onde fôssemos um mais proativos,<br />
tanto na lógica de levantamento de tudo o<br />
que são necessidades da empresa, ao nível
SCM Supply Chain Magazine 33<br />
EM PORTUGAL,A<br />
ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA<br />
DE COMPRAS E<br />
APROVISIONAMENTO<br />
(APCADEC) CONTA COM<br />
UMA PARCERIA COM<br />
O EIPM DE FORMA A<br />
APOIAR OS ASSOCIADOS<br />
NO PROCESSO DE<br />
CANDIDATURA.<br />
das compras, como de desafiar fornecedores<br />
a trazerem de inovação de fora para dentro,<br />
o que não é algo que a área de procurement<br />
tradicionalmente faz”.<br />
Através desse maior envolvimento dos<br />
fornecedores na busca por inovação,<br />
“queremos criar esta proatividade para<br />
os próprios fornecedores. Para além de<br />
responder aos pedidos básicos, nós temos<br />
de trazer inovações para que nós possamos<br />
difundir aqui na área”.<br />
“Temos cerca de 500 processos levantados<br />
antes do fim do ano, definimos a nossa<br />
estratégia, fazemos a matriz de Kraljic,<br />
de acordo com o risco e dificuldade de<br />
fornecimento que existe no mercado, depois<br />
estabelecemos estratégias e táticas para os<br />
principais processos que identificamos,<br />
bem-vindo a<br />
uma estreita colaboração<br />
em toda a Europa<br />
Descubra o caminho mais curto para uma experiência local,<br />
apoio ao cliente, garantia de disponibilidade e uma<br />
parceria dedicada, com a nossa cobertura Europeia.<br />
together towards a sustainable future
34<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
discutimos isso com as áreas e ‘vamos a<br />
jogo’”, explica o responsável, acrescentando<br />
que se para cada processo tiverem entre<br />
um e dois fornecedores, existe uma grande<br />
oportunidade para gerar informação.<br />
Diogo Serras Pereira conta que, para além<br />
de “responder a pedidos” (embora exista<br />
todo um processo de ir a mercado e de<br />
estabelecer uma estratégia de negociação),<br />
pretendem trazer inovação para o processo,<br />
indo além da função core que as compras têm.<br />
Anualmente, desenvolvem o Plano Anual de<br />
Compras (PAC), e depois de a empresa fechar<br />
o budget para o ano seguinte, vão falar com<br />
as direções de clientes e estabelecem o plano<br />
de procurement.<br />
“Este Roadmap que desenvolvemos obrigounos<br />
a revisitar o nosso modus operandis como<br />
as valências que nós precisaríamos de ter,<br />
desde o elaborar o plano estratégico, algo<br />
novo na altura; às competências dos nossos<br />
gestores de categoria; ao modelo de decisão<br />
e partilha de informação entre os vários<br />
stakeholders; até ao transformar a relação<br />
entre Procurement e Fornecedor / Parceiro de<br />
uma relação 100% negocial para algo mais<br />
estruturado que também provoque a partilha e<br />
inovação “<br />
IMPACTFUL BUSINESS<br />
Diogo Serras Pereira explica que a área<br />
das telecomunicações tem uma necessidade,<br />
sobretudo no universo corporate (B2B), de<br />
tornar mais abrangente o seu portefólio<br />
de serviços, e de passar de uma lógica<br />
de resistir/combater uma ameaça, sendo<br />
apenas transportadores de sinal, para<br />
uma lógica de incluir serviços de valor<br />
aumentado, diferentes, conexos com os de<br />
telecomunicações, onde se incluem serviços<br />
de consultoria, integrações, implementações<br />
de soluções, ou possibilitar o potenciar de<br />
eficiências como seja através do deployment<br />
do 5G em determinadas empresas ou setores,<br />
como é o caso da logística.<br />
Como exemplos de processos em que
SCM Supply Chain Magazine 35<br />
podem ter impacto, o diretor de compras deixa<br />
exemplos:<br />
Negociação de energia – “Nós<br />
quando negociamos energia, além do custo,<br />
temos uma preocupação significativa com a<br />
eficiência, mas também com todas as metas<br />
que temos para atingir a sustentabilidade”.<br />
Tendo isto em mente, há uns anos, a NOS<br />
SGPG estabeleceu um plano para contratação<br />
de energia 100% verde a 10 anos.<br />
A NOS SGPG efetuou um trabalho profundo<br />
e estruturado de análise de toda a cadeia<br />
de valor de empresas produtoras de energia<br />
renovável, discutindo com promotores,<br />
fabricantes e especialistas internacionais na<br />
área da energia, “desmontando” os valores das<br />
principais componentes de custo e analisando<br />
tendências futuras quer do preço no mercado<br />
de energia como de descida expectável dos<br />
custos de produção de energia renovável.<br />
“Fomos ver, de acordo com as tecnologias<br />
que estão a aparecer cada vez mais, como<br />
a eólica ou solar, o que é que os melhores<br />
estudos de mercado, das entidades que<br />
produzem os equipamentos para este tipo de<br />
parques, nos indicavam quanto à evolução<br />
do custo de produção de energia verde VS as<br />
tradicionais”, explica Diogo Serras Pereira.<br />
Face a essa análise, “o que nós víamos<br />
era que a curva de custo de euro por<br />
Megawatt (MW) nestas eólicas ou solares,<br />
era uma exponencial negativa, que iria ter<br />
valores muito agressivos, portanto, se nós<br />
contrapuséssemos isto contra a melhor<br />
informação que nós temos de mercado de uma<br />
contratação tradicional, víamos que se nós<br />
conseguíssemos contratar a determinado valor,<br />
estaríamos abaixo do futuro valor expectável<br />
de mercado”.<br />
Assim, tomaram a decisão de, para grande<br />
parte do seu consumo, fixar a contratação<br />
de energia renovável a um preço que<br />
consideraram justo, e “ao dia de hoje, podemos<br />
dizer que temos valores de contratação de<br />
energia a preços muito interessantes, ao<br />
contrário da maioria dos nossos concorrentes.<br />
Esta simples medida pode permitir-nos obter<br />
vantagens competitivas na oferta de P&S<br />
(B2B por exemplo), dependentes de forma<br />
significativa dos custos energéticos”.<br />
A energia foi um claro exemplo de um<br />
contrato de sucesso para a NOS SGPS,<br />
mostrando-se especialmente importante após<br />
a explosão dos custos de energia. “O que<br />
fazíamos até aqui era tipicamente o que fazem<br />
muitas organizações que têm mais ou menos<br />
o nosso modelo e peso em Opex do que são<br />
os custos de energia. Nós temos um peso – ou<br />
tínhamos, antes da crise – em valor absoluto<br />
em grande, mas o peso em termos de rubricas<br />
de custo no total de custos operacionais é<br />
relativamente diminuto, portanto, era um<br />
tema que não nos preocupava muito e que<br />
fechávamos anualmente”, explica.<br />
No entanto, com as tendências de mercado,<br />
identificaram não só a necessidade de ir<br />
para o mercado verde para fazer face às suas<br />
obrigações de redução de CO2 e eficiências<br />
energéticas, mas também para otimizar este<br />
custo, tendo em atenção as novas tipologias<br />
de produção de energia que acontecem e o<br />
desenvolvimento tecnológico a longo prazo<br />
Cibersegurança - “Sendo a NOS<br />
uma empresa tecnológica de referência<br />
e dimensão internacional, parece-nos<br />
fazer sentido que o desenvolvimento de<br />
determinadas competências internas e adoção<br />
de determinadas soluções para colmatar<br />
determinada necessidade de negócio, muitas<br />
vezes transversal a vários setores, confere<br />
e transmite confiança ao mercado dessas<br />
mesmas soluções”, o que gera também um
36<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
impacto nos seus fornecedores, que têm<br />
curiosidade em avaliar o tipo de soluções<br />
adotadas pela empresa, especialmente em<br />
áreas de cariz tecnológico. Tendo isso em<br />
conta, avança que “as competências que temos<br />
desenvolvido e as soluções que temos adotado<br />
começam a fazer parte do nosso portfolio”,<br />
como é o exemplo da Cibersegurança, uma<br />
nova área em que apostaram.<br />
FORNECEDORES ENQUANTO<br />
PARCEIROS<br />
Um dos projetos mais críticos que têm é o<br />
estabelecimento do programa de relação com<br />
os fornecedores. “O que nós queremos criar<br />
é esta envolvência com bastante dinamismo<br />
onde, além de reconhecermos quem são os<br />
nossos melhores fornecedores, um bocadinho<br />
como se faz nas áreas comerciais de premiar os<br />
melhores comerciais, e reconhecer e premiar<br />
quem são os nossos melhores fornecedores em<br />
determinadas categorias ou setores”, defende<br />
Diogo Serras Pereira.<br />
A NOS SGPS faz uma avaliação para avaliar<br />
os seus parceiros em várias valências, como por<br />
exemplo cumprimento de contratos, busca de<br />
inovação ou sustentabilidade. “O que fazemos<br />
com isto é, quem tem uma avaliação abaixo<br />
de 70%, é chamado para ter reuniões com as<br />
direções de cliente para desenharem um plano<br />
de melhoria. Não é só olhar para os melhores<br />
e premiá-los. Queremos também ajudar os que<br />
mais precisam, porque também precisamos<br />
deles”, explica o diretor de compras.<br />
Para além disso, apostar na dinâmica que<br />
referia anteriormente de desafiarem os seus<br />
fornecedores a trazerem inovações e, também<br />
eles, a desafiá-los a fazer diferente. “Não<br />
procuramos soluções que já vieram propor<br />
internamente, ou que estão a responder a<br />
cadernos de encargos que nós lançámos no<br />
mercado. Queremos que, com base nas suas<br />
teias de relações com clientes, nos tragam<br />
novidades, inovação, para que nós possamos<br />
questionar internamente se tem ou não<br />
interesse”, aponta.<br />
“Esta lógica de nós, por um lado, pensarmos<br />
na negociação tradicional interna, mas<br />
olharmos também para as necessidades que<br />
temos do outro lado, e percebermos se algum<br />
destes modelos se adaptam, é uma coisa que<br />
tentamos fazer cada vez mais, e daí a lógica<br />
de impactful business”, conclui Diogo Serras<br />
Pereira. •
38<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
TRANSPORTES<br />
Diversidade
SCM Supply Chain Magazine<br />
39<br />
Texto: Bruna Manguito<br />
TOP 10 EMPRESAS<br />
MAIS INCLUSIVAS<br />
DO MUNDO<br />
A inclusão está a tornar-se cada vez mais<br />
comum no vocabulário das empresas, e<br />
isso não é por acaso. A diversidade é uma<br />
fonte de enriquecimento e contribui para<br />
um ambiente de trabalho mais inovador e<br />
produtivo. No entanto, não basta apenas<br />
falar sobre inclusão, é necessário agir e<br />
promover mudanças concretas. É neste<br />
sentido que a Procurement Magazine<br />
procurou exaltar as 10 empresas que<br />
considera serem as mais inclusivas do<br />
mundo.<br />
O<br />
relatório contém entrevistas com líderes<br />
empresariais de diferentes setores<br />
industriais com o objetivo de identificar<br />
que áreas-chave as empresas estão a<br />
adaptar às suas cadeias de abastecimento<br />
de semicondutores, de forma a torná-las<br />
mais resilientes e flexíveis. O documento<br />
salienta ainda como é que os fornecedores<br />
de logística podem apoiar as empresas, por<br />
exemplo proporcionando-lhe uma melhor<br />
visibilidade da cadeia de abastecimento e<br />
melhores insights de dados. Assim, estas<br />
ações permitirão aperfeiçoar as suas<br />
estratégias de inventário e ainda apoiar as<br />
suas iniciativas de sustentabilidade.<br />
A Procurement Magazine destacou<br />
recentemente as 10 empresas que<br />
considera serem as mais inclusivas do<br />
mundo tendo como critério as suas<br />
práticas de compras. Através da promoção<br />
de negócios com fornecedores subrepresentados<br />
ou marginalizados, como,<br />
por exemplo, mulheres, minorias étnicas,<br />
membros da comunidade LGBTQ+ e<br />
pessoas com deficiência, estas empresas<br />
estão empenhadas em criar um ambiente<br />
de trabalho positivo onde a diversidade,<br />
equidade e inclusão são valorizadas tanto<br />
dentro da organização como nas suas<br />
práticas de procurement:<br />
