Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
os anos 1990: a internet, criada para integrar as pessoas, eliminar distâncias
e barreiras, diversificar as perspectivas individuais, estaria criando uma
espécie de “autismo digital”, “isolamento nas redes”, “solidão entre
milhões” e seres depressivos diante de uma infinita barra de rolagem? O
solipsismo é a teoria de que somente existe meu eu envolvido pelas minhas
sensações. Sou o mundo e sua totalidade, e os outros seres, no fundo, são
apenas sensações. Olhando e se deleitando consigo, parte da atividade da
internet é um “solipsismo voyerístico”, ou seja, envolvido em si e observando
a si (voyeur).
Vamos trazer mais facetas da polêmica. É inegável que a internet tem o
potencial de criar autonomia e nos tirar de isolamentos involuntários. Li, em
2018, como Barranco Alto, um pequenino distrito de Alfenas, estava
diretamente experimentando isso. Lá vivem cerca de 500 pessoas. Às
margens de Furnas, isolada geograficamente de outras áreas urbanas, a cada
3 casas, 2 são de veraneio, cheias apenas quando é alta temporada. Nessa
típica sociedade face-to-face, onde é quase impossível não conhecer alguém,
pois todos são vizinhos, uma balsa era a ligação com o mundo exterior.
Esperar por uma travessia que só ocorre de hora em hora ou se arriscar em
estradas de terra bastantes difíceis. Mais do que um convite, um mandato à
solidão, à introspeção. Em 2016, uma empresa regional levou internet à
microrregião. O depoimento de uma professora universitária federal,
moradora de Barranco Alto, chamou atenção. Ela ministra aulas de
matemática em modalidade de ensino a distância. Para trabalhar, antes da
internet chegar ao lugar onde mora, tinha que viajar de moto três vezes para
Alterosa, a 40 quilômetros de Barranco Alto. Cada perna do trajeto durava
uma hora e meia em estrada de terra. Com a banda larga instalada, as viagens
restringiram-se aos dias de avaliação. Passou a trabalhar de casa. Fez cursos
on-line, assistiu a videoconferências sem sair do lugar, criou perfis em redes
sociais e reencontrou (virtualmente) amigos de infância.
O caso dessa professora é algo para pensarmos. Ineludível: ela deixou um
isolamento. Conectou-se com alunos, colegas e mestres sem sair de casa. E,
no fim da minha frase, reside o mais curioso: sem sair de casa. Isolou-se
rompendo um isolamento. O paradoxo é o X da questão que me intriga há