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Revista PRECISO 55ª Edição - Médico Escritor PAULO CAMELO

Entrevista com o Médico Escritor Paulo Camelo

Entrevista com o Médico Escritor Paulo Camelo

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PRECISO

PERNAMBUCO, FEVEREIRO de 2023 – Revista PRECISO – 55ª edição

PAULO CAMELO

Médico escritor


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Coordenação Geral

Batista Neto

Francisco Pires

Coordenação de Projetos Culturais

Roseane Campos

Analista Social

Bete Nunes

Coordenação Jurídica

Louise Pires

NESTA EDIÇÃO

COLABORADORES

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Nos Jardins da Academia Pernambucana de Letras

foi Palco para uma cerimônia religiosa. No preparo

deste cenário, ainda pela manhã, com flores claras,

rosas claras representavam a pureza de um

momento único para os nubentes.

Assim também o foi para o escritor Paulo Camelo

na biblioteca Waldemar Lopes e onde a revista

PRECISO foi entrevistá-lo.

Presenciei a filmagem por Francisco Pires autor de

obras intimistas, religiosas, cotidianas,

conclusivas...

No decorrer dessa narrativa percebi um artista

múltiplo e sabendo de perfeição.

ELIZABETH BRANDT

Escritora

Na sua linguagem clara e enxuta, o homem se

apresenta através da narrativa recheada de

sentimentos ricos inclinados às pesquisas.

Ele cavouca o cérebro e retira elementos

plausíveis para exercitar seus conhecimentos

vários e descreve com um toque solene a sua

origem.

Há ritmo e cadência em toda a trajetória de sua

existência.

Seus registros de obras acadêmicas seguem um

processo linear de progresso intenso e extenso

rumo ao belo.

O homem, o escritor, o esposo, o artista, o amigo, o

pai, o acadêmico se misturam na descontração

frente às lentes de filmagem.

Ele consegue ser ele mesmo e se despe dos

preconceitos, e incorpora a existência plena, e

aguarda nas expectativas das obras escritas o

fulgor dos Sentidos apurados.

E fecha cortinas e absorve na alquimia da palavra

sã o alimento da alma inebriada de amores.

Seu discurso é lento necessário e preciso.

Inebriantes também são as palavras nas

entrelinhas.

Página 3


Gente,

eu

sou

Paulo

Camelo,

para

quem

não

conhece.

Para

quem

conhece,

continuo

sendo

Paulo

Camelo

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Eu e minha mulher

Carmen Lucia

Marques de Almeida

Página 5


Foi numa segunda-feira

do ano 47:

nasceu um guri, pivete,

empunhou sua bandeira,

tomou banho de banheira,

se enxugou à luz do sol

e se enrolou num lençol,

mas de nada disso eu lembro:

no 22 de dezembro

eu chorei em mi bemol.

E foi assim...

Eu fui crescendo...

Hoje,

já nos meus 75 anos,

estou tentando,

talvez,

contar um pouco

da minha história,

a história humana,

a história profissional,

a história literária.

Vamos começar pela literária.

Talvez seja

a que mais

interessa no momento.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Casamento de Raul Verissimo Camelo de Almeida com Maria Magdalena

de Andrade Lima, que passou a se chamar Maria Madalena de Andrade

Almeida. Engenho Espadas, 7 de setembro de 1930.

Nasci pobre, de prole numerosa.

O meu pai, um rapaz trabalhador

que no ano de 30 uma formosa

e prendada donzela desposou,

teve dúzia de filhos, seis casais,

criou dez na pobreza e na decência

(o oitavo fui eu, quinto rapaz,

outras duas findaram descendência)

e, nos vendo alcançar independência,

atirou-se ao estudo e se formou.

Página 7


Meu pai

se formou

advogado aos

70 anos.

Eu já tinha

três filhos

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Eu sou

recifense

da gema,

mas me criei

em alguns

momentos,

nas férias

escolares,

no interior, no

Engenho

Espadas,

sujando os pés

de massapê

nos atoleiros

da vida,

chupando cana

no canavial e

andando de

carro de boi...

correndo e

brincando na

bagaceira.

De cavalo eu

tenho pouca

experiência,

mas andei.

Engenho Espadas, localizado na

confluência dos municípios de Bom

Jardim, Limoeiro e Vicência, região

da Mata Norte do Estado de

Pernambuco

Página 9


Eu com 1 ano,

na bagaceira do

Engenho Espadas.

Ao fundo a venda

de Sr. Abílio e a

casa do feitor, com uma

casa de farinha ao lado.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Mas eu sou citadino

e vivi a minha vida

na cidade, na

Avenida

Norte, 5010.

Por que eu digo o

número e nome?

Porque esta casa

marcou toda a

família e em tudo

que eu falo sobre a

minha vida existe

Avenida Norte 5010.

Ali eu fui feliz...

Não que eu não o

seja agora,

mas ali eu fui feliz.

Na minha infância eu

brinquei todas as

brincadeiras que as

crianças tinham.

Ali eu ouvi

Jerônimo,

o Herói do

Sertão.

Ali eu ouvi o

Brasil ser

Campeão

do Mundo

na Suécia.

Milton Rang

Jerônimo

Dulce Martins

a eterna noiva

Tina Vita

a mãe de Jerônimo

Cahue Filho

Moleque Saci

Lourival Faissal

sonoplastia

Página 11


Os 10 irmãos.

Atrás: Hermes,

Severino (Cici), José

Urbano e Raulzinho.