10. TIAA<br />
Em décimo lugar na lista de empresas<br />
mais inclusivas do mundo está a TIAA, uma<br />
empresa de serviços financeiros que não só<br />
fornece serviços de reforma, investimento e<br />
banca, mas também valoriza a diversidade,<br />
equidade e inclusão. A TIAA reconhece<br />
que a diversidade impulsiona a inovação<br />
e fomenta um ambiente de trabalho<br />
positivo, valorizando todos os funcionários,<br />
independentemente da sua origem ou
40<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
identidade. Através do seu programa de<br />
diversidade de fornecedores e outras<br />
iniciativas, a TIAA está a trabalhar ativamente<br />
para promover um ambiente de negócios mais<br />
diversificado e inclusivo.<br />
9. Northrop Grumman Corporation<br />
Outra empresa que está presente na lista<br />
é a Northrop Grumman Corporation, uma<br />
empresa ligada ao setor aeroespacial e de<br />
defesa global que oferece uma gama de<br />
produtos e serviços nas áreas de defesa,<br />
segurança e tecnologia. A empresa entende<br />
a importância de promover a diversidade,<br />
equidade e inclusão tanto dentro da sua<br />
organização como nas suas práticas de<br />
procurement. Da mesma forma, além do seu<br />
programa de diversidade de fornecedores,<br />
a Northrop Grumman procura criar uma<br />
cultura de inclusão dentro da organização,<br />
reconhecendo que uma força de trabalho<br />
diversificada conduz a melhores resultados<br />
e impulsiona a inovação. A empresa está<br />
ainda empenhada em retribuir à comunidade<br />
e apoiar programas que promovam a<br />
diversidade e inclusão.<br />
8. Mastercard Incorporated<br />
A Mastercard Incorporated, uma empresa<br />
de serviços financeiros global, também<br />
ocupa um lugar de destaque nesta lista.<br />
A empresa entende a importância da<br />
diversidade na promoção da inovação e do<br />
sucesso empresarial. Com o seu programa de
SCM Supply Chain Magazine 41<br />
diversidade de fornecedores, a Mastercard<br />
procura colaborar com fornecedores diversos,<br />
incluindo empresas pertencentes a minorias,<br />
mulheres e à comunidade LGBTQ+. Através<br />
desta iniciativa, a empresa cria oportunidades<br />
económicas para grupos sub-representados<br />
e promove a inclusão na sua cadeia de<br />
abastecimento. Ao abrir espaço para novas<br />
ideias e perspetivas, a Mastercard fortalece o<br />
seu negócio e contribui para a construção de<br />
uma economia mais inclusiva.<br />
7. Johnson & Johnson<br />
A Johnson & Johnson, empresa de indústria<br />
farmacêutica e de dispositivos médicos,<br />
também reconhece a importância da<br />
diversidade, equidade e inclusão nas suas<br />
operações e práticas de procurement. Desta<br />
forma, a empresa tornou uma prioridade<br />
promover esses valores tanto internamente<br />
como na escolha dos seus fornecedores. O<br />
seu programa de diversidade de fornecedores<br />
procura trabalhar com uma diversidade de<br />
empresas, incluindo aquelas detidas por<br />
minorias, mulheres e veteranos. A Johnson &<br />
Johnson acredita que esta atitude é essencial<br />
para impulsionar o crescimento económico<br />
e oferecer oportunidades para grupos subrepresentados.<br />
6. Hilton Worldwide Holdings Inc.<br />
A Hilton Worldwide Holdings Inc., uma<br />
empresa de hospitalidade, está empenhada<br />
em promover a diversidade, equidade e<br />
inclusão dentro da sua organização e cadeia de<br />
abastecimento. O programa de diversidade de<br />
fornecedores da Hilton desempenha um papel<br />
crucial nesse compromisso. A empresa procura<br />
trabalhar e apoiar fornecedores de origens<br />
diversas, incluindo empresas detidas por<br />
minorias, mulheres e veteranos. Reconhecendo<br />
a importância de promover oportunidades<br />
económicas para grupos sub-representados,<br />
a Hilton prioriza a sua inclusão na cadeia de<br />
abastecimento.<br />
5. EY (Ernst & Young LLP)<br />
A EY (Ernst & Young LLP), uma empresa<br />
multinacional de serviços profissionais,<br />
oferece uma ampla gama de serviços de<br />
auditoria, impostos e consultoria. Além da sua<br />
missão principal, a empresa está empenhada<br />
em promover a diversidade, equidade e<br />
inclusão tanto dentro da sua organização<br />
como nas suas práticas de procurement. A<br />
EY compreende que um local de trabalho<br />
diverso e inclusivo fomenta um ambiente<br />
mais inovador e produtivo. Como parte desse<br />
compromisso, a empresa implementou um<br />
programa de diversidade de fornecedores<br />
que visa apoiar e trabalhar com fornecedores<br />
de diversas origens. O programa concentrase<br />
em incluir empresas detidas por grupos<br />
sub-representados, como minorias, mulheres<br />
e membros da comunidade LGBTQ+, na sua<br />
cadeia de abastecimento.<br />
4. Cox Communications, Inc<br />
A Cox Communications não é apenas uma<br />
empresa que fornece serviços de cabo, internet<br />
e telefone aos seus clientes. A empresa está<br />
também comprometida em construir um<br />
ambiente de trabalho diverso e inclusivo, onde<br />
todos se sintam valorizados, respeitados e<br />
apoiados. Esse compromisso reflete-se não<br />
apenas nas suas políticas e práticas internas,<br />
mas também nos seus processos de compras.<br />
É por isso que o seu programa de diversidade<br />
de fornecedores procura ativamente trabalhar<br />
com fornecedores de diversas origens, com o<br />
objetivo de criar oportunidades económicas<br />
para grupos sub-representados, priorizando<br />
os negócios detidos por minorias, mulheres e<br />
veteranos. Ao fazê-lo, não só contribui para
42<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
o crescimento dessas empresas, mas também<br />
ajuda a construir comunidades mais inclusivas.<br />
3. Comcast Corporation<br />
A Comcast é uma empresa no setor de<br />
media e tecnologia, que oferece serviços<br />
de cabo, internet e entretenimento aos<br />
seus clientes. O compromisso da Comcast<br />
em promover a diversidade é evidente<br />
através do seu programa de diversidade de<br />
fornecedores, que visa integrar negócios<br />
diversos, como empresas detidas por minorias,<br />
mulheres e pessoas LGBTQ+, na sua cadeia de<br />
abastecimento. A empresa reconhece que a<br />
diversidade de fornecedores é um componente<br />
crítico para criar uma economia mais<br />
inclusiva e prioriza o trabalho com diversos<br />
fornecedores para impulsionar a inovação e<br />
apoiar comunidades sub-representadas.<br />
2. AT&T Inc.<br />
A AT&T é uma empresa de telecomunicações<br />
que oferece uma variedade de serviços de<br />
comunicação, internet e entretenimento aos<br />
consumidores. A empresa está empenhada<br />
em promover a diversidade, a igualdade e a<br />
inclusão, não só na sua cultura corporativa,<br />
mas também nas suas práticas de<br />
procurement. O seu programa de diversidade<br />
de fornecedores tem como objetivo promover<br />
uma cadeia de abastecimento diversificada,<br />
envolvendo fornecedores provenientes<br />
de diferentes origens, como empresas<br />
pertencentes a minorias, mulheres e veteranos.<br />
O compromisso da empresa em colaborar com<br />
uma ampla gama de fornecedores demonstra<br />
o seu objetivo de criar oportunidades<br />
económicas para comunidades subrepresentadas,<br />
enquanto melhora a qualidade<br />
dos produtos e serviços que oferece.<br />
1. Accenture<br />
A Accenture é uma empresa global de<br />
serviços profissionais que oferece uma<br />
variedade de serviços de consultoria, tecnologia<br />
e outsourcing. É amplamente reconhecida<br />
pelo seu compromisso com a diversidade, a<br />
igualdade e a inclusão, tanto internamente<br />
como nas suas práticas de procurement. O seu<br />
programa de diversidade de fornecedores é
SCM Supply Chain Magazine 43<br />
uma das formas através das quais a empresa<br />
demonstra o seu compromisso com a<br />
diversidade. O programa procura incluir diversos<br />
fornecedores na sua cadeia de abastecimento,<br />
incluindo empresas pertencentes a minorias,<br />
mulheres e membros da comunidade LGBTQ+.<br />
A Accenture oferece aos fornecedores<br />
diversos acesso a orientação, networking e<br />
oportunidades de formação para ajudá-los<br />
a expandir os seus negócios e prosperar no<br />
mercado. A empresa também estabelece<br />
parcerias com pequenas e médias empresas<br />
(PME) e empresas em mercados emergentes,<br />
com o objetivo de promover o crescimento<br />
e a sustentabilidade económica. Além do<br />
programa de diversidade de fornecedores,<br />
a Accenture está empenhada em promover<br />
a diversidade e a inclusão internamente,<br />
criando uma cultura que abraça a diversidade<br />
em todas as suas operações. A empresa<br />
implementou uma série de iniciativas e<br />
programas de diversidade, incluindo grupos<br />
de recursos para os funcionários, formação<br />
em diversidade e inclusão, e programas de<br />
desenvolvimento de liderança para grupos<br />
sub-representados. Esses esforços renderam<br />
à Accenture reconhecimento como uma das<br />
empresas de procurement mais diversas do<br />
mundo. A empresa recebeu vários prémios<br />
pelo seu programa de diversidade de<br />
fornecedores, incluindo o prémio "Corporation<br />
of the Year" do National Minority Supplier<br />
Development Council e o prémio "America's<br />
Top Corporations for Women's Business<br />
Enterprises" do Women's Business Enterprise<br />
National Council. •<br />
CONNOSCO
44<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
PROCUREMENT<br />
Apple
SCM Supply Chain Magazine 45<br />
O COMPROMISSO<br />
SUSTENTÁVEL<br />
DA APPLE<br />
Sendo a Apple uma líder global na área<br />
produtos tecnológicos, tem a seu cargo<br />
uma responsabilidade social acrescida. A<br />
sustentabilidade ambiental é um tema que<br />
está na ordem do dia, e a multinacional temno<br />
levado a sério. Exemplo disso é o trabalho<br />
que tem vindo a fazer com a sua rede de<br />
parceiros, a nível internacional.<br />
A<br />
Apple anunciou recentemente que os<br />
seus parceiros suportam agora mais 13<br />
gigawatts de eletricidade renovável em<br />
todo o mundo, o que representa um aumento<br />
de cerca de 30%, no último ano. No total,<br />
mais de 250 fornecedores, a operar em 28<br />
países, estão empenhados em utilizar energia<br />
renovável para toda a produção da Apple, até<br />
2030. Isto representa mais de 85% dos gastos<br />
diretos de produção da empresa, e mais de<br />
20 gigawatts em compromissos.<br />
Já neutra em carbono pelas suas emissões<br />
corporativas globais, a multinacional utiliza<br />
ferramentas inovadoras para ser neutra em<br />
carbono para cada produto, até 2030. Isto<br />
inclui 4,7 mil milhões de dólares em Green<br />
Bonds (fundo de financiamento para fins<br />
sustentáveis), que estão a ajudar a financiar<br />
a expansão de soluções de energia limpa e a<br />
redução de emissões em todo o mundo.<br />
A Apple partilhou recentemente detalhes<br />
dos gastos do seu Green Bond de 2022, que<br />
incluiu investimentos em energia solar em<br />
larga-escala, designs de baixo carbono,<br />
eficiência energética, e remoção de carbono.<br />
“Na Apple, somos neutros em carbono para<br />
as nossas próprias operações e inovamos<br />
todo os dias para irmos mais longe no<br />
trabalho urgente de enfrentar as alterações<br />
climáticas”, afirma Tim Cook, CEO da Apple.<br />
“Com parceiros em todo o mundo, estamos a<br />
adicionar ainda mais energia renovável para<br />
alimentar a nossa cadeia de abastecimento<br />
global e investir em tecnologias verdes de<br />
próxima geração. A escala deste desafio é<br />
imensa, assim como a nossa determinação<br />
em enfrentá-lo”.<br />
Mais de 40 parceiros fabricantes aderiram<br />
ao Programa de Energia Limpa do Fornecedor<br />
Apple (Apple’s Supplier Clean Energy<br />
Program), no último ano.
