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Manual de<br />

Ecografia Clínica Pulmonar<br />

Manual de apoio ao<br />

curso básico de ecografia pulmonar<br />

1ª edição - 2021


Índice<br />

Prefácio 3<br />

A ecografia clínica e o pulmão 4<br />

Princípios gerais 8<br />

Sinais semiológicos 15<br />

Síndromes intersticiais 23<br />

Consolidações 28<br />

Pneumotórax 35<br />

Derrame Pleural 41<br />

Dor pleurítica 47<br />

Via aérea 52<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 2


Prefácio<br />

(António Carneiro)<br />

É-me particularmente gratificante prefaciar este Manual dos Curso de Ecografia Pulmonar da Reanima.<br />

A Reanima é uma Associação sem fins lucrativos, dedicada à formação pós-graduada de Médicos e<br />

Enfermeiros desde 1997. As primeiras iniciativas da Reanima para incorporar a formação em ecografia<br />

clínica no seu portfólio remontam a 2005, mas os apoios previstos falharam e o projeto só se<br />

concretizou em 2015, quando José Pazelli (formador Winfocus Brasileiro) e o Miguel Montorfano<br />

(Argentino, à data Presidente da Winfocus Mundial) se envolveram pessoalmente neste projeto.<br />

A Reanima, assume a ecografia clínica como a 5ª dimensão do exame objetivo (observação, palpação,<br />

percussão, auscultação e agora ultrassons). A observação complementada pelas mãos que palpam e<br />

percutem são a base do exame objetivo desde Hipócrates. Há dois séculos atrás passou a ser possível<br />

auscultar e agora somos presenteados com a possibilidade de perscrutar para além da epiderme com<br />

recurso aos ultrassons e doppler. A semiologia ecográfica colhe-se ao lado do doente em função dos<br />

achados e das questões clínicas equacionadas nesse momento para essa situação. As quatro<br />

primeiras dimensões são preferencialmente sistematizadas por segmentos / sistemas e orientadas<br />

pela anamnese. A ecografia clínica mantém esses atributos, mas refina duas dimensões: 1º) Responde<br />

a questões concretas surgidas na avaliação semiológica – é preciso formular a questão: há líquido<br />

livre? o coração contrai normalmente? as veias colapsam com os movimentos respiratórios? as veias<br />

colapsam com a pressão? há linhas B no pulmão; 2º) É intermediada por aparelhos cujo manejo e<br />

utilização exigem treino, têm a sua curva de aprendizagem e evoluem em acelerado processo de<br />

miniaturização (bolso). O clínico treinado pode responder de imediato à questão que formulou e<br />

monitorizar a evolução nos casos em que tal se justifique.<br />

Neste contexto a Reanima estabeleceu um protocolo com a Winfocus Internacional, fundando a<br />

Winfocus Portugal (presidida pelo Nuno Cortesão) e posteriormente estabeleceu uma parceria para<br />

constituir a Winfocus Ibérica com envolvimento de Ramón Nogué e Tomas Villén.<br />

A estratégia da Reanima foi a mesma de todos os seus cursos com certificação internacional.<br />

Iniciamos o processo com cursos dirigidos e ministrados por formadores certificados. Treinamos e<br />

certificamos os nossos próprios formadores e passamos a fazer formação de formadores com<br />

certificação Winfocus. O Rui Barros, o Nuno Cortesão e o João Neves dinamizaram o processo,<br />

inicialmente com a colaboração dos imagiologistas Daniel Fonseca, Manuela Certo e Paulo Fonseca,<br />

e hoje a reanima tem 16 instrutores dispersos pelo País.<br />

O Manual de Ecografia Pulmonar, reflete a metodologia pedagógica da Reanima, a incorporação de<br />

formação à distância, a formação prática presencial e descentralizada, a oportunidade de tutoria para<br />

formandos que pretendam ver as suas competências certificadas e a ainda a criação de condições de<br />

certificação da competência pelo Winfocus.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 3


A ecografia clínica e o pulmão<br />

(Rui Barros)<br />

A ecografia clínica, exame efectuado no local de prestação de cuidados, realizado e interpretado pelo<br />

clínico e em tempo real, é a quinta dimensão do exame físico. Preferimos chamar-lhe ecografia clínica<br />

a usar o acrónimo internacional POCUS (“point-of-care ultrasonography”) porque nos parece ser este<br />

o termo que melhor resume as características e alcance de um exame efectuado pelo médico<br />

responsável pelo doente e orientado pela clinica.<br />

Hoje, o exame físico clássico integrando os dados da inspeção, palpação, percussão e auscultação,<br />

pode ser complementado com uma ferramenta poderosa capaz de aumentar a precisão de diagnóstico<br />

e de lhe acrescentar novos dados. Com a inclusão da ecografia como complemento da exploração<br />

física convencional, podemos não só ver por fora, ouvir e sentir, mas também ver por dentro e ver o<br />

que ouvimos. A ecografia clínica não vem substituir nenhum dos componentes do exame físico, mas<br />

complementá-los com mais informação, acrescentando sensibilidade e especificidade aos dados<br />

previamente recolhidos.<br />

À medida que os aparelhos se foram tornando mais portáteis, simples e baratos a ecografia pôde ser<br />

generalizada a qualquer médico e aplicada virtualmente em qualquer ambiente de prestação de<br />

cuidados, desde a consulta externa, à urgência, enfermaria ou cuidados intensivos. O ponto comum<br />

é ser realizada e interpretada pelo clínico, no momento da avaliação, ou seja em tempo real, e com o<br />

objectivo primário de esclarecer dúvidas que surjam durante essa avaliação.<br />

É um exame dirigido pela clínica e normalmente pretende responder a questões simples que exijam<br />

respostas dicotómicas como, por exemplo: tem ou não tem derrame, a estrutura observada é grande<br />

ou pequena, está ou não está dilatada, etc. Não dispensa nem substitui os exames convencionais de<br />

ecografia, que são diferidos para um tempo diferente e compreendem uma avaliação anatómica,<br />

funcional e mais detalhada dos órgãos avaliados.<br />

A confirmação de um problema ou de uma suspeita levantada na exploração convencional, durante a<br />

avaliação, em tempo real, permite a tomada de decisões imediatas que podem passar por atitudes<br />

terapêuticas urgentes, levar a uma orientação diferente na estratégia de diagnóstico e de requisição<br />

de exames complementares ou até na redefinição de níveis de monitorização adequados à situação<br />

encontrada.<br />

Sendo um exame não invasivo e com a possibilidade de ser repetido ao longo do tempo, permite uma<br />

monitorização dinâmica da evolução e da resposta às intervenções terapêuticas efectuadas.<br />

