Edição de 28 de setembro de 2020

Mercado
Trainee para negros do Magalu
reacende discussão sobre racismo
Marca foi acusada de racismo reverso e provocou reação de políticos
e parte do público; o Ministério do Trabalho, porém, validou iniciativa
leonardo araujo
Magalu abriu inscrições para
seu programa de trainee
O
2021 aceitando apenas candidatos
negros. O objetivo, segundo
a empresa, é trazer mais diversidade
racial para os cargos de
liderança, cuja porcentagem de
negros atual é de 16%. A Bayer
também anunciou o Programa
Liderança Negra Bayer. Segundo
a empresa, o primeiro
em dez anos com um recorte
étnico-racial. Ambas dividiram
opiniões.
Críticos como Fernando Holiday
(Patriota-SP), vereador
por São Paulo, afirmam que as
iniciativas geram dúvidas sobre
a capacidade profissional de
negros e instituem “um padrão
racista de contratação”. Carlos
Jordy (PSL-RJ), deputado federal
do Rio de Janeiro, disse que
iria acionar o Ministério Público
para “que seja apurado crime
de racismo”.
Procuradas, Magalu e Bayer
mencionaram Nota Técnica do
Ministério Público do Trabalho
(MPT) que valida ações afirmativas
como as anunciadas. Aliás,
no fim da última semana, o
MPT em São Paulo indeferiu as
denúncias recebidas contra o
Magazine Luiza. O órgão concluiu
que o caso não se trata
de violação trabalhista, mas de
uma ação afirmativa de reparação
histórica.
As consultorias Indique
Uma Preta e ID_BR auxiliaram
o Magalu na composição do
programa. Questionadas sobre
as afirmações de Holiday, as
especialistas discordaram do
vereador.
“Acreditamos que vivência e
repertório valem mais do que a
faculdade ou o intercâmbio que
você fez. Daí a necessidade de
políticas afirmativas nas grandes
corporações, políticas essas
que já estão sendo aplicadas no
campo da educação há alguns
anos e já apresentam avanços
positivos. Quando falamos de
processos seletivos tradicionais,
ainda existe a máxima de
que apenas ‘universidades de
ponta’ (aquelas que só pessoas
com alto poder aquisitivo podem
pagar) formam profissionais
excelentes. Esse modelo
de avaliação acaba sendo excludente
para pessoas negras”, dizem
as sócias do Indique Uma
Preta.
“O padrão racista de contratação
já existe e ele é branco”,
afirma Luana Génot, diretora-
-executiva do ID_BR. O histórico
dos últimos programas de
grandes empresas deixa claro
que as seleções são ocupadas,
majoritariamente, por pessoas
“O padrãO racista
de cOntrataçãO
já existe e ele
é brancO”
brancas. “As ações afirmativas
não são um medidor de quem é
mais ou menos capaz. Até porque,
ainda assim, haverão processos
seletivos que vão medir
o fit, ou seja, o encaixe dos candidatos
com o perfil da vaga e
da empresa”, justifica Luana.
Muitos críticos da iniciativa
dizem que há racismo contra
brancos no processo. “Essa fra-
Fotos: Divulgação
Verônica Dudiman, Daniele Mattos e
Amanda Abreu, cofundadoras do Indique
Uma Preta (à esquerda). Luana Génot,
diretora-executiva do ID_BR (acima)
se não possui legitimidade”,
explicam as sócias do Indique
Uma Preta. “No Brasil, brancos
não sofrem com o racismo
estrutural, ou seja, aquele racismo
que institucionalmente
nega acessos e oportunidades
às pessoas negras”.
As sócias do Indique Uma
Preta também destacam que
a diversidade é boa para os
negócios. “Estudos das mais
respeitadas universidades no
mundo apontam que diferentes
pontos de vista resolvem
problemas mais complexos.
Segundo a McKinsey, empresas
que possuem diversidade étnico
racial em seu quadro de colaboradores
possuem resultados
até 35% melhores do que outras
empresas”.
Luana finaliza com uma frase
que parece sumarizar as iniciativas
de maneira cabal: “Não é
favor, é estratégia”.
jornal propmark - 28 de setembro de 2020 31