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pensar”; quando diz que o pensar tem “o caráter de um retrocesso”. E ele pratica
esse retrocesso quando submete Sein und Zeit a uma “crítica imanente” ou
afirma que uma interpretação determinada da verdade platônica “não é
sustentável” ou fala muito genericamente do “olhar para trás” sobre sua obra,
“que se torna sempre retratação”, o que não significa revogação, mas pensar de
novo o já pensado. 5
Todo pensador, se se torna muito velho, deve assim aspirar a dissolver o que
há de resultado propriamente dito em seu pensar, e simplesmente porque ele o
medita novamente. Ele dirá com Jaspers: “E agora, que se desejaria pela
primeira vez realmente começar, é preciso partir!”. O eu pensante não tem idade,
e, na medida em que os pensadores não existem efetivamente senão no pensar,
sua felicidade e infelicidade é o se tornarem velhos sem envelhecer. Com a
paixão do pensar ocorre o mesmo que acontece com as outras paixões: o que
habitualmente conhecemos como particularidades próprias da pessoa, cuja
totalidade ordenada pela vontade produz então algo como um caráter, não resiste
ao assalto da paixão que toma e, de certa forma, se apodera do homem e da
pessoa. O eu que, pensando, “se sustém em si mesmo” na tempestade
desencadeada, como diz Heidegger, e para quem o tempo literalmente pára, não
só não tem idade, como também, ainda que sempre um eu especificamente
diferente, não tem particularidade. O eu pensante é totalmente diferente do si da
consciência.
Além disso, o pensar, como Hegel uma vez observou a propósito da filosofia
(em 1807, numa carta a Zellmann), é “algo solitário”; e isso não só porque estou
só, no que Platão chama de “o diálogo áfono comigo mesmo” (Sofista, 263e),
mas porque nesse diálogo sempre entra algo “indizível” que não pode ser
totalmente trazido à voz pela linguagem, e tampouco propriamente à palavra,
pois não se comunica nem aos outros nem mesmo ao interessado. É sem dúvida
esse “indizível”, de que Platão fala na Sétima Carta, que transforma a tal ponto o
pensar em algo solitário e constitui, porém, o solo nutriz sempre diverso de onde
se eleva e se renova constantemente. Poder-se-ia imaginar — mas não é
absolutamente o caso no que concerne a Heidegger — que a paixão do pensar se
funda de imprevisto sobre o homem mais sociável e o destrói à força da solidão.
O primeiro e, ao que eu saiba, o único a falar do pensar como pathos, como
prova que se funda sobre alguém que deve suportá-la, foi Platão, que, no Teeteto
(155d), cita o espanto como o início da filosofia, certamente sem ter em vista a
simples surpresa que nasce em nós quando encontramos algo estranho. Pois o
espanto que é o começo da filosofia — tal como a surpresa é o começo das