Mais à frente: Célia,

Léa e eu. Na frente:

Marta Isabel,

Madalena (Lena) e

Almira. (por volta de

1955)

Eu com as irmãs Lena

(menor) e Marta

(maior) no quintal de

nossa casa na Avenida

Norte 5010, vendo ao

fundo o armazém de

material de

construção da

casa vizinha,

de número 5050.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Avenida Norte, 5010

Página 135


E eu cresci, a timidez apareceu, eu

não me curei. Eu não tive a

juventude que os jovens tinham.

Eu era um adolescente católico

praticante, que ia à missa todos os

domingos e comungava e ajudava

na missa. Eu era acólito, mas,

também, bebia o vinho depois da

missa e assim nós éramos santos e

pecadores.

Eu cresci e passei no vestibular.

Passei no vestibular de primeira e

conheci a minha primeira

namorada, que não foi o meu

primeiro amor. Meu primeiro amor

ficou no meio do tempo. Essa

primeira namorada foi meio que

passageira, porque eu não tinha

experiência, nem ela, e nós

acabamos.

Quando uma colega minha,

estudando comigo, me chamou

para estudar na casa dela, um

grupo de estudo, qual a

justificativa?

- Paulo, vai lá na minha

casa... eu tenho uma

irmã que acabou o

namoro e está sozinha.

Eu fui estudar. E lá eu encontrei

uma danadinha magra, com 38 kg

só, cabelinho curto, um blusão

solto por fora da bermuda. Gostei

da danada! E, depois de muita

timidez, consegui namorar com ela.

Já faz muito tempo.

Tenho 51 anos de casado.

Não vou dizer que foi tudo bonitinho

não, viu? Meu casamento acabou

duas vezes, mas eu não deixei que

ele chegasse ao fundo do poço, ou

melhor, ele chegou, mas eu pisei

assim, empurrei de volta e hoje

estou aqui contando a história.

1. Com minhas irmãs mais novas Lena e

Almira, na minha primeira comunhão,

26/11/1957

2. Com Carmen, em Itamaracá

3. Em meu casamento, 05DEZ1971

4. Em minhas bodas de ouro

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Eu conheci a que hoje é minha mulher e fiz o meu primeiro

poema para ela, antes de começar a namorar com ela.

Passei três meses naquele lenga-lenga sem saber o que

fazer até que começamos a namorar e eu fiz o meu primeiro

poema,

O AMOR QUE

EU QUERO

Triste, amargurado,

pensativo e só,

não sou por ela amado,

mesmo que eu tenha dado

o que tenho de melhor.

Rancor nunca senti

nem agora sentirei.

Desde o dia em que nasci,

a primeira dor que senti

foi por amor, isso eu sei

pois vivo em Deus e com Ele

o sentimento é Amor;

o ódio, a raiva, a ira,

a falsidade, a mentira

nunca merecem louvor.

Nunca lhe dei desventura,

briga nós nunca tivemos;

sempre a tratei com ternura

pois, tendo a alma pura,

nós felizes viveremos.

Mas se ela não me ama

com amor puro e sincero,

eu esperarei calado

pois amar sem ser amado

não é isso que eu quero.

Eu anseio por amor,

o amor que Deus ensina.

Sei que isso alcançarei,

por ela amado serei,

pois essa é a nossa sina.

18/02/1967

Até então, aquilo ali foi um acidente de percurso.

Fiz alguns outros poemas, mas eu não me considerava nada

na vida em termos literários.

Passaram-se os anos até que alguém na minha sala de

trabalho - sem nunca ter visto nada que eu escrevi - olhou

para mim e disse:

- Paulo, tu és um poeta.

E eu respondi:

- Como é que tu sabes?

E a partir desse momento eu aceitei esse título, essa alcunha

de poeta.

Não sei se sou, mas

O homem é aquilo

que dizem dele

Naquele tempo tudo que eu escrevia eu datilografava, não

existia computador. Eu datilografava e guardava e escondia.

Não mostrava a ninguém. A partir daquele momento eu

comecei a me soltar e tentar mostrar. Até então eram

poemas livres, poucos sonetos... Tinham ritmo, mas ainda era

um ritmo elementar... E eu fui juntando. Já casado, tinha

alguma coisa na vida que me ligava a fazer poema, mas, às

vezes, até mesmo insosso.

A vida me levou a conhecer outras pessoas. Essa parte é uma

parte muito íntima, eu não vou me estender nela, mas eu

conheci outras pessoas e essas pessoas me levaram a

pensar mais alto, a sair do meu EU, e eu comecei a escrever

poemas.

Aí eu comecei

a cometer loucuras...

E com o tempo eu já tinha material suficiente para escrever

um livro. Mostrei algum tempo depois a um médico, Dr.

Guilherme Montenegro Abath. Ele me incentivou a escrever

meu primeiro livro, ANTES DA AURORA, que é o título de um

poema meu que é muito hermético, diz muito do que eu sou,

muito do que eu fiz, e muita gente não vê e não consegue

entender. Foi o meu primeiro livro, lançado em 9 de Abril de

1987. A partir daí eu me senti apto a participar da Sociedade

Brasileira de Médicos Escritores (SOBRAMES), quando eu fui

chamado pelo Dr. Luiz Barreto, que já participava dela.

Sou médico-escritor, chamado para fazer parte da Sociedade

Brasileira de Médicos Escritores desde 1988. Portanto, já

tenho 35 anos como médico-escritor, ou reconhecidamente

médico-escritor.

