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O Dilema do Porco Espinho - Leandro Karnal

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Estados Unidos registra que triplicou o número de casos de pacientes com

transtorno narcisista da personalidade. Os pacientes são majoritariamente

jovens com 20 anos. A geração dos baby boomers manteve os mesmos níveis

desses transtornos que eram registrados antes do advento da internet.

Os primeiros resultados de grandes pesquisas sobre os efeitos nefastos da

solidão nas redes datam dos anos 1990, quando a internet ainda desconhecia

algoritmos como os do Google e do Facebook. O primeiro estudo que

encontrei é de 1998, embora haja anteriores. Nele, pesquisadores da

Universidade Carnegie Mellon, nos Estados Unidos, afirmavam que pessoas

que passam pelo menos algumas horas por semana conectadas à internet

tendem a apresentar crises de depressão e de solidão. No ano seguinte,

estudos sobre Internet Addiction [vício em internet] feitos pela St. Bonaventure

University, de Nova York, passaram a equiparar os efeitos de horas e mais

horas no mundo virtual com o consumo de drogas e seus efeitos no corpo e

na mente das pessoas. A psiquiatria levou tempo para entender a obsessão

pela internet como um distúrbio, pois era complicado relacionar uma

dependência com fatores não químicos. Kimberly S. Young, líder do estudo

pioneiro, escreveu que, mesmo sabendo não se tratar de “uma substância

tóxica”, o uso excessivo da internet provocava efeitos colaterais, criava

processos de dependência e isolamento. O que nos atrairia para esse “vício”

seriam a descoberta do novo, a sensação de liberdade (que não seria real), a

negação do Eu real (que viria de mãos dadas à criação de uma nova e

poderosa identidade virtual), o anonimato e a facilidade de se relacionar e

encerrar relacionamentos.

Em nosso país, o problema é igualmente sério. Temos um importante

centro de pesquisa e tratamento de viciados em internet, liderado por

Cristiano Nabuco de Abreu, na Universidade de São Paulo. Ele tem usado o

termo “autismo digital” e criou um blog para discutir os problemas que

estuda. E o que descobriram tantos estudos? Na verdade, deram corpo a

inquietações sobre as quais venho escrevendo e falando há anos.

O processo da solidão nas redes é, de fato, o que chamei aqui de

solipsismo, que mescla práticas de voyeur à depressão. O primeiro passo para

isso é parar de interagir com o meio social. O indivíduo deixa de ver pessoas

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