11.11.2021 Views

Edição de 28 de setembro de 2020

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

última página<br />

Damir Kopezhanov/Unsplash<br />

Encontros<br />

Rodolfo Sampaio<br />

Estou escrevendo esse texto do meu novo<br />

escritório. Aliás, nem tão novo assim, já<br />

que estou sentado no mesmo lugar há aproximadamente<br />

uns seis meses. E escolhi um<br />

lugar bem peculiar da minha casa para fazer<br />

<strong>de</strong> escritório. No dia em que cheguei da<br />

agência, no começo da tar<strong>de</strong>, achando que<br />

o mundo ia acabar, eu coloquei meu computador,<br />

<strong>de</strong>sktop e gigante, em cima da<br />

mesinha <strong>de</strong> centro da sala e sentei no tapete,<br />

encostado no sofá. Era provisório. Virou<br />

<strong>de</strong>finitivo. Em toda reunião que eu faço, as<br />

pessoas preveem um <strong>de</strong>stino sombrio para a<br />

minha coluna, que, por enquanto, segue heroicamente<br />

firme.<br />

E, nesse momento em que<br />

todo mundo chegou à conclusão<br />

que o home office funciona e, assim<br />

como para a minha coluna,<br />

um futuro sombrio também está<br />

sendo previsto para os escritórios<br />

corporativos, eu quero fazer<br />

uma o<strong>de</strong> aos escritórios. Não ao<br />

escritório em si, que nada mais é<br />

do que aquela coisa que se me<strong>de</strong><br />

em metros quadrados, feita <strong>de</strong><br />

tijolos, salas <strong>de</strong> reunião e máquinas<br />

<strong>de</strong> café. Minha o<strong>de</strong> é aos encontros. Encontros<br />

profissionais que são realizados em<br />

alguns escritórios apontam caminhos e mudam<br />

vidas.<br />

Vou falar <strong>de</strong> um certo prédio na Lagoa. Ali<br />

pelos meus 16, 17 anos, eu não tinha a menor<br />

i<strong>de</strong>ia do que eu queria fazer. Mas uma coisa<br />

eu sabia. Eu queria trabalhar num escritório,<br />

daqueles bem bacanas, num prédio <strong>de</strong> vidro<br />

escuro. E queria chegar em casa no fim do dia<br />

e tomar whisky com bastante gelo num copo<br />

largo, que ocupasse toda a mão. Que nem nas<br />

novelas. Achava isso chique. Meu jeito <strong>de</strong> ir<br />

trabalhar num escritório bacana, num prédio<br />

<strong>de</strong> vidro escuro, foi fazer propaganda.<br />

Criação. Logo eu, que nem cartinha pras namoradas<br />

era bom <strong>de</strong> escrever. O primeiro prédio<br />

<strong>de</strong> vidro escuro em que eu trabalhei foi a<br />

“Vamos manter<br />

a distância<br />

regulamentar,<br />

por ora. mas<br />

sem esquecer<br />

que a Vida<br />

é feita <strong>de</strong><br />

encontros”<br />

Artplan. O en<strong>de</strong>reço era incrível: <strong>de</strong> frente pra<br />

Lagoa Rodrigo <strong>de</strong> Freitas, no Rio. Entrar naquele<br />

prédio, apertar o 5, andar da criação, e<br />

sentir o cheiro da cola que vinha do estúdio<br />

me transportava para o mundo <strong>de</strong> Mad Men.<br />

E, olha que chegar ali não era fácil pra mim,<br />

não. Eu morava a uns 60 quilômetros <strong>de</strong> distância,<br />

em Campo Gran<strong>de</strong>, que, pela milésima<br />

vez, não é o do Mato Grosso do Sul. Penúltimo<br />

bairro da cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong> Janeiro, Campo<br />

Gran<strong>de</strong> fica on<strong>de</strong> Judas per<strong>de</strong>u as botas, vizinho<br />

<strong>de</strong> Santa Cruz, bairro on<strong>de</strong> o vento faz a<br />

curva e retorna para refrescar paragens mais<br />

glamourosas da Cida<strong>de</strong> Maravilhosa. A Lagoa<br />

era longe, bem longe. Mas naquele escritório<br />

tudo me encantava. O encontro<br />

<strong>de</strong> pessoas apaixonadas e<br />

inteligentes, os “brainstorms”<br />

frenéticos, os almoços <strong>de</strong>scompromissados.<br />

O Roberto Medina<br />

lá no sétimo andar fazendo<br />

o Rock in Rio (a galera brincava<br />

que o andar da presidência era o<br />

sétimo céu, e o da criação era o<br />

quinto dos infernos!!!).<br />

Não era o quinto dos infernos,<br />

muito pelo contrário. Se existia<br />

um lugar no mundo on<strong>de</strong> eu<br />

queria estar naquela época, esse lugar era o<br />

quinto andar daquele prédio na Lagoa. Estar<br />

ali, no meio daquelas pessoas que amavam a<br />

propaganda e criavam com tanto tesão e originalida<strong>de</strong>,<br />

me <strong>de</strong>safiava. Lembro-me que eu<br />

pegava um job e labutava pra tirar uma i<strong>de</strong>ia<br />

bacana da cachola, enquanto os caras faziam<br />

várias com uma facilida<strong>de</strong> irritante. Dei muitas<br />

voltas na Lagoa cabisbaixo. Invejei muito<br />

a vida dos peixinhos que ficavam na beirada,<br />

já que não tinham <strong>de</strong> criar nada pra ninguém.<br />

Amor e ódio. Muito do que levei pela minha<br />

vida profissional, eu aprendi ali. Dali veio o<br />

meu critério, se é que tenho algum. Foi naquele<br />

escritório, naquele prédio na Lagoa,<br />

que eu aprendi a amar a boa propaganda.<br />

Vamos manter a distância regulamentar, por<br />

ora. Mas sem esquecer que a vida é feita <strong>de</strong><br />

encontros.<br />

Rodolfo Sampaio é sócio e CCO da Moma Pro<br />

rodolfo@momapro.com.br<br />

38 <strong>28</strong> <strong>de</strong> <strong>setembro</strong> <strong>de</strong> <strong>2020</strong> - jornal propmark

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!