Página 15


Um fato interessante. No dia 7 de

março de 1987 eu deveria me

apresentar no local onde nós

teríamos a reunião, lugar onde

hoje se chama Memorial da

Medicina de Pernambuco. Não era

esse o nome ainda, era a antiga

Faculdade de Medicina. Doutor Luiz

Barreto iria me apresentar, mas

eis que ele não foi... E eu lá calado,

tímido, no meio de tanta gente

desconhecida, não sabia o que

fazer.

Então chegou o doutor Pedro

Cavalcanti, chegou para mim e

disse:

- Quem é você?

Eu disse:

- Eu sou Paulo Camelo. Vim a

convite de Dr. Luiz Barreto, mas

ele não veio para me apresentar.

E ele disse:

- Pois eu vou apresentar.

E me apresentou como um novo

componente.

O doutor Waldenio Porto, que era

presidente, me acolheu e eu a

partir daí, passei a ser membro da

Sociedade Brasileira de Médicos

Escritores.

Após reunião festiva

na Sobrames.

Atrás:

Pedro Fernandes Neto,

eu,

José Medeiros/AL,

Cláudio Pina/presidente,

José Carlos

Serufo/MG,

Arimá Maranhão,

Janduhy Finizola.

Na frente:

Luiz Barreto,

Djanira Silva,

Mário Guimarães,

Terezinha Cavalcanti,

Carlos Cavalcanti,

Zilia Codeceira,

José Nivaldo,

Waldenio Porto,

Zélia Monte Bezerra e

Meraldo Zisman.

Hoje, depois desses 37 anos, eu já

fui presidente, vice-presidente,

secretário, tesoureiro - que foi o

meu primeiro cargo. Hoje eu sou

secretário novamente.

E, quando o Doutor Luiz Barreto foi

presidente, ele jogou na minha mão

um troço chamado

Boletim SOBRAMES

e eu assumi esse Boletim

SOBRAMES, a confecção dele,

desde o número zero. Hoje

estamos no número 230, portanto

são 232, porque o número 55 teve

o número 55a. Eu participei de

todos os números dessa revista

que, depois de algum tempo,

passou a ser eletrônica, passou a

ser lançada na internet e ela é

divulgada internacionalmente.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Eu, que com o meu tempo, na minha

timidez, andava com uma lanterna

de sombra na mão, ninguém me

conhecia. Passei anos na SOBRAMES

e ninguém sabia nem quem eu era.

Hoje sou conhecido pelo que eu fiz,

pelo que eu faço, pelas minhas

obras e por aquilo que eu abarquei.

Nunca pelo que eu sou,

mas pelo que eu fiz.

E hoje eu, realmente, sou poeta.

Também, depois de mais de 20

livros escritos, a gente não pode se

esconder. Se bem que nem todos os

meus livros são de poema, é bom

dizer. Eu já fiz muitos...

Sou sonetista, com 1048 sonetos

catalogados. Talvez haja algo

perdido por aí. Creio que não.

Tenho mais outro tanto de outros

poemas...

Na prosa eu sou fraco, mas tenho

alguma coisa. Tenho um livro de

contos. Tenho dois dicionários: um,

Glossário Etimológico Médico, e o

Dicionário do Falar Pernambucano.

E por aí eu tenho mais algumas

outras coisinhas.

Otras cositas más...

E hoje nós estamos aqui falando um

pouco - eu posso dizer - nessa sala

da Biblioteca WALDEMAR LOPES

(na Academia Pernambucana de

Letras) que foi

um grande homem,

um grande poeta,

que eu tive a

honra de conhecer.

Hoje estamos na biblioteca

Waldemar Lopes e eu falando de

mim...

Página 17


Waldemar Lopes

1911-2006

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Página 19


PRECISO nº 55 - FEV/2023


Uma vez um colega

meu, escritor,

disse:

Paulo,

você não

pode ser feito uma

pata.

A pata não vende os

ovos dela porque

não

grita.

A galinha

põe os ovos

e sai cantando...

E eu não

cantava as minhas

obras.

Eu fui feito uma pata

durante a minha

vida, com minha

lanterna de sombra

na mão.

Mas,

as minhas

obras

falaram

por mim.

Hoje eu

estou aqui.

Página 21


PRECISO nº 55 - FEV/2023


Asa, pra que

te quero?

(Trecho do conto)

Ficava, na sua delirante idéia,

horas e horas estudando o vôo

dos morcegos.

Esses animais possuíam

membranas nos membros e,

não tendo os corpos tão

adaptados ao vôo como as

aves, mesmo assim

conseguiam proezas

espetaculares no ar.

Nos intervalos entre os

sonhos, trabalhava. E seu

trabalho era muito bem

proveitoso e aproveitado.

Aumentou seu raio de ação, e

iniciou suas atividades em

outros Estados, no que

necessariamente incluía horas

de vôo. Horas de vôo dentro de

um charuto mais pesado que o

ar, mas que não obedecia a

ordens dos seus membros, do

seu corpo. Um charuto que o

levava no interior.

Sim, estava voando, utilizando

as leis da física que imaginava

poder dominar (tal qual Santos

Dumont pensou).

Mas seu horizonte sempre era

outro: o vôo individual, em

queda livre - não o vôo de

Santos Dumont, mas aquele

dos irmãos Wright, que

quiseram se dizer inventores

do avião - sem, no entanto,

necessitar de máquina, tal qual

uma asa delta ou um páraquedas.

