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Dicionario-Paulo-Freire-versao-1

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“estimula a cultura do silêncio” (2005, p. 67) – o educador é o que diz a

palavra; os educandos, os que a escutam. O educando serve como “depósito”

de conteúdos, não aprende e permanece no silenciamento, sem voz e vez.

Freire ressalta que esse modelo educativo mantém “um saber instrumental

que não aguça o sujeito ao invento, a reinvenção e a busca inquietante em ser

mais” (2006b, p. 67).

A prática da educação libertadora, por sua vez, conduz o educando a dizer

a palavra verdadeira, profética e utópica. Essa pronúncia dialogada possibilita

o sujeito a fazer, expressar-se, inventar, criar e recriar na perspectiva do ser

mais, “que não é privilégio de alguns eleitos, mas direito dos homens” (2005,

p. 91). A palavra, tendo o poder quase mágico de criar mundos, está no

centro do processo educativo como ação cultural. Romper o silêncio,

subverter a histórica cultura do silêncio: condição primeira para homens e

mulheres se assumirem como seres culturais. Mas há um silenciar que a

educação precisa cultivar. É aquele silêncio que torna possível o verdadeiro

diálogo, a palavra autêntica. Quem não escuta não pode falar com, mas fazer

discursos para, ou, em termos de cultura, vai continuar perpetuando invasões

culturais. A mesma pedagogia que ajuda a articular a palavra é também uma

pedagogia do silêncio.

Num escrito de 1985, Virtudes do educador, Paulo Freire descreve a

capacidade de trabalhar a tensão entre a palavra e o silêncio como uma das

qualidades do educador. Trata-se de uma “tensão permanente que se cria

entre a palavra do educador e o silêncio do educando, entre a palavra dos

educandos e o silêncio do educador” (p. 2). Esta qualidade é acompanhada de

outra, a coerência entre o discurso e a prática. A coerência, no entanto, não

significa uma atitude moralista ou fundamentalista, mas o assumir-se como

sujeito em meio às contradições da história. Diz ele: “Se necessita ser

incoerente para transformar-se em coerente” (p. 1). Do contrário, seria

inclusive impossível saber o que é coerência.

Por fim, o valor da palavra para Freire pode ser vista na maneira como ele

lida com a linguagem. Sua escrita caracteriza-se por uma sonoridade que

resulta de um querer bem às palavras, de usá-las no lugar certo e de modo

correto. No depoimento de Ana Maria Araújo Freire: “Paulo tinha a

preocupação em produzir textos bonitos, do ponto de vista lingüístico e ético.

E que expusessem com exatidão e clareza epistemológica o seu raciocínio

filosófico-político-ético de educador dos/as oprimidos/as” (FREIRE, A. M.,

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