edição de 23 de maio de 2022
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do pequeno, já comecei nos painéis,<br />
com esse <strong>de</strong>safio dos materiais, das<br />
escadas, <strong>de</strong> estar na rua no frio, na<br />
chuva, no calor, na neve, seja lá<br />
o que for. Com as dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
segurança também, altura, os perigos.<br />
E os <strong>de</strong>safios das superfícies,<br />
porque algumas pare<strong>de</strong>s têm muitas<br />
intervenções <strong>de</strong> janelas, portas, os<br />
formatos das pare<strong>de</strong>s às vezes não<br />
correspon<strong>de</strong>m à arte que eu quero<br />
fazer. As viagens, os hotéis, a comida,<br />
estar longe da família, ou seja,<br />
tem milhares <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
estar nas ruas. Mas tem a gran<strong>de</strong> satisfação<br />
<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r ver o resultado das<br />
produções, do esforço, dos <strong>de</strong>safios.<br />
É isso que continua me movendo.<br />
Tem uma equipe que te ajuda na pintura<br />
dos murais?<br />
Eu optei por um time bem pequeno.<br />
Na realida<strong>de</strong> eu tenho algumas<br />
parcerias em partes mais<br />
burocráticas, porque eu acabo<br />
trabalhando em diversos países e<br />
isso requer uma documentação <strong>de</strong><br />
segurança <strong>de</strong> trabalho, advogados,<br />
parte <strong>de</strong> divulgação <strong>de</strong> assessoria.<br />
Eu costumo dizer que a parte da<br />
pintura é o mais fácil, chegar até<br />
ela é o mais difícil. Mas eu sou um<br />
cara que estou totalmente empenhado<br />
na criação 100%. Eu amo<br />
fazer isso, amo pintar. Mas é claro<br />
que, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo das dimensões,<br />
eu sempre tenho dois profissionais<br />
comigo, que são o Agnaldo e o Marcos.<br />
Eu acabei criando um projeto<br />
chamado Envolva-se, em que eu<br />
dou oportunida<strong>de</strong>s para pessoas<br />
<strong>de</strong> várias partes do mundo e quando<br />
eu estou nesses países acabo<br />
chamando-as para participarem<br />
dos projetos e ter essa troca <strong>de</strong> informações.<br />
Isso para mim também<br />
está sendo bastante produtivo.<br />
O que acha do trabalho colaborativo?<br />
Funciona no seu caso?<br />
Acho que tudo faz parte, nós<br />
somos todos inter<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes e<br />
interconectados. A gente não sabe<br />
tudo, é importante se conectar<br />
com pessoas que têm informação.<br />
Eu preciso muitas vezes estar ligado<br />
a historiadores, pesquisadores,<br />
porque eu gosto <strong>de</strong> enten<strong>de</strong>r a<br />
história dos lugares e países on<strong>de</strong><br />
estou. A questão da tecnologia<br />
também, da utilização <strong>de</strong> novos<br />
materiais, novos equipamentos.<br />
Eu acho isso superimportante. É<br />
como uma peça <strong>de</strong> quebra-cabeças,<br />
a peça que muitas vezes falta<br />
“às vezes,<br />
olhar<br />
para trás<br />
também nos<br />
leva para o<br />
futuro”<br />
Alan Teixeira/Divulgação<br />
na gente e po<strong>de</strong> acrescentar com<br />
a informação <strong>de</strong> alguém. Eu pesquiso<br />
muita coisa da história do<br />
passado. Às vezes, algo que foi<br />
criado na arte egípcia acaba servindo<br />
<strong>de</strong> referência para o que eu<br />
estou fazendo hoje. Às vezes, o<br />
olhar para trás também nos leva<br />
para o futuro.<br />
Sua arte abriu caminho para outros<br />
artistas? Ou vice-versa?<br />
É um processo interessante,<br />
porque eu tive pouquíssimas oportunida<strong>de</strong>s.<br />
Os meus pares me excluíram<br />
durante o início da minha<br />
trajetória, talvez por <strong>de</strong>sconhecerem<br />
a origem do meu trabalho.<br />
Mas hoje eu acho que as portas<br />
estão abertas, o muro que existia<br />
<strong>de</strong> divisão entre os museus, as galerias<br />
e as universida<strong>de</strong>s, as ruas,<br />
a comunida<strong>de</strong>, a favela, os artistas<br />
que estão nos lugares, países mais<br />
simples, todos estão conectados.<br />
Não há mais diferença nesse aspecto.<br />
Um segue inspirando o outro. A<br />
arte é infinita, a gente sempre vai<br />
ver uma forma diferente <strong>de</strong> pensar,<br />
<strong>de</strong> criar, cada artista tem seu mundo,<br />
seu universo. É interessante<br />
quando a gente começa a apren<strong>de</strong>r<br />
sobre a história da arte, os artistas,<br />
por que fizeram aquilo e como funcionou,<br />
qual é a conexão da arte<br />