Página 23


PRECISO nº 55 - FEV/2023


Página 25


– Não esqueci de você, Raul... Acompanhei sua trajetória, sem

poder fazer muita coisa, mas procurando livrá-lo de agruras

maiores. Estendi minha mão para ajudá-lo em momentos de

necessidade.

– Papai?

– Sim, meu filho.

E, chamando Mamãe, Dona Marta, Almira e Hermes, que

prontamente me rodearam, continuou:

– Estamos aqui para recepcioná-lo.

– Então...

Olhei em volta... Caminhei, inexplicavelmente, através de uma

parede, e me vi em outra sala. Fixei o olhar para um canto

daquela sala.

Uma equipe de médicos estava, desesperadamente, tentando

fazer com que um coração voltasse a funcionar.

Em outro canto, uma pessoa parada, a olhar...

Alguém foi até ele, e houve um pequeno diálogo... Reconheci

meu filho Paulo. Ouvi o diálogo.

Campainha acionada, correria...

– Parada!

– Ambu!

– Prepare a sala!

Fui retirado de meu leito... Fui? Mas eu estava ali, ao lado de

meus filhos, que olhavam desolados a equipe médica me

levando... levando meu corpo!

Como???

Uma luz forte acendeu em minha frente. Surgiu, então, uma

pessoa a falar comigo:

– Você nos perdeu prematuramente, mas nós não o

deixamos. Lembra, Raul, de tanto ensinamento que você

pegou com gente simples?

– Seu Urbano...?

– Sim, Raul. Eu estava naqueles seus momentos de aflição,

tentando ajudá-lo.

Outro vulto...

– O senhor não pode ficar aqui.

– Eu sou médico. E sou filho dele.

– Ah! Então aproxime-se.

– Não! Eu só iria atrapalhar.

Poucos minutos, e um médico da equipe dirigiu-se a ele.

Trocaram algumas palavras, e ele saiu.

Agora acompanhado de meus anfitriões, pedi que me

acompanhassem na minha última visita a Nim.

Ela estava rodeada de amigos, e eu esperei para ver e sentir

o beijo que eu lhe enviara.

E Paulo chegou e lhe deu um beijo... meu beijo!

Fiquei ainda algum tempo ali, e depois acompanhei meus

anfitriões a minha nova morada.

Agora fico à espera dos outros...

Enquanto espero, volta à lembrança toda minha trajetória, e

eu me pergunto, como me perguntava constantemente,

enquanto vivo estava:

– Quem eras tu, Major Raul?!

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Não diga nada

Sufoque a dor e fique a declamar

versos de amor, versos de paz, canções

maravilhosas, aprenda as lições

que a vida nos ensina sem parar.

Veja que lindo o som da passarada

em tarde quente. Escute esses pardais

em seus namoros, sinta quanta paz

eles transmitem... Não, não diga nada!

Escute apenas o gemer do vento

acariciando as folhas no pomar,

deguste essa pitanga, a manga rosa...

E diga se é preciso mais alento,

e veja se é possível não cantar

a força desse amor em verso e prosa.

O Salmo 23

Nada me faltará, pois meu pastor

tu és, Senhor. Cuida do teu rebanho.

A tua proteção não tem tamanho

e os bons caminhos mostras, por amor.

Por águas mais tranqüilas passarei,

não temerei o mal ao meu redor

porque comigo estás.

Não temo a dor, nem mesmo a morte.

És meu pastor, eu sei.

Perante os inimigos posso estar,

pois com teu óleo unges-me a cabeça

e serei farto. Eu sei que és meu pastor.

Bondade e amor irão me acompanhar

e habitarei contigo. Que me desça

a tua paz e proteção, Senhor.

Página 27


Nas profundezas

desse olhar

Cantei ao teu ouvido uma canção

e divulguei ao mundo o meu amor

forte e sincero, raio multicor

que comandou de vez minha razão

ao som doce e sutil do coração,

canção de amor que me fez naufragar.

Entrei nas profundezas desse olhar

e em lágrima de amor eu me afoguei,

te fiz minha rainha, eu sou teu rei,

e os nossos corpos serão nosso lar.

Pregado na cruz

Por quem veio o seu sangue derramar

o Senhor Jesus Cristo no Calvário?

Ele foi acusado de falsário

em dizer-se homem-Deus pra nos salvar.

E o castigo era ser crucificado,

e por isso pregado foi na cruz

pelos punhos e pés. Ficou Jesus

assim preso, sem ter osso quebrado.

Entre dois criminosos colocado,

era enorme o sofrer, a sede e mais

a abertura no peito, o sol, a luz,

o vinagre na boca, o peito arfado,

e, trocado que foi por Barrabás,

no Calvário, a sofrer, morreu Jesus.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


É

só querer

Um futuro em esplendor

sonhado para o planeta

não fique só na caneta

e no papel. Com vigor,

vamos todos nos dispor

a criar novo ambiente,

bem melhor, mais envolvente,

e felizes nós seremos.

A força para isso temos.

É só querer, ir em frente.

Foi numa

segunda-feira

E, quando eu chego aos setenta,

eu olho um pouco pra trás:

muitos risos, muitos ais,

muito sal, muita pimenta.

O mundo inteiro me tenta

mas não perco essa estribeira,

pois ainda tenho esteira

a caminhar, muito chão.

Eu comecei meu verão

foi numa segunda-feira.

Página 29


Talvez eu seja assim

Talvez eu seja assim, igual você,

pois tenho amor, eu creio, eu reconheço,

e não me oponho a mais um recomeço

a cada vez que o mundo não me crê.

