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poeta alemão vivo se encontrou com o crítico mais importante na época, coisa de
que ambos tinham consciência — foi o segundo, e incomparavelmente mais
importante, golpe de sorte na vida de Benjamin. Prontamente a amizade teve as
conseqüências mais adversas; pôs contra si os poucos amigos que tinha,
ameaçou sua relação com o Instituto de Pesquisa Social, a cujas “sugestões”
tinha todas as razões “para ser dócil” (Briefe, vol. ii, p. 683), e o único motivo
por não ter lhe custado sua amizade com Scholem foi a lealdade constante e
admirável generosidade de Scholem em todos os assuntos relacionados ao seu
amigo. Tanto Adorno como Scholem acusaram a “desastrosa influência”
(Scholem) de Brecht 5 sobre o uso claramente não dialético das categorias
marxianas por Benjamin e sua ruptura categórica com toda a metafísica; e o
problema era que Benjamin, em geral totalmente inclinado a compromissos,
ainda que em sua maioria desnecessários, sabia e sustentava que sua amizade
com Brecht constituía um limite absoluto não só à docilidade, mas também à
diplomacia, pois “minha concordância com a produção de Brecht é um dos
pontos mais importantes e estratégicos de toda a minha posição” (Brief, vol. ii, p.
594). Em Brecht encontrou um poeta de raros poderes intelectuais e, quase tão
importante para ele na época, alguém na esquerda que, apesar de todas as
conversas sobre a dialética, tinha tanto de dialético quanto ele mesmo, mas cuja
inteligência estava incomumente próxima da realidade. Com Brecht, ele podia
praticar o que o próprio Brecht chamava de “pensamento cru” (das plumpe
Denken): “A principal coisa é aprender a pensar cruamente. Pensamento cru, este
é o pensamento dos grandes”, dizia Brecht, e Benjamin acrescentava à guisa de
esclarecimento: “Há muitas pessoas que imaginam que um dialético é um
amante de sutilezas. [...] Os pensamentos crus, pelo contrário, deveriam fazer
parte e parcela do pensamento dialético, pois não são senão a referência da teoria
à prática [...] um pensamento deve ser cru para se converter em ação”. 6 Bem, o
que atraiu Benjamin ao pensar cru provavelmente não foi tanto uma referência à
prática, mas antes à realidade, e para ele essa realidade se manifestava de modo
mais direto nos provérbios e expressões idiomáticas da linguagem cotidiana. “Os
provérbios são uma escola de pensamento cru”, escreve ele no mesmo contexto;
e a arte de tomar literalmente a linguagem proverbial e idiomática permitiu a
Benjamin — como a Kafka, em quem muitas vezes se podem discernir
nitidamente como fonte de inspiração figuras de linguagem que fornecem a
chave de muitos “enigmas” — escrever uma prosa com uma proximidade tão
singularmente encantadora e encantada da realidade.