Este aspecto é particularmente útil no doente crítico em que as alterações anatomofuncionais em<br />

resposta ao tratamento são rápidas e a própria resposta condiciona a atitude seguinte, mas também<br />

o é no doente mais estável, onde a monitorização da resposta ao tratamento pode ser avaliada de<br />

forma mais frequente e mais precoce com o apoio da ecografia. A ecografia clínica é também útil no<br />

apoio às técnicas invasivas, tornando-as mais seguras e eficazes, mas a sua utilidade estende-se para<br />

lá do momento do procedimento. Ela permite não só confirmar o sucesso da intervenção, mas também<br />

verificar a presença de complicações e, se presentes, a sua monitorização.<br />

Não menos importante, a ecografia clínica potencia a aproximação do médico ao doente. Ao contrário<br />

de muitas outras evoluções tecnológicas aplicadas à saúde, em que o médico se encerra na própria<br />

execução do exame ou procedimento e utiliza-o com frequência como barreira na relação médicodoente,<br />

a ecografia obriga o clínico, muitas vezes pressionado pelo tempo e sem disponibilidade para<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 4


se ocupar dos pequenos detalhes do exame físico e da anamnese, a regressar ao seu doente,<br />

aplicando o tempo necessário à realização do exame a rever pequenos detalhes da história clínica, a<br />

revisitar alguns dados esquecidos ou que escaparam à inspeção ou palpação, ou apenas a conversar,<br />

reforçando a relação e a confiança.<br />

Quando aplicada ao pulmão, a ecografia clínica é uma técnica fácil de aprender com uma curva de<br />

aprendizagem rápida. Baseia-se na identificação e interpretação de sinais simples, que são na sua<br />

maioria artefactos resultantes da relação entre o conteúdo de ar e de líquido dentro do pulmão.<br />

Noutros casos são imagens reais, fáceis de adquirir e de interpretar. É uma técnica simples que usa<br />

aparelhos simples, sondas simples e processamentos de imagem pouco complexos, idealmente sem<br />

filtros para magnificar os artefactos. Após um curto período de treino certificado, pode ser efectuada<br />

de forma segura e com um elevado grau de concordância entre peritos e não peritos. Durante o treino,<br />

o operador deve ter sempre presente o contexto clínico, as perguntas que pretende ver respondidas<br />

com a ecografia e uma boa execução técnica, por forma a obter as melhores imagens possíveis. Por<br />

seu lado, a aquisição da imagem depende sempre das características ecográficas do doente e das<br />

características do equipamento a ser utilizado,<br />

Como ferramenta de diagnóstico na patologia pulmonar tem a vantagem de ser um exame barato,<br />

facilmente disponível, de execução rápida e livre de radiações, que pode ser utilizado em<br />

complemento ou em substituição dos exames radiológicos convencionais (radiografia e TC). É útil no<br />

diagnóstico de patologias frequentes como, por exemplo, o pneumotórax, derrames pleurais livres e<br />

loculados, pneumonias, atelectasias, fibrose pulmonar, insuficiência cardíaca e embolia pulmonar,<br />

possuindo para muitas destas patologias, alta sensibilidade e especificidade. Permite avaliar e<br />

monitorizar o grau de congestão pulmonar, útil no tratamento da insuficiência cardíaca, na<br />

hemodiálise ou na avaliação hemodinâmica do doente critico. Permite complementar técnicas<br />

invasivas com visualização direta de estruturas como por exemplo na toracocentese, colocação de<br />

cateter venoso central ou entubação traqueal, diminuindo o risco de complicações e facilitando o seu<br />

diagnóstico precoce quando acontecem, como, por exemplo, a presença de hemotórax após<br />

colocação de cateter central ou de pneumotórax após toracocentese. Como complemento à entubação<br />

traqueal permite o diagnóstico imediato de entubação esofágica e estimar a adequação da<br />

profundidade da entubação, identificando precocemente a presença de entubação selectiva. Em 2012<br />

a primeira conferência de consenso internacional levou à publicação de recomendações para o uso<br />

de ecografia clínica pulmonar.<br />

É importante reconhecermos as suas limitações. Um tempo de treino adequado e certificado que<br />

permita a aquisição da técnica e da competência na interpretação dos dados é fundamental. Alguns<br />

aspectos na execução do exame não estão padronizados nem são ainda consensuais como, por<br />

exemplo, a definição das zonas torácicas a avaliar, a metodologia do exame, o tipo de sonda a usar e<br />

o processamento da imagem. Sendo uma técnica com alta sensibilidade para algumas patologias mais<br />

frequentes, pode levar à identificação de achados com significado clínico incerto e consequente<br />

sobrediagnóstico e sobretratamento. Por outro lado, a falta de experiência na interpretação de um<br />

exame aparentemente simples, pode levar à uma noção falsa de domínio da técnica e de segurança,<br />

e condicionar erros de diagnóstico e subdiagnósticos, sobretudo quando o clínico executa o exame<br />

com baixo nível de treino e sem tutoria.<br />

O exame pulmonar, à semelhança do que acontece em todo o âmbito da ecografia clínica, é integrador,<br />

sempre dirigido pela clínica. A sua análise é condicionada pelos restantes dados recolhidos na<br />

avaliação, incluindo se possível, a avaliação ecográfica de outros órgãos. Esta avaliação<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 5


multiorgânica inclui para a maioria das patologias pulmonares a integração de dados do coração e do<br />

sistema vascular periférico.<br />

Questões relacionadas com o controlo da infecção hospitalar, nomeadamente a limpeza e desinfecção<br />

dos aparelhos devem ser equacionadas quando se pretende a generalização de exames realizados<br />

por aparelhos partilhados por diferentes doentes e profissionais de saúde, muitas vezes em cenários<br />

com alto risco de aquisição e transmissão vírus e de bactérias multirresistentes.<br />