46<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
A multinacional apelou aos seus<br />
fornecedores para descarbonizarem todas<br />
as operações relacionadas com a Apple,<br />
incluindo o fornecimento de eletricidade<br />
100% renovável. Para ajudá-los a cumprir os<br />
seus compromissos e a chegar mais longe,<br />
a Apple trabalha em estreita colaboração<br />
com os fornecedores para identificar e<br />
implementar soluções de energia limpa e<br />
redução de carbono, oferecendo um conjunto<br />
de recursos de aprendizagem gratuitos, e de<br />
formações ao vivo através da sua Academia<br />
de Energia Limpa (Clean Energy Academy).<br />
“Os nossos novos compromissos com os<br />
fornecedores demonstram o rápido ritmo de<br />
progresso em direção ao nosso objetivo de<br />
neutralidade de carbono para 2030”, afirma<br />
Lisa Jackson, vice-presidente de Ambiente,<br />
Política e Iniciativas Sociais da Apple.<br />
“Estamos a tomar medidas urgentes à escala<br />
global para desbloquear um futuro mais<br />
verde, inovador e resiliente”.<br />
Através da sua participação no programa,<br />
os fornecedores da empresa estão a sinalizar<br />
a procura para a expansão da capacidade<br />
de eletricidade renovável em todo o mundo.<br />
Desde 2019, a energia renovável operacional<br />
através da cadeia de abastecimento<br />
global da Apple expandiu-se cinco<br />
vezes, totalizando agora 13,7 gigawatts,<br />
representando 17,4 milhões de toneladas de<br />
métricas de emissões carbónicas evitadas,<br />
no ano passado. Esta medida equivale à<br />
remoção de cerca de 3,8 milhões de carros<br />
na estrada.<br />
A Apple também suporta cerca de 1,5<br />
gigawatts de eletricidade renovável em<br />
todo o mundo para alimentar os escritórios<br />
corporativos, centros de dados, e lojas,<br />
abrangendo 44 países. Além disto, a empresa<br />
ainda investiu diretamente quase 500<br />
megawatts de energia solar e eólica na<br />
China e no Japão para fazer face às emissões<br />
da cadeia de abastecimento a montante.<br />
Os parceiros de fabrico da Apple sediados<br />
nos EUA estão a fazer progressos constantes<br />
em direção às energias renováveis, com<br />
27 fornecedores no Programa de Energia<br />
Limpa do Fornecedor a encontrarem várias<br />
abordagens com sucesso. Alguns deles<br />
alcançaram 100% de eletricidade renovável<br />
para toda a produção relacionada com<br />
a Apple. A Coherent Corp. aproxima-se<br />
desse objetivo através da utilização de um<br />
programa de utilidade verde, enquanto<br />
outros, como a Qorvo, estão a utilizar<br />
contratos de compra de energia para<br />
projetos solares e eólicos em todo o país.<br />
Cerca de 70 fornecedores na China estão<br />
agora empenhados em alcançar 100%<br />
de eletricidade renovável. Com base nas<br />
experiências do programa, a Avary Holding,<br />
que aderiu à iniciativa em 2020, está a lançar<br />
o seu próprio projeto para impulsionar uma<br />
ação escalável, fazendo com que os seus<br />
fornecedores descarbonizem e adotem<br />
energia renovável. As receitas do Green Bond<br />
de 2019 contribuíram para o investimento<br />
da Apple no Fundo de Energia Limpa da<br />
China, um fundo de investimento para ligar<br />
os fornecedores na China a fontes de energia<br />
renováveis. Esta abordagem tem permitido<br />
à Apple, e aos seus fornecedores, investir<br />
em conjunto em mais de 650 megawatts de<br />
eletricidade renovável.<br />
30 parceiros industriais europeus estão<br />
empenhados em alcançar energia limpa,<br />
sendo que seis (a Viscom AG e a Victrex),<br />
já estão a atingir 100% de eletricidade<br />
renovável para as suas cargas Apple.<br />
Para ajudar a acelerar o progresso da<br />
energia limpa e inovações ambientais em
SCM Supply Chain Magazine 47<br />
todo o mundo, a Apple já desembolsou<br />
mais de 3,2 mil milhões de dólares, com 4,7<br />
mil milhões incluídos no compromisso da<br />
empresa com o Green Bond. Até ao momento,<br />
a multinacional atribuiu 700 milhões de<br />
dólares das receitas do Green Bond de<br />
2019 para apoiar 59 projetos, incluindo o<br />
desenvolvimento e distribuição de recursos de<br />
formação em energia limpa para fornecedores<br />
e esforços colaborativos de advocacia no<br />
Japão, Vietname e Coreia do Sul.<br />
Espera-se que os projetos apoiados pelo<br />
Green Bond de 2019 mitiguem mais de 13,5<br />
milhões de toneladas métricas de dióxido<br />
de carbono ao longo da sua vida útil.<br />
Para além da criação de capacidade para<br />
energias renováveis em toda a cadeia de<br />
abastecimento, os investimentos do Green<br />
Bond da Apple, no ano passado, apoiaram<br />
inovações ambientais em toda a empresa,<br />
incluindo um design de baixo carbono,<br />
eficiência energética, e a expansão das<br />
energias renováveis nas redes em todo o<br />
mundo. •<br />
Programa de Energia Limpa<br />
do Fornecedor Apple<br />
Mais de 250 fornecedores<br />
comprometidos com energia<br />
100% renovável para a produção<br />
da Apple até 2030<br />
Representadas mais de 85% de<br />
despesas diretas de fabrico da<br />
Apple<br />
13.7 gigawatt de energia<br />
renovável online na cadeia<br />
de abastecimento da Apple<br />
aumentou cinco vezes desde 2019<br />
Evitadas 17.4 milhões de<br />
toneladas métricas de emissões<br />
de carbono em 2022
48<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
INTRALOGÍSTICA<br />
Gestão de armazém<br />
O ARMAZÉM<br />
COMO<br />
PROTAGONISTA<br />
ESQUECIDO<br />
O papel vital do armazém na gestão<br />
logística é muitas vezes negligenciado<br />
pelas empresas, que tendem a concentrarse<br />
na produção e nas áreas comerciais.<br />
No entanto, Alexandra Pinto, consultora<br />
de Gestão e Engenharia Industrial do<br />
INEGI - Instituto de Ciência e Inovação<br />
em Engenharia Mecânica e Engenharia<br />
Industrial, ilumina-nos sobre a importância<br />
estratégica da gestão logística, com<br />
destaque para o papel vital deste<br />
protagonista esquecido no sucesso<br />
empresarial.<br />
O<br />
armazém desempenha um papel vital na<br />
gestão da cadeia de abastecimento, tendo<br />
como principal função permitir a constituição<br />
e manutenção de stocks, assegurando a<br />
disponibilização do produto ao cliente, no<br />
equilíbrio ótimo de custo e serviço, cumprindo<br />
com a proposta de valor definida. Fazendo parte<br />
da Cadeia de Abastecimento, o armazém sofre<br />
as mesmas pressões de rapidez de resposta,<br />
elevado nível de serviço e redução de custo<br />
operacional sentidas na cadeia. Verifica-se,<br />
no entanto, que muitas empresas têm o seu<br />
expertise na produção ou na área comercial,<br />
sendo a gestão logística, e em particular o<br />
armazém, uma área muitas vezes negligenciada.<br />
Historicamente, o armazém é visto como um<br />
depósito de bens, e também de custos. A nossa<br />
experiência em projetos de consultoria nesta<br />
área permite-nos afirmar que, muito pelo<br />
contrário, a correta gestão da armazenagem<br />
acrescenta valor em termos de serviço ao<br />
cliente, baixa os custos totais logísticos e facilita<br />
o fluxo na Cadeia de Abastecimento.<br />
UM PILAR INDISPENSÁVEL<br />
Existe no contexto atual, no entanto, um<br />
conjunto de fatores que tem vindo a contribuir<br />
para um papel cada vez mais determinante do
SCM Supply Chain Magazine 49<br />
armazém no sucesso da gestão da cadeia de<br />
abastecimento e na concretização da estratégia<br />
da empresa.<br />
Com o crescimento acelerado das vendas<br />
B2C e do canal online, é exigida uma entrega<br />
mais rápida, com maior flexibilidade e a custo<br />
mínimo. A pressão do prazo de entrega propagase<br />
a montante na cadeia de abastecimento<br />
impactando também nas empresas industriais.<br />
Isto acontece, muitas vezes, em contextos em<br />
que as empresas têm já margens comerciais<br />
reduzidas e em que outros elementos de custo,<br />
nomeadamente o de transporte, sofreram<br />
aumentos significativos. De um modo geral,<br />
a expectativa do cliente em relação ao nível<br />
serviço é elevada e as empresas deparamse<br />
com dificuldades em corresponder a essa<br />
expectativa, sem alterar de forma significativa<br />
as suas operações logísticas e sem refletir<br />
aumentos de custos no cliente. As encomendas<br />
têm tido uma tendência tipicamente de baixas<br />
quantidades e multi-produto, o que impacta<br />
significativamente o seu custo de preparação,<br />
em particular se a operação de armazenagem<br />
não tiver sido ajustada a esta realidade.<br />
Paralelamente, verifica-se nos últimos anos<br />
um aumento significativo da procura por<br />
espaços de armazenagem num cenário de<br />
escassez de oferta, e crescem as dificuldades<br />
de captação e retenção de talento para funções<br />
logísticas de uma forma transversal.<br />
Acresce ainda aos requisitos pedidos ao<br />
armazém o facto de que num mercado em que<br />
aumenta a procura pela customização, e em<br />
que esta procura é muitas vezes incerta, existe<br />
uma tendência crescente para modelos do tipo<br />
“assemble and ship to order”, em que é dada<br />
prioridade a stocks genéricos que podem ser<br />
customizados em armazém de acordo com os<br />
requisitos finais do cliente.<br />
O armazém desempenha neste contexto<br />
acelerado e de mudança, um papel ainda<br />
mais determinante no sucesso da operação,<br />
com o risco de constituir um ponto de<br />
estrangulamento, sem capacidade de resposta<br />
para garantir os níveis de serviço esperados<br />
internamente e comunicados ao cliente. É típico<br />
em empresas industriais proceder-se a projetos<br />
de investimento para ganhar alguns segundos<br />
nos processos produtivos, para depois em<br />
armazém se perderem minutos, horas e dias em<br />
processos não otimizados.<br />
AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO<br />
A performance do armazém influencia de<br />
forma significativa a capacidade de diferenciação<br />
de uma empresa, por exemplo, através do seu<br />
potencial para a redução de custos e otimização<br />
de níveis de serviço, ou permitindo a realização<br />
de operações finais de valor acrescentado que<br />
podem contribuir para o aumento do valor do<br />
produto e melhorar a experiência do cliente.<br />
Ou ainda servindo como plataformas de crossdocking,<br />
consolidação ou transhipment que<br />
permitem reduzir os custos de transporte.<br />
A operação de armazenagem deve por isso ser<br />
pensada em total alinhamento com a estratégia<br />
da empresa, tendo em conta dimensões como:<br />
• Localização;<br />
• Layout e uso do espaço;<br />
• Equipamentos de armazenagem e<br />
movimentação;<br />
• Processos de receção, conferência,<br />
arrumação, picking, embalagem e<br />
expedição;<br />
• Automatismos;<br />
• Sistemas e tecnologias de informação;<br />
• Níveis de serviço definidos;<br />
• Sazonalidade na produção ou procura;<br />
• Requisitos de customização ou adição final<br />
de valor.<br />
Um estudo recente da McKinsey & Company1,<br />
aponta as seguintes causas como as principais
50<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
causas para uma deficiente performance da<br />
operação de armazenagem:<br />
• Ausência de uma estratégia de foco<br />
tecnológico para a melhoria da eficiência e<br />
qualidade;<br />
• Falta de metodologias e de uma abordagem<br />
estruturada para a identificação de causas<br />
raiz para os baixos níveis de performance;<br />
• Não existência de um projeto de melhoria<br />
contínua para a excelência da operação de<br />
armazenagem;<br />
• Falta de uma perspetiva “end-to-end” da<br />
cadeia de abastecimento que considere<br />
a totalidade dos seus processos, custos e<br />
interfaces com cadeias de abastecimento<br />
externas.<br />
É essencial avaliar de forma contínua a<br />
performance da operação de armazenagem<br />
com o objetivo de identificar desalinhamentos<br />
relativamente aos objetivos definidos e definir<br />
soluções neste seguimento. Esta avaliação de<br />
performance é normalmente realizada através<br />
da definição clara de indicadores e sua contínua<br />
monitorização, nomeadamente:<br />
• Indicadores de produtividade - Permitem<br />
avaliar a capacidade da equipa em operar<br />
com elevados níveis de performance – ou<br />
seja, se as equipas entregam os resultados<br />
dentro dos prazos definidos pela gestão.<br />
Através da monitorização destes indicadores<br />
é possível identificar gargalos operacionais<br />
e oportunidades de otimização.<br />
• Indicadores de capacidade - Identificam o<br />
nível de capacidade operacional disponível<br />
e permitem identificar, por exemplo, se<br />
existem sobrecargas em alguma área, ou por<br />
outro lado, se existe capacidade que não<br />
esteja a ser utilizada.<br />
• Indicadores de qualidade - Permitem medir<br />
a conformidade do trabalho realizado em<br />
relação aos padrões definidos pela gestão<br />
e esperados pelo cliente. Estes indicadores<br />
são utilizados para compreender se o serviço<br />
atual corresponde às expectativas do cliente.<br />
Permitem a otimização de níveis de serviço e a<br />
criação de diferenciação no mercado;<br />
• Indicadores estratégicos – Os indicadores<br />
estratégicos estão diretamente relacionados<br />
com os objetivos estratégicos do negócio,<br />
e permitem avaliar a operação de<br />
armazenagem está em total alinhamento e a<br />
suportar a estratégia de negócio.<br />
O POTENCIAL DAS TECNOLOGIAS<br />
DE INFORMAÇÃO<br />
O potencial impacto da tecnologia nos níveis<br />
de produtividade e eficiência, assim como na<br />
redução de riscos e promoção de maior ergonomia<br />
nas diferentes funções, é enorme. Este é um dos<br />
eixos prioritários de consideração quando se<br />
pretende otimizar a operação de armazenagem.<br />
Com investimentos record nos últimos 5<br />
anos, a inovação a este nível tem sido notável<br />
e existem inúmeros “case studies” de sucesso.<br />
O portfólio de soluções é amplo e com relativa<br />
maturidade em diversas áreas, como seja, por<br />
exemplo, na utilização de robots para auxílio<br />
às operações de picking, na implementação<br />
de sistemas WMS (Warehouse Management<br />
Systems) com soluções de otimização dinâmica<br />
de rotas de picking, ou implementação de<br />
soluções automáticas para a separação de<br />
artigos, entre inúmeras outras.<br />
Entre as tecnologias com maior potencial<br />
de aplicação às operações de armazenagem<br />
destacam se:<br />
• Robots / Cobots;<br />
• Exoesqueletos;<br />
• AGVs – Automated guided vehicle / AMRs –<br />
Autonomous Mobile Robots;<br />
• IA – Inteligência Artificial / ML – Machine<br />
Learning;
SCM Supply Chain Magazine 51<br />
• Blockchain ;<br />
• RV – Realidade virtual / RA – Realidade<br />
aumentada;<br />
• IoT – Internet of Things;<br />
• Digital Twins;<br />
• WMS – Warehouse Management System; /<br />
WES – Warehouse Execution System;<br />
• Sistemas de armazenagem automáticos;<br />
• Sistemas de separação automáticos;<br />
• Soluções Pick To Light / Put To Light;<br />
• Voice Picking;<br />
• RFID;<br />
• Drones.<br />
Na definição de iniciativas de automação ou<br />
digitalização da operação de armazenagem<br />
é essencial garantir o alinhamento destas<br />
iniciativas com a estratégia da empresa,<br />
apostando em use cases selecionados com um<br />
retorno de investimento claramente identificado,<br />
e para os quais existe o buy-in dos diferentes<br />
stakeholders. Os casos de sucesso confirmam<br />
que existe maior valor em iniciativas cirúrgicas e<br />
estratégicas de transformação digital, do que em<br />
megaprojetos de complexidade excessiva que, na<br />
maioria dos casos, inviabiliza o seu sucesso numa<br />
fase muito precoce.<br />
COMO SE AVALIA O DESEMPENHO DE<br />
UM ARMAZÉM?<br />
A performance do armazém influencia de<br />
forma significativa a capacidade de diferenciação<br />
de uma empresa, por exemplo, através do seu<br />
potencial para a redução de custos e otimização<br />
de níveis de serviço, ou permitindo a realização<br />
de operações finais de valor acrescentado que<br />
podem contribuir para o aumento do valor do<br />
produto e melhorar a experiência do cliente.<br />
Ou ainda servindo como plataformas de crossdocking,<br />
consolidação ou transhipment que<br />
permitem reduzir os custos de transporte.<br />
A operação de armazenagem deve por isso ser<br />
pensada em total alinhamento com a estratégia<br />
da empresa, tendo em conta dimensões como:<br />
• Localização;<br />
• Layout e uso do espaço;<br />
• Equipamentos de armazenagem e<br />
movimentação;<br />
• Processos de receção, conferência, arrumação,<br />
picking, embalagem e expedição;<br />
• Automatismos;<br />
• Sistemas e tecnologias de informação;<br />
• Níveis de serviço definidos;<br />
• Sazonalidade na produção ou procura;<br />
• Requisitos de customização ou adição final de<br />
