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perfeito em seu desenho cristalino”, aliado à sinestesia vivenciada e expressa
magistralmente em “o vapor tilintante do perfumado vento sul, que
transfigura todas as árvores em harpas de vento”. Emerson achou-se
constantemente dividido entre períodos de solidão autoimposta para criar a
vivência em sociedade.
O exemplo frutificou. Desponta outro amante da Natureza, Henry David
Thoreau, autor de Walden, ou a vida nos bosques. Thoreau foi, à distância de
quase dois séculos, um ambientalista: “[...] na floresta intocada está a
preservação do mundo. Cada árvore lança suas fibras em busca do silvestre”.
Thoreau foi um entusiasta radical da Natureza. Isolou-se durante dois anos
em uma floresta, por necessidade absoluta de liberdade, independência social
e descoberta espiritual. O isolamento deveria oferecer-lhe conhecimento da
natureza ao seu redor (as árvores, o lago com os peixes etc.), bem como de
sua própria natureza. Dotado de temperamento introspectivo, solitário por
excelência, conviveu bem com sua solidão. Apreciador de leituras orientais, o
Bhagavad Gita em especial, Thoreau estabeleceu sintonia fina com a Natureza.
É possível imaginar que sua solidão na floresta fosse eloquente: ouvindo o
silêncio sagrado dos bosques de pinheiros, aspirando-lhes o perfume,
fotografando com os olhos as folhas da relva. Dois anos possibilitaram-lhe
testemunhar a beleza da mudança de estações em Concord, Massachusetts. O
lago Walden incendiado pelas cores vermelhas e douradas do outono, o
verde-esmeralda das árvores no verão, a queda suave dos flocos de neve no
inverno, acalentando a natureza em repouso, e o renascimento vibrante de
cores e sons de pássaros gorjeando na primavera. Solidão privilegiada na
beleza da Nova Inglaterra. Solidão contemplativa e cheia de significados que
traz um pouco de dor. O sofrimento estava mais no mundo. Thoreau prefere
um frio aquecido pela natureza isolada aos espinhos da companhia humana.
Vivemos em um mundo de preconceito. A solidão do homem é tornada
épica. Em culturas patriarcais e misóginas, a da mulher é considerada, em
geral, banal. Haja vista o caso de Heloísa de Argenteuil, nascida por volta de
1095 na França. Uma mulher medieval, fora do padrão da época, pois sabia
ler, escrever, conhecia o latim, o grego e o hebraico, interessava-se por
filosofia: uma erudita. Heloísa amou Pedro Abelardo e foi por ele amada. Ele