Homens Em Tempos Sombrios - Hannah Arendt
Toda vida humana, compreendida entre o nascimento e a morte, constitui umahistória, que se insere na História — livro de muitos atores e narradores, massem autores tangíveis.A realidade, aponta Hannah Arendt no seu ensaio sobre verdade e política queintegra Entre o passado e o futuro, é diferente de e mais que a totalidadeinalcançável dos fatos. Aquele que fala as coisas que são, sempre conta umahistória e, nessa história, os fatos particulares perdem a sua contingência aoadquirir significado humano. A função política do que conta a história, namedida em que está preocupado com a verdade factual, é ensinar a aceitação dascoisas tais como elas são. É isso que permite o juízo que, no caso de umabiografia, esclarece quem foi e de que foi capaz uma pessoa.A posteridade pode julgar uma vida; uma biógrafa — explica ElizabethYoung-Bruehl no prefácio de seu livro — precisa apenas julgar se a história deuma vida merece ser contada. Ao recolher e registrar, numa história, a trajetóriade uma vida, Elizabeth Young-Bruehl resgatou-a do círculo limitado e privadoda memória dos que a conheceram e que com ela conviveram. Ofereceu, dessemodo, para os seus leitores, na linha da lição arendtiana, os elementos para ojuízo da figura humana de Hannah Arendt.Qual — para continuar na linha arendtiana — o poder de iluminação de suavida e qual o seu significado público? Existem personalidades cuja vida damente nos fascina, mas cuja existência, no mundo intersubjetivo e visível dasaparências, no qual vivemos, suscita pouco interesse. É o caso de Kant, queHannah Arendt tanto admirou. Outras figuras intelectuais chamam a nossaatenção para o que pode haver de fecundo na interação criativa do pensamentocom a ação. É o caso de Malraux, cuja vida é tão rica — se não mais — que asua própria obra.A vida da mente de Hannah Arendt vem sendo há muito tempo — maisprecisamente desde 1951, data da publicação, em inglês, de As origens dototalitarismo — tida como original e importante. A leitura de sua biografiamostra que sua vida foi também, em muitos sentidos, interessante. Uma dasdimensões desse interesse reside na maneira pela qual, na condição de judiaalemã,um ser humano atravessou e interagiu com as catástrofes políticas, osdesastres morais e os surpreendentes desenvolvimentos das artes e das ciênciasno século xx. Ao elaborar, em termos pessoais, um “modo de ver” e um “modode ser” como resposta ao fenômeno da ruptura — aquilo que articulouintelectualmente como a lacuna entre o passado e o futuro que assinala o mundocontemporâneo — Hannah Arendt colocou não só a vida de sua mente, como
também a sua vida acima da trivialidade banal do cotidiano, que se esgota nometabolismo do processo biológico. Daí o interesse de sua vida, que é, além domais, uma vida ligada a uma geração das mais importantes no cenário cultural domundo ocidental. É por isso que o livro de Young-Bruehl é, ao modo arendtiano,um relato exemplar.Ter escrito a biografia de Hannah Arendt, na linha da lição arendtiana, é, nomeu entender, o primeiro grande mérito do livro de Elisabeth Young-Bruehl. Écerto que a leitura da biógrafa sobre sua biografada reveste-se da afetuosaadmiração que converte Hannah Arendt: for the love of the world em algo comoein lebensbild, uma construção de vida. Entretanto, como compartilho comYoung-Bruehl o seu entusiasmo por Hannah Arendt — e lamento, num certosentido, não ter escrito a sua biografia —, só posso aplaudir o tato e odiscernimento com os quais meticulosamente elaborou, nas quinhentas e tantaspáginas de seu livro, o significativo relato de uma vida e de uma geração noturbulento mundo do século xx.
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Toda vida humana, compreendida entre o nascimento e a morte, constitui uma
história, que se insere na História — livro de muitos atores e narradores, mas
sem autores tangíveis.
A realidade, aponta Hannah Arendt no seu ensaio sobre verdade e política que
integra Entre o passado e o futuro, é diferente de e mais que a totalidade
inalcançável dos fatos. Aquele que fala as coisas que são, sempre conta uma
história e, nessa história, os fatos particulares perdem a sua contingência ao
adquirir significado humano. A função política do que conta a história, na
medida em que está preocupado com a verdade factual, é ensinar a aceitação das
coisas tais como elas são. É isso que permite o juízo que, no caso de uma
biografia, esclarece quem foi e de que foi capaz uma pessoa.
A posteridade pode julgar uma vida; uma biógrafa — explica Elizabeth
Young-Bruehl no prefácio de seu livro — precisa apenas julgar se a história de
uma vida merece ser contada. Ao recolher e registrar, numa história, a trajetória
de uma vida, Elizabeth Young-Bruehl resgatou-a do círculo limitado e privado
da memória dos que a conheceram e que com ela conviveram. Ofereceu, desse
modo, para os seus leitores, na linha da lição arendtiana, os elementos para o
juízo da figura humana de Hannah Arendt.
Qual — para continuar na linha arendtiana — o poder de iluminação de sua
vida e qual o seu significado público? Existem personalidades cuja vida da
mente nos fascina, mas cuja existência, no mundo intersubjetivo e visível das
aparências, no qual vivemos, suscita pouco interesse. É o caso de Kant, que
Hannah Arendt tanto admirou. Outras figuras intelectuais chamam a nossa
atenção para o que pode haver de fecundo na interação criativa do pensamento
com a ação. É o caso de Malraux, cuja vida é tão rica — se não mais — que a
sua própria obra.
A vida da mente de Hannah Arendt vem sendo há muito tempo — mais
precisamente desde 1951, data da publicação, em inglês, de As origens do
totalitarismo — tida como original e importante. A leitura de sua biografia
mostra que sua vida foi também, em muitos sentidos, interessante. Uma das
dimensões desse interesse reside na maneira pela qual, na condição de judiaalemã,
um ser humano atravessou e interagiu com as catástrofes políticas, os
desastres morais e os surpreendentes desenvolvimentos das artes e das ciências
no século xx. Ao elaborar, em termos pessoais, um “modo de ver” e um “modo
de ser” como resposta ao fenômeno da ruptura — aquilo que articulou
intelectualmente como a lacuna entre o passado e o futuro que assinala o mundo
contemporâneo — Hannah Arendt colocou não só a vida de sua mente, como