Talvez eu seja assim, você bem vê,

porém o meu amor jamais tem preço:

é dado, ele é doado, e pelo avesso

eu me apresento, o inverso do meu ser.

Talvez eu seja assim, talvez eu seja,

e no poema eu solto a minha voz

para poder ao mundo amar melhor.

Mas não darei o amor numa bandeja,

à espera de outro amor. Sou meu algoz,

e me penitencio ao viver só.

Meu Salmo

O meu bom Deus, que me mantém na fé,

é o Deus da vida, da consolação,

que, mesmo em dias de desolação

e pandemia, de tristeza até,

mostra a beleza de manter a mão

bem firme e forte em aceitar qualquer

vicissitude e me suster em pé

quando o vigor da vida perde o chão.

O meu bom Deus conhece o que padeço

e me dá forças para resistir

e agradecer a vida, o riso, o amor.

Ao meu bom Deus, sereno, eu agradeço

até nas dores certas do porvir.

Ao meu bom Deus me entrego sem

temor.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Logomarca idealizada e construída por mim em 1977. Deixada sem uso por vários anos até

assumir a identificação a que se propunha, está nas minhas obras. Compõe-se das QUATRO

iniciais de meu nome, PAULO CAMELO de ANDRADE ALMEIDA.

Página 31


PESO DA RÉGUA, Portugal

Aos seis anos eu fui para a escola. Eu já sabia ler. Minha mãe

me ensinou no quadro negro e, quando eu cheguei na escola,

a professora me passou de ano do preliminar - como

chamavam naquele tempo, que era não o jardim da infância,

era alfabetização - para o primeiro ano. Então eu fiz dois

anos no primeiro. Ali eu passei três anos numa escola

simples, com poucos alunos e uma única professora, que era

enérgica. Em algum momento eu senti o peso da régua na

minha mão.

Eu, alguns anos atrás, dei um dos poucos passeios

internacionais. Fui a um congresso em Portugal e nos

passeios turísticos ali, por Vila Real... ali nós andamos e eu

conheci uma cidade cujo nome me lembrou a minha infância e

a minha professora do primário. A cidade chama-se PESO DA

RÉGUA, e, quando eu vi o nome PESO DA RÉGUA, me lembrei

da minha professora do primário, Dona Lourdes de Medeiros,

no Externato Professor Medeiros. Dona Lourdes era esposa

do Dr. Abaeté de Medeiros, médico-escritor que foi da

SOBRAMES.

A Dona Lourdes... ela ensinava aos alunos numa única classe,

numa única sala com todas as classes misturadas.

Num determinado dia ela foi tomar a lição do sistema

métrico decimal a uma aluna. Olhou para nós e disse:

Quem souber

não fale.

E colocou no quadro negro... e a aluna dizia: quilômetro,

hectômetro, decâmetro, e parava..

A Dona Lourdes dizia: “VAMOS, CONTINUE”, e a aluna fazia:

quilômetro, hectômetro, decâmetro, e não sabia continuar...

Na terceira vez, ela disse: quilômetro, hectômetro,

decâmetro... e eu não aguentei mais e disse:

METRO.

A professora olhou para mim e disse:

E eu disse:

Eu disse que não era para falar,

seu amarelo.

Amarelo é ouro,

preto é besouro.

Aí eu senti o peso da régua na minha mão.

Levei castigo. Eu era Paulo. Paulo é pequenino, mas é treloso.

São essas coisas da vida.

O nome, às vezes, a gente crê que não diz, mas, diz muito da

gente.

Essa foi uma passagem da minha infância e isso me lembra

alguma coisa, não da professora, mas do curso primário,

onde eu pensava que português era uma matéria muito difícil

e depois eu vi que português era aquilo que iria me levar a

vida toda.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


E nós aprendemos a fazer poemas, aprendemos a fazer

sonetos lendo os autores, recitando... e uma coisa que ficou

marcada foi que todos os versos, quando eles terminavam

em palavras paroxítonas, o verso seguinte tinha que começar

com vogal para que você não perdesse o ritmo. Eu gravei

isso e não vi isso ser utilizado durante a minha vida literária.

Num determinado dia, alguém, na internet, já disse:

- Paulo, você pode me ensinar

a fazer poesia?

Primeiro, não se ensina a fazer poesia. Eu poderia fazer

poema. Poesia é substantivo abstrato; poema, substantivo

concreto... Mas eu não sei, isso é dom da pessoa.

E eu disse

Mas você poderia

me ensinar alguma coisa...

Está certo, eu posso fazer.

E comecei a falar sobre o ritmo no poema. E aí eu mostrei a

razão e o porquê de se utilizar muito o ritmo num poema. E

esse ritmo que naquele momento eu denominei de RITMO

HOLÍSTICO. Foi o que me levou pela vida literária e até hoje eu

utilizo esse RITMO HOLÍSTICO que eu aprendi no meu curso

primário. É o próprio ritmo da vida...

Holos quer dizer TUDO. E eu me mantenho assim.

Olha, gente, eu falei do Ritmo... o ritmo nos guia em tudo, no

andar, no batimento cardíaco, no voar das aves, dos

pássaros...

Se nós

voássemos,

também haveria um ritmo.

E no poema não poderia ser diferente.

O ritmo é uma das coisas mais importantes num poema, mas

há aqueles - eu digo aqueles porque eu vejo isso na nossa

literatura - há aqueles que leem um poema, que declamam

um poema como se cada verso fosse uma unidade autônoma

e que eles não se unissem aos outros.

