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CONCLUSÃO
Solitários do mundo, afastai-vos
Ao reunir diversos artigos no livro Reinvenção da intimidade: políticas do
sofrimento cotidiano, Cristian Dunker trata do nosso tema no primeiro
capítulo: “Solidão, modo de usar”. O livro é muito bom, e esse capítulo, em
particular, faz pensar. Começo parafraseando alguns argumentos de Dunker.
A ideia do francês Rimbaud é um ponto de partida: Eu é um outro. O poeta
completa em carta a um amigo: azar da madeira que se descobre violino, azar
do cobre que desperta clarim. Entre matéria e forma, existe o atrito da
transformação. Sou a matéria ou serei a forma? Onde estaria meu eu e meu
outro?
A solidão é “experiência simbólica por excelência, ela traz consigo não a
separação para com os outros, mas a distância e o estranhamento com
relação a si mesmo. Solidão não é apenas introspecção ou introversão, mas
dissolução da própria solidez do ser”.
Ao longo deste livro, tratei várias vezes do poder de consciência que a
solidão poderia trazer. Aqui a reflexão vai além, pois trata-se de dizer não ao
mundo e não a si mesmo, transformando solidão em solitude.
Dunker relembra que a solidão pode ser experiência enriquecedora. O
processo de estranhar a si mesmo e sobreviver à sua própria imperfeição
ocorre na filosofia; em espaços arquitetônicos (claustros, criptas, jardins em
labirintos), nas pinturas de paisagens, nas poesias com temas como a
saudade ou o desterro e na literatura, como Brás Cubas de Machado.
Isolamento nem sempre é bom, claro. O extremo são os chamados
hikikomori, jovens japoneses que ficam trancados no quarto com a internet