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O Dilema do Porco Espinho - Leandro Karnal

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punir por encarceramento e expiar a culpa por meio da reflexão solitária.

Foucault conclui que trocamos a punição pela marca no corpo por uma forma

de controle sobre o corpo, treinando-o, recondicionando-o para salvar sua

alma, sede dos hábitos e chave da Salvação. Deixamos de querer castigar pelo

crime para adotarmos uma lógica de salvar a consciência de cada indivíduo

por meio do recondicionamento do corpo e da solidão da reclusão. Ou seja,

prender alguém, privando-o de sua liberdade e da interação com outras

pessoas, como forma de punir é algo razoavelmente recente em nossa

história.

As grandes reformas surgiram com os livros de John Howard (O estado das

prisões na Inglaterra e o País de Gales) e Jeremias Bentham (Teoria das penas e das

recompensas), além da criação e da reforma do sistema prisional de Nova York

no século XIX. Howard, na fundação do país, propôs uma ampla reforma

prisional cuja base seria o isolamento do condenado durante o noturno

(reclusão noturna), impondo-lhe trabalho, instrução moral e religiosa,

separando as pessoas por classificação de crimes. Pregava prisões com

condições de higiene e alimentação adequada, rompendo com a lógica das

masmorras. Bentham formulou o Sistema do Panóptico, tão estudado por

Foucault no livro já citado. Tratava-se de uma proposta arquitetônica

revolucionária para os prédios das prisões. A ideia era fazer dois edifícios na

forma de cilindros concêntricos, ambos divididos em vários planos (ou alas).

No cilindro interno ficariam, sem serem vistos pelos presos, os carcereiros, e

no externo os condenados, arranjados em celas unitárias, separados por

classificação criminal. Bentham também sugeria a educação profissional e a

aplicação excepcional de castigos disciplinares físicos (leia: tortura).

Os dois livros foram amplamente lidos e debatidos. Com o incentivo da

ampla comunidade quaker, a Filadélfia adotou essas propostas. Desde sua

fundação, pelo ex-prisioneiro William Penn, líder quaker, a Pensilvânia

buscava adotar a privação da liberdade e os trabalhos forçados como pena

basal, preferindo esses castigos aos corporais, mutilações e pena de morte.

Penn viu toda sorte de “corrupção e pecados” na prisão, como homens e

mulheres juntos, criminosos perigosos ao lado de outros com pouca

periculosidade, subornos e esquemas envolvendo carcereiros e condenados.

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