valor.<br />
Um estudo recente da McKinsey & Company1,<br />
aponta as seguintes causas como as principais<br />
para uma deficiente performance da operação de<br />
armazenagem:<br />
• Ausência de uma estratégia de foco<br />
tecnológico para a melhoria da eficiência e<br />
qualidade;<br />
• Falta de metodologias e de uma abordagem<br />
estruturada para a identificação de causas<br />
raiz para os baixos níveis de performance;<br />
• Não existência de um projeto de melhoria<br />
contínua para a excelência da operação de<br />
armazenagem;<br />
• Falta de uma perspetiva “end-to-end” da<br />
cadeia de abastecimento que considere<br />
a totalidade dos seus processos, custos e<br />
interfaces com cadeias de abastecimento<br />
externas.<br />
É essencial avaliar de forma contínua a<br />
performance da operação de armazenagem<br />
com o objetivo de identificar desalinhamentos<br />
relativamente aos objetivos definidos e definir<br />
soluções neste seguimento. Esta avaliação de<br />
performance é normalmente realizada através<br />
da definição clara de indicadores e sua contínua<br />
monitorização, nomeadamente:<br />
• Indicadores de produtividade - Permitem<br />
avaliar a capacidade da equipa em operar
C<br />
M<br />
Y<br />
CM<br />
MY<br />
CY<br />
CMY<br />
K<br />
52<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
com elevados níveis de performance – ou<br />
seja, se as equipas entregam os resultados<br />
dentro dos prazos definidos pela gestão.<br />
Através da monitorização destes indicadores<br />
é possível identificar gargalos operacionais<br />
e oportunidades de otimização;<br />
• Indicadores de capacidade - Identificam o<br />
nível de capacidade operacional disponível<br />
e permitem identificar, por exemplo, se<br />
existem sobrecargas em alguma área, ou<br />
por outro lado, se existe capacidade que<br />
não esteja a ser utilizada;<br />
• Indicadores de qualidade - Permitem medir<br />
a conformidade do trabalho realizado em<br />
relação aos padrões definidos pela gestão<br />
e esperados pelo cliente. Estes indicadores<br />
são utilizados para compreender se o serviço<br />
atual corresponde às expectativas do cliente.<br />
Permitem a otimização de níveis de serviço e<br />
a criação de diferenciação no mercado;<br />
• Indicadores estratégicos – Os indicadores<br />
estratégicos estão diretamente relacionados<br />
com os objetivos estratégicos do negócio,<br />
e permitem avaliar a operação de<br />
armazenagem está em total alinhamento e<br />
a suportar a estratégia de negócio.<br />
AS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO<br />
PODEM AJUDAR?<br />
O potencial impacto da tecnologia nos níveis<br />
de produtividade e eficiência, assim como na<br />
redução de riscos e promoção de maior ergonomia<br />
nas diferentes funções, é enorme. Este é um dos<br />
eixos prioritários de consideração quando se<br />
pretende otimizar a operação de armazenagem.<br />
Com investimentos record nos últimos 5<br />
anos, a inovação a este nível tem sido notável<br />
e existem inúmeros “case studies” de sucesso.<br />
O portfólio de soluções é amplo e com relativa<br />
maturidade em diversas áreas, como seja, por<br />
exemplo, na utilização de robots para auxílio<br />
às operações de picking, na implementação<br />
de sistemas WMS (Warehouse Management<br />
Systems) com soluções de otimização dinâmica<br />
de rotas de picking, ou implementação de<br />
soluções automáticas para a separação de<br />
artigos, entre inúmeras outras.<br />
Entre as tecnologias com maior potencial<br />
de aplicação às operações de armazenagem<br />
destacam se:<br />
• Robots / Cobots;<br />
• Exoesqueletos;<br />
• AGVs – Automated guided vehicle / AMRs –<br />
Autonomous Mobile Robots;<br />
• IA – Inteligência Artificial / ML – Machine<br />
Learning;<br />
• Blockchain;<br />
• RV – Realidade virtual / RA – Realidade<br />
aumentada;<br />
• IoT – Internet of Things;<br />
• Digital Twins;<br />
• WMS – Warehouse Management System /<br />
WES – Warehouse Execution System;<br />
• Sistemas de armazenagem automáticos;<br />
• Sistemas de separação automáticos;<br />
• Soluções Pick To Light / Put To Light;<br />
• Voice Picking;<br />
• RFID;<br />
• Drones.<br />
Na definição de iniciativas de automação ou<br />
digitalização da operação de armazenagem<br />
é essencial garantir o alinhamento destas<br />
iniciativas com a estratégia da empresa,<br />
apostando em use cases selecionados com<br />
um retorno de investimento claramente<br />
identificado, e para os quais existe o buy-in dos<br />
diferentes stakeholders. Os casos de sucesso<br />
existentes confirmam que existe maior valor<br />
em iniciativas cirúrgicas e estratégicas de<br />
transformação digital, do que em megaprojetos<br />
de complexidade excessiva que, na maioria dos<br />
casos, inviabiliza o seu sucesso numa fase muito<br />
precoce. •
54<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
TECNOLOGIA<br />
GoWizi
SCM Supply Chain Magazine 55<br />
Rui Mirra Santos, Co-fundador e CEO da GoWizi<br />
Texto: Fábio Santos<br />
UM ELO<br />
ENTRE OS<br />
DISTRIBUIDORES<br />
E A DISTRIBUIÇÃO<br />
A GoWizi é uma empresa portuguesa que<br />
utiliza a Inteligência Artificial para reduzir<br />
os custos operacionais das empresas,<br />
funcionando como um elo entre os grandes<br />
distribuidores e as empresas de distribuição.<br />
Em entrevista à SCM, Rui Mirra Santos, Cofundador<br />
e CEO da GoWizi, explica-nos como<br />
funciona a solução e de que forma procuram<br />
ajudar as empresas nesta tarefa.<br />
1. Como surgiu a ideia<br />
de fundar a GoWizi?<br />
Desde que fui viver para Lisboa, ainda<br />
como estudante, que o “tempo morto”<br />
semanal no supermercado era incomodativo.<br />
Adicionalmente, o número de intermediários<br />
nas cadeias de distribuição levou a que<br />
refletisse sobre o seu desenho estrutural.<br />
O aparecimento da COVID-19 motivou a<br />
criação de um projeto que visava eliminar<br />
todos estes intermediários e desenvolver uma<br />
rede digital direct-to-consumer (D2C) para<br />
os produtores agrícolas locais. Experiência<br />
curta, mas enriquecedora que rapidamente<br />
revelou o quão complexo é operar uma rede<br />
de entrega last-mile, de forma ágil, com<br />
poucos intermediários e com uma experiência<br />
de consumidor exemplar. Isto motivou-me a<br />
desenhar uma rede, que desde o início teve<br />
como propósito ser o mais eficiente e digital<br />
possível. Ao montar esta operação tivemos a<br />
oportunidade de criar um negócio, numa área<br />
que está a atravessar agora o processo de<br />
digitalização. Após algum tempo em atividade,<br />
entendi que o verdadeiro fator diferenciador<br />
e proposição de valor residia no software<br />
proprietário que tinha desenvolvido, que<br />
geria toda a operação de forma autónoma,<br />
com os tais níveis elevados de experiência do<br />
cliente. Foi neste momento que decidi montar<br />
a GoWizi, juntamente com o José, o Rodrigo<br />
e, mais tarde, o Ricardo - uma empresa<br />
tecnológica que está a redesenhar as redes de<br />
entregas last-mile do futuro.<br />
2. O que pretendiam trazer<br />
de novo para a cadeia de<br />
abastecimento?<br />
Se olharmos de forma holística para a rede<br />
de distribuição, percebemos a importância<br />
e o peso que a last-mile tem, dado que
56<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
representa 53% dos custos de entrega. É aqui<br />
que entra a GoWizi, com uma proposta de valor<br />
composta, essencialmente, pelo aumento da<br />
transparência, para todos os intervenientes da<br />
cadeia de entrega e pelo aumento da eficiência<br />
das redes de distribuição, na last-mile delivery.<br />
A implementação de soluções digitais<br />
nas redes de distribuição ainda está muito<br />
incompleta. Como é um sistema grande e<br />
naturalmente complexo, o processo dificultase,<br />
especialmente em comparação com<br />
outras indústrias. O que significa que grandes<br />
empresas estão a liderar esta digitalização,<br />
enquanto que PMEs e startups, extremamente<br />
relevantes na cadeia de distribuição, enfrentam<br />
alguns dos desafios da nova economia digital.<br />
Estes surgem desde a produção até à entrega<br />
ao domicílio, uma vez que os intervenientes<br />
têm alguma dificuldade a identificar falhas e a<br />
apurar responsabilidades.<br />
Porém, também existem oportunidades, não<br />
só para criativos e visionários que gostem de<br />
superar estes e outros desafios, mas também<br />
para a sociedade em si - como a criação de<br />
postos de trabalho e serviços de excelência,<br />
que aumentem a qualidade de vida.<br />
3. Com recurso a IA, a GoWizi<br />
consegue reduzir os custos<br />
operacionais das entregas<br />
de mercadoria em 75%, bem<br />
como aumentar as margens<br />
de lucro das empresas em<br />
30%. Como conseguem atingir<br />
essas metas?<br />
O software da GoWizi utiliza Inteligência<br />
Artificial (IA) para gerir as redes de last-mile<br />
delivery dos nossos clientes, eficientemente. O<br />
algoritmo utiliza toda a informação recolhida,<br />
tanto do lado da procura, como slots horários,<br />
relação entre pontos de entrega e pontos de<br />
recolha, geolocalização, restrições especiais<br />
e refrigeração - como da oferta, como os<br />
condutores disponíveis, a capacidade das<br />
viaturas, as localizações em tempo real e os<br />
horários dos condutores. Com esta informação<br />
conseguimos corresponder às expectativas<br />
dos nossos clientes, com o menor número de<br />
recursos possíveis, garantindo as restrições da<br />
procura e da oferta e minimizando os custos<br />
associados.<br />
Deste modo, existe um impacto direto nos<br />
custos operacionais das empresas, não só<br />
devido ao esforço reduzido no planeamento<br />
que, previamente, era manual, mas também<br />
no desenho das próprias rotas, que se tornam<br />
mais eficientes, com uma alta velocidade de<br />
processamento.<br />
Finalmente, e indiretamente, também as<br />
receitas são afetadas. Ao aumentarmos a<br />
eficiência, fazemos com que os negócios<br />
consigam entregar mais, para um dado nível<br />
de recursos contratados. Tudo isto eleva a
SCM Supply Chain Magazine 57<br />
qualidade do serviço das empresas de last-mile<br />
delivery, o que afeta positivamente as receitas<br />
e, consequentemente, o lucro.<br />
4. Outra área em que também<br />
recorrem à IA é ao nível da<br />
predição, uma área crítica<br />
para as empresas ao nível<br />
do controlo de stocks. Como<br />
funciona essa análise e de que<br />
forma conseguem otimizar as<br />
operações de cada empresa,<br />
e de cada setor, através do<br />
algoritmo?<br />
A previsão matemática é um mecanismo<br />
bastante antigo. Tem vindo a tornar-se mais<br />
mediática recentemente com a disponibilidade<br />
de uma elevada quantidade de dados e,<br />
através da aplicação de machine learning nos<br />
últimos anos. Podem ser aplicadas a todas as<br />
indústrias e, com toda a certeza, à logística. É<br />
importante termos a noção de que, como dizia<br />
George Box, “todos os modelos estão errados,<br />
mas alguns são úteis”. Nunca vamos estar<br />
exatamente alinhados com a realidade. No<br />
entanto, ao analisar a diferença entre a nossa<br />
previsão e a realidade,<br />
conseguimos medir o<br />
impacto que a melhoria<br />
destas previsões pode<br />
ter no funcionamento do<br />
nosso negócio.<br />
Na GoWizi tiramos partido<br />
da informação que cada empresa gera<br />
para a informar sobre eventos importantes, de<br />
acordo com padrões, como atrasos em certas<br />
zonas, ou mesmo o tempo extra necessário<br />
para chegar à porta de determinada morada e,<br />
com isto, notificar gestores operacionais ou até<br />
clientes. O objetivo é que estes consigam agir<br />
em antecipação, de modo a evitar custos extra<br />
ou uma experiência negativa.<br />
5. Quais as vantagens<br />
que obtiveram através da<br />
participação no Programa<br />
Banco Montepio Acredita<br />
Portugal?<br />
O Programa Banco Montepio Acredita<br />
Portugal, organizado pela Unlimit, foi uma<br />
forma muito prática e eficaz de sentir o<br />
“pulso” à ideia e ao ecossistema. Conseguimos<br />
perceber o contexto nacional, nas mais<br />
diversas áreas, receber feedback rápido e<br />
preciso, de várias entidades, bem como obter<br />
uma ligação direta a empresas de grandes<br />
dimensões do setor. Finalmente, a amplificação<br />
que a mensagem da GoWizi recebe, por estar<br />
associada ao programa da Unlimit, acaba por<br />
ser muito relevante no desenvolvimento de um<br />
posicionamento de uma marca no mercado.<br />
6. Referem também que o<br />
próximo passo é escalar a<br />
solução. A que nível?<br />
A GoWizi recentemente atingiu os<br />
objetivos que delineamos para a primeira<br />
fase: encontrámos um problema grande,
58<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
idealizámos uma solução,<br />
criámos um minimum viable<br />
product (MVP), testámos com<br />
clientes-piloto e atualmente temos<br />
a primeira versão completa da aplicação que<br />
é utilizada atualmente por cinco clientes<br />
operacionais, em mais de 12.000 entregas por<br />
mês e por mais de 160 utilizadores - com um<br />
crescimento de volume de negócio mensal<br />
médio acima dos 30%.<br />
A próxima fase tem como foco a<br />
escalabilidade da solução e o crescimento<br />
do negócio. Resumidamente, o desafio será<br />
encontrar a solução ideal para crescer esta<br />
base de clientes, de forma exponencial, rápida<br />
e eficiente - no que toca ao custo de aquisição<br />
- e com uma estrutura de custos que cresça<br />
de forma independente. Nos negócios de<br />
software, em específico os de software-as-aservice<br />
(SaaS), e em particular o nosso caso, a<br />
vantagem é que temos menos barreiras<br />
à penetração em países estrangeiros,<br />
mas também o desafio de precisar de<br />
atingir patamares de volume de negócio<br />
muito elevados, para que a faturação se torne<br />
relevante. Isto obrigou-nos - como acontece<br />
com muitos empreendedores portugueses - a<br />
pensar no mercado de uma forma global e<br />
decidir atacar este mercado internacional<br />
daqui para a frente.<br />
Sobre o produto, neste momento, esperamos<br />
dar novidades muito em breve. Apenas<br />
quero terminar acrescentando que na GoWizi<br />
cultivamos centralmente o mindset de que<br />
o produto nunca estará finalizado. Tal como<br />
o mundo à nossa volta está em constante<br />
evolução, da mesma forma, o nosso produto<br />
também tem de o estar. Observar, Concluir,<br />
Inovar - repetir. É o lema de vencedor de<br />
qualquer história de sucesso. •<br />
C<br />
M<br />
Y<br />
CM<br />
MY<br />
CY<br />
CMY<br />
K
60<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
TRANSPORTE<br />
Lowlow<br />
Texto: Fábio Santos<br />
UM MICRO<br />
QUE FAZ MACRO<br />
Criada em junho do ano passado,<br />
a start-up portuguesa de logística<br />
sustentável Lowlow tem como missão<br />
descarbonizar as entregas de última<br />
milha. Uma das iniciativas foi a criação<br />
de um microhub de logística em Lisboa,<br />
de forma a funcionar como um suporte<br />
para a logística urbana, tendo tido o<br />
apoio da Galp. Em entrevista à SCM,<br />
Bruno Galaio, head of strategy da<br />
Lowlow, explica como surgiu a empresa<br />
e quais as suas ambições.<br />
Aideia da criação da Lowlow surgiu<br />
através de uma má experiência de<br />
entrega de alimentos ao domicílio, em<br />
que o pedido não veio completo e chegou<br />
tarde. O fundador e CEO da Lowlow, Rafael<br />
Fernandes, tinha na altura uma loja de motas<br />
elétricas, e pensou em explorar a otimização<br />
deste processo de entregas, com a<br />
possibilidade de recorrer a veículos elétricos.<br />
Foi então que, através da sua experiência em<br />
multinacionais de retalho e da sua rede de<br />
contactos, começou a sondar as necessidades<br />
do mercado e como eram feitos os processos,<br />
de forma a conseguir adaptar um modelo<br />
que correspondesse às necessidades destas<br />
empresas.<br />
Em junho de 2022 surgiu então a Lowlow,<br />
tendo como missão a descarbonização das<br />
entregas de última milha, e em cinco meses<br />
conseguiu poupar a emissão de mais de 400<br />
toneladas de CO₂ nos centros urbanos de<br />
Lisboa e do Porto.<br />
“Começámos a crescer inicialmente<br />
no retalho, na entrega de mercadorias,<br />
comida, entre outros. Sendo que a nossa<br />
última aposta por ser consequência disso,<br />
da maturação do processo logístico da<br />
empresa, a logística dos pacotes, tornandonos<br />
quase um 3PL com uma solução para<br />
e-commerce através dos microhubs”, explica<br />
Bruno Galaio, e assim foi até dezembro de<br />
2022, tendo o fundador tomado a decisão<br />
de profissionalizar a empresa na logística e<br />
torná-la oficialmente num 3PL.
