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classe operária”, a quem amou e que se unira a ele na Dinamarca; Walter
Benjamin, o crítico literário mais importante da Alemanha entre as duas guerras,
que, “cansado de ser perseguido”, tirou a vida, e Karl Koch 28 —, anunciava para
si próprio o que estava implícito num poema anterior: “Eu sei, é claro: Apenas
por sorte sobrevivi a tantos amigos. Mas hoje à noite, num sonho, ouvi esses
amigos dizerem de mim, ‘Os que são mais fortes sobrevivem’. E eu me odiei”. 29
Parece ter sido a única época em que sua autoconfiança ficou abalada; ele se
comparou aos outros, e a autoconfiança sempre reside numa recusa em se
conceder a tais comparações, sejam para melhor ou para pior. Mas era apenas
um sonho.
Assim, num certo sentido, Brecht também se sentia perdido — não porque
seus talentos individuais não puderam amadurecer como deveriam ou poderiam,
nem porque o mundo o ferira, como realmente o feriu, mas porque a tarefa era
excessiva. Portanto, quando ele sente a torrente a se alçar, não espreita
longinquamente para trás, como Rilke, mais belamente do que qualquer outro,
fez em suas últimas obras, mas apela aos que dela emergirão, e esse apelo ao
futuro — à posteridade — nada tem a ver com o “progresso”. O que o destacava
era compreender quão fatalmente ridículo seria avaliar o fluxo dos
acontecimentos com a medida das aspirações individuais — por exemplo,
encarar a catástrofe internacional do desemprego com o desejo de fazer carreira
e com reflexões sobre seus êxitos e fracassos pessoais, ou confrontar a catástrofe
da guerra com o ideal de uma personalidade rodeada por boa companhia, ou
seguir para o exílio, como fizeram tantos colegas seus, lamentando a fama
perdida ou a vida destruída. Não há nenhuma partícula de sentimentalismo na
definição, bela e belamente precisa, de Brecht sobre o refugiado: “Ein Bote des
Unglücks” (“um mensageiro de más notícias”). 30 A mensagem de um
mensageiro, evidentemente, não lhe diz respeito. Não eram apenas seus
infortúnios pessoais que os refugiados levavam consigo de país para país, de
continente para continente — “mudando de países mais vezes do que de sapatos”
—, mas o grande infortúnio de todo o mundo. Se a maioria tendia a esquecer sua
mensagem, antes mesmo de perceber que ninguém gosta do portador de más
notícias — bem, não foi sempre esse o problema com os mensageiros?
Essa expressão engenhosa, mais que engenhosa, “mensageiros de más
notícias”, para os refugiados e eLivross, pode ilustrar a grande inteligência
poética de Brecht, esse supremo dom de condensação que é o pré-requisito de
toda a poesia. Eis mais uns poucos exemplos desse modo de pensar
extraordinariamente denso e, portanto, muito complexo. Num poema sobre a