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Opinião
“Por favor, não matem os velhinhos!”
OPINIÃO
Pedro Pimparel Serafim
É incrível como em pleno
século XXI, onde rapidamente
temos acesso a todo tipo de
conteúdo, a Sociedade teima
em dar a sua opinião sem possuir
qualquer conhecimento
das matérias em questão. O
vício pela procura da relevância
leva as pessoas a formarem
um ideal sem a devida recolha
de bases informativas. Desta
forma, são criadas posições
pessoais pouco sustentadas e,
muitas das vezes, sem qualquer
credibilidade. O caso
da legalização da Eutanásia
em Portugal remonta a 1995
mas é desde 2018 que este
assunto tem ganho uma força
maior, tanto em termos mediáticos
como Parlamentares.
As regras para se ser eutanasiado
são bem claras e,
têm a meu ver, uma estrutura
sólida e que apela na sua totalidade
à razão. A primeira e
provavelmente a mais óbvia
passa pela obrigatoriedade de
se ser maior de idade a fim
de se tomar uma decisão tão
cirúrgica. O ponto de situação
do indivíduo é outro dos
fatores a ter em conta, já que
o processo só pode entrar em
ação num caso de dor extrema
ou agonia prolongada associada
a uma doença incurável e
fatal. Resumidamente, a pessoa
já sabe que é uma questão
de tempo até o término da sua
vida. A Eutanásia seria assim
uma escapatória para as dores
que são praticamente insuportáveis.
De salientar, que se
trata de uma decisão pessoal e
revogável, ou seja, determinada
pelo próprio e sempre com
a possibilidade de desistência
em qualquer circunstância.
Por fim, salientar que outro
dos pressupostos passa pela
sanidade mental do indivíduo.
O mesmo tem que estar apto
do foro psicológico para que
o seu desejo possa ir avante.
Mal eu descobri estas regras, a
confusão instalou-se na minha
cabeça. Na altura senti que me
estava a escapar algum pormenor
para haver tanta gente
contra esta medida. Algum
super argumento que colocasse
em causa os valores éticos
e morais neste aceso debate.
Fiquei estupefacto quando
me apercebi dos argumentos
contra defendidos por múltiplas
entidades e, rapidamente
cheguei à conclusão, que não
é a racionalidade o mote para
pôr em causa este princípio.
Um dos argumentos defendidos
pelos opositores à
Eutanásia passa pela seguinte
premissa: “Só Deus pode tirar
uma vida”. Apesar de respeitar
por completo a religiosidade,
o meu cepticismo leva-
-me sempre a olhar de forma
desconfiada para tudo aquilo
que não consigo analisar com
os meus próprios sentidos. Se
por um lado tenho um enorme
respeito, por outro não posso
aceitar que certas medidas não
prosperem por puras crenças
pessoais. Infelizmente não é
só neste caso em específico
que causas espirituais servem
de travão ao progresso e que
são vistas como um motivo
superior ao próprio pensamento.
A minha perplexidade
aumentou quando num debate
quinzenal em 2018, Assunção
Cristas, na altura presidente
do CDS-PP, referiu o seguinte:
“o Sr. Minsitro não é capaz
de dizer se na sua grelha
de prioridades precisamos de
melhorar os cuidados paleativos
ou destituir a Eutanásia,
que certamente sai mais barato”.
A questão da poupança
obviamente não pode ser um
fator a ter em conta quando
este assunto vem à tona.
O objetivo da Eutanásia não
passa por uma redução de
custos como é lógico. António
Filipe, deputado do PCP,
acredita que o Estado tem o
dever de “mobilizar os avanços
tecnológicos e científicos
para assegurar o aumento da
esperança de vida e não para
a encurtar”. Numa primeira
leitura este comentário pode
parecer acertado, mas o que
é certo é que o aparecimento
desta nova realidade não colocará
certamente em causa
o desenvolvimento de outras
plataformas de apoio associadas
à saúde. A Eutanásia
não passa a ser uma primeira
hipótese para a resolução de
problemas, logo, por consequência,
em nada afetará outros
mecanismos que terão como
objetivo a mais rápida e segura
recuperação dos pacientes.
Em suma, eu sou a favor da
morte medicamente assistida.
Tal como dizia o escritor brasileiro
Jean Carlos de Andrade,
“nós somos donos de nós
mesmos, podemos fazer tudo,
somos livres e desimpedidos”.
Uma pessoa tem o direito de
decidir aquilo que é melhor
para si numa fase da vida onde
não parece haver luz ao fundo
do túnel. Todos aqueles que se
opõem a esta ideia, ainda não
encontraram fundamentos válidos
que contrariem esta proposta.
A Eutanásia não é sinónimo
de “matar velhinhos”.
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