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A Guerra_ a ascensao do PCC e o - Bruno Paes Manso

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1. O racha

Na sala reservada de uma penitenciária de Mato Grosso do Sul, depois de

muita insistência e tratativas com as autoridades locais, um preso aceita

conceder entrevista para uma pesquisa. Ele é apresentado por um agente

penitenciário, desconfortável com a quebra em sua rotina de trabalho. Todos

estão de pé na sala, diante de uma mesa e duas cadeiras. “Tudo bem mesmo

falar com a pesquisadora?”, pergunta o carcereiro, olhando para o preso, que

concorda de pronto, sem esconder a tensão refletida nos olhos espremidos de

tanta raiva.

O segurança sai da sala. Antes, coloca sobre a mesa um sanduíche de pão

com presunto e queijo, talvez para aliviar o ambiente e deixar o preso à

vontade. Carlos [1] não usa algemas nem uniforme do presídio. Ele aparenta

ter trinta e poucos anos, tem a pele moreno-clara, nariz e lábios finos, um

físico atarracado capaz de impor respeito. Sentado na cadeira, ele se mostra

disposto a romper o silêncio naquele meio onde quem fala pouco tem mais

valor. Parece decidido a colocar para fora algo que o incomoda. Quando abre

a boca, pode-se ver que faltam os dois dentes superiores da frente.

“Vai, abre logo o seu coração, o que você quer saber?”, Carlos provoca.

“Você quer saber sobre a guerra das facções, certo?”, ele emenda. Sim, claro,

não havia como negar. Era este o principal objetivo daquele encontro em

dezembro de 2016. Os presídios brasileiros viviam momentos de incerteza. A

mais poderosa facção brasileira, o Primeiro Comando da Capital, tinha

rompido o pacto de não agressão que desde sua fundação mantinha com o

Comando Vermelho, grupo criminoso criado no Rio de Janeiro e com

franquias espalhadas em outros estados.

Àquela altura, as informações sobre essa rixa ainda eram confusas.

Ficariam evidentes semanas depois, precisamente a partir do dia 1 o de janeiro

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