SCM Supply Chain Magazine 61<br />
No início a ideia era criar um microhub, no<br />
entanto, ainda sem um espaço físico para fazer<br />
de espaço de cross-docking, começaram por<br />
ter um “hub móvel”, com uma carrinha a servir<br />
de cross-docking point, tanto em Lisboa como<br />
no Porto. O processo ainda tinha algumas<br />
imperfeições, mas conseguiram encontrar uma<br />
alternativa graças à Galp, que acabou por lhes<br />
ceder um espaço que não estava a utilizar para<br />
que pudessem utilizar como microhub logístico,<br />
inaugurado em fevereiro. “A Galp ajudou-nos<br />
a ter este primeiro espaço, que está situado<br />
junto às Amoreiras, o que nos permite cobrir<br />
uma grande parte do centro urbano de<br />
Lisboa a distribuir pacotes”.<br />
Bruno Galaio avança que os microhubs serão<br />
a próxima aposta para a logística de última<br />
milha, e que estes já têm um papel importante<br />
no Norte da Europa para a distribuição.<br />
“Queremos que também o sejam em Portugal.<br />
Nos próximos meses vamos reforçar esta<br />
aposta, contribuindo para reduzir a pegada<br />
carbónica do last mile em Lisboa”, afirma,<br />
sendo que também ponderam chegar a outras<br />
regiões de Portugal, como ao Porto. “A ideia<br />
será conseguirmos até ao final do primeiro<br />
semestre, dependendo de alguns fatores<br />
externos, termos à volta de quatro hubs, três<br />
em Lisboa e um no Porto. Até ao final do ano<br />
queremos ter entre cinco e seis, sendo que<br />
um deles esperamos vir a ser internacional”.<br />
O responsável estima que cerca de 80%<br />
dos seus clientes sejam internacionais e<br />
tenham operações em Espanha, e como tal,<br />
estão a estudar também essa possibilidade de<br />
posicionamento ibérico.<br />
“DESVIÁMOS DUAS BALAS”<br />
O mercado imobiliário logístico tem estado<br />
a aumentar ao nível da procura, e a decrescer<br />
na oferta, o que se reflete em altos preços de<br />
arrendamento. Graças à parceria com a Galp,
62<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
a Lowlow conseguiu amenizar aquilo que<br />
seria um dos seus grandes custos, e dar um<br />
novo uso a um espaço que, caso contrário,<br />
não estaria a ser utilizado.<br />
Bruno Galaio conta que os seus veículos<br />
encontram-se em vários hubs por Lisboa,<br />
alguns mesmo nos espaços dos clientes,<br />
onde carregam durante a noite e são<br />
preparados para fazerem a distribuição.<br />
“Nós não temos uma carência de imobiliário<br />
como os CTT ou a DHL, que têm necessidade<br />
de grandes pavilhões e sorting centres, o<br />
que acaba por influenciar bastante o P&L”,<br />
explica o responsável.<br />
“A Galp tem apostado muito nesta<br />
estratégia de diversificar a oferta e de fazer<br />
cada vez mais parte da vida da cidade.<br />
Tinham este património sem qualquer tipo<br />
de rendimento, nós propusemos o projeto<br />
e pareceu-lhes bem, até porque encaixa no<br />
conceito e na missão de sustentabilidade<br />
da Galp. Foi um processo muito rápido, na<br />
verdade, cerca de um mês/mês e meio para<br />
agilizar tudo e concretizar o projeto”.<br />
O fulfillment do hub é feito de noite,<br />
idealmente, “o mais cedo possível”, de<br />
modo a otimizar o processo e a evitar que<br />
os veículos que abastecem o hub estejam<br />
presos no trânsito. “A carrinha chega,<br />
descarrega as encomendas que depois são<br />
organizadas em diferentes códigos postais,<br />
e a docking station, apesar de ser muito<br />
pequena, tem várias lanes com códigos<br />
postais atribuídos. Quando os motoristas<br />
entram ao serviço já têm as caixas<br />
organizadas e seguem para distribuição.<br />
Estamos a processar à volta de 400 a 500<br />
encomendas diariamente”, detalha Bruno<br />
Galaio.<br />
MICROHUBS POTENCIAM<br />
DISTRIBUIÇÃO<br />
A capacidade depende do volume, pois<br />
algumas encomendas vão em grosso e<br />
outras não, mas estimam que sejam feitas<br />
entre 50 e 60 encomendas numa volta.<br />
“Os veículos têm uma grande capacidade<br />
de acomodação, e esta estratégia de<br />
microhubs potenciou a distribuição, porque<br />
onde passavam várias carrinhas para fazer<br />
entregas, passa um driver numa mota pela<br />
rua inteira”, aponta o responsável.<br />
Ao nível dos benefícios, aponta a<br />
diminuição do tráfego, facilitado devido às<br />
pequenas dimensões da mota; o aumento<br />
do número de entregas por rota e por<br />
driver; bem como o impacto ambiental,<br />
por ser feito com uso de veículos elétricos.<br />
Apesar do seu limite de 120 quilómetros<br />
por bateria, por se tratar de um sistema<br />
plug&play, enquanto um driver está a fazer<br />
a distribuição, têm outra bateria a carregar<br />
para a distribuição seguinte.<br />
“Neste momento temos cerca de 40
SCM Supply Chain Magazine 63<br />
drivers fixos, que já trabalham connosco há<br />
algum tempo, e temos bastante confiança<br />
no trabalho deles, e depois há alguns drivers<br />
para colmatar alturas de pico”, explica. De<br />
modo a conseguirem fazer esta previsão das<br />
necessidades, contam com uma tecnologia<br />
própria para fazer o forecast dos picos,<br />
tendo também em conta a informação que<br />
vão recebendo dos clientes, de modo a<br />
ajustarem as suas operações.<br />
Bruno Galaio conta que os drivers têm<br />
formação para as entregas e que procuram<br />
manter as pessoas na mesma rota, por uma<br />
questão de familiarização com a zona e com<br />
os próprios clientes.<br />
A RELEVÂNCIA DA EXPERIÊNCIA<br />
DE ENTREGA<br />
Tal como sentido na própria origem da<br />
Lowlow, a experiência do consumidor no<br />
ato de entrega é cada vez mais valorizada.<br />
“Há algum tempo, uma das coisas em que os<br />
executivos das marcas de retalho apostavam<br />
bastante era em desenhar a experiência<br />
do consumidor em loja. A Nespresso, por<br />
exemplo, ainda hoje é um case study nas<br />
universidades de gestão e nos MBA pela<br />
jornada do consumidor dentro da loja”,<br />
contextualiza, “começamos a ver que, por<br />
causa das alterações que o nosso padrão<br />
de consumo sofreu, devido à pandemia e ao<br />
potencial do teletrabalho, agora estamos<br />
muito mais tempo em casa, e a entrega<br />
passou a ganhar mais relevância para a<br />
marca e naquilo que dá ao cliente”.<br />
Esta vertente da experiência do cliente é<br />
outro dos pontos em que a Lowlow procurou<br />
focar-se, e desde o próprio packaging a dizer<br />
uma frase-chavão/slogan da empresa no ato<br />
de entrega, a empresa procura diferenciar-se<br />
do restante mercado através de um serviço<br />
“o mais customizado possível”.<br />
“Este processo customizado do last mile,<br />
da entrega porta-a-porta, acaba por ser<br />
algo que começa a ser procurado e em que<br />
também queremos apostar mais no futuro.<br />
O cliente procura tanto a rapidez como essa<br />
personalização. E claro que causa impacto<br />
na pessoa que está a receber”, refere Bruno<br />
Galaio. Ao mesmo tempo, aponta que grande<br />
parte das empresas também procura a<br />
vertente das entregas verdes, através de<br />
veículos 100% elétricos, e que todas as<br />
entregas da Lowlow são feitas recorrendo a<br />
esse tipo de veículos.<br />
“O tempo que estamos dispostos a esperar<br />
por uma encomenda é cada vez menor. E<br />
daí fazer sentido estas soluções microfulfillment”,<br />
afirma. “É o nosso desafio e<br />
acaba por ser também a nossa missão”.<br />
Em busca de novos locais, a Lowlow<br />
quer chegar ao Porto, com uma estratégia<br />
semelhante, mas primeiro solidificar<br />
Lisboa. “Já temos alguns clientes à espera<br />
do Porto. Prevemos que a expansão seja<br />
rápida, sem estar dependente de alguns<br />
fatores externos. Queremos manter a nossa<br />
sustentabilidade, mas com uma massa<br />
financeira que nos permita crescer e escalar<br />
à velocidade que os clientes nos procuram”,<br />
explica Bruno Galaio, referindo que já deram<br />
início à primeira ronda de investimento.<br />
Ao nível do hub em si, o head of strategy<br />
da empresa explica que a sua localização<br />
vai seguir a mesma linha de pensamento de<br />
Lisboa, triangulando a melhor localização<br />
para fazerem as entregas mais rápidas e<br />
serem mais eficientes. “Essa é a grande<br />
estratégia, sendo que o Porto tem o desafio<br />
adicional de que geralmente faz-se Porto e<br />
Gaia. Portanto, idilicamente pode acontecer<br />
haver dois hubs, um em cada localidade. •
64<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
TRANSPORTE<br />
Roubo de mercadorias<br />
Texto: Bruna Manguito<br />
UMA AMEAÇA<br />
EM EXPANSÃO<br />
David Sousa, diretor da SEMPER<br />
Segundo dados fornecidos pela TAPA<br />
(Transported Asset Protection Association),<br />
nos últimos 31 dias de 2022, os furtos de<br />
mercadorias atingiram um montante alarmante<br />
de 17 milhões de euros no mercado EMEA<br />
(Europa, Oriente Médio e África). Contudo,<br />
este aumento levanta questões sobre as<br />
principais razões por de trás deste fenômeno e<br />
a que David Sousa, diretor da SEMPER, tentou<br />
responder. “Sempre foi uma “indústria” bastante<br />
rentável. Os camiões estão em viagem, param<br />
em locais (….) não pode ser muito escolhido,<br />
digamos assim, e ponho a ressalva que deve<br />
ser o melhor possível e deve ser escolhido, mas<br />
nem todos os sítios podem albergar camiões,<br />
por isso, acaba por ser em locais que possam,<br />
efetivamente, ser partilhados. As mercadorias<br />
estão muito expostas e muitas delas são<br />
facilmente transacionáveis e, portanto, tornamse<br />
um alvo apetecível”, explica. De acordo com<br />
o diretor, apesar de maior parte dos furtos<br />
ser feito por ladrões amadores e que roubam,<br />
maioritariamente, camiões com lona por serem<br />
mais acessíveis, este ato está cada vez mais<br />
desenvolvido já que "existem redes que seguem<br />
os camiões a partir de locais previamente<br />
estudados até que os mesmos façam o<br />
parqueamento, e, então, nessa altura, já roubam<br />
sabendo o que vão roubar. Isto é verdade<br />
para mercadorias especialmente atrativas ao<br />
roubo desde materiais informáticos, eletrónica,<br />
cosmética, perfumaria, entre outros”. Outra<br />
tendência crescente é o uso de bolsas de carga<br />
por redes criminosas que através da criação de<br />
empresas fictícias, conseguem obter
SCM Supply Chain Magazine 65
66<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
acesso a mercadorias valiosas. “Já existem<br />
situações em que as redes criminosas adquirem<br />
empresas de transporte reais, que já estão<br />
registadas em bolsas de cargas, que têm seguro,<br />
que têm alvará, que têm histórico financeiro,<br />
que têm reputação no mercado. Adquirem<br />
estas pequenas empresas, operam com elas<br />
durante algum tempo para ganhar confiança,<br />
ou, normalmente, importar mercadorias de<br />
baixo valor para criar um histórico ou continuar<br />
com o histórico e, depois, concorrem para<br />
cargas de elevado valor e desaparecem com<br />
elas”, ressalta o responsável. Desta forma,<br />
alerta que é preciso ter cuidado ao lidar com<br />
plataformas eletrónicas, pois têm-se tornado<br />
um terreno fértil para tentativas de fraude.<br />
Diante do aumento alarmante de roubos de<br />
mercadorias na cadeia de abastecimento, a<br />
atenção redobrada dos stakeholders, incluindo<br />
expedidores, transportadores e intermediários<br />
logísticos, é essencial para garantir a segurança e<br />
a integridade dos produtos durante o transporte.<br />
O combate a essas práticas criminosas exige<br />
uma abordagem multifacetada, que envolve<br />
medidas de segurança avançadas, cooperação<br />
entre as partes envolvidas e o desenvolvimento<br />
de estratégias eficazes para proteger a cadeia de<br />
abastecimento contra o roubo de mercadorias.<br />
IMPACTOS FINANCEIROS<br />
E REPUTACIONAIS<br />
No cenário do roubo de mercadorias na<br />
Europa, Espanha destaca-se como uma das<br />
zonas mais afetadas, “tendo em conta a duração<br />