Atualmente, o uso generalizado da ecografia clínica por médicos de diferentes especialidades, após<br />

formação e treino adequados, desmistificou a noção de que a ecografia é uma técnica restrita a<br />

peritos. Cardiologistas, ginecologistas, obstetras, urologistas e mais recentemente emergencistas,<br />

intensivistas, cirurgiões, anestesistas e internistas modificaram o papel da ecografia, ampliando as<br />

suas aplicações ao doente crítico e não crítico, médico ou cirúrgico, independentemente da patologia.<br />

Esta generalização estende-se à formação pré e pós graduada. A visualização direta de um órgão ou<br />

estrutura permite complementar o ensino da anatomia e da fisiologia transformando a ecografia numa<br />

poderosa ferramenta de ensino nas disciplinas basilares da formação médica. Aplicada ao sistema<br />

respiratório, permite uma melhor compreensão da ventilação, da função diafragmática, da<br />

fisiopatologia dos síndromes intersticiais, das consolidações e atelectasias. Permite ainda<br />

compreender melhor as relações anatómicas e funcionais do pulmão com os órgãos intra-abdominais,<br />

diafragma e sistema cardiovascular. Como complemento do exame físico convencional é uma<br />

ferramenta de diagnóstico que pode alterar a forma como as gerações futuras vão aprender e exercer<br />

a medicina. Com este enorme potencial parece inevitável que as próximas gerações passem a usar a<br />

ecografia como a quinta dimensão do exame físico.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 6


Bibliografia<br />

Moore CL, Copel JA. Point-of-care ultrasonography. N Engl J Med 2011; 364:749-57.<br />

Mouratev G, Howe D, Hoppmann, et al. Teaching medical students ultrasound to measure liver size:<br />

comparison with experienced clinicians using physical examination alone. Teach Learn Med 2013;<br />

25:84-8<br />

Mayo PH, Copetti R, Feller-Kopman D, Mathis G, Maury E, Mongodi S, Mojoli F, Volpicelli G, Zanobetti<br />

M. Thoracic ultrasonography: a narrative review. Intensive Care Med 2019<br />

Volpicelli G. Lung sonography. Ultrasound Med 2013; 32:165–171<br />

Solomon SD, Saldana F. Point-of-care ultrasound in medical education - stop listening and look. N Eng<br />

J Med 2014;270: 1083-85<br />

Volpicelli G, Elbarbary M, Blaivas M, et al. International evidence-based recommendations for pointof-care<br />

lung ultrasound. Intensive Care Med 2012; 38: 577–591<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 7


Princípios gerais<br />

(Luís Magalhães)<br />

Geração da imagem<br />

A ecografia é a representação gráfica dos sinais obtidos pela emissão e recepção de ultrassons<br />

através da superfície que queremos observar. Estes ultrassons são produzidos por um cristal<br />

piezoelétrico que se encontra no topo da sonda e são propagados ao longo do meio. Ao interagirem<br />

com as diversas estruturas, as ondas são refletidas de novo para a sonda, sendo posteriormente<br />

processadas de forma a gerarem a imagem que vemos no monitor.<br />

Esta imagem depende de dois fatores: características do feixe de ultrassons que utilizamos e<br />

características do meio que os ultrassons atravessam.<br />

a) Características do feixe de ultrassons:<br />

A sonda é a responsável pela emissão e recepção dos ultrassons. Estes ultrassons podem ter<br />

diferentes frequências, comprimentos de onda e amplitudes. A frequência é definida pelo número de<br />

ciclos da onda num segundo e medida em Hertz (Hz). Quanto maior a frequência, menor o<br />

comprimento de onda e maior a resolução, permitindo ver com mais “detalhe” as estruturas mais<br />

superficiais. Por outro lado, quanto menor a frequência, maior o comprimento de onda e maior a<br />

penetração nos tecidos, uma vez que perdem menos energia ao longo do percurso, permitindo ver em<br />

maior profundidade, mas com menor resolução. A amplitude é a altura máxima da onda, que traduz a<br />

intensidade do eco. Quanto maior a amplitude, mais brilhante ou branca aparece a imagem (figura<br />

2.1).<br />

Figura 2.1 - Características da onda: As ondas têm a mesma amplitude (medida em decibéis), mas frequências diferentes. A<br />

onda de cima tem uma frequência menor e comprimento de onda maior que a onda de baixo. A frequência mais alta permite<br />

distinguir os dois pontos brancos mais superficiais (maior resolução) mas penetra uma menor distância no tecido (menor<br />

profundidade) impedindo de ver o ponto preto.<br />

Além de possuírem frequências diferentes, as sondas diferem também na sua forma, principalmente<br />

na secção que entra em contacto com o doente, estando adaptadas à função que desempenham. As<br />

três sondas mais usadas estão representadas na figura 2.2:<br />

• Sonda linear (6-13MHz): superfície plana, alta frequência, adequada para vasos superficiais,<br />

via aérea superior, pleura e tecidos moles.<br />

• Sonda convexa (2-5MHz): também conhecida por sonda abdominal, superfície curvilínea, baixa<br />

frequência, adequada para abdómen e pulmão.<br />

• Sonda sectorial (1-5MHz): também conhecida por sonda cardíaca, superfície plana e<br />

quadrangular, baixa frequência, adequada para o coração.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 8


Todas as sondas possuem um marcador que se relaciona com uma marca no ecrã, facilitando a<br />

orientação.<br />

Figura 2.2 - Exemplos das 3 sondas mais utilizadas na ecografia clínica e, para cada uma, um exemplo da imagem obtida.<br />

b) Características do meio ecografado:<br />

Os ultrassons são refletidos de forma diferente consoante o meio (sólido, líquido ou gasoso) pelo qual<br />

se propagam, sendo a imagem gerada através das diferenças acústicas entre os tecidos justapostos.<br />

