Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
iii
Hannah Arendt nasceu em 1906, em Hanover, na Alemanha, e foi criada em
Königsberg, de onde era sua família — uma família de judeus abonados e
integrados na vida e na cultura da Alemanha daquela época. O pai de Hannah
Arendt, Paul Arendt, morreu em 1913, quando ela tinha sete anos, e foi sua mãe,
Martha Cohn Arendt, a figura importante na sua educação. Martha Arendt foi
uma personalidade forte, ligada aos socialdemocratas, admiradora de Rosa
Luxemburgo, e que se empenhou em patrocinar a independência intelectual de
sua filha.
A ligação de Hannah Arendt com sua mãe foi intensa. Eu mesmo a ouvi dizer,
nos Estados Unidos, quando fui seu aluno na Universidade de Cornell, a
expressão que Young-Bruehl registra e que Hannah Arendt usava, quando não
gostava ou não queria uma coisa: “Isto não é para a filha de minha mãe”. Uma
ligação intensa nunca é simples. Martha Arendt foi também uma mãe possessiva,
sobretudo no final de sua vida. Exigia mais do que sua filha podia dar, como
Hannah Arendt, apesar de sempre discreta em assuntos pessoais, confessou com
franqueza para seu marido, Heinrich Blücher, quando da morte de Martha
Arendt.
Há uma história que esclarece algo de Martha Arendt, registrada por Young-
Bruehl e que, quando ouvi da própria Hannah Arendt, pareceu-me
paradigmática. Ao chegar aos Estados Unidos, em 1941, pouco depois de
Hannah Arendt e também com grandes dificuldades, em plena época de guerra e
perseguições, Martha Arendt logo relembrou à sua filha, com humor mas
pertinentemente, a recomendação e a discussão que tiveram em Königsberg:
Hannah Arendt insistindo, como jovem estudante, em aprender grego e latim e
recusando-se a estudar inglês, língua que lhe seria necessária e que já estaria ao
seu alcance, caso tivesse seguido a orientação materna.
A jovem Hannah Arendt foi uma inteligência precoce e independente. Leu
Kant com dezesseis anos e conhecia muito bem grego e latim. Freqüentou em
Berlim, antes de ingressar na universidade, os cursos de Romano Guardini sobre
teologia e, aos dezessete anos, escrevia poemas — só agora tornados públicos —
que combinavam imagens românticas com angústias kierkegaardianas.
Ingressou na universidade em 1924, doutorando-se em 1929. Os anos de
universidade de Hannah Arendt — os de estabilidade da República de Weimar
— foram decisivos na sua formação. Foram os anos do seu primeiro amor: a
filosofia, que no seu caso também se encarnou na figura de Martin Heidegger.