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O Dilema do Porco Espinho - Leandro Karnal

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ligada sempre e sem outros contatos sociais reais. Alimentam-se, vivem ou

sobrevivem naquele espaço. Estão em contato com o mundo todo, mas

isolados do outro maior, ou seja, o outro que está no eu seguindo Rimbaud.

Em espectro oposto estão os herbs (herbívoros), no mesmo arquipélago,

pessoas que não praticam nem procuram o sexo ou o casamento.

Aumentando a tipologia que dialoga com o isolamento, surgem os neets,

jovens que não estão “nem trabalhando, nem estudando, nem treinando”.

Por fim, o freeter (junção de free com Arbeiter, trabalhador em alemão). Eles

não constituem a carreira desejada pela maioria dos nipônicos. Não ficam

presos a uma empresa que se transforma em família. O freeter pula de uma

função para outra, faz coisas informais e não se fixa em nada. Defeito ou

virtude?

Os tipos descritos são bons de serem observados em uma sociedade como a

japonesa, que estabelece vínculos formais muito fortes com comunidade

familiar e laboral. Seriam de fato vínculos ou cadeias? A resposta vai variar se

a pergunta for feita a um japonês entrosado com a tradição ou um freeter. Nós

estaríamos, segundo Dunker, mais sensíveis à medida que “gramáticas do

espaço público avançam sobre o privado. E, assim, reciprocamente”.

O autor considera que a boa solidão é oposta ao sentimento de não precisar

do outro. Perceber que sim, necessito do outro, porém não de forma absoluta,

transforma a solidão em potência criativa e sem a carga de humilhação da

solidão patológica. Se você sente muita tristeza quando os filhos saem de casa

ou as férias começam, estaria, para o autor, chegando a hora de experimentar

uma solidão de verdade.

Se eu tivesse que resumir as muitas boas ideias de Cristian Dunker,

encerraria a paráfrase do seu texto com a frase da página 31: “Cultivo da

solidão é o cultivo do Outro que nos habita”. Estranhar-se, despir-se de

retóricas e máscaras que os outros perceberam em você e que você incorporou

ou desenvolveu, afastar-se da cena que o mundo e cada um de nós demanda:

eis a fórmula da boa, libertadora e criativa solidão-solitude.

A solidão deve ser uma vitória, uma conquista, um esforço pessoal para evitar

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