A impedância acústica é a resistência de um meio à propagação do feixe de ultrassons. Quanto mais<br />

denso é um objeto, maior a impedância acústica, originando uma maior reflecção de sons de volta<br />

para a sonda. Por exemplo, o osso é denso e, por esse motivo, reflete a maioria dos ultrassons que<br />

lhe chegam. Como a intensidade de retorno dos feixes de ultrassons (designada por brilho) é elevada,<br />

ele é processado na imagem como uma estrutura hiperecogénica (imagem “branca”), associado a<br />

uma região anecoica (“preta”) posterior, impossibilitando a aquisição de imagens abaixo do osso<br />

porque todos os ultrassons foram refletidos.<br />

Os meios líquidos têm baixa impedância, fazendo que poucos ecos sejam refletidos, o que se traduz<br />

por imagens hipoecoicas (“cinzento escuro”) no monitor. Estruturas mais heterogéneas, como o<br />

tecido muscular ou visceral, tendem a refletir mais ultrassons tendo, por isso, ecogenicidade<br />

intermédia entre o osso e o líquido. Exemplos de alguns meios podem ser vistos na figura 2.3.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 9


Figura 2.3 - A: imagem da parede torácica. As costelas (*) são identificáveis pela hiperecogenecidade superficial e cone de<br />

sombra profundo. Destaque também para a transição entre o tecido muscular e o pulmão, identificada pela linha hiperecoica<br />

designada de linha pleural (cabeça da seta); B: Tecido muscular e visceral (tiroide, “T”) hiperecoicos, em oposição ao vasos do<br />

pescoço (carótida, “C”, e jugular, “J”) que aparecem hipoecoicos.<br />

A geração da imagem é condicionada não só pela impedância acústica de uma determinada estrutura,<br />

mas também pelas diferentes interfaces acústicas (separações de estruturas com diferentes<br />

impedâncias acústicas).<br />

Quando o feixe de ultrassons passa por uma interface acústica ele pode sofrer um dos seguintes<br />

fenómenos que modificam a sua direção: reflexão, refração, difusão e absorção (figura 2.4).<br />

• Reflexão: parte das ondas são redirecionadas de volta para a fonte. A quantidade de energia<br />

refletida é diretamente proporcional à diferença de impedância entre as estruturas. Quando a<br />

diferença é muito grande, quase toda a energia é reflectida, originando uma interface<br />

hiperecoica (por exemplo entre os tecidos moles e o ar do pulmão, originando a linha pleural<br />

hiperecoica)<br />

• Refração: parte das as ondas são redirecionadas em pequenos ângulos quando atravessam<br />

fronteiras entre meios com diferentes impedâncias (por exemplo entre meios líquidos e<br />

sólidos).<br />

• Difusão: Dispersão dos ultrassons de forma aleatória em todas as direções quando encontram<br />

estruturas pequenas ou irregulares. Quando este fenómeno acontece de forma significativa,<br />

como no caso dos meios gasosos, deixamos de conseguir visualizar uma imagem real e<br />

passamos a ver artefactos.<br />

• Absorção: uma pequena parte da energia é absorvida pelo próprio meio, sendo transformada<br />

em energia térmica.<br />

Em determinadas circunstâncias, são representadas no monitor imagens que não correspondem à<br />

realidade “anatómica”. Chamamos a estes achados artefactos. A maioria dos artefactos afeta a<br />

qualidade de imagem, mas alguns podem conter informação importante, pelo que o seu<br />

reconhecimento é fundamental.<br />

A sombra acústica posterior é provocada quando uma estrutura com alta impedância acústica (ex.<br />

cálcio) impede a passagem dos ultrassons, criando uma imagem hiperecoica seguida por um cone<br />

anecoico posterior. Em sentido inverso, quando os ultrassons passam num meio que os transmite de<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 10


forma muito eficaz (fluídos), pode dar-se o reforço acústico posterior visível, por exemplo, quando<br />

observamos a bexiga repleta (figura 2.5).<br />

Imagens em espelho ocorrem quando os ultrassons encontram uma estrutura muito refletora que gera<br />

uma imagem profunda que é simétrica à imagem mais superficial (por exemplo, o fígado refletido no<br />

diafragma, figura 2.6).<br />

Figura 2.4 - A: reflexão dos ultrassons na linha pleural (seta amarela); B: refração dos ultrassons no diafragma (seta amarela);<br />

C: difusão dos ultrassons no parênquima pulmonar (setas amarelas).<br />

Figura 2.5 - Reforço acústico posterior (seta)<br />

Figura 2.6 - Imagem em espelho: os ultrassons atravessam<br />

o fígado e são reflectidos no diafragma, criando uma<br />

imagem em espelho do fígado abaixo do diafragma.<br />

Em especial na ecografia pulmonar, o artefacto mais importante a ter em conta é a reverberação. Esta<br />

acontece quando os sons são refletidos entre duas estruturas muito refletoras no plano exato da<br />

sonda, levando à formação de linhas paralelas ao longo do ecrã a uma distância fixa, designadas de<br />

linhas A. Estas podem ser visualizadas, por exemplo, no pulmão normal, em que os ultrassons são<br />

reflectidos entre a pleura e a sonda, originando as linhas A, que se repetem a espaços equidistantes,<br />

correspondendo esses espaços, à distância entre a sonda e a linha pleural. Um segundo exemplo de<br />

reverberação também visível no pulmão são as linhas B, um artefacto em cauda de cometa<br />

representado por linhas verticais hiperecoicas e possivelmente originadas pelos ultrassons presos<br />

na interface entre o ar e componente intersticial do parênquima pulmonar (figura 2.7).<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 11


Figura 2.7 - Artefactos de reverberação. A: Linha pleural (seta) e linhas A (pontas da seta) resultantes da reverberação na<br />

interface tecidos moles / ar. De notar que têm a mesma distância entre elas que a distância entre a sonda e a linha pleural; B:<br />

Linhas B (#) que se originam na linha pleural e se prolongam distalmente até ao final da imagem sem se extinguirem.<br />

Modos da ecografia<br />

Há 5 tipos de modos principais de representação dos ultrassons obtidos:<br />

• Modo B<br />

• Modo M<br />

• Doppler colorido<br />

• Doppler de amplitude<br />

• Doppler espectral<br />

O modo B, bidimensional ou 2D, é o modo que estamos mais familiarizados e consiste numa projeção<br />

a duas dimensões em tempo real da área observada. O modo M, ou “motion”, é utilizado para<br />

representar graficamente a variação das estruturas num determinado plano ao longo do tempo (figura<br />