Eu aprendi desde o meu curso primário que um poema é um

todo e eu peguei, no início, ainda, fazendo alguns poemas que

não tinham esse ritmo forte, mas, aprimorando, eu utilizei e

hoje utilizo este ritmo holístico.

Por que holístico? Porque você integra o poema todo em um

ritmo, não fazendo como muitas pessoas declamam... e já

ouvi pessoas dizerem que eu declamava ruim porque eu não

parava no fim do verso.

Vejam, eu poderia ler

É difícil viver Amor assim

Só no olhar, no ouvir

Sem se tocar

... parando no fim

Eu estou lendo porque eu não sei decorados os meus mil e

tantos sonetos, infelizmente. Mas vamos ver:

em não saber curar tanta amargura...

um pranto dolorido me contém...

sozinho, em desespero, não me vem

tal lenitivo que me traga a cura

Alguém poderia ler

em não saber curar tanta amargura...

um pranto dolorido me contém...

Este é o ritmo holístico

Eu não consigo mostrar diferentemente, porque meus

sonetos, perseguem este ritmo.

Eu não consigo quebrar o ritmo depois de um verso, deixando

aquela sílaba átona, morta, lá, sem se unir a nada. Ela tem

que se unir.

Eu lembro que na música A BANDA, de Chico Buarque, toda

em sete sílabas, ele colocou um verso com seis sílabas.

Ninguém notou. Não sei nem se ele notou. Nunca me disse.

Mas, ele chegou, disse:

A minha gente sofrida

despediu-se da dor.

Assim alguma pessoa leria

a minha gente sofrida

despediu-se da dor

e esse DESPEDIU-SE DA DOR ficaria só com seis sílabas. Na

verdade é:

a minha gente sofrida

despediu-se da dor.

Isso é um ritmo holístico e para que eu não fizesse esta

quebra de ter seis sílabas - ou nove sílabas se eu falasse em

decassílabo - eu procuro colocar uma vogal que se ligue ao

anterior e não perca este ritmo holístico.

Página 33


CINE ESPERANÇA

2023

Nas Fazendas da Esperança em

Jaboatão dos Guararapes, Primavera, São Joaquim do Monte, Garanhuns/PE

Alhandra/PB

PRECISO nº 55 - FEV/2023


No meu científico, no Colégio Salesiano, eu fiz um teste

vocacional e eu tinha condições de trabalhar com Ciências da

Saúde e poderia trabalhar com Ciências Exatas. Ou seja, eu

poderia ser médico, ser um engenheiro, nunca um advogado.

Em 1963 meu irmão mais velho, médico, com um laboratório,

chamou a minha irmã mais nova para ser datilógrafa nesse

trabalho e depois de todo esse preparo ela disse:

- Eu não vou porque eu vou perder as minhas novelas.

E ele disse:

- Paulo você quer?

De pronto aceitei. Fui ser datilógrafo no laboratório de

análises. Ali foi o meu começo, 18 de dezembro de 1963. Com

esse dinheiro consegui pagar o meu curso científico e fiz

vestibular. Por que eu fiz vestibular? Eu, trabalhando em

laboratório, gostei daquilo que eu estava fazendo e, então,

entre medicina e engenharia, optei pela medicina. Fiz o

vestibular de medicina e passei. E, estudando medicina, com

o tempo, meu irmão, que tinha o laboratório mas não fazia a

parte de microbiologia, me disse:

Paulo, você vai estagiar em bacteriologia

porque é a parte que a gente não tem.

E eu fiz microbiologia. Fiz meu estágio de sexto ano em

microbiologia, fiz mestrado em microbiologia para suprir o

que não existia no laboratório onde eu trabalhava e aí eu

gostei e comecei a viver da microbiologia.

Mas a microbiologia não era tudo para mim. Eu gostava da

organização, eu gostava de muitas outras coisas... E, depois

de eu fazer o mestrado em microbiologia, eu fiz uma

especialização em administração hospitalar. Foi isso que me

guiou dali pra frente.

Com o tempo, o laboratório foi diminuindo e a administração

foi crescendo. Eu deixei o laboratório, já como servidor

público que eu fui durante toda a minha vida. Deixei o

laboratório e passei para a administração... arquivo,

estatística, faturamento e auditoria. Terminei meus tempos

como médico auditor.

Eu não fiz nenhum estágio em clínica, não fiz nenhum estágio

em cirurgia, um estágio pequeno em maternidade não me

levou a nada e eu me mantive naquilo que eu já fazia.

Trabalhei em laboratório e consegui viver

este meu tempo todo fazendo isso:

laboratório e administração.

Parei o laboratório em 1983 e, desde aquele tempo, eu

trabalhei em administração até 2020, quando eu me afastei

totalmente dos meus afazeres profissionais, mas não parei

como ser humano.

No laboratório do IMIP por volta de 1968. Tonho (Antonio Fernando

Muniz Passos), D. Teresa (Teresinha Gueiros da Silva), Assuero

(Assuero Gueiros da Silva, esposo de D. Teresa), eu e Cici (meu irmão

Severino Camelo de Andrade Almeida, chefe do laboratório).

Página 35


ORGANIZAÇÃO CONSERVAS

agora com

CERTIFICADO DIGITAL e INSCRIÇÃO MERCANTIL

NOSSOS AGRADECIMENTOS A

Bruno César, Cícero Macário, Clara Marques,

Humberto Viana, Ismael Júnior, Jaime Gomes e Renato Lima

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Por que é

que eu escrevo

poema?

Porque eu quero contar tudo, mas não posso dizer...

