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O Dilema do Porco Espinho - Leandro Karnal

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David Riesman, em A multidão solitária, argumentava que a sociedade estava

em transição de um estágio “orientado para dentro” para um estágio

“orientado para o outro”. Até a geração da guerra, as pessoas eram

profundamente influenciadas por pais e autoridades mais velhas e de sua

comunidade, tendendo a reproduzir seus padrões de vida. No pós-guerra,

Riesman detectava a diminuição da importância da vida familiar e

comunitária e a ascensão dos meios de comunicação de massas. Nesse novo

padrão, os indivíduos passavam a depender cada vez mais da aprovação de

seus pares para tocarem a vida: “As pessoas perdem a liberdade social e a

autonomia individual tentando ser como as outras”.

Se ele tinha alguma razão, quase setenta anos depois vivemos a

exacerbação disso. Temos vários mundos e muitas possiblidades ao alcance

das mãos, mas usamos essas possiblidades para reafirmarmos a nós mesmos.

A ideia inicial era a de que eu alargaria horizontes, mas o conteúdo digital que

acessamos é o espelho de Narciso: ouvimos apenas as músicas que nos

atraem, buscamos somente notícias que nos interessam e rechaçamos o não

familiar e o não usual.

Eli Pariser, um jovem ativista e estudioso da internet, escritor do livro O

filtro invisível, explica que algoritmos dos sites de pesquisa e das redes sociais

filtram e personalizam nossas buscas e selecionam nossos gostos diante das

informações que procuramos. Qual de nós nunca se surpreendeu, ao entrar

numa rede social, com um anúncio de algo que procurou dias antes? O

algoritmo pode facilitar a vida, mas também impede os usuários da web de

fruí-la indiscriminadamente. Ou seja, tenho a ilusão de liberdade de

navegação, mas trafego em trilhos que construí inadvertidamente. Se tentar

sair deles, descarrilho a composição. Segundo Pariser, os usuários são menos

expostos a pontos de vista conflitantes com os seus. Isolados

intelectualmente, vivemos em bolhas de informação e cultura. Daí o título

original do livro: The Filter Bubble (no Brasil, publicado como O filtro invisível).

Somos seduzidos por conteúdos previamente selecionados para que gostemos

deles. Profundamente conectados, vivemos isolados. Ele chama essa nova

forma de solidão de iSolamento, brincando os nomes de produtos da Apple.

O iSolamento tem efeito na medicina. O Instituto Nacional de Saúde dos

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