2.8). O efeito doppler é observado quando um objeto está em movimento em relação ao observador,<br />

permitindo representar o seu movimento no ecrã. No Doppler colorido, o ecógrafo atribui uma cor<br />

consoante a estrutura se está a mover na direção da sonda ou a afastar da sonda (habitualmente<br />

vermelho e azul, respectivamente, devendo-se confirmar a correspondência das cores na escala)<br />

(figura 2.9).<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 12


Figura 2.8 - Modo M sob a linha pleura e parênquima<br />

pulmonar. Em cima, uma imagem em Modo B com uma linha<br />

vertical a demarcar o plano que está a ser registado e, em<br />

baixo, o gráfico da variação das estruturas ao longo do tempo<br />

naquele plano.<br />

Figura 2.9 - Doppler de cores sobre a artéria carótida. A cor<br />

vermelha representa o sangue a mover-se em direção à<br />

sonda.<br />

Ajustes da imagem<br />

Para melhorar a qualidade da imagem obtida, existem alguns parâmetros que podem ser otimizados<br />

nos diversos aparelhos.<br />

A profundidade determina até quantos centímetros são visualizados no monitor (figura 2.10). A<br />

profundidade ideal varia consoante o que estamos a observar, mas como regra, a estrutura que<br />

queremos identificar deve ficar no meio da imagem. Devemos incluir outras estruturas que possam<br />

ser do interesse (por exemplo, incluir na imagem a artéria carótida quando queremos abordar a veia<br />

jugular). A profundidade é habitualmente representada em centímetros desde a superfície da sonda e<br />

pode ser verificada na régua presente no bordo lateral do monitor.<br />

Figura 2.10 - Vasos do pescoço em diferentes profundidades. A imagem da esquerda encontra-se demasiado superficial<br />

(perdemos a noção das estruturas envolventes), enquanto a imagem do meio está demasiado profunda (as estruturas que<br />

queremos analisar ocupam uma porção muito pequena do ecrã). A imagem da direita mostra uma profundidade adequada para<br />

os vasos do pescoço.<br />

Outra variável que podemos alterar é o ganho. Este parâmetro ajusta o brilho sem alterar a resolução<br />

da imagem (figura 2.11). Alguns aparelhos permitem manipulações mais finas no ganho, dividindo o<br />

monitor em duas ou mais secções e permitindo ajustes de forma sectorial, ou seja, apenas num dos<br />

sectores da imagem.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 13


Figura 2.11 - Fígado em diferentes ganhos. A imagem da esquerda tem ganho aumentado e a da direita ganho diminuído.<br />

As sondas mais modernas são extremamente complexas e incluem mecanismos para melhorar a<br />

qualidade das imagens e diminuir os artefactos. Estes filtros vêm habitualmente ativos por definição<br />

e são úteis em diversos cenários, mas podem ser um obstáculo à nossa observação, principalmente<br />

na ecografia do pulmão que depende da geração e análise de artefactos. Assim, é importante aprender<br />

a desligar estes filtros no nosso aparelho para melhorar a qualidade de imagem em função do nossos<br />

objectivos. São exemplos o Multibeam (MB) e o Tissue Harmonic Imaging (THI).<br />

Conclusão<br />

A sonda emite um feixe de ultrassons que interatua com as estruturas a observar, recebe-o de volta<br />

(reflexão) e processa a imagem. As propriedades físicas dos feixes de ultrassons (frequência,<br />

comprimento de onda e amplitude), dos tecidos (impedância acústica) e a interface entre diferentes<br />

tecidos (interfaces acústicas) determinam modificações no feixe de ultrassons que condicionam os<br />

ecos recuperados e processados na imagem final.<br />

Os artefactos surgem porque a velocidade do feixe de ultrassons não é constante e a reflexão não é<br />

linear. Na ecografia pulmonar a análise e a interpretação dos artefactos é muito importante,<br />

principalmente os artefactos de reverberação, responsáveis pela formação das linhas A e B.<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 14


Sinais semiológicos<br />

(Luís Magalhães)<br />

Limitações da ecografia pulmonar<br />

Classicamente o tórax era considerado como uma região onde a ecografia tinha poucas<br />

potencialidades. As estruturas ósseas da parede torácica, ao absorverem e refletirem o feixe de<br />

utrassons, impedem a visualização das estruturas subjacentes. O ar, presente nos pulmões, dissipa<br />

os ultrassons impedindo a formação de uma imagem real e o gradiente de impedância formado ao<br />

nível da linha pleural, entre os componentes do espaço intercostal e o ar dentro do pulmão, condiciona<br />

uma reflexão da totalidade do feixe de ultassons a esse nível. Estes fenómenos impossibilitam a<br />

formação de uma imagem com correspondência anatómica ao parênquima pulmonar e foram<br />

considerados, durante muitos anos, limitações impeditivas da utilização da ecografia para o<br />

diagnóstico de patologia pulmonar. No entanto estas limitações podem ser ultrapassadas:<br />

A caixa torácica: O pulmão é um órgão intratorácico protegido pela caixa torácica e, por este motivo,<br />

parte do pulmão não está diretamente acessível à ecografia. Esta limitação pode ser parcialmente<br />

ultrapassada através do posicionamento da sonda, colocando-a paralela os espaços intercostais e<br />

usando movimentos de basculação. Nos doentes colaborantes, os movimentos respiratórios forçados<br />

permitem mover o pulmão sob o espaço intercostal, aumentando a área acessível à ecografia. Assim,<br />

pelo menos 70% da superfície pulmonar é acessível à ecografia, sendo os pontos de mais difícil<br />

acesso aqueles que se encontram profundos à omoplata, ao esterno e adjacentes à coluna vertebral.<br />

