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seria tão monstruoso como um hermafrodita. O elo entre os homens,
subjetivamente, é a “vontade de comunicação ilimitada” e, objetivamente, o fato
da compreensibilidade universal. A unidade e a solidariedade entre a
humanidade não podem consistir num acordo universal sobre uma única religião,
ou uma única filosofia, ou uma única forma de governo, mas na fé de que o
múltiplo aponta para um Uno, simultaneamente oculto e revelado pela
diversidade.
A era axial iniciou o desenvolvimento das grandes civilizações mundiais, que,
juntas, constituem o que geralmente chamamos de história mundial, e encerrou
um período a que chamamos de pré-histórico, devido a esse desenvolvimento
posterior. Se pensamos em nossa própria era nos termos desse plano histórico,
podemos muito bem chegar à conclusão de que o surgimento da humanidade
como uma realidade política tangível marca o fim daquele período da história
mundial que se iniciou na era axial. Jaspers, de certa maneira, concorda com o
sentimento generalizado de que nossos tempos, de alguma forma, chegaram ao
fim, mas discorda da ênfase sobre a ruína que geralmente acompanha tais
diagnósticos. “Vivemos como que batendo a portas que ainda estão fechadas
para nós.” 11 O que aparece tão nitidamente como um fim pode ser mais bem
compreendido como um início cujo significado profundo ainda não conseguimos
captar. Nosso presente é enfaticamente, e não apenas logicamente, a suspensão
entre um não-mais e um ainda-não. O que agora se inicia, após o fim da história
mundial, é a história da humanidade. O que isso será ao final, não sabemos.
Podemos nos preparar para ela através de uma filosofia da humanidade cujo
conceito central seria o conceito de comunicação de Jaspers. Essa filosofia não
abolirá, nem sequer criticará, os grandes sistemas filosóficos do passado na
Índia, na China e no Ocidente, mas os despirá de suas afirmações metafísicas
dogmáticas, as dissolverá, por assim dizer, em correntes de pensamento que se
encontram e se cruzam entre si, pondo-os em comunicação recíproca, e
finalmente reterá apenas o que é universalmente comunicativo. Uma filosofia da
humanidade se distingue de uma filosofia do homem pela sua insistência sobre o
fato de que não o Homem falando consigo mesmo no diálogo da solidão, mas os
homens falando e comunicando-se entre si habitam a Terra. Evidentemente, a
filosofia da humanidade não pode prescrever nenhuma ação política como um
dos grandes âmbitos humanos da vida, contra todos os filósofos anteriores que,
desde Platão, pensavam a bios politikos como um modo inferior de vida e a
política como um mal necessário ou, nas palavras de Madison, “a maior de todas
as reflexões sobre a natureza humana”. 12