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encontros familiares em que ninguém vai ouvi-lo. Solidão intensa é quando
não se sai mais de casa, não se interage. Aumenta-se, com isso, o risco de
depressão, de doenças degenerativas físicas (pela falta de movimento) ou de
Alzheimer. A mesma pesquisa revelou que apenas 20% das famílias tinham
consciência de que a situação de isolamento de seus membros mais velhos
causava-lhes problemas de saúde mental e física. Não sei o que acho mais
estarrecedor: os muitos que não percebem o óbvio ou os poucos que,
conscientemente, dão de ombros à situação. Diante do fato de que a
população brasileira está envelhecendo, como viveremos essa realidade que
nos bate à porta? Vale lembrar que a Organização Mundial da Saúde classifica
a solidão como fator de risco maior que o tabagismo e tão grande quanto a
obesidade para a saúde humana. Somente na Europa, mais da metade dos
idosos com mais de 75 anos mora sozinha. Isso, em si, não é problema,
apenas sinal dos tempos, pois muitos desses idosos estão bem com a situação
e o fazem por opção. Mas outros tantos estão em quadros de solidão intensa
devido à dispersão de seus familiares.
É claro que os modelos de família mudaram e que a rotina das pessoas e
sua falta de formação específica podem levá-las a terceirizar cuidados com os
mais velhos (assim como muitas vezes fazemos com os mais novos também).
Não há problemas nisso e, na verdade, quem consegue pagar por bons
cuidadores pode estar em caminho certo. Mas temos que entrecruzar essa
afirmação com uma lógica de classe e gênero. Pessoas que não podem pagar
por cuidados com os idosos da família fazem o quê? Outro ponto:
normalmente são as mulheres de uma família as que, mais uma vez, ficam
encarregadas desses cuidados. Gera-se um peso excessivo a determinados
familiares por ainda acreditarmos numa divisão interna injusta de papéis.
Levantamento feito com idosos com vida social no Brasil demonstrou que,
para quase 80% dos entrevistados, a pessoa mais significativa de sua vida era
um familiar que não o cônjuge, sobretudo filhas e netas.
Cynthia A. Sarti, do Centro de Estudos em Saúde Coletiva da Unifesp/EPM,
uma estudiosa do assunto, escreveu que idosos precisam “ser ouvidos. Isto
implica pensar os idosos como sujeitos não apenas de direitos, mas também
de desejo”. Talvez esse seja o maior ponto a se considerar, uma vez que todos