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da comunidade, do diálogo, da amizade, da pluralidade, da natalidade e da ação.
Entretanto, só se dispôs efetivamente a fazer uma crítica profunda a Heidegger
— sobretudo ao segundo Heidegger, cuja rejeição da vontade, no entender de
Hannah Arendt, o impedia de perceber as possibilidades da política e da ação —
naquilo que veio a ser The life of the mind, mais precisamente em 1974, quando
reviu os textos de suas “Gifford lectures” e estava certa de que Heidegger, aos 85
anos, velho e próximo da morte, não mais a leria.
Os anos de vida universitária de Hannah Arendt foram igualmente os que
ensejaram o início de seu contato com Karl Jaspers, a quem foi encaminhada por
Heidegger, depois de ter seguido os cursos de Husserl em Freiburg. Em Jaspers,
Hannah Arendt encontrou uma personalidade de excepcional estatura moral, em
plena maturidade intelectual e que não foi apenas o diretor de sua tese de
doutorado sobre Santo Agostinho, defendida e apresentada em Heidelberg. Foi
também, e sobretudo, a pessoa que, através de sua atitude exemplar nos tempos
obscuros dos desastres morais do nazismo, permitiu a Hannah Arendt,
posteriormente, reconciliar-se com aquela dimensão da tradição germânica que
era legitimamente sua. Daí o papel que Hannah Arendt sempre lhe atribuiu, com
filial reverência, gratidão e amizade, de esclarecedor das coisas e de orientador
em matéria de discussão racional. Colaboraram intelectualmente de maneira
intensa e permanente, depois da Segunda Guerra Mundial, e Hannah Arendt
sentiu a morte de seu mestre em 1969, como Jaspers também sentira a de Max
Weber em 1920. Jaspers, por seu lado, viu na pessoa e na obra de Hannah Arendt
a confirmação de sua longa vida de professor.
A efervescência e a criatividade intelectual da cultura da República de Weimar
são, hoje, ponto pacífico. Essa efervescência não escapou, na época, a um arguto
observador brasileiro — Horácio Lafer — que, no seu livro de 1929, Tendências
filosóficas contemporâneas, publicado em São Paulo, considerou o momento
filosófico alemão interessantíssimo, julgando que ele encobria, numa espécie de
caos, um dinamismo intelectual de riqueza admirável, e vaticinando, por isso
mesmo, o aparecimento de uma nova seara de grandes pensadores. Na 2 a edição
de seu livro, em 1950, Horácio Lafer considerava confirmada a sua previsão com
a presença filosófica de Hartmann, Husserl, Cassirer e Heidegger. Hannah
Arendt é, sem dúvida nenhuma, produto e confirmação dessa efervescência e
criatividade. Ela deve à universidade alemã de seu tempo de estudante o seu
método: uma espécie de fenomenologia, que assume a palavra como ponto de
partida, ao detectar na historicidade dos seus significados o repertório das
percepções passadas — verdadeiras ou falsas, reveladoras ou dissimuladoras —