A presença de ar no pulmão: O ar é o principal constituinte do pulmão e tal como descrito<br />

anteriormente a sua presença impede a visualização direta do parênquima pulmonar por fenómenos<br />

de difusão e reflexão.<br />

O reconhecimento de que o ar produz artefactos ecográficos e que a interação entre o componente<br />

gasoso e não gasoso do pulmão, dependendo da proporção relativa de cada um deles, pode produzir<br />

diferentes artefactos, é o conceito basilar da ecografia pulmonar. Os diferentes artefactos produzidos<br />

por esta interação traduzem indiretamente (porque não são imagens reais), o estado do pulmão<br />

subjacente e podem ser usados como ferramentas de diagnóstico. Quando a proporção relativa do<br />

componente não gasoso vai aumentando, os artefactos vão-se modificando. À medida que a<br />

densidade do parênquima pulmonar aumenta, os feixes de ultrassom passam a conseguir penetrar na<br />

profundidade do pulmão podendo, a partir de um determinado nível de densidade, passar a produzir<br />

imagens reais, de maneira semelhante ao que acontece nos órgãos sólidos. A ecografia é, deste modo,<br />

usada como um sensor da densidade pulmonar, um verdadeiro “densitómetro”.<br />

Exame de superfície: Devido à dispersão dos ultrassons aquando da interface com o meio gasoso, a<br />

ecografia pulmonar não consegue identificar patologia que afete exclusivamente o parênquima<br />

pulmonar profundo. Basta haver uma pequena quantidade de pulmão normalmente arejado entre a<br />

superfície pleural e uma qualquer lesão, que esta não será visível, independentemente da sua<br />

etiologia. Apenas a patologia que toca a pleura é detectável na ecografia pulmonar.<br />

Esta limitação é minimizada na prática clínica, uma vez que a maioria da patologia pulmonar aguda<br />

afeta, de alguma forma, as zonas mais periféricas do pulmão e a pleura.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 15


Semiologia da ecografia pulmonar<br />

A avaliação do pulmão centra-se em duas regiões principais: a pleura e o parênquima pulmonar, e é<br />

complementada pela avaliação de outras estruturas anexas, tais como o diafragma.<br />

Linha Pleural:<br />

Percorrendo a imagem ecográfica partindo superfície da sonda para a profundidade, podemos<br />

identificar primeiro as estruturas mais superficiais da parede torácica (tecido subcutâneo e músculo),<br />

depois as costelas e, num plano ligeiramente mais profundo em relação à superfície das costelas, uma<br />

linha hiperecoica que percorre a imagem entre as duas costelas adjacentes, designada de linha<br />

pleural, que marca a interface entre os tecidos e o ar intratorácico (figura 3.1). Esta linha corresponde<br />

ao local anatómico da pleura parietal e é originada pela diferença das impedâncias acústicas (sólido /<br />

gasoso) nesse local. Abaixo desta linha são visíveis os artefactos ou outros achados que caracterizam<br />

a ecografia pulmonar.<br />

Figura 3.1: Aspeto ultrassonográfico do pulmão com uma sonda linear, mostrando o espaço intercostal, a linha pleural entre<br />

duas costelas e as linhas A<br />

Linhas A e Padrão A:<br />

No pulmão normal (mas não exclusivamente neste) são características as linhas A (figura 3.1). São<br />

linhas hiperecoicas perpendiculares ao eixo dos ultrassons que aparecem abaixo da linha pleural, à<br />

mesma distância que separa a sonda da linha pleural e equidistantes entre elas. Estas linhas são o<br />

resultado de um artefacto de reverberação dos ultrassons entre a linha pleural e a superfície da sonda.<br />

Sempre que os ultrassons são refletidos na superfície pleural em direção à sonda, são interpretados<br />

pelo aparelho como uma nova linha pleural, equidistante e abaixo da precedente. A identificação de<br />

linhas A é totalmente dependente do operador: o feixe de ultrassons tem de incidir perpendicular à<br />

superfície pleural para que os ultrassons refletidos regressem à sonda, de forma a provocarem este<br />

artefacto. Devem fazer-se pequenas angulações até à aquisição otimizada da imagem. A sua presença<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 16


sinaliza a existência de ar, mas não distingue se o ar se encontra na cavidade pleural ou dentro do<br />

pulmão.<br />

Deslizamento Pulmonar:<br />

No pulmão normal e em ventilação, a pleura visceral move-se sob a pleura parietal. Este movimento<br />

das pleuras origina um sinal ecográfico designado de deslizamento pleural, caracterizado por um<br />

trémulo horizontal da linha pleural, que pode ser melhor observado usando uma sonda de alta<br />

frequência e com os ganhos diminuídos. A presença deste sinal garante que existe uma aposição das<br />

duas pleuras, ou seja, não existe ar ou líquido entre elas, e que há ventilação.<br />

A presença de deslizamento pleural com linhas A subjacentes constitui o Padrão A, que é o padrão<br />

observado no pulmão normal. No entanto, este padrão não exclui patologia, nomeadamente doença<br />

das vias aéreas (ex. asma, doença pulmonar obstrutiva crónica) ou doença vascular (ex. embolia<br />

pulmonar).<br />

Pulso pulmonar e ponto pulmonar:<br />

Há outros dois sinais relacionados com a linha pleural com importância semiológica. O pulso<br />

pulmonar é um movimento pulsátil ritmado com os batimentos cardíacos que traduz a transmissão da<br />

pulsatilidade do coração e grandes vasos através do pulmão até à superfície pleural (vídeo 3.1). A sua<br />

presença indica que a pleura visceral e a pleura parietal estão justapostas e, consequentemente, que<br />

o pulmão está expandido e que não existe ar ou líquido entre as pleuras na zona avaliada. O ponto<br />

pulmonar é um ponto de intersecção sobre a linha pleural que separa a presença e ausência de<br />

deslizamento (vídeo 3.2). Isto acontece no ponto de separação da pleura visceral com a pleura parietal<br />

na presença de pneumotórax parcial. Assim, a sua identificação afirma o diagnóstico de pneumotórax.<br />

Vídeo 3.1: Pulso pulmonar. A linha pleura possui um<br />

movimento ritmado, pulsátil, que acompanha os batimentos<br />

cardíacos.<br />

Vídeo 3.2: Ponto pulmonar. Na metade esquerda da imagem<br />

existe deslizamento da linha pleural enquanto na metade<br />

direita a linha pleural está fixa. A intersecção dos dois pontos<br />

corresponde ao ponto pulmonar<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 17


Linhas B e Padrão B ou síndrome intersticial:<br />

Quando a percentagem de ar no pulmão diminui o padrão A é substituído por outro tipo de artefactos.<br />

