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O Dilema do Porco Espinho - Leandro Karnal

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comportamento ou cometer uma falta grave durante a pena, o isolamento em

cela individual (ou em outro local apropriado) é permitido. Proíbe-se que a

cela solitária seja escura, surda ou cela forte (artigo 45, §2º, e 52, inciso II, da

Lei nº 7.210/1984). Ainda que essa lei fosse observada estritamente (o que

sabemos não ser a regra), condenar à solidão dentro do isolamento (da

sociedade, da família, amigos etc.) é algo a ser pensado.

Usamos tal punição justamente porque sabemos que ela é radicalmente

contrária à natureza humana. Somos seres gregários, e a solidão em

definitivo, ou o isolamento, comprovadamente causa danos à saúde psíquica.

São mapeadas as chamadas “psicoses de prisão”. As críticas a esse sistema

punitivo datam também do século XIX que o criou, pois loucura, depressão,

desespero e suicídio sempre o acompanharam. Mesmo o argumento da

ressocialização é falho, uma vez que, “caso sobrevivesse ao isolamento, o

preso retornava à sociedade mais marginalizado e desajustado do que havia

ingressado no cárcere”, afirma Tatiana Baptista, baseando-se em pesquisas

com dados acumulados desde os anos 1970.

Alexis de Tocqueville visitou os Estados Unidos nos anos 1830 para estudar

o sistema prisional novo que ali havia. Escreveu que o confinamento em

solitárias era um castigo que “devora vítimas incessantemente e sem

piedade”. Charles Dickens, relatando suas opiniões sobre o sistema prisional

da Pensilvânia, que ele conhecera em suas viagens à América, escreveu que

“manipular devagar e diariamente os mistérios do cérebro pode ser

imensamente pior do que qualquer tortura no corpo”. Na Dinamarca, dados

oficiais captados entre 1870 e 1920 foram analisados, e a conclusão foi a

mesma: quando em longos períodos de isolamento, os presos desenvolviam

doenças mentais. A Suprema Corte dos Estados Unidos também se

pronunciou sobre o assunto em 1890, atestando o que os médicos diziam: o

confinamento em solitárias realmente produz uma redução nas capacidades

físicas e mentais.

No último meio século, as discussões sobre o confinamento em solitárias

se sofisticaram muito. Defensores do sistema alegam que é necessário,

especialmente diante de presos “marcados para morrer” pelo grupo ou para

aqueles que são extremamente perigosos. Se não forem isolados, o que fazer?

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