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A Guerra_ a ascensao do PCC e o - Bruno Paes Manso

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O crack […], que infestava a cadeia nos anos 90, foi banido do sistema

penitenciário de São Paulo por ordem da facção dominante. Tanta gente

fumava crack que, quando um preso negava o uso, eu achava que devia

ser mentira. Nunca imaginei que essa droga seria varrida das prisões em

meu tempo de vida, muito menos que os responsáveis pela proibição

seriam justamente uma facção envolvida com o tráfico nas ruas, depois de

concluir que o craqueiro conturbava a ordem imposta por eles nos

presídios a ponto de lhes prejudicar os negócios.

Em 1997, um dos fundadores do PCC, Misael, criou um estatuto com

dezesseis artigos tentando colocar no papel os princípios da facção. Anos

antes, no começo da década, Misael teria se aproximado dos italianos Bruno

e Marcelo Torsi, ligados à Camorra, uma das correntes da Máfia italiana, no

Presídio de Taubaté. Nas conversas que trocaram, os italianos teriam indicado

diretrizes para a facção se tornar algo diferente de uma simples quadrilha.

Contudo, uma década e meia antes, Misael já aparecia entre os presos

vinculados às Comissões de Solidariedade. Durante o período de

redemocratização, foram criadas comissões compostas por presos e

funcionários das prisões – uma instância de representação reconhecida pelo

Estado. Eram canais entre a população carcerária e as autoridades que

denunciavam violações de direitos. Misael fez parte da comissão na

Penitenciária do Estado entre 1984 e 1986. Ou seja, ele já expressava

sensibilidade política e capacidade de articulação. As comissões sofreram

toda forma de boicote dos setores conservadores e foram desarticuladas em

poucos anos. [6]

O período entre a desarticulação das comissões, em 1986, e a criação do

PCC, em 1993, foi de intensa violência do estado dentro e fora das prisões.

Havia pelo menos um elo entre esses dois momentos: Misael. No entanto,

como ensinavam os mafiosos, a ideologia não bastava. Era preciso

organização. A lealdade e a contribuição dos associados eram a chave para

uma organização sólida. Esses ideais foram colocados no papel no Primeiro

Estatuto do PCC, escrito por Misael e depois publicado no Diário Oficial do

Estado a pedido do deputado estadual Afanasio Jazadji, que tentava

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