O Padrão B ou síndrome intersticial é caracterizado pelo aumento do componente não gasoso no<br />

interstício pulmonar mantendo-se, no entanto, algum conteúdo de ar no espaço alveolar. Esta<br />

modificação do conteúdo intersticial permite a formação de um artefacto de reverberação vertical<br />

distinto, designado de linhas B (figura 3.2). As linhas B são caracterizadas por um feixe hiperecoico<br />

vertical que se estende desde a linha pleural até ao fundo do ecrã sem se extinguir, que se move<br />

sincronamente com a pleura e que apaga as linhas A (vídeo 3.3).<br />

A presença de múltiplas linhas B define o Padrão B ou síndrome intersticial. O número de linhas B<br />

aumenta à medida que aumenta a proporção do componente não gasoso presente no interstício<br />

pulmonar. Uma ou duas destas linhas B podem ser vistas em doentes saudáveis, principalmente em<br />

zonas pendentes do pulmão, sem significado patológico. A presença de três ou mais linhas B por<br />

campo deve ser considerada patológica.<br />

*<br />

*<br />

*<br />

*<br />

Figura 3.2: Múltiplos artefactos de reverberação verticais<br />

que se originam na linha pleural e se propagam até ao final<br />

da imagem, designadas linhas B (asteriscos), constituindo<br />

o padrão B ou síndrome alveolointersticial<br />

Vídeo 3.3: Padrão B. As linhas B são artefactos verticais com<br />

origem na linha pleural, que acompanham o movimento da<br />

linha pleural, percorrem todo o campo da imagem sem se<br />

extinguir e apagam as linhas A<br />

Linhas E e Linhas Z:<br />

As linhas E e linhas Z são dois tipos distintos de artefactos que pelas suas características podem ser<br />

confundidas com as linhas B.<br />

As linhas E são formadas na presença de enfisema subcutâneo. São também linhas verticais que, ao<br />

contrário das linhas B, não se originam na linha pleural mas sim no tecido subcutâneo, apagam a linha<br />

pleural e não acompanham o movimento da linha pleural.<br />

As linhas Z são artefactos verticais sem conotação patológica, frequentemente identificadas em<br />

exames normais. Diferenciam-se das linhas B porque são menos hiperecoicas que a linha pleural, são<br />

mal definidas, desvanecem na profundidade em alguns centímetros (2-4cm) e não apagam as linhas<br />

A.<br />

Padrão C, de consolidação ou síndrome alveolar:<br />

A substituição progressiva do componente gasoso pode levar ao preenchimento alveolar, ficando<br />

essa área praticamente sem ar. Nesta situação os ultrassons penetram na profundidade do pulmão e<br />

são refletidos (em vez de dissipados), fazendo com que o pulmão seja visível como uma imagem real<br />

e anatómica, correspondente à consolidação (figura 3.3 e vídeo 3.4).<br />

Dentro da consolidação podem existir áreas de aspeto ramificado, hiperecoicas (broncogramas<br />

aéreos) ou hipoecoicas (broncogramas líquidos) que traduzem a presença de ar ou liquido<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 18


espetivamente dentro dos brônquios rodeados por pulmão afetado. Na consolidação pneumónica,<br />

ao contrario da atelectasia, o volume pulmonar está mantido, a imagem é mais hiperecoica e irregular<br />

(por existir mais ar) e podem existir broncogramas aéreos dinâmicos (movimento de ar dentro dos<br />

brônquios não colapsados acompanhando os movimentos respiratórios). Habitualmente em redor das<br />

consolidações, podemos identificar um padrão B que se transforma em padrão A à medida que nos<br />

afastamos do processo pneumónico.<br />

Figura 3.3: Acima do diafragma podemos ver que o pulmão<br />

adquire uma ecogenecidade semelhante à do baço,<br />

representando o padrão C ou de consolidação. De notar a<br />

presença de focos hiperecoicos dentro da consolidação,<br />

compatíveis com presença de ar podendo formar<br />

broncogramas aéreos (seta).<br />

Vídeo 3.4: Consolidação pneumónica sobre o diafragma.<br />

Padrão C com broncograma aéreo dinâmico. Á periferia da<br />

lesão o padrão C transforma-se em padrão B. Adjacente à<br />

pneumonia identifica-se pequena quantidade de derrame<br />

pleural<br />

Derrame pleural:<br />

Os derrames pleurais são facilmente identificados usando a ecografia. O líquido aparece como uma<br />

área anecoica ou hipoecoica entre a pleura, o pulmão e o diafragma (figura 3.4). Tal como as<br />

consolidações, estas imagens não constituem artefactos, mas sim imagens reais. A ecogenecidade<br />

do líquido, bem como a presença de septos, pode dar indicações sobre as suas características (livre<br />

ou locudado; transudado, exsudado ou empiema) (vídeo 3.5). A ecografia pode ainda auxiliar na<br />

localização, quantificação e definição do local mais adequado para a abordagem invasiva do espaço<br />

pleural.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 19


Técnica do exame pulmonar<br />

A avaliação é feita varrendo todo o campo pulmonar com a sonda à procura de alterações, quer na<br />

sua face anterior, lateral ou posterior. Cada hemitórax pode ser dividido em 6 áreas conforme a figura<br />

3.5, com o objetivo de facilitar a descrição e comunicação dos achados. As regiões P1 e P2 são<br />

separadas da P3 e P4 pela linha axilar anterior e estas últimas da P5 e P6 pela linha axilar posterior.<br />

Nos doentes estáveis a posição sentada pode ajudar a observar as bases pulmonares e as regiões<br />

posteriores. Já no doente crítico, estamos muitas vezes limitados ao decúbito dorsal, pelo que somos<br />

obrigados a rodar ligeiramente o doente (se possível) para observar as regiões posteriores.<br />