Você vê meus poemas, têm ritmo, tem melodia... Todos. Ritmo

e melodia. Eles têm gramática. O português deles é perfeito,

se é que eu posso dizer assim. Não são muito herméticos,

mas eles têm o hermetismo suficiente para esconder o que

eu não quero dizer...

Eu faço poemas, às vezes, por encomenda, mas, muito raro,

muito raro. Eu espero, quando eu recebo uma encomenda

dessas, eu espero que a inspiração chegue o suficiente para

que eu possa despertar o poema.

Em 1980, quando os meus pais fizeram BODAS DE OURO,

minha mãe chegou para mim e disse:

- PAULO, eu quero que você faça o hino das nossas BODAS

DE OURO para ser cantado na missa.

Eu disse:

- Mamãe, eu não sei fazer música. Muito pouco eu

escrevo...

Eu uso muito

EU TE AMO

para as pessoas que eu amo,

mas, há diferença entre o amor

e o que dizem Ser Amor...

Tem passagem na minha vida

e da minha família

que eu choro

quando eu falo.

Aliás,

eu sou muito emotivo.

Eu choro por besteira...

Agora,

não choro por raiva,

nem por tristeza.

Por tristeza,

às vezes,

mas não tanto...

Em 1980 eu ainda não tinha publicado meu primeiro livro.

(ANTES da AURORA)

- Mas, eu quero que você faça.

Foi uma encomenda, mas eu esperei que a inspiração viesse

e eu fiz letra e música do hino, que foi cantado na missa de

BODAS DE OURO de meus pais.

Não satisfeito, eu escrevi a partitura

para ser tocada

por órgão e violino.

Eu era quase nada. Eu não tinha muita coisa escrita. Eu tinha

um chorinho que eu nunca tinha mostrado para ninguém e

nunca gravei.

Então eu vi ali que a inspiração era o mais importante e a

inspiração me leva a escrever sempre.

Raramente eu escrevo

algo sem inspiração.

Outra coisa: eu não decoro. Sei dos meus mil e poucos

poemas... Se alguém apresentar um deles sem dizer a

autoria, eu digo ESSE É MEU! Mas eu não o conheço para ler,

para dizer suficiente.

Página 37


Bodas de ouro

Paulo Camelo

A festa que hoje vos fazemos,

cantando em uma só voz,

talvez não diga o que sentimos,

talvez não mostre o nosso amor,

mas esse pouco que vos damos,

por mais que seja, não vos diz

do muito que agradecemos

por nossa vida ser feliz.

Bodas de Ouro, cinqüenta anos

de harmonia, de felicidade.

Nós, vossos filhos, nos irmanamos

para mostrar-vos nossa amizade.

Esta família numerosa

que hoje está a se alegrar

formou-se há cinqüenta anos

num casamento exemplar,

quando Raul e Madalena,

num feriado nacional,

prestaram a Deus um juramento

de amor matrimonial.

Bodas de Ouro, cinqüenta anos

de harmonia, de felicidade.

Nós, vossos filhos, nos irmanamos

para mostrar-vos nossa amizade.

Família em pose para foto nas bodas de ouro, na capela do Colégio

Damas. Ao lado de minha mãe estava minha avó Marta Gomes de

Andrade Lima (Mãe Outra). 7 de setembro de 1980.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Antes

da

Aurora

Paulo Camelo , 19/11/1986

Antes de romper a aurora

eu vi o dia!

meu corpo flutuou,

apesar da massa.

Onde estaria eu naquela hora?

Não sei se havia um mundo

ou se eram dois.

Havia formas geométricas:

um cubo, um círculo...

e eu?

E aqui, conversando, eu achei esse ANTES DA AURORA, meu

primeiro livro.

A capa é uma fotografia minha. Eu fotografei uma falésia,

uma microfalésia em um maceió em Ponta de Pedras, e

joguei esta cor um pouco acinzentada para dizer que é

colorido.

Eu estou fugindo do tema...

Nesse Antes da Aurora eu quero ler para vocês um poema.

Ele é descritivo, mas não diz nada. Ele diz tudo e ninguém vê.

Deixa eu ler Antes da Aurora. Esse poema eu não vou dizer do

que ele fala porque senão quebra...

Eu vou ler esse poema para sintetizar um pouco do que eu

sou como poeta. Vamos a ele,

Este poema eu fiz há muito tempo com a técnica ainda não

muito aprimorada. É um poema de Versos Livres...

Depois eu aprimorei meu ritmo,

minha técnica métrica,

me dediquei ao soneto.

Hoje eu sou sonetista, mas, de vez em quando, eu gosto de

voltar ao que eu escrevia antes.

Eu era eu naquele instante

e ao mesmo tempo não o era.

E a gramática que eu aprendi

para nada serviu.

Eu, tu, nós, não sei quem era.

Até o Eu não era eu.

Havia várias partes

em mundos diversos.

Eu podia dizer “nós”

e falar de mim.

Podia dizer “eu”

e falar de nós.

Minha cabeça era um mundo

que noutro mundo entrou

e se encontrou com o eu

do meu corpo que ficou.

O meu corpo estava em outro

e no outro se apoiou.

Havia partes do eu,

ou partes de nós?

Não sei.

Ainda não havia rompido a aurora.

Página 39


Oi

Paulo Camelo

Oi, quanto tempo!

Não mais te vi,

sequer falamos.

Tínhamos tantas idéias a trocar,

experiências, vivências,

aquele lance de emoções...

Quanto tempo!

