Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
comumente por vida política. Na medida em que esse espaço público é também
um âmbito espiritual, há manifesto nele aquilo que os romanos chamavam de
humanitas, entendendo por isso algo que era a própria estatura da qualidade
humana, pois era válida sem ser objetiva. É precisamente o que Kant, e depois
Jaspers, entende por Humanität, a personalidade válida que, uma vez adquirida,
nunca abandona um homem, ainda que todos os outros dons do corpo e da mente
possam sucumbir à destrutividade do tempo. A humanitas nunca é adquirida em
solidão e nunca com a oferta de sua obra ao público. Só pode ser alcançada por
alguém que lançou sua vida e sua pessoa na “aventura no âmbito público” —
quando, nesse curso, arrisca-se a revelar algo que não é “subjetivo” e, por essa
própria razão, não pode reconhecer nem controlar. Assim, a “aventura no âmbito
público” onde se adquire a humanitas torna-se um presente para a humanidade.
Quando sugiro que o elemento pessoal que vem para o âmbito público
juntamente com Jaspers é a humanitas, desejo subentender que ninguém, tanto
quanto ele, pode nos ajudar a superar nossa desconfiança em relação a esse
mesmo âmbito público, a sentir a alegria e a honra que há em elogiar para todos
alguém que amamos. Pois Jaspers nunca partilhou do preconceito generalizado
das pessoas cultas de que a luz brilhante da publicidade torna todas as coisas
apáticas e sem profundidade, que apenas a mediocridade se mostra bem sob ela
e, portanto, o filósofo deve se manter à distância dela. Vocês lembrarão a opinião
de Kant, segundo a qual a pedra de toque para determinar se a dificuldade de um
ensaio filosófico é autêntica ou meras “névoas de esperteza” pode se encontrar
na sua possibilidade de popularização. E Jaspers, que a esse respeito, como na
verdade a todos os demais, é o único sucessor que Kant jamais teve, mais de
uma vez abandonou, como Kant, a esfera acadêmica e sua linguagem conceitual
para se dirigir ao público leitor em geral. Além disso, por três vezes — uma vez
logo antes de os nazistas chegarem ao poder, com seu Man in the Modern Age
[O homem na Idade Moderna] (1933) 3 , a seguir, imediatamente depois da queda
do Terceiro Reich, com The question of German guilt [A questão da culpa
alemã], e agora com The atom bomb and the future of man [A bomba atômica e o
futuro do homem] — interveio diretamente em questões políticas da atualidade. 4
Pois ele sabe, como sabe o estadista, que as questões políticas são sérias demais
para serem deixadas aos políticos.
A afirmação do âmbito público por Jaspers é única, pois provém de um
filósofo e brota da convicção fundamental subjacente a toda sua atividade como
filósofo: que tanto a filosofia como a política dizem respeito a todos. É o que
elas têm em comum; é a razão por que pertencem ao âmbito público, onde o que