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O Dilema do Porco Espinho - Leandro Karnal

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seríamos expostos a uma maior diversidade de experiências, enriquecendo

nossa existência. Como declarou o entusiasta Howard Rheingold, em A

comunidade virtual: “As relações sociais não se baseiam apenas em contatos

físicos. Na verdade, elas têm aumentado graças à mídia artificial desde a

invenção da mídia impressa e do telefone”.

Quase uma década depois dessa pesquisa, sou forçado a dizer que ela

partia de pontos de vista bastante ingênuos. Aqui começamos o lado das

trevas do debate. Contardo Calligaris disse que a escola era um lugar para o

jovem se resguardar um pouco e descansar da família. Concordo com ele.

Também o quarto dos filhos deveria ser um espaço de solidão saudável. Para

os adolescentes, o isolamento do quarto, quando ele é possível (a maioria da

população jovem não possui quarto individual), é um escaninho protegido

dedicado ao culto do eu, ao afastamento de outros e ao prazer individual.

O gosto adolescente pelo isolamento apresenta o mesmo caráter ambíguo

nos adultos. Queremos estar a sós, de preferência com o celular,

estabelecendo contato com todo mundo, menos com as pessoas reais da casa.

Trata-se de uma sociabilidade controlada, com botão de on-off, permitindo

que possamos entrar e sair das conversas com autonomia. Talvez não seja a

solidão que nos cause horror, mas a falta de controle sobre estar só ou

acompanhado. O celular respondeu de forma extraordinária a essa demanda,

criando a companhia real-ficcional do mundo. Todo o sucesso do aparelho

está no jogo de permitir palco e camarim ao mesmo tempo.

Nenhuma escrita sobre a solidão poderá ignorar o celular, a muleta

suprema que criamos para ter o suficiente isolamento do mundo aliado ao

contato com quem e quando desejarmos. Somos deuses com ele e decidimos

que não é bom que estejamos sós e que, da mesma forma, é ótimo voltar à

nossa concha confortável. Somos lobos de alcateia com prazer de uivar

solitários para a Lua de quando em vez. Melhor, somos lobos com Instagram

e WhatsApp e perfil de muitas alcateias.

Então, parece que a chave de tudo não é solidão ou companhia, porém

controle. Idealizamos praias isoladas para... podermos encher a praia com

pessoas do nosso círculo. A ideia de exclusividade é acompanhada da

possibilidade de selecionar quem poderá povoar o espaço único. Quando a

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