A nossa sensibilidade nos tocou

e nos fizemos tocar, trocar,

imaginar momentos,

viver momentos,

viver...

Quanto tempo!

Vai, não volta mais.

Os momentos são outros,

outras as emoções

mas a nossa vida é a mesma,

será a mesma.

Mudanças normais, naturais,

evoluções da vida.

Ainda seremos nós.

Quanto tempo!

Eu era mais fora de técnica,

eu não utilizava muito a

técnica, porque o poeta usa

a poesia e usa o poema.

A poesia - substantivo

abstrato, como eu já disse -

ela é o sentimento. Cunhado

por mim:

POESIA

É SENTIMENTO.

O RESTO

É MOMENTO.

E no momento você tem o

poema, você tem a

descrição poética, você tem

uma tela pintada, você tem

um conto, uma crônica... a

forma de se falar da poesia,

ela é muito... apesar de ser...

é... é muito física... física que

eu diga... ela... ela não é

abstrata, ela é concreta...

Mas

a técnica

vai mostrar essa

forma,

de um jeito

ou

de outro.

E eu aprimorei a técnica

para o soneto.

Hoje eu trabalho soneto

holístico, mas eu gostei de

querer mostrar como era eu

nos tempos idos.

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Eu acho que já falei de mim tudo,

não falei do GRITO da VÉIA

Página 41


Vamos falar agora um pouco do

Paulo carnavalesco. Eu, na minha

adolescência, na minha juventude,

eu brinquei muito Carnaval. Corso...

fazia corso. Era uma beleza! Lama,

água... jogava para um lado, jogava

para o outro, em cima de um

caminhão, em cima de um Jeep. Era

uma beleza.

O tempo foi passando, eu fui

modificando para os bailes de

carnaval nos clubes, que também foi

passando... E eu passei a ver o

carnaval pela televisão... e eu parei

o meu carnaval.

Algum tempo depois, a um convite

de um amigo meu, eu fui ver um

desfile do GRITO DA VÉIA. Já tinha

6 anos que eles saíam e eu não

conhecia. E eu fui. Era o ano de

2010, na rua Velha. Chegando lá, eu

vi a orquestra tocando e ali junto,

numa parede, o estandarte parado.

Eu perguntei

Este estandarte,

quem leva?

Aí o Jacques (Ribemboim) - que é o

criador do Grito da Véia - me disse:

- O porta estandarte sofreu um

acidente, não pôde vir.

Aí um rapaz correu e pegou o

estandarte e saiu com o estandarte

na mão, e eu, ali atrás, como não

quer, querendo... sem fazer nada...

Aí o rapaz não sabia - ou não queria,

não sei - levar o estandarte. O

estandarte, você pega... 7 kg. É

pouco. Dois minutos depois, é

pesado. E ele soltou. E eu na minha

simplicidade - que eu gosto de ser -

na minha... na minha humildade, na

minha timidez, eu joguei tudo para

fora e peguei aquele estandarte.

Não queria fazer feito ele, segurar e

soltar. Eu estava de bermuda.

Levantei o mastro, joguei no bolso

da bermuda. Arranjei um suporte

físico e saí com o estandarte. A

partir dali eu não deixei mais o

estandarte do Grito da Véia.

E eu fui declarado o

porta-estandarte

oficial

PRECISO nº 55 - FEV/2023


Sem acento é diferente

Paulo Camelo

Vou com você pular no Grito da Véia,

mas não posso esquecer o acento,

pois veia não grita,

a Véia é quem grita,

e sem acento é diferente.

O frevo é o apoio,

o Grito eu apóio

e a multidão empolga a gente.

O grito não pára e ninguém sabe para

onde o frevo nos leva, mas vamos em frente.

O Grito da Véia sempre empolga a gente.

O frevo é bem quente,

o grito é freqüente,

e sem o trema é diferente.

O Grito da Véia

empolga a platéia

e nesse passo eu vou contente.

Brinquei o Grito da Véia durante 10

anos, de 2010 a 2019.

Aí, em 2020, eu precisei de tirar um

tumor maligno no abdômen, não

pude sair com o Grito da Véia.

Eu já estava preparando um

substituto que de vez em quando

pegava, mas, esse substituto

adoeceu e eu dei o meu estandarte

a outra pessoa. Eu fiquei, ali, louco

para pegar aquele estandarte, mas

eu não podia. Por ordem médica eu

não podia levá-lo naquele ano.

Não demorou muito, veio uma

pandemia que nos deixou longe de

qualquer coisa por dois anos.

2021/2022 não houve o Grito da

Véia. Em 2022 aquele que seria o

meu substituto, morreu, e eu fiquei

sem condição de continuar.

E hoje eu adoro ser porta

estandarte, adoro o Grito da Véia,

mas eu tenho 75 anos.

Uma experiência que não me foi

muito boa nesses últimos anos: eu

abdiquei de ser porta estandarte.

Quem sabe eu volte... Mas este ano

eu estou fora.

Em 2011 eu fiz esse frevo

canção e está gravado.

Eu, como escritor, primando pelo

bem falar, vi que houve uma

mudança na nossa gramática

tirando alguns acentos e fazendo

algumas modificações que não

deram em nada. E eu não gosto

disso, não, mas...

Aí eu fiz um frevo canção chamado

SEM ACENTO É DIFERENTE. O título do

frevo canção é

SEM ACENTO É DIFERENTE.

Estava na praia, caminhando, me

veio à cabeça letra e música.

E eu fiz.

Página 43


Isso também é

Recife...

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