Figura 3.5: Localização das 6 zonas para descrição da ecografia pulmonar. A sonda deve ser colocada perpendicularmente à<br />

pleura e aos espaços intercostais.<br />

A pleura é uma estrutura superficial, melhor caracterizada utilizando uma sonda de alta frequência. Já<br />

para a avaliação do parênquima pulmonar, necessitamos de ter uma maior profundidade, pelo que<br />

uma sonda de menor frequência, como a convexa, é mais indicada. Com esta sonda é mais fácil detetar<br />

os artefactos e padrões descritos, bem como evitar alguns erros de localização. A sonda deve ser<br />

orientada com o marcador para a zona cefálica, atravessando perpendicularmente os espaços<br />

intercostais e fazendo um ângulo reto com a pleura, de modo a maximizar os artefactos de<br />

reverberação.<br />

Figura 3.4: Derrame pleural hipoecóico delimitado pelo Vídeo 3.5: Adjacente a uma zona com padrão C - consolidação<br />

diafragma, pulmão e parede torácica. O pulmão apresenta-se - identifica-se a presença de derrame pleural com múltiplos<br />

consolidado, em provável relação com atelectasia passiva<br />

Uma vez que o pulmão está dentro da caixa torácica, septos, a principal aspeto característico referência do anatómica derrame parapneumónico.<br />

que vamos ter<br />

pelo derrame.<br />

são os arcos costais. O exame deve começar sempre pela identificação de dois arcos costais<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 20


consecutivos e o respectivo espaço intercostal, com a linha pleural entre as duas costelas, a costela<br />

superior do lado do marcador do ecrã e a costela inferior no lado oposto. À imagem composta pelas<br />

duas costelas, respectivas sombras acústicas e espaço intercostal dá-se o nome de sinal do morcego<br />

ou “bat sign” (figura 3.1). A segunda referencia obrigatória a identificar é o diafragma, fundamental<br />

para nos garantir que estamos a avaliar estruturas intratorácicas. A sua identificação é<br />

particularmente útil quando estamos a analisar os campos inferiores, onde é fácil confundir artefactos<br />

ou imagens intra-abdominais e retroperitoneais com patologia pulmonar.<br />

Conclusões<br />

A semiologia da ecografia pulmonar é baseada na análises de artefactos gerados pela relação entre o<br />

componente gasoso e não gasoso do pulmão e a ecografia funciona como um densitómetro do<br />

pulmão. Podemos distinguir 3 padrões ecográficos: Padrão A, caracterizado pelas linhas A (padrão<br />

da normalidade), Padrão B ou síndrome intersticial, caracterizado pelas linhas B (diminuição do ar e<br />

aumento do líquido) e Padrão C, consolidação ou síndrome alveolar (substituição quase completa do<br />

ar por líquido).<br />

É importante reconhecer as principais limitações da ecografia pulmonar. Patologias que não<br />

aumentem o componente não gasoso não terão tradução ecográfica e lesões profundas, sem contacto<br />

com a pleura, não são visíveis pela ecografia pulmonar.<br />

O exame deve ser efetuado de forma sistematizada e orientado pela clínica, sendo as duas principais<br />

referências anatómicas a identificação da linha pleural no sinal do morcego e a identificação do<br />

diafragma.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 21


Bibliografia<br />

Volpicelli G. Lung sonography. J Ultrasound Med. 2013;32(1):165-71.<br />

Lichtenstein DA, Meziere GA. Relevance of lung ultrasound in the diagnosis of acute respiratory<br />

failure: the BLUE protocol. Chest. 2008;134(1):117-25.<br />

Volpicelli G, Elbarbary M, Blaivas M, Lichtenstein DA, Mathis G, Kirkpatrick AW, et al. International<br />

evidence-based recommendations for point-of-care lung ultrasound. Intensive Care Med.<br />

2012;38(4):577-91.<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 22


Síndromes intersticiais<br />

(Raquel Martins)<br />

Introdução<br />

As síndromes intersticiais são definidas como um conjunto de patologias heterogéneas que têm em<br />

comum entre si o facto de atingirem preferencialmente o interstício pulmonar. Estas doenças podem<br />

apresentar um curso crónico (ex. fibrose pulmonar) ou agudo (ex. insuficiência cardíaca, pneumonia<br />

intersticial), ter uma expressão mais difusa (ex. síndrome da dificuldade respiratória aguda, fibrose<br />

pulmonar) ou localizada (ex. contusão pulmonar, pneumonia). Nestas patologias, o processo<br />

patológico intersticial provoca o espessamento dos septos interlobulares, seja por edema<br />

(hidrostático ou inflamatório), seja por fibrose, permitindo uma propagação do feixe de ultrassom em<br />

profundidade, de uma forma diferente do que acontece habitualmente no pulmão normal. Tal resulta<br />

no aprisionamento das ondas no espaço intersticial, provocando artefactos de reverberação que se<br />

traduzem pela formação de linhas B ou sinal do cometa - que são linhas verticais hiperecoicas, bem<br />

definidas, originadas na pleura e que se movem de forma síncrona com o deslizamento pleural,<br />

prolongando-se até ao final do ecrã sem se desvanecerem, apagando as usuais e não patológicas<br />

linhas A à sua passagem (figura 4.1).<br />

Figura 4.1: Ecografia pulmonar onde se identifica o sinal do morcego (composto pela sombra da duas costelas ladeando a linha<br />

hiperecogénica pleural), uma linha A e uma linha B hiperecogénica e bem definida que se prolonga desde a linha pleural até ao<br />

final do ecrã, apagando a linha A à sua passagem.<br />

Estas linhas podem surgir em indivíduos saudáveis (frequentemente visíveis nas bases pulmonares),<br />

mas quando se apresentam em número igual ou superior a 3 num único espaço intercostal<br />

(constituindo assim o denominado padrão B) apresentam grande sensibilidade e especificidade para<br />

patologia com envolvimento do interstício pulmonar. Efetivamente já vários estudos mostraram que<br />

a ultrassonografia pulmonar tem precisão superior à radiografia e semelhante à TC torácica para o<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 23


diagnóstico de síndrome intersticial, com a vantagem em relação a este último de não ter radiação,<br />

ser mais barata e executável à cabeceira do doente.<br />

Aspetos técnicos<br />

Posição do doente: O exame pode realizado em decúbito dorsal ou sentado. No doente colaborante,<br />

a posição de sentado pode permitir uma avaliação mais detalhada e completa do padrão de<br />

distribuição. É importante lateralizar sempre o doente incapaz de se sentar, para avaliação das regiões<br />

posteriores.<br />

Escolha da Sonda: Devemos usar preferencialmente a sonda convexa (2-5MHz) pela capacidade de<br />

observar em maior profundidade e identificar outros sinais ou padrões concomitantes. A sonda linear<br