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Homens Em Tempos Sombrios - Hannah Arendt

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o sr. Nettl considera corretamente como sua mais importante contribuição para a

teoria política. O ponto principal é que ela aprendera com os conselhos operários

revolucionários (os posteriores sovietes) que “a boa organização não precede a

ação, mas é seu produto”, que “a organização da ação revolucionária pode e deve

ser aprendida na própria revolução, assim como só se pode aprender a nadar na

água”, que as revoluções não são “feitas” por ninguém, mas irrompem

“espontaneamente”, e que “a pressão para a ação” sempre vem “de baixo”. Uma

revolução é “grande e forte enquanto os socialdemocratas [na época, ainda o

único partido revolucionário] não a destroçam”.

Entretanto, houve dois aspectos do prelúdio de 1905 que escaparam

inteiramente a ela. Havia, afinal, o fato surpreendente de que a revolução

eclodira, não só num país atrasado e não industrializado, mas num território onde

não existia absolutamente nenhum movimento socialista forte com apoio das

massas. E em segundo lugar havia o fato igualmente inegável de que a revolução

fora o resultado da derrota russa na guerra russo-japonesa. Foram dois fatos que

Lênin nunca esqueceu e dos quais extraiu duas conclusões. Primeiramente, não

era necessário uma grande organização; um grupo pequeno e solidamente

organizado, com um líder que soubesse o que queria, era suficiente para tomar o

poder, uma vez eliminada a autoridade do antigo regime. Grandes organizações

revolucionárias constituíam apenas um incômodo. E, em segundo lugar, como as

revoluções não eram “feitas”, mas resultantes de circunstâncias e acontecimentos

além do poder de quem quer que fosse, as guerras eram bem-vindas. 9 Esse

segundo ponto foi a fonte dos desacordos de Rosa com Lênin, durante a Primeira

Guerra Mundial, e a primeira de suas críticas à tática de Lênin na Revolução

Russa de 1917. Pois ela se recusava categoricamente, do princípio ao fim, em

ver na guerra outra coisa senão a mais terrível catástrofe, sem importar qual

fosse seu resultado final; o preço em vidas humanas, principalmente vidas

proletárias, seria alto demais sob quaisquer circunstâncias. Além disso, seria

contra seu feitio encarar a revolução como beneficiária da guerra e do massacre

— coisa que não incomodava minimamente a Lênin. E quanto à questão da

organização, ela não acreditava numa vitória onde o povo em geral não tomasse

parte ou não tivesse voz; na verdade, acreditava tão pouco em tomar o poder a

qualquer preço que “tinha muito mais medo de uma revolução deformada do que

uma fracassada” — esta era, de fato, “a grande diferença entre ela” e os

bolcheviques.

E os acontecimentos não provaram que ela tinha razão? Não é a história da

União Soviética uma longa demonstração dos terríveis perigos das “revoluções

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