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autoconhecimento.
Por que escritores, através dos séculos, escolhem falar da solidão em suas
obras? Para o cineasta Orson Welles, a resposta era a frase pessimista “o
homem nasce só, vive só e morre só. O amor e a amizade dão-nos a ilusão,
momentaneamente, de não estarmos sós”.
Um artista da palavra, um escritor, um dramaturgo, ao discorrer sobre a
solidão, reflete no papel sua experiência de tal vivência, uma vez que pessoas
inteligentes e sensíveis, habitadas por livros e habitando livros, são em geral
solitárias. Quanto maior o repertório, maior a introspeção. Além do mais, o
escritor necessita de isolamento para poder dialogar consigo e com a
percepção das coisas ao seu redor.
Precisamos fazer uma distinção possível, ainda que não aceita por todos,
entre solidão e solitude. A primeira pode ser considerada negativa,
independendo, inclusive, de estar isolado, apartado da sociedade, pois
podemos nos sentir solitários na multidão. A solitude, por outro lado, tem
caráter positivo, enseja ao ser a possibilidade de escuta de seu “eu” e é
condição imprescindível para qualquer forma de expressão estética. O artista
sabe que precisa de momentos isolados para poder gerar o belo. Há aqueles
que consideram verdadeiro sofrimento a reclusão autoimposta,
provavelmente por alguma característica sensível de seu temperamento mais
gregário. Leonard Bernstein, o famoso maestro norte-americano, confessava
a amigos que detestava isolar-se para compor. Já o britânico Andrew Wiles,
verdadeiro artista da matemática, de bom grado isolou-se por completo
durante um ano (1993-1994) para poder eliminar um erro encontrado após a
sua demonstração do último Teorema de Fermat, um dos mais antigos e
notáveis problemas em aberto da história dos números. Graças à sua
dedicação e ao concurso de Richard Taylor, o erro foi corrigido e ele teve o
orgulho merecido de ver o teorema rebatizado como Teorema de Fermat-
Wiles. Difícil imaginar que ele se sentisse solitário tendo a mente povoada de
fórmulas e equações matemáticas. Se a inteligência de alguém é fator de
afastamento das massas, ela propicia produções extraordinárias.
A solidão se manifesta no bebê quando busca companhia na audição de sua
própria voz ao produzir os primeiros sons, no choro sentido para chamar