dos tempos de condução e a distância, é<br />
perfeitamente normal que os primeiros, e os<br />
últimos também quando é de entrada, quando<br />
é de importação, mas os primeiros quando<br />
é de exportação com saída de mercadorias<br />
aqui, sejam perto da fronteira com Espanha.<br />
E, portanto, os roubos acontecem por uma<br />
questão de oportunismo”, menciona David<br />
Sousa. No entanto, Espanha não é exclusiva<br />
nesse aspeto, mencionando a Itália e o Reino<br />
Unido como outros países problemáticos em<br />
relação a roubos de mercadorias. Quando<br />
questionado sobre a situação em Portugal, o<br />
diretor afirmou que existem alguns roubos,<br />
mas que Portugal possui características que<br />
minimizam os mesmos, como a estreiteza<br />
territorial do país. Isso faz com que as<br />
mercadorias saiam rapidamente do país,<br />
evitando paragens que poderiam facilitar os<br />
roubos. Além disso, muitas empresas optam por<br />
parquear as mercadorias em locais com maior<br />
segurança, como as suas próprias instalações<br />
ou áreas com medidas de segurança adequadas.<br />
Em relação à cadeia de abastecimento como<br />
um todo, o diretor menciona que o roubo de<br />
mercadorias afeta cada elemento de forma<br />
distinta mas que as empresas exportadoras<br />
são diretamente afetadas pelas perdas<br />
financeiras e pelas penalidades contratuais<br />
impostas: "Quando acontecem os roubos, essas<br />
penalidades, que são pesadas, são aplicadas".<br />
Além disso, ressalta que a disponibilidade das<br />
mercadorias no mercado pode ser prejudicada,<br />
reduzindo a competitividade das marcas.<br />
ESTRATÉGIAS DEFENSIVAS<br />
O diretor da SEMPER aproveitou para referir<br />
o paradoxo existente entre a exigência dos<br />
tempos de entrega e a segurança-descanso dos<br />
motoristas, uma vez que a demanda por prazos<br />
de entrega das mercadorias cada vez mais<br />
reduzidos tem impulsionado a competividade,<br />
e consequentemente, a procura por operadores<br />
que possam entregar mercadorias de forma<br />
rápida e eficiente. Como explicou o responsável,<br />
"o operador que conseguir, de uma forma<br />
regular, com um preço mais competitivo,<br />
com um tempo de trânsito inferior, entregar
SCM Supply Chain Magazine 67<br />
mercadorias, será o operador de eleição". No<br />
entanto, essa pressão por prazos cada vez<br />
menores coloca os transportadores numa<br />
situação complexa. Por um lado, estão sujeitos<br />
a restrições legais em relação aos tempos<br />
de descanso dos motoristas. Por outro lado,<br />
essa pressão pode comprometer a segurança<br />
das mercadorias, já que muitas vezes não é<br />
possível adotar todos os cuidados necessários<br />
durante o transporte. David Sousa destacou<br />
que "toda essa pressão pode levar a que não<br />
possam ser tomadas, muitas vezes, cuidados<br />
adicionais como deveriam ser para todas as<br />
mercadorias". Outro desafio enfrentado pelos<br />
transportadores é a disponibilidade de locais<br />
de parqueamento adequados. Apesar de<br />
existirem locais fechados e vigiados, estes não<br />
são abundantes, especialmente ao longo das<br />
principais rotas de transporte, o que dificulta<br />
a tarefa dos transportadores para estacionar.<br />
Diante desse cenário, o profissional sugere<br />
algumas medidas para que as empresas de<br />
transporte possam proteger-se de forma mais<br />
eficaz. Uma das recomendações é ter um<br />
seguro abrangente, levando em consideração<br />
não apenas o roubo, mas também outros<br />
riscos. Além disso, é importante que as<br />
empresas pesquisem e forneçam informações<br />
aos transportadores sobre as bolsas de<br />
carga e os cuidados necessários ao utilizar<br />
operadores desconhecidos. Isso inclui realizar<br />
verificações financeiras e históricas, entrar<br />
em contato direto com agentes de seguros e<br />
outros transportadores, e procurar referências<br />
e informações fora das plataformas de<br />
transporte. Em relação ao estacionamento,<br />
é recomendado que as empresas tenham<br />
critérios mais criteriosos na escolha dos<br />
locais de parqueamento. Com o aumento do<br />
risco de roubo, é fundamental que planeiem<br />
cuidadosamente as rotas e escolham os locais<br />
mais seguros possíveis ao longo do trajeto. O<br />
especialista ressalta a importância de "tomar<br />
todas as medidas possíveis para planear a<br />
viagem, planear o descanso do motorista da<br />
noite e escolher o local mais seguro possível<br />
ao longo da rota". Ao tomar essas medidas, as<br />
empresas poderão proteger os seus negócios<br />
e garantir a segurança das mercadorias<br />
transportadas. •
68<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
CARREIRA<br />
Supply chain<br />
Texto: Ana Paiva<br />
BURNOUT:<br />
SOMOS APENAS<br />
HUMANOS<br />
Os últimos anos têm sido desafiantes para<br />
toda a gente, mas particularmente para<br />
os profissionais de supply chain. Com o<br />
mundo de pernas para o ar foram eles<br />
que, trabalhando quase sem parar, em<br />
cenários inéditos, mantiveram as cadeias de<br />
abastecimento mundiais a funcionar. Mas,<br />
no mundo real, os super heróis cansam-se.<br />
Stressam. Esgotam-se. E o burnout também<br />
lhes bate à porta. É que na verdade eles são<br />
apenas humanos.<br />
Oburnout é uma doença que tem vindo<br />
a afetar cada vez mais profissionais de<br />
diferentes setores, como é o caso da supply<br />
chain. Trata-se de uma área exigente, com<br />
rápida necessidade de resposta, deadlines<br />
apertados e um acompanhamento permanente.<br />
Dadas estas especificidades, fica claro que<br />
nem sempre é fácil desligar. Mas é preciso. O<br />
equilíbrio entre a vida profissional e pessoal<br />
é essencial ao bem-estar de todos nós.<br />
Para uma, precisamos da outra. De forma a<br />
melhor entender o tema conversamos com<br />
uma psicóloga, um professor catedrático de<br />
Fisiologia, três entidades ligadas à área de<br />
recursos humanos, um líder de supply chain,<br />
e três profissionais que passaram por um<br />
processo de burnout, que nos contaram a sua<br />
experiência em primeira mão.<br />
Em 2022, oito em cada 10 funcionários<br />
consideraram estar em risco de burnout, uma<br />
tendência que aumentou significativamente<br />
desde 2019 (63%) até ao passado ano (81%).<br />
Esta é uma das conclusões do “Global Talent<br />
Trends 2022-<strong>2023</strong> Study: Rise of the Relatable
SCM Supply Chain Magazine 69<br />
Organization”, desenvolvido pela Mercer. Para<br />
o relatório foram tidas em conta opiniões de<br />
mais de 13.000 executivos, líderes de recursos<br />
humanos e funcionários de 25 regiões globais,<br />
entre elas Portugal.<br />
“Mudam-se os tempos, mudam-se as<br />
vontades”, é um ditado que se aplica<br />
perfeitamente aos dias de hoje, no que ao<br />
paradigma laboral diz respeito. A forma de<br />
trabalhar está a ser repensada, incentivada<br />
pelos desafios causados pela pandemia a nível<br />
global. Surgiram novos modelos de trabalho,<br />
como é o caso do regime híbrido, e novas<br />
necessidades relativamente ao bem-estar<br />
dos trabalhadores. Tornou-se mais evidente<br />
a importância da saúde mental em cada um<br />
de nós, bem como na forma de as empresas<br />
encararem esta questão.<br />
Estamos a assistir, no mercado de trabalho,<br />
a uma completa mudança de paradigma, a<br />
começar pelas expectativas e valores dos<br />
trabalhadores. “Os funcionários sentem-se com<br />
mais poder para agir, como se pode comprovar<br />
pelo fenómeno da demissão silenciosa<br />
(quite quitting) e das demissões voluntárias<br />
(voluntary resignation) em Portugal, que<br />
ultrapassam o período pré-pandemia”, pode<br />
ler-se no estudo.<br />
Algumas das tendências futuras passam<br />
pela ideia de que “as pessoas já não querem<br />
trabalhar para uma empresa, mas sim com uma<br />
empresa”, como refere o relatório. Nota-se<br />
uma grande necessidade de os trabalhadores<br />
se sentirem valorizados e de serem encarados<br />
como uma parte indispensável às empresas.<br />
Porque de facto, o são. Mas será que as<br />
organizações estão prontas para ir ao encontro<br />
das necessidades dos colaboradores?<br />
De acordo com o estudo, em Portugal, 38%<br />
das empresas dizem ter planos para <strong>2023</strong> para<br />
expandir os benefícios, de forma a apoiar todos<br />
os segmentos no local de trabalho. Por sua<br />
vez, 79% prestam, atualmente, algum apoio à<br />
saúde mental dos colaboradores, sendo que<br />
apenas 15% disponibilizam recursos de gestão<br />
de crise após um evento traumático. Apenas<br />
31% estão focadas em redesenhar o trabalho<br />
tendo em consideração o bem-estar dos
70<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
funcionários (cargas de trabalho realistas, dias<br />
sem reuniões, ambiente de trabalho favorável,<br />
entre outros). Ainda assim, 27% oferecem,<br />
atualmente, acesso a “prestadores de serviço<br />
de saúde mental” virtuais.<br />
Uma das conclusões do estudo é de que o<br />
conceito de “parceria” em vez de “liderança”<br />
pode ser um dos maiores trunfos para as<br />
empresas se tornarem mais competitivas na<br />
atração de talento. E mais humanas.<br />
O que é o burnout e como<br />
se manifesta?<br />
“O burnout, por definição, é uma<br />
perturbação que decorre de um stress, ou<br />
de uma ansiedade crónica no trabalho. É<br />
uma doença profissional, que acontece no<br />
contexto de trabalho, e não se trata de uma<br />
situação pontual. É algo que é continuado”,<br />
explica Tânia Gaspar, psicóloga. Os sintomas<br />
associados a este problema manifestam-se<br />
de várias maneiras e afetam, de forma global,<br />
a vida de uma pessoa. “Por um lado, existem<br />
os sintomas psicológicos, em que a pessoa<br />
está mais irritável, muitas vezes tem alguma<br />
labilidade e frieza emocional, e cansaço físico.<br />
Depois, na parte cognitiva, afeta, de forma<br />
progressiva, a capacidade de concentração,<br />
planeamento, memória”. A perturbação no<br />
sono é um dos primeiros sintomas, e é um<br />
dos fatores que desencadeia todos os outros.<br />
“As pessoas não valorizam muito o sono, mas<br />
é fundamental para a nossa saúde mental.<br />
Se não conseguimos dormir, não repomos o<br />
nosso funcionamento, e geramos impacto<br />
no nosso estilo de vida, como a alimentação,<br />
exercício físico, entre outros”, refere. A nível<br />
social, esta doença também se apresenta,<br />
nomeadamente, através de comportamentos<br />
de isolamento, irritação, e menos envolvência<br />
social.<br />
Ana Barbosa, supply chain specialist<br />
A necessidade de isolamento foi um dos<br />
sintomas que afetou Ana Barbosa, supply<br />
chain specialist. “Comecei a afastar-me<br />
de toda a gente. Não queria conversar<br />
com ninguém, só queria estar na minha<br />
bolha, e trabalhar o mais possível. Quando<br />
pessoas que são minimamente sociais<br />
e comunicativas, deixam de o ser, é um<br />
sinal de alerta”, confessa. O burnout foi<br />
diagnosticado em Ana Barbosa em outubro<br />
de 2014, enquanto supply chain manager, na<br />
área do retalho. Trabalhava há seis anos, e<br />
era responsável por coordenar uma equipa<br />
de aprovisionamento de um dos maiores<br />
negócios da empresa até à data. “Comecei a<br />
sentir os primeiros sintomas, como cansaço<br />
extremo, muitas dores de cabeça, falta de<br />
apetite, insónias e sensação de tonturas.<br />
Trabalhava em esforço para acompanhar o<br />
dinamismo e garantir que o trabalho não<br />
era afetado de forma alguma”, indica. Estes<br />
sintomas foram potenciados por um esforço<br />
extremo. “Nesta altura chegava a trabalhar<br />
14 ou 15 horas por dia, dormia quatro horas<br />
por noite e não tirava períodos de férias<br />
prolongados. Tornei-me obsessiva com o<br />
trabalho e queria controlar tudo. Havia uma<br />
autopressão enorme que me consumia, mas<br />
exigia mais de mim”, revela.
