Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
iii. a teoria do conhecimento
Como conseguiria o conhecimento abolir a morte? Como conseguiria um
homem “conhecer tudo”? Ao pôr essas questões, entramos diretamente no centro
da teoria do conhecimento de Broch. A resposta de Broch nos dará alguma idéia
do seu escopo. Assim, ele responde à primeira questão da seguinte forma: de
todo o conhecimento abrangente resulta necessariamente a simultaneidade, que
abole a sucessão temporal e, por conseguinte, a morte; estabelece-se na vida
humana uma espécie de eternidade, uma imagem da eternidade. Quanto à
segunda questão, a chave para ela se encontra na frase: “O que é preciso é uma
teoria geral do empirismo”, 35 isto é, um sistema que levará em consideração
todas as experiências futuras possíveis. (“Se se pudesse realmente averiguar a
soma total de todas as potencialidades humanas, tal modelo nos proporcionaria
um esquema de todas as experiências futuras possíveis”, escreve Broch no
“Índice Preliminar” da Psicologia de massas.) Com uma tal teoria, o homem,
“por virtude do absoluto que nele opera, por virtude da lógica de seu pensamento
que a ele se impõe”, 36 assegura uma “imaginabilidade” que é “uma
imaginabilidade em si mesma”, 37 que existiria mesmo que não houvesse nenhum
Deus de quem o homem fosse a imagem. Nas palavras de Broch, seria uma
tentativa de ver se a epistemologia não poderia conseguir “chegar por trás de
Deus, por assim dizer, para dali olhá-lo”. 38 E juntos — a abolição do tempo na
simultaneidade do conhecimento e o estabelecimento de uma teoria abrangente
da experiência onde a chocante casualidade das experiências individuais e dados
empíricos é transformada na certeza e necessidade auto-evidente e axiomática (e
portanto sempre tautológica) das proposições lógicas — podem ser alcançadas
com a descoberta de um “sujeito epistemológico” que, como o sujeito científico
no campo de observação, representa “a personalidade humana em sua mais
extrema abstração”. 39 Mas, enquanto o sujeito científico no campo de
observação representa apenas o “ato em si de ver, de observar”, o “sujeito
epistemológico” seria capaz de representar todo o homem, a personalidade
humana em geral, visto que o conhecer é a mais elevada de todas as funções
humanas. 40
Antecipemos o mal-entendido mais provável. Essa teoria do conhecimento,
que logo discutiremos em maiores detalhes, não é uma filosofia em sentido
estrito, e as palavras “conhecer” e “pensar” não podem ser aqui tomadas como
equivalentes entre si, não mais do que em qualquer outro lugar. Estritamente
falando, apenas o conhecer pode ter um objetivo, seja ético, religioso ou político.