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que um conceito foi transformado numa metáfora — desde que “metáfora” seja
entendida em seu sentido original não alegórico de metapherein (transportar).
Pois uma metáfora estabelece uma conexão que é sensorialmente percebida em
sua imediaticidade e dispensa interpretações, ao passo que uma alegoria sempre
procede de uma noção abstrata e então inventa algo palpável, para representá-lo
praticamente à vontade. A alegoria deve ser explicada antes que adquira sentido,
deve-se encontrar uma solução para o enigma que ela apresenta, de modo que a
interpretação muitas vezes laboriosa das figuras alegóricas infelizmente sempre
lembra a solução de quebra-cabeças, mesmo quando não se exige maior engenho
do que na representação alegórica da morte por um esqueleto. Desde Homero, a
metáfora tem arcado com aquele elemento do poético que transporta a cognição;
o seu emprego estabelece as correspondances entre coisas fisicamente as mais
remotas entre si — como quando na Ilíada a investida violenta do medo e da dor
sobre os corações dos aqueus corresponde à rude investida combinada dos
ventos do norte e oeste sobre as águas escuras (Ilíada, ix, 1-8); ou quando a
aproximação do exército, seguindo para a batalha, linha após linha, corresponde
às longas vagas do oceano que, impelidas pelo vento, alteiam-se encrespadas em
alto-mar, correm linha a linha para a costa, e então explodem trovejantes na terra
(Ilíada, iv, 422-8). As metáforas são os meios pelos quais se realiza
poeticamente a unicidade do mundo. O que é tão difícil de entender em
Benjamin é que, sem ser poeta, ele pensava poeticamente e, por conseguinte,
estava fadado a considerar a metáfora como o maior dom da linguagem. A
“transferência” lingüística nos permite dar forma material ao invisível — “Uma
poderosa fortaleza é nosso Deus” — e assim torná-lo capaz de ser
experimentado. Não lhe era problema entender a teoria da superestrutura como a
doutrina final do pensamento metafórico — exatamente porque, sem muito
trabalho e evitando todas as “mediações”, ele relacionava diretamente a
superestrutura com a chamada infra-estrutura “material”, que para ele significava
a totalidade dos dados sensorialmente experimentados. Estava evidentemente
fascinado por aquilo mesmo que os outros rotulavam de pensamento “marxista
vulgar” ou “não dialético”.
Parece plausível que Benjamin, cuja existência espiritual se formara e
enformara por Goethe, um poeta e não um filósofo, e cujo interesse era
despertado quase que exclusivamente por poetas e romancistas, embora tivesse
estudado filosofia, deveria achar mais fácil se comunicar com poetas do que com
teóricos, fossem eles da variante dialética ou metafísica. E na verdade não há
dúvida de que sua amizade com Brecht — única pelo fato de que, aqui, o maior