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Cultura

“She Said”: a homenagem ao poder do jornalismo de

investigação

CRÍTICA

Carla Silva

No passado dia 17 de novembro,

“She Said”, um filme

de Maria Schrader, estreou

nas salas de cinema em Portugal.

Adaptado do livro das

jornalistas Jodi Kantor e Megan

Twohey, premiadas com

o Pulitzer, o filme retrata o

caso da queda do produtor

Harvey Weinstein e a história

das suas respectivas vítimas.

O filme desvenda a grande

investigação e o artigo publicado

pelo The New York

Times onde são denunciadas

diversas alegações de assédio

e agressão sexual contra Harvey

ao longo de três décadas.

“She Said” sustenta uma história

intensa até ao confronto

final entre o jornal e Weinstein

e os seus advogados, no

momento da publicação do

artigo. Esta investigação foi

só o pontapé inicial, depois

disso, muitos outros casos

vieram à tona, provocando assim

o movimento #Metoo há

5 anos e dando voz às mulheres

em toda a parte do mundo.

Na contextualização inicial

da longa-metragem, é

abordada uma tentativa falhada

de denunciar assédios

sexuais por parte de Donald

Trump, de modo a afetar a

sua campanha presidencial.

Aborda também o escândalo

sexual da Fox News, retratado

no filme “Bombshell:

O Escândalo” de Jay Roach.

A nível estético, o filme é

elementar. Os planos não são

arrojados ou até mesmo fascinantes,

mas esta sua simplicidade

não impediu que o filme

fosse altamente eficiente. A

banda sonora emocionante de

Nicholas Birtell ajuda a intensificar

o suspense e a manter

o espectador vidrado no ecrã.

Dramatizações de eventos

reais continuam a dominar

os ecrãs em 2022, mas

muitas foram criticadas pelo

enaltecimento dos criminosos

às custas das vítimas. “She

Said”, evita essa narrativa

sensacionalista, dando lugar

a uma abordagem realista e

empática, “amiga” das vítimas.

Adaptar histórias reais

ao grande ecrã é uma enorme

responsabilidade, contudo, o

filme cumpriu o seu propósito

de maneira admirável. O

elemento biográfico foi valorizado

ao incluir uma das vítimas

reais, a atriz Ashley Judd,

tornando assim a reconstrução

mais rica e detalhada. A atriz

desempenhou o seu próprio

papel: resistiu à manipulação

de Weinstein e teve a

sua carreira prejudicada, até

decidir contar a sua história.

Os detalhes obscenos, recordados

e narrados pelas vítimas

do grande produtor da

Miramax, são difíceis para o

público assimilar. O ponto

de vista íntimo do filme tem a

capacidade de fazer o espectador

torcer, genuinamente,

tanto pela equipa jornalística,

como pelas vítimas de Harvey.

As atrizes Koe Kazan e

Carey Mulligan, que interpretaram

as jornalistas Jodi

Kantor e Megan Twohey, respetivamente,

fizeram uma dupla

marcante e contribuíram

para a emotividade do filme.

O papel das duas personagens

é completamente distinto

- enquanto Jodi é mais

contida e frágil, Megan é o

símbolo de poder. Apesar das

discrepâncias, o companheirismo

entre as duas nunca foi

quebrado, ao longo do filme.

Maria Schrader escolheu

humanizar a história mostrando

desafios pessoais de ambas

as jornalistas, de forma a realçar

a complexidade do dia a

dia da mulher contemporânea.

É uma abordagem relevante,

mas faltou “força” ao retratar

a depressão pós-parto de

Meghan, tal como as dificuldades

que Jodi enfrentava na

criação das filhas, tornando

assim estes momentos desin

teressantes. Apesar do forte

argumento, é um filme muito

simples, como foi referido

anteriormente. Contudo, tamanha

simplicidade poderá

fazer com que a obra seja esquecida

ao longo do tempo.

É um filme envolvente e

comovente sobre um caso

que é apenas uma agulha no

palheiro, representando uma

enorme teia de muitos outros

casos semelhantes. A obra

carrega uma forte carga emocional,

difícil de exprimir.

Ainda assim, a temática foi

tratada com a devida seriedade

e evitou os erros banais

tais como a responsabilização

das vítimas pelo sucedido.

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