que eles fazem com a vida que tiveram<br />
ou preten<strong>de</strong>m ter. Acho que<br />
essa é a beleza da arte, nos tornar<br />
todos conectados e aprendizes um<br />
dos outros.<br />
Em quais ruas <strong>de</strong> cida<strong>de</strong>s brasileiras a<br />
sua arte está exposta? E em quais outros<br />
países?<br />
Vale a pena comentar que o meu<br />
trabalho, em alguns aspectos para<br />
que ele aconteça, é muito similar<br />
a uma peça <strong>de</strong> teatro. Eu faço a<br />
criação, tenho a i<strong>de</strong>ia, o conceito, a<br />
mensagem, aquilo que eu quero <strong>de</strong>senvolver,<br />
e algumas empresas se<br />
conectam a essa proposta, que muitas<br />
vezes fala <strong>de</strong> proteção do meio<br />
ambiente, dos animais, dos mananciais,<br />
florestas, povos indígenas,<br />
questões <strong>de</strong> racismo, <strong>de</strong> violência.<br />
Enfim, quando existe essa conexão<br />
funciona muito bem porque a empresa<br />
po<strong>de</strong> patrocinar isso, como<br />
já aconteceu inúmeras vezes. A minha<br />
arte continua completamente<br />
íntegra. A gente mantém a criação<br />
original e a marca consegue aproveitar<br />
o fato <strong>de</strong> estar entregando<br />
algo para a cida<strong>de</strong>, estar participando<br />
<strong>de</strong> um painel que muitas vezes<br />
está numa avenida, num local relevante<br />
da cida<strong>de</strong>. Temos toda uma<br />
repercussão midiática e isso acaba<br />
sendo bastante importante para<br />
todos os lados. E no que diz respeito<br />
às cida<strong>de</strong>s, eu tenho murais em<br />
muitas capitais, cida<strong>de</strong>s do interior<br />
e cerca <strong>de</strong> 50 países. Vale a pena comentar<br />
que nos Estados Unidos são<br />
50 murais, sendo 20 <strong>de</strong>les em Nova<br />
York. Enfim, eu acho que a cada dia<br />
mais as portas vão se abrindo para<br />
esse tipo <strong>de</strong> trabalho e acho que a<br />
street art, <strong>de</strong> alguma forma, já marcou<br />
essa geração, assim como outros<br />
movimentos <strong>de</strong> arte marcaram<br />
outras épocas.<br />
“a arte é<br />
infinita, a<br />
gente sempre<br />
vai ver<br />
uma forma<br />
diferente<br />
<strong>de</strong> pensar,<br />
<strong>de</strong> criar”<br />
Quando e como a arte <strong>de</strong> rua começou<br />
a ser mais valorizada, e qual é a importância<br />
<strong>de</strong>la para a economia criativa<br />
no Brasil?<br />
Hoje eu sou privilegiado <strong>de</strong> ter<br />
um dos trabalhos mais publicados<br />
em livros didáticos, tenho circulado<br />
por universida<strong>de</strong>s realizando<br />
palestras, tive a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
ter dois murais no Guinness Book.<br />
Nada disso eu busquei, nada disso<br />
eu esperava. Aconteceu <strong>de</strong> forma<br />
orgânica, natural, espontânea mesmo.<br />
Acho que uma resposta simples<br />
para a sua pergunta é o retorno<br />
que eu tenho todos os dias, meninos<br />
e meninas nas comunida<strong>de</strong>s,<br />
nos lugares mais simples, carentes,<br />
voltando a sonhar, a ter esperança,<br />
pensando que é possível através<br />
da arte abrir portas e fronteiras. A<br />
possibilida<strong>de</strong> que a arte me <strong>de</strong>u,<br />
vindo <strong>de</strong> uma origem simples, <strong>de</strong><br />
certa forma tem movimentado<br />
mentes, corações e emoções <strong>de</strong><br />
muitas pessoas. O feedback que eu<br />
tenho pelos lugares que passo é relacionado<br />
a esse universo. Hoje eu<br />
tenho feito obras para 12 diferentes<br />
países, porque todas as obras que<br />
eu tenho em mural, tenho original<br />
em tela, e acabo distribuindo para<br />
galerias ao redor do mundo. Comecei<br />
esse movimento embrionário,<br />
fui um dos precursores no Brasil,<br />
um movimento que ainda era novo<br />
no mundo, e hoje a gente vê esse<br />
crescimento estrondoso da street<br />
art no planeta, movimentando<br />
muita coisa. Não só a parte financeira,<br />
mas as i<strong>de</strong>ias, as emoções, os<br />
sentimentos, mudando a cara das<br />
cida<strong>de</strong>s, levando arte para os lugares<br />
mais inusitados e simples, on<strong>de</strong><br />
pessoas das mais diversas classes<br />
sociais po<strong>de</strong>m ter acesso. E com o<br />
meu instituto, o Instituto Kobra, eu<br />
quero amplificar isso e dar oportunida<strong>de</strong>s<br />
para meninos e meninas.<br />
28 <strong>23</strong> <strong>de</strong> <strong>maio</strong> <strong>de</strong> <strong>2022</strong> - jornal propmark