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como Reino Unido; proclamamos a República, condenando Pedro II ao exílio
na França.
Chico Buarque passou pouco mais de um ano na França e na Itália durante
o regime militar. Caetano Veloso e Gilberto Gil viveram exilados na
Inglaterra. Fernando Henrique Cardoso viveu na China. José Serra, no Chile.
Brizola, no Uruguai e nos Estados Unidos. João Goulart, no Uruguai. Luís
Carlos Prestes, na Bolívia e na União Soviética. A lista não tem fim nem
filiação política clara.
Ao longo da história, não só pessoas foram condenadas ao exílio, mas
nações e governos inteiros. O Tibete é um governo que só existe fora de seu
lugar de origem. A Armênia, entre os séculos XI e XIV, diante da invasão dos
turcos seljúcidas, exilou-se na Cilícia. Casos assim ganham o nome de
diáspora, sendo a mais famosa a dos judeus, descrita na Bíblia, deportados
primeiro pelos babilônicos e, depois, pelos romanos após a destruição do
segundo templo, em 70 d.C. As diásporas judaicas tornaram-se caso
paradigmático. Hoje falamos na diáspora africana para nos referirmos aos
brutais anos de tráfico negreiro. Uma diáspora polonesa levou imensos
contingentes populacionais para a França e os Estados Unidos. Tártaros da
Crimeia foram forçados a se retirar para a Ásia Central em 1944, processo
baseado em limpeza étnica.
O terrível do desterro é a sensação de perder a identidade ou formar uma
nova que parece estar sempre fora do lugar, para usar a expressão de Edward
Said, intelectual palestino que fez carreira como autoexilado nos Estados
Unidos. Em A balada do cálamo, Atiq Rahimi, ele próprio um exilado afegão na
Índia, no Paquistão e na França, lembra-nos de que tudo começou com essa
condenação à solidão. Seja pelo parto, seja pela expulsão do Paraíso,
começamos nossa jornada no mundo por meio do exílio. Por isso, somos
capazes de nos relacionar com a dor alheia nessas circunstâncias.
A humanidade passa de 7 bilhões de consciências solitárias e incapazes de
dissolução no outro. Toda a trajetória da espécie humana no passado e hoje é
uma tentativa de criar ou barrar a comunicação com a solidão. Fazemos arte,
criamos família, escrevemos e lemos, votamos e falamos em redes sociais a
partir da experiência absoluta da solidão sentida de forma consciente ou não.