Dicionario-Paulo-Freire-versao-1

silvawander2016
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DOMESTICAÇÃORicardo RossatoTrata-se de categoria determinante no contexto dos escritos, locuções,seminários, palestras e manifestações de Paulo Freire. Vincula-se diretamentecom outras extremamente relevantes que permeiam todo o pensamento desseautor, mas notadamente com opressor-oprimido, pedagogia do oprimido,alienação, educação bancária, acomodação, invasão cultural. Presente desde oinício da sua obra, notadamente na primeira parte de Pedagogia do oprimido,também perpassa o conteúdo dos últimos textos escritos, como Pedagogia daindignação. Domesticação pode ser definida como um processo através doqual se cria uma consciência passiva de submissão tanto a pessoas como a umsistema, seja social, seja econômico ou educacional. Embora constitua umaatitude pessoal de aceitação sem questionamento da própria vida e darealidade, implica uma sujeição a uma determinada ordem social estabelecidatomando-a como definitiva e permanente e, portanto, imutável. Em nívelmacrossocial leva à legitimação de uma visão neocolonialista, aceitando adependência internacional, tomando-a “como natural e inevitável” (FREIRE,1996, p. 16). Leva a pessoa à acomodação aos valores vigentes criando umaatitude de internalização dos valores dominantes, o que impede qualquerquestionamento ou verbalização que conteste o sistema. Leva à perda dasubjetividade fazendo com que a pessoa perca a capacidade de construção deum pensamento crítico, abrindo mão de sua palavra sobre si, sobre a história,sobre o mundo. Em educação é a própria negação da pedagogia daautonomia. Elimina qualquer problematização e reação tanto face ao presentecomo em relação ao futuro numa atitude de desesperança e fatalismo dianteda realidade assumindo-a como estática e definitiva. No processo deeducação, o educando é visto como um ser passivo e sem domínio darealidade: “a) O educador é o que educa; os educandos os que são educados;[...] c) o educador é o que pensa; os educandos os pensados; [...] j) oeducador, finalmente é o sujeito do processo; os educandos meros objetos”(FREIRE, 1978, p. 67-68). Paulo Freire analisa o processo com a negação dohumanismo e da dialogicidade: “Na verdade a manipulação e a conquista,expressões da invasão cultural, e ao mesmo tempo instrumentos para mantê-

la, não são caminhos de libertação. São caminhos de ‘domesticação’”(FREIRE, 1980, p. 43).O processo de libertação consiste em transformar a domesticação emcaminho de conscientização: à medida que surge a consciência dacontradição, esta deve despertar para um processo de descoberta de si mesmoe do mundo: “A sua ‘domesticação’ e a da realidade, da qual se lhes falacomo algo estático, pode despertá-los como contradição de si mesmos e darealidade” (FREIRE, 1980, p. 70), ambos em processo e devenir constantes.Sendo que a domesticação é uma característica própria dos animais que nãotêm compreensão humana e, portanto, se submetem às condições impostas,Paulo Freire, praticamente, sempre emprega o termo entre aspas. Ela constituiuma negação do humano em sua plenitude. Aproxima-se do treinamento emque há uma reprodução mecanicista de atos sem consciência do seusignificado mais profundo.A indignação consiste na capacidade de superar a dominaçãodomesticaçãoconstruindo uma consciência e buscando a sua superação e aemancipação pessoal e social, transformando a realidade e lutando naesperança da construção de nova ordem e novas estruturas. “Enquanto serhumano jamais aceitei que minha presença e minha passagem por ele fossempreestabelecidas. A minha compreensão das relações entre subjetividade eobjetividade, consciência e mundo, prática e teoria foi sempre dialética e nãomecânica” (FREIRE, 2000, p. 89) . A domesticação é negação da subjetividadepois não permite a emergência do sujeito como agente criador etransformador da história. Nega-se intrinsecamente a própria dialética. “Atémesmo quando se pensa dialético, a sua é uma “dialética domesticada, comodiria Gurvitch. A domesticação torna alguém reacionário, pois “pretendefrear o processo, ‘domesticar’ o tempo e, assim, aos homens” (FREIRE, 2004,p. 220).Nos textos e no pensamento de Paulo Freire há conceitos elaborados apartir de outros autores como George Gurvitch, Hannah Arendt, Jean-PaulSartre, Franz Fanon e Antônio Gramsci, dentre outros.Referências: FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980;FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996; FREIRE, Paulo.Pedagogia da indignação. São Paulo: UNESP, 2000; FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 5. ed.Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1978; FREIRE, Paulo. Pedagogia da tolerância: São Paulo: Unesp, 2004.

la, não são caminhos de libertação. São caminhos de ‘domesticação’”

(FREIRE, 1980, p. 43).

O processo de libertação consiste em transformar a domesticação em

caminho de conscientização: à medida que surge a consciência da

contradição, esta deve despertar para um processo de descoberta de si mesmo

e do mundo: “A sua ‘domesticação’ e a da realidade, da qual se lhes fala

como algo estático, pode despertá-los como contradição de si mesmos e da

realidade” (FREIRE, 1980, p. 70), ambos em processo e devenir constantes.

Sendo que a domesticação é uma característica própria dos animais que não

têm compreensão humana e, portanto, se submetem às condições impostas,

Paulo Freire, praticamente, sempre emprega o termo entre aspas. Ela constitui

uma negação do humano em sua plenitude. Aproxima-se do treinamento em

que há uma reprodução mecanicista de atos sem consciência do seu

significado mais profundo.

A indignação consiste na capacidade de superar a dominaçãodomesticação

construindo uma consciência e buscando a sua superação e a

emancipação pessoal e social, transformando a realidade e lutando na

esperança da construção de nova ordem e novas estruturas. “Enquanto ser

humano jamais aceitei que minha presença e minha passagem por ele fossem

preestabelecidas. A minha compreensão das relações entre subjetividade e

objetividade, consciência e mundo, prática e teoria foi sempre dialética e não

mecânica” (FREIRE, 2000, p. 89) . A domesticação é negação da subjetividade

pois não permite a emergência do sujeito como agente criador e

transformador da história. Nega-se intrinsecamente a própria dialética. “Até

mesmo quando se pensa dialético, a sua é uma “dialética domesticada, como

diria Gurvitch. A domesticação torna alguém reacionário, pois “pretende

frear o processo, ‘domesticar’ o tempo e, assim, aos homens” (FREIRE, 2004,

p. 220).

Nos textos e no pensamento de Paulo Freire há conceitos elaborados a

partir de outros autores como George Gurvitch, Hannah Arendt, Jean-Paul

Sartre, Franz Fanon e Antônio Gramsci, dentre outros.

Referências: FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980;

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 6. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996; FREIRE, Paulo.

Pedagogia da indignação. São Paulo: UNESP, 2000; FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 5. ed.

Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1978; FREIRE, Paulo. Pedagogia da tolerância: São Paulo: Unesp, 2004.

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