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nada houve de esotérico.
Quem então alcançava a novidade, e o que dizia ela? Desde a Primeira Guerra
Mundial havia nas universidades alemãs certamente não uma revolta, mas uma
grande insatisfação na atividade acadêmica docente e discente, espalhando-se
por todas as faculdades que fossem algo além de simples escolas profissionais e
todos os estudantes para quem o estudo significava mais que uma preparação
para seus ofícios. A filosofia não era um ganha-pão; era antes a disciplina dos
famintos resolutos e, por isso mesmo, muito exigentes. Não aspiravam
absolutamente à sabedoria: quem se interessava pela solução de todos os
enigmas tinha à sua disposição um vasto sortimento no mercado das concepções
de mundo e respectivos partidos; para fazer sua escolha, não havia nenhuma
necessidade de um ensino filosófico. Mas o que eles queriam, tampouco o
sabiam. A Universidade em geral lhes oferecia as escolas — os neokantianos, os
neo-hegelianos, os neoplatônicos etc. — ou a velha disciplina escolar,
convenientemente dividida em compartimentos, como a teoria do conhecimento,
a estética, a ética, a lógica etc., que não era verdadeiramente transmitida, mas
antes esvaziada de sua substância por um tédio sem fim. Contra essa atividade
em suma confortável e, à sua maneira, também totalmente sólida, havia então,
mesmo antes do aparecimento de Heidegger, um pequeno número de rebeldes.
Cronologicamente falando, houve Husserl e seu apelo para ir “às coisas
mesmas”; isso significava: “Deixemos as teorias, deixemos os livros” e
estabeleçamos a filosofia como uma ciência rigorosa que consiga ser admitida ao
lado das outras disciplinas acadêmicas. Era algo naturalmente muito ingênuo e
desprovido de qualquer intenção rebelde, mas foi algo que primeiro Scheler e,
um pouco depois, Heidegger puderam reivindicar. A seguir houve também em
Heidelberg, conscientemente rebelde e oriundo de uma outra tradição, Karl
Jaspers, que, como se sabe, por longo tempo manteve laços de amizade com
Heidegger, exatamente porque o que havia de rebelde no desígnio de Heidegger
lhe interessava como algo radicalmente filosófico em meio ao falatório
acadêmico sobre a filosofia.
O que esse pequeno número de pessoas tinha em comum era — para usar as
palavras de Heidegger — o fato de saber distinguir “entre um objeto de erudição
e uma coisa pensada”, 1 e o objeto de erudição lhes era praticamente indiferente.
A novidade então alcançava os que estavam a par, de modo mais ou menos
expresso, da ruptura da tradição e dos “tempos sombrios” que acabavam de
despontar: os que, por conseguinte, consideravam a erudição nas coisas da
filosofia como um jogo ocioso e só se dispunham a se dobrar à disciplina