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estranhamento. Na vida pessoal, foi um acumulador, traço característico de
pessoas com problemas sérios de intimidade. Acumular objetos talvez seja
uma forma de construir barreiras materiais dentro das quais me protejo e me
escondo. Saía de casa munido de uma pletora de máquinas fotográficas e
gravadores, usando-os como filtros de seus contatos com outras pessoas.
Homem magro, de cabelo singular, extremamente pálido e com pele
manchada (por doenças que teve na infância), era um tímido inveterado.
Passou boa parte da vida adulta sofrendo de amores quase sempre platônicos
(ou não sentimentalmente correspondidos) por vários garotos bem mais
jovens. Truman Capote, um dos muitos alvos de suas afeições, foi vituperioso
ao descrevê-lo como alguém que “desde o berço, era um perdedor”
irremediável, “a pessoa mais sem amigos e sozinha que já conheci na vida”.
Laing liga a produção de Warhol à sua vida introspectiva e solitária em
meio à multidão. Desde 1960, por meio de filmadoras, máquinas polaroides,
gravadores de som, ele criou muito de sua arte. Especialmente nos anos 1980,
não era possível vê-lo numa festa sem um ou mais desses aparelhos. Warhol
estava sempre atrás de uma dessas máquinas, nunca se expondo sem a
proteção delas. Ao mesmo tempo, os filmes, foots e sons eram formas de
capturar as pessoas sem que elas, como produto, pudessem lhe causar algum
mal, “um estratagema de enorme apelo à solidão, vindo de alguém cujo medo
da rejeição era quase tão intenso quanto seu desejo por intimidade”.
Meu intento ao narrar um pouco de Kubrick ou de Warhol não é reforçar
um mito. Há uma falácia, perigosa em certo sentido, que insiste na ideia do
gênio solitário. Nas artes e nas ciências, ninguém cria totalmente sozinho ou
a partir do nada. Muita gente imagina Michelangelo solitário, em silêncio,
pintando a Capela Sistina, ou Leonardo em seu ateliê criando mais uma obraprima.
A verdade está longe disso. Se o leitor ou a leitora estava prestando
atenção, desde o início falei que artistas estão ladeados de assistentes e
colaboradores o tempo todo. Mais do que isso: estudaram com alguém,
formaram outras pessoas; trocaram impressões e técnicas com outros
artistas; apropriaram-se, inspiraram-se e, até aprenderem, copiaram outros
artistas anteriores ou contemporâneos. Todo o processo de técnica, muitas
vezes o de inspiração também, envolve colaborações e o avesso da solidão.