SCM Supply Chain Magazine 71<br />
Apesar de ter noção de que o setor da<br />
supply chain, devido às especificidades<br />
de urgência que o caracterizam, poder ser<br />
um impulsionador para encaminhar um<br />
profissional num processo de burnout,<br />
considera que o que o potenciou foram os<br />
traços mais vincados da sua personalidade.<br />
“Sempre fui muito perfecionista, sou<br />
bastante ambiciosa e considero-me uma<br />
profissional muito dedicada e extremamente<br />
responsável. A responsabilidade acrescida<br />
e a pressão natural da área da supply chain<br />
eram motivadores para trabalhar mais e não<br />
consegui equilibrar o meu worklife balance”,<br />
conta. Aliado a isto, considera-se “sorrateira”,<br />
uma vez que conseguiu esconder o seu estado<br />
de toda a gente.<br />
Por sua vez, Tânia Gaspar, ressalva que<br />
embora as características pessoais possam<br />
estar associadas ao burnout, não são o<br />
principal motivo. “Nós, psicólogos, estamos a<br />
fazer o trabalho de transmitir que o burnout<br />
não é um problema individual porque, muitas<br />
vezes, a ideia que passa é de que a pessoa<br />
é frágil e, então, tem responsabilidade por<br />
estar doente”. Ainda assim, traços como rigor,<br />
uma menor abertura à mudança, rigidez<br />
e perfecionismo, podem estar também<br />
associados. É necessário haver um equilíbrio<br />
entre a conscienciosidade, o rigor do trabalho<br />
e a realidade. “Estas pessoas focam-se muito<br />
no trabalho e em fazê-lo bem. Fazem e<br />
refazem para tentar alcançar aquele estado<br />
de perfeição, mas nunca estão satisfeitas.<br />
Isto gera uma sensação de incompetência,<br />
o que não contribui para um bom estado<br />
emocional”, explica. Além disto, problemas da<br />
vida pessoal também contribuem para uma<br />
maior vulnerabilidade e menos recursos para<br />
lidar com intensos níveis de stress no local de<br />
trabalho.<br />
Os sintomas de Ana Barbosa agravaram-se e<br />
o seu estado deteriorou-se. Perda de sentidos,<br />
dores no corpo e incapacidade de se levantar<br />
da cama traduziram-se num ponto de não<br />
retorno. O primeiro passo para a recuperação<br />
foi aceitar e assumir que precisava de ajuda<br />
profissional. O processo de recuperação de<br />
Ana Barbosa foi intenso e necessitou de um<br />
bom suporte emocional familiar. Precisou<br />
de ser medicada para conseguir dormir. “O<br />
sentimento ao acordar era como se estivesse<br />
a acordar de uma anestesia geral, em que era<br />
complicado juntar 1+1. E eu sabia como era<br />
a minha vida, o que era o meu trabalho e as<br />
minhas responsabilidades. Este momento dá<br />
muito medo e gera uma ansiedade brutal”,<br />
confessa. Após algum tempo de recuperação<br />
começaram a surgir outras dúvidas. “Será que<br />
consigo voltar ao trabalho? Será que vai voltar<br />
a acontecer o mesmo? E se acontecer, vou ser<br />
capaz de antecipar?” Passada a fase do medo<br />
e das dúvidas, começou a ter outra perspetiva<br />
e a ganhar consciência. Durante o tempo de<br />
recuperação, descansou, respeitou as horas de<br />
repouso que o corpo necessitava, alimentouse<br />
de forma saudável, praticou desporto,<br />
e voltou aos eventos sociais. Um processo<br />
gradual e consistente que a levou a regressar<br />
ao mesmo cargo e empresa, onde permaneceu<br />
durante mais 10 anos. Ana Barbosa nada tem<br />
a apontar em relação ao comportamento da<br />
organização, que a recebeu bem e a tratou com<br />
“amabilidade” e “respeito”.<br />
Quanto aos ensinamentos que leva desta<br />
experiência, revela que se tornou “numa pessoa<br />
mais consciente dos meus limites, que sabe<br />
respeitar o descanso, tanto o meu como o das<br />
minhas pessoas. Tornei-me uma melhor líder,<br />
percebendo a importância da delegação e da<br />
assertividade da carga de trabalho nas equipas,<br />
bem como estar mais atenta aos sintomas”.
72<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
O líder: responsabilidade versus<br />
vulnerabilidade<br />
O líder é um elemento fundamental na<br />
prevenção de um burnout. Tem a seu cargo<br />
tarefas fundamentais, como a delegação<br />
equitativa de tarefas, a motivação dos<br />
colaboradores, ouvir as suas preocupações e agir<br />
em conformidade, e estar alerta para potenciais<br />
problemas.<br />
“Dois dos aspetos essenciais nas lideranças é<br />
a identificação dos sinais, e entendê-los”, indica<br />
José Soares, professor catedrático de Fisiologia<br />
da Universidade do Porto, acrescentando que “há<br />
alguns líderes que tendem a achar que temos de<br />
ser todos iguais a eles, e nós não somos todos<br />
iguais”. Se o líder transparecer que o burnout<br />
é um ponto de fraqueza, pode mesmo agravar<br />
o estado de saúde do trabalhador. É preciso<br />
entender que esta condição não se trata de uma<br />
questão de vontade ou escolha. Sem ajuda não<br />
é possível mudar. “Talvez o pior que se pode<br />
dizer a alguém nesta situação é: ‘anima-te’. Isso,<br />
já a pessoa quereria”, afirma. Assim, após a<br />
identificação dos sinais e da sua compreensão,<br />
importa agir. “Intervir no sentido de mostrar<br />
confiança, compreensão e, eventualmente,<br />
estimular a pessoa a ter um acompanhamento<br />
que, muitas vezes, não passa apenas por uma<br />
José Soares, professor catedrático de Fisiologia da Universidade do Porto<br />
conversa, mas sim por um acompanhamento<br />
profissional”, aconselha.<br />
Ainda assim, não nos podemos esquecer
SCM Supply Chain Magazine 73<br />
de que os líderes também são humanos, com<br />
fragilidades iguais às de todos os outros, e com<br />
a responsabilidade acrescida de identificar<br />
possíveis sinais de rutura nos seus trabalhadores.<br />
O que os põe numa posição de risco. “As<br />
lideranças também estão pressionadas porque<br />
têm objetivos definidos pelas organizações<br />
que, muitas vezes, não são realistas. Por outro<br />
lado, têm a seu cargo os trabalhadores que<br />
têm os seus problemas, as suas dificuldades, a<br />
reivindicação dos seus direitos, e encaram o líder<br />
como a resolução desses problemas”, afirma<br />
Tânia Gaspar. Algo que a psicóloga considera<br />
importante é que os objetivos sejam “justos<br />
e realistas”, pois as empresas, muitas vezes,<br />
estabelecem metas aos líderes que não são<br />
ajustadas. Isto gera um círculo vicioso, uma vez<br />
que os líderes passam estes objetivos aos seus<br />
colaboradores, gerando pressão e frustração. “Se<br />
o meu objetivo é fazer 100, mas humanamente<br />
só é possível fazer 50, por muito que eu me<br />
esforce, nunca vou atingir esse objetivo”, salienta.<br />
Pode dizer-se que para prestar um melhor<br />
serviço aos seus trabalhadores, as lideranças<br />
também precisam da devida atenção.<br />
“Trabalhar em logística é como ser um atleta<br />
de alta competição. Mas neste mundo, jogam-se<br />
os olímpicos, o mundial e a liga das nações, todos<br />
os dias”, é assim que Nuno Santos, CI EMEA<br />
logistics manager, McCormick & Co., caracteriza<br />
a área exigente da supply chain. Embora<br />
considere um setor de grande exigência, entende<br />
que, independentemente da função, “o alto<br />
desempenho poderá estar associado a riscos<br />
para a saúde quando não existe uma boa relação<br />
entre o esforço e a recuperação”. Na qualidade<br />
de líder, reconhece que lhe está subjacente a<br />
adoção de medidas para prevenir o burnout nos<br />
seus trabalhadores, bem como em si próprio.<br />
“Cabe ao líder ter a empatia e humildade de<br />
entender as diferenças e capacidades únicas<br />
Nuno Santos, CI EMEA logistics manager, McCormick & Co.<br />
de cada colaborador garantindo que existe o<br />
rendimento necessário para o cumprimento<br />
dos objetivos sem nunca colocar em causa o<br />
bem-estar físico e emocional”, afirma. Considera<br />
fundamental ouvir os trabalhadores e criar<br />
ambientes favoráveis e seguros para que possam<br />
ser transparentes e não receber nenhum tipo de<br />
julgamento. Depois, é importante acompanhálos,<br />
ajustar a carga de trabalho e atribuir<br />
deadlines realistas. “Os líderes de logística não<br />
são médicos, mas estas atitudes podem salvar<br />
vidas”, indica Nuno Santos.<br />
“Quando o burnout se instalou,<br />
até controlar a minha própria<br />
respiração era um desafio”<br />
Para Armanda Lima, a “comunicação aberta<br />
e transparente” é essencial entre o líder e o<br />
colaborador, permitindo criar “um ambiente<br />
seguro para que as pessoas possam expressar<br />
as suas perspetivas e expectativas, e os líderes<br />
possam estar atentos às equipas e indivíduos,<br />
percebendo como se sentem e atuando quando<br />
detetam desconforto na equipa ou entre<br />
profissionais”.<br />
Em 2021, Armanda Lima trabalhava numa<br />
empresa do setor dos transportes que vivia
74<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
tempos exigentes devido à escassez de<br />
contentores e aumento de preços. O seu<br />
trabalho consistia em gerir as reclamações<br />
dos clientes e encontrar soluções para os<br />
vários problemas que iam surgindo. “Tudo isto<br />
resultava em frustração para mim e para os<br />
clientes, pois devido aos tempos de trânsito<br />
alargados pela escassez de equipamento,<br />
navios atrasados derivados da pandemia, ou<br />
pelos preços proibitivos, quando conseguíamos<br />
uma solução já o negócio estava sem efeito”,<br />
conta. Sem perceber que estava drenada de<br />
energia, aceitou uma nova oportunidade de<br />
emprego. De início tudo corria bem, uma vez<br />
que ganhou experiência e aprendia coisas<br />
novas todos os dias. Os problemas chegaram<br />
quando, na altura das férias da equipa que<br />
liderava, ficou sobrecarregada com trabalho.<br />
“Os dias tornaram-se intermináveis e o cansaço<br />
começou a afetar-me”, confessa. Tendo em<br />
conta o cansaço extremo, decidiu procurar outro<br />
emprego com menos responsabilidades, mas já<br />
era tarde demais. Dois meses depois começou<br />
a notar sintomas físicos de burnout, como<br />
náuseas, palpitações, visão turva, falta de ar e<br />
ataques de pânico “violentos”. “Fui ao fundo.<br />
Comecei a sentir-me inútil e com medo de<br />
realizar qualquer tarefa, receio de errar, de não<br />
conseguir concentrar-me. Quando o burnout<br />
se instalou, até controlar a minha própria<br />
respiração era um desafio”, conta Armanda<br />
Lima.<br />
À semelhança de Ana Barbosa, considera que<br />
o “perfecionismo” e “ansiedade” a impediram<br />
de colher os frutos do seu trabalho. Expôs-se<br />
a uma pressão imposta por si, uma vez que da<br />
sua equipa e organização, só recebia apoio.<br />
“Mais tarde percebi que essa imposição vinha<br />
de outros contextos onde não fui reconhecida.<br />
Infelizmente, no meu melhor momento<br />
profissional, todo o peso que veio de trás,<br />
desabou sobre mim”, revela.<br />
Depois da tempestade vem a bonança, e<br />
esta experiência trouxe a Armanda Lima novos<br />
ensinamentos, entre eles como alcançar um<br />
ponto de equilíbrio. “Tornei-me mais ponderada,<br />
aprendi a ser mais compassiva comigo mesma,<br />
entendendo que tudo tem um período de<br />
adaptação e que não é necessário ser uma<br />
máquina perfeita e sem falhas”. Ainda assim,<br />
reconhece que está em constante crescimento,<br />
a nível pessoal e profissional, e que manter<br />
um equilíbrio entre as duas vertentes é<br />
fundamental. “Atualmente, o tempo é um<br />
dos meus melhores aliados nesta jornada de<br />
autodescoberta”.<br />
Por sua vez, o caso de Fábio dos Santos,<br />
functional analyst num transitário, traduziu-se<br />
num quase processo de burnout. Felizmente<br />
conseguiu reconhecer os sinais de alerta e sair a<br />
tempo de uma situação que, se se prolongasse<br />
no tempo, poderia ter consequências drásticas.<br />
Fábio dos Santos deu entrada em 2013,<br />
enquanto estagiário, numa empresa do setor<br />
dos transportes expresso que se caracteriza,<br />
pelo seu core, por serviços de urgência. A<br />
cultura da empresa, e da própria tarefa, exigia<br />
manter-se contactável 24 horas por dia, durante<br />
sete dias por semana. Passados dois meses,<br />
foi nomeado diretor de uma das delegações<br />
da empresa, e o seu dia consistia em entrar<br />
no trabalho às 8 horas, e sair às 22 ou 23<br />
horas. “Na minha pior semana lembro-me<br />
de ter feito 70 horas em sete dias”, confessa.<br />
Assim, começou a percecionar uma cultura que<br />
dificultava o equilíbrio com a sua vida pessoal.<br />
Considera que este é um setor de muita pressão<br />
porque o próprio tipo de serviço assim o exige.<br />
“Se um cliente me ligasse à meia-noite eu<br />
tinha de atender porque não se pode deixar<br />
sem resposta”. Com este mindset, a exaustão<br />
instalou-se de forma gradual. “A determinada
SCM Supply Chain Magazine 75<br />
altura, o corpo e a mente começaram a<br />
desgastar-se. Quando eu entrei nesta delegação<br />
pesava 78kg e, quando saí, um ano depois,<br />
pesava 72kg”.<br />
Nesta altura, quando mudou para a nova<br />
delegação, enquanto supervisor, a cultura<br />
empresarial já não era tão intensa, embora<br />
continuasse a existir pressão. Em 2017, não se<br />
sentindo completamente realizado, decidiu sair<br />
da organização, terminar o mestrado e dar uma<br />
volta pelo mundo. Após este período, entrou<br />
para uma empresa no setor dos transitários.<br />
No entanto, em 2020, a primeira entidade<br />
onde iniciou o seu caminho profissional,<br />
abordou Fábio dos Santos no sentido de criar<br />
