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Dicionario-Paulo-Freire-versao-1

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nossa opinião, sem nunca esquecer evidentemente de nos orientar. O que,

aliás, é o papel de todos os pais. Eu nunca me esqueço: quando estávamos

exilados em Genebra, na Suíça, eu tinha a vontade de seguir a carreira de

músico, e perguntei ao meu pai se poderia. Ele então respondeu: “Eu só faço

uma exigência, que você seja músico com amor”.

Evidentemente, nem tudo era paz e amor o tempo todo, havia momentos

difíceis, de desentendimento, de ruptura, de discórdia. Mas, do contrário,

como saberíamos, ou melhor, como conheceríamos e, principalmente,

reconheceríamos o amor? Aqui, acredito, vale a pena uma observação : da

mesma forma que meus avós educaram seus filhos, ele não só continuou essa

educação conosco, mas também levou consigo dessa educação o binômio da

dualidade que ele utilizaria em seus escritos: opressor x oprimido; liberdade x

prisão; autoridade x autoritarismo; democracia x ditadura; etc.

Não passamos por momentos fáceis, é verdade. A prisão do meu pai no

Recife, o exílio do Brasil, em 64, a saudade dos familiares que ficaram, a

necessidade de nos acostumarmos com outras culturas, o trabalho, enfim,

viver fora do Brasil. Tudo isso marca muito uma família, evidentemente,

qualquer família. A nossa conseguiu sobreviver, graças à nossa mãe, Elza

Freire. Minha mãe deixou no Brasil tudo o que a amarrava ao país e se

dedicou a cuidar da família. Ela foi a nossa mãe, ela foi companheira, ela foi

guia do meu pai, ela foi amor, perdão, aconchego, porto seguro, política,

educadora, a luz da família. Meu pai costumava dizer: “Elza é a

infraestrutura, e eu sou a superestrutura da família”.

A volta ao Brasil para a família foi fundamental para a nossa saúde física

e mental. Não voltamos todos, dois ficaram, porque assim queriam, e foram

respeitados na sua vontade e na sua liberdade.

Mas o que é família em, ou para – tanto faz – Paulo Freire? Do meu ponto

de vista, que pode ser diferente dos meus irmãos, é que para o meu pai a

família é saber estar juntos, amando uns aos outros, cuidando uns aos outros,

às vezes discordando, com razão ou sem razão, com amor corrigindo,

errando, acertando. É saber dar limites aos filhos, fazer com que eles sejam

autônomos. Minha mãe sempre dizia: “Meus filhos não são meus, meus

filhos são do mundo”.

Na verdade, não se pode falar da família Freire, sem falar de Elza Freire.

Essa mulher recifense, pernambucana, nascida em 16 de junho de 1916 e

falecida a 24 de outubro de 1986, foi professora primária e diretora de escola

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