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pela repetição”, ao passo que, posteriormente, só o concederia na medida em que
a literatura e a expressão literária não podem oferecer algo melhor, enquanto a
matemática, ao fazer equações, e certamente a lógica absoluta que subjaz à
matemática (é claro que não em algo concreto, mas como modelo de toda
cognição possível) estão perfeitamente capacitadas para assumir essa função de
transformar toda seqüência temporal em coexistência espacial.
É notável a freqüência com que Broch emprega palavras como “compulsão”,
“necessidade”, “necessidade obrigatória” nesses contextos, e o quanto dependia
do caráter coercitivo da argumentação lógica. No desvio radical do mythos para
o logos, que constituiu o ponto de partida para a sua teoria do conhecimento, ele
quis conscientemente substituir a coercitividade da visão mítica do mundo pela
necessidade obrigatória do argumento lógico. A necessidade obrigatória é, por
assim dizer, o denominador comum das visões mítica e lógica do mundo. Apenas
aquilo que é necessário e, portanto, aparece ao homem como compulsório pode
reivindicar validade absoluta. Dessa identificação entre necessidade e absoluto
provém a atitude singularmente ambivalente de Broch em relação à questão da
liberdade humana. Realmente ele não tinha uma opinião mais elevada da
liberdade do que da filosofia: de qualquer forma, sempre a buscou apenas no
âmbito da psicologia e nunca lhe concedeu a dignidade metafísica e fundante da
ciência, que sempre concedeu à necessidade.
Para Broch, a liberdade é o esforço anárquico, latente em cada eu, em direção
ao “desapego” diante dos companheiros humanos. Esse esforço já vem
representado no mundo animal pelo “mais isolado”. Se o homem segue apenas o
empenho pela liberdade do seu eu, é “o animal anárquico”. 59 Mas, como o
homem é “incapaz de subsistir sem seus companheiros homens, portanto incapaz
de viver plenamente suas tendências anárquicas”, ele tenta subjugar e escravizar
outros seres humanos. O aspecto rebeldemente anárquico do eu que, embora
dependa de outros homens, prefere permanecer em total não-relação interior com
eles, em nome da independência, já aparece nos seus textos iniciais como uma
das fontes do mal radical. Mas nesses textos iniciais fica obscurecido pela
análise de Broch sobre a forma puramente estética do mal real. Nos escritos
posteriores, todos orientados em termos da teoria do conhecimento, a situação se
inverte. Da teoria do conhecimento segue-se diretamente a conseqüência política
de que o homem nas suas relações com seus companheiros humanos deve ser
submetido à mesmíssima compulsão a que necessariamente se submete em sua
cognição, em outras palavras, no seu intercurso consigo mesmo. Broch nunca
acreditou que essa esfera política, onde o homem age externamente e é