uma delegação de raiz, ou seja, teria de criar<br />
o plano de negócios, instalar a empresa,<br />
recrutar funcionários, entre outras tarefas.<br />
“Eu aceitei pensando que, no tempo em que<br />
estive afastado, a cultura da empresa pudesse<br />
ter mudado”, revela. Não foi o caso. As tarefas<br />
começaram a acumular-se nas suas mãos e<br />
sentia que, durante o dia de trabalho, não<br />
as conseguia concluir. A solução que lhe foi<br />
sugerida era terminar as tarefas à noite, antes<br />
de dormir. “Quando eu chegava a casa, por volta<br />
das 20 horas, a minha vida era jantar, ligar o<br />
computador e voltar a trabalhar”, conta.<br />
O ponto que o colocou de sobreaviso<br />
foi quando regressou das suas férias e um<br />
dos diretores o abordou dizendo-lhe que<br />
tudo estava errado. A exigência e falta de<br />
reconhecimento foram esgotantes e Fábio dos<br />
Santos foi obrigado a exigir o fim da situação.<br />
“Exaltei-me verbalmente de tal forma que me<br />
senti uma terceira pessoa a observar aquela<br />
situação de fora. Se eu estava a caminhar para<br />
um processo de burnout, este foi o alerta”,<br />
revela. Decidiu recorrer a ajuda psicológica<br />
porque sentia que necessitava desse apoio.<br />
“Neste momento apercebi-me de que a minha<br />
vida profissional estava a ter um grande<br />
impacto na minha saúde mental e que, por isso,<br />
tinha de procurar outro sítio para trabalhar”.<br />
Conseguiu uma nova oportunidade de trabalho<br />
que suscitou alguma confusão noutras pessoas.<br />
“Perguntaram-me porque é que eu estava a<br />
desistir de um cargo de diretor, de um carro<br />
da empresa e de rendimentos altos. A minha<br />
resposta era de que ‘eu quero ser pai, e não<br />
quero criar um filho das 22 às 23 horas’”, indica.<br />
“Muitas vezes, o que causa a<br />
situação de burnout é a cultura<br />
empresarial”<br />
Atualmente, algumas empresas incluem o<br />
tema da saúde mental nos seus valores, mas isto<br />
levanta várias questões pertinentes. Levam, de<br />
facto, a sério o tema? Apostam em benefícios<br />
em prol dos seus trabalhadores? Estarão as<br />
empresas preparadas para lidar com problemas<br />
como o burnout? A maioria das organizações<br />
em Portugal têm consciência de que esta é uma<br />
questão importante para os trabalhadores? Ainda<br />
que algumas empresas tenham esta consciência,<br />
ainda há um longo caminho a percorrer.<br />
“Nós [psicólogos] queremos mesmo transmitir<br />
que a empresa também tem responsabilidade<br />
porque algumas delas aproveitam-se do<br />
problema para o apontar como fragilidade<br />
do trabalhador. Muitas vezes, o que causa a<br />
situação de burnout é a cultura empresarial,<br />
ou mesmo as próprias tarefas que não estão<br />
equilibradas com os recursos que as pessoas<br />
têm para as completar”, explica Tânia Gaspar.<br />
É por isso que a responsabilidade social das<br />
organizações tem um grande peso neste tema.<br />
Se o funcionário se encontrar numa fase mais<br />
vulnerável da sua vida e a empresa prestar o<br />
devido apoio, resultará numa maior ligação<br />
entre ambas as partes e, consequentemente, na<br />
sua motivação. “Os nossos dados revelam
76<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
que a perceção dos profissionais é de que as<br />
empresas se preocupam muito mais com os<br />
utentes/clientes, e menos com os recursos<br />
humanos internos”, revela.<br />
A psicóloga aponta algumas medidas para<br />
as organizações tornarem o ambiente de<br />
trabalho mais “saudável e preventivo”, como<br />
protocolos com instituições de saúde para<br />
acompanhamento psicológico, promover<br />
um estilo de vida saudável, atividades de<br />
teambuilding e de confraternização, e criar<br />
espaços de convívio agradáveis na empresa<br />
onde as pessoas possam estar juntas e<br />
partilhar conversas sobre outros temas que não<br />
trabalho. “A organização deve ter o bem-estar<br />
dos profissionais, e da própria empresa, como<br />
uma base que está em todas as medidas para<br />
alcançar a sua missão”, afirma.<br />
José Soares corrobora esta ideia. “A cultura<br />
da organização não pode ser só ‘people first’.<br />
Têm que, com a sua intervenção, demonstrar<br />
às pessoas algo que eu acho que é decisivo:<br />
a confiança”. Os trabalhadores devem confiar<br />
em quem os lidera e, consequentemente, na<br />
empresa. “É reconhecer que há um pilar de<br />
confiança, e que a organização percebe estes<br />
casos e não os descarta”.<br />
Os profissionais de logística têm vindo a ser,<br />
cada vez mais, afetados pelo burnout, uma<br />
vez que se trata de um setor exigente que<br />
se pauta por um ritmo elevado e constante.<br />
“A necessidade de atenção ao detalhe e ao<br />
resultado da operação logística obriga a<br />
níveis de pressão, concentração e de resposta<br />
muito exigentes. A capacidade de resolução<br />
de problemas diários é uma realidade com<br />
que estes profissionais se deparam todos os<br />
dias”, afirma André Borralho, RH e process<br />
director da Gesgrup, empresa especializada<br />
na externalização de serviços logísticos,<br />
pertencente ao Grupo Constant. Acrescenta<br />
ainda que “quando inserimos estes níveis de<br />
exigência no enquadramento de sociedade e de<br />
mercado de trabalho (integração da Geração Z),<br />
gera, necessariamente, níveis de insatisfação<br />
e intolerância ao stress, diferentes daqueles<br />
a que estávamos habituados há cinco ou 10<br />
anos”. Analisando numa perspetiva em cadeia,<br />
o primeiro impacto acontece nos resultados<br />
e produtividade dos trabalhadores e, por<br />
consequência, no desempenho da organização.<br />
Desta forma, André Borralho considera que<br />
as empresas estão, cada vez mais, a tentar<br />
implementar soluções de acompanhamento<br />
individual aos trabalhadores “conjugando<br />
com uma proximidade de gestão e liderança<br />
André Borralho, RH e process director da Gesgrup<br />
que é fundamental para poder analisar cada<br />
caso e tomar ações específicas que ajudem o<br />
colaborador em causa”.<br />
Por sua vez, Pedro Mega, global headhunter,<br />
logistics & supply chain, Global Talent HQ,<br />
empresa de recrutamento e seleção, vai ao<br />
encontro da perspetiva de André Borralho.<br />
“O burnout é um problema que pode afetar<br />
significativamente os profissionais da área<br />
da logística, pois, geralmente, lidam com um<br />
grande volume de tarefas e responsabilidades<br />
e prazos apertados”. Por isto, considera que as
SCM Supply Chain Magazine 77<br />
Pedro Mega, global headhunter, logistics & supply chain, Global Talent HQ<br />
para melhorar o seu bem-estar no ambiente<br />
de trabalho, e Carlos Sezões destaca algumas,<br />
“acima de tudo refletir e desenvolver o seu<br />
sentido de propósito, ou seja, o que faz, por que<br />
o faz, o que pretende obter. Isto incrementará<br />
bastante a resiliência individual. Depois é<br />
importante desenvolver práticas de autogestão<br />
que mitiguem efeitos do stress, como pausas<br />
no trabalho, desporto, hobbies que revigorem o<br />
corpo e a mente, e permitam manter o foco nos<br />
momentos-chave”.<br />
empresas do setor devem estar atentas à saúde<br />
mental dos seus funcionários e intervir nesse<br />
sentido. “Devem investir em estratégias que<br />
promovam o equilíbrio entre a vida pessoal e<br />
profissional, oferecer suporte emocional aos<br />
trabalhadores, incentivar pausas e momentos<br />
de descanso durante o trabalho, além de<br />
promover um ambiente seguro e saudável”,<br />
salienta. No que aos colaboradores diz respeito,<br />
sugere que adotem algumas práticas benéficas,<br />
como priorizar o autocuidado através de uma<br />
alimentação saudável e prática de desporto;<br />
aprender a gerir o stress através de técnicas<br />
de respiração, meditação ou exercícios de<br />
relaxamento; estabelecer limites claros entre<br />
a vida pessoal e profissional; ou ter uma<br />
consistente rede de apoio.<br />
Carlos Sezões, managing partner da Darefy,<br />
plataforma de transformação de lideranças e<br />
culturas empresariais, destaca a importância<br />
da intervenção do líder, nomeadamente<br />
através de práticas que “assegurem o bemestar<br />
psicológico, como auscultações regulares,<br />
formais ou informais, com empatia, e feedback<br />
positivo”. Quanto ao papel das organizações,<br />
refere que “devem desenvolver culturas<br />
colaborativas com apoio, entreajuda, e bons<br />
níveis de flexibilidade”. Os trabalhadores<br />
também devem adotar algumas estratégias<br />
Carlos Sezões, managing partner da Darefy<br />
O primeiro passo é admitir que<br />
precisamos de ajuda<br />
Os profissionais a quem demos voz passaram<br />
por momentos difíceis dos quais retiraram<br />
ensinamentos valiosos. Por isso mesmo, hoje<br />
têm a possibilidade de aconselhar quem<br />
está a passar por um processo semelhante.<br />
Ana Barbosa destaca a importância de ouvir<br />
o corpo e respeitar quando pede descanso,<br />
apostar numa vida saudável, partilhar as<br />
nossas preocupações com o círculo social<br />
e gerir de forma equilibrada a vida pessoal<br />
com a profissional. “Admitir que temos uma<br />
fragilidade, que queremos tratar dela e que<br />
precisamos de ajuda é dos maiores atos de<br />
coragem que o ser humano pode ter. Estejamos<br />
atentos a nós e aos nossos”, aconselha.
78<br />
ABRIL <strong>2023</strong><br />
Já Armanda Lima, incentiva a procurar ajuda, a<br />
permitir-se desacelerar e a não hesitar em pedir<br />
apoio à sua rede de família e amigos, bem como<br />
de um profissional qualificado. “Lembre-se de<br />
que é natural e humano precisar de ajuda em<br />
determinados momentos, e não há vergonha<br />
nisso. Todos temos limitações e precisamos de<br />
cuidar da nossa saúde mental e emocional para<br />
vivermos plenamente”.<br />
Para Fábio dos Santos, foi importante perceber<br />
o ambiente que o rodeava, nomeadamente<br />
o comportamento dos diretores à sua volta.<br />
“Pensava sistematicamente: ‘É nesta pessoa<br />
que me quero tornar? Quero ser uma pessoa<br />
ausente e constantemente cansada?’”. Considera<br />
fundamental pedir ajuda quando necessário,<br />
mas reconhece que ainda há um grande estigma<br />
em Portugal por recorrer a ajuda psicológica. “É<br />
preciso chegar ao entendimento de que a saúde<br />
não é só física, mas também é mental e é preciso<br />
cuidar dela”.<br />
Tânia Gaspar explica que a intervenção<br />
psicológica nestes casos passa pela organização<br />
da vida em quatro áreas: o trabalho, a vida<br />
familiar, o lazer, e o “eu”. “O que acontece é que,<br />
as pessoas com burnout, encaram o trabalho<br />
como se fosse toda a sua vida, inundando todas<br />
as outras áreas que também são importantes.<br />
Não podemos viver única e exclusivamente só<br />
para uma delas”. Assim, o trabalho do psicólogo<br />
passa por promover um maior investimento nas<br />
outras áreas que compõem a nossa vida, tentando<br />
alcançar o bem-estar para apoiar a área do<br />
trabalho.<br />
O voltar ao trabalho é um momento crucial,<br />
mas tem de ser tratado com cuidado. Tânia<br />
Gaspar explica que, muitas vezes, após uma<br />
situação de burnout, as chefias não sabem lidar<br />
com a situação e voltam a atribuir a mesma<br />
carga de trabalho, e agem sob os mesmos<br />
comportamentos; ou então encaram a pessoa<br />
com desconfiança e fragilidade, tirando-lhe<br />
poder e confiança. “Quando uma pessoa está<br />
numa situação delicada como esta, também<br />
perde autoconfiança a nível da sua capacidade de<br />
trabalho”. Assim, deveria haver um processo de<br />
reintegração, com acompanhamento psicológico,<br />
garantindo o regresso ao trabalho com uma nova<br />
dinâmica que mantenha a estabilidade emocional<br />
do colaborador.<br />
Sem pessoas não se fazem negócios. Elas são<br />
um dos fatores (se não, o fator) mais importante<br />
para o crescimento de qualquer organização.<br />
Para que possam dar o seu valioso contributo, o<br />
bem-estar físico e psicológico precisam de estar<br />
em harmonia. Assim, é urgente promover um<br />
ambiente de trabalho saudável e transparente,<br />
manter os colaboradores satisfeitos e estar<br />
atento. O trabalhador não deve levar o seu corpo<br />
e mente ao limite. É importante dosear, de forma<br />
equilibrada, a atenção que se presta a cada área<br />
que compõe a vida. Todas são fundamentais e<br />
necessárias. Podemos ter ambição para alcançar<br />
os objetivos a que nos propomos, desde que não<br />
tome todas as forças, especialmente na área<br />
profissional. Como afirma Tânia Gaspar, “tem<br />
de haver um maior equilíbrio entre conseguir<br />
evoluir na carreira sem que o esforço tenha de ser<br />
desumano”.<br />
O Laboratório de Ambientes de Trabalho<br />
Saudáveis (LABPATS), dinamizado Tânia Gaspar<br />
e pelo Instituto Nacional de Administração,<br />
I.P. tem um instrumento de diagnóstico<br />
denominado Ecossistemas de Ambientes de<br />
Trabalho Saudáveis (EATS). O LABPATS coloca o<br />
diagnóstico e o respetivo relatório à disposição<br />
das empresas, bem como o relatório (se o número<br />
de respostas for superior a 30), de forma gratuita.<br />
O objetivo da iniciativa passa por avaliar a saúde<br />
mental dos profissionais. As empresas deverão<br />
enviar um email destinado a laboratorioPATS@<br />
gmail.com para saber mais informações. •<br />
C<br />
M<br />
Y<br />
CM<br />
MY<br />
CY<br />
CMY<br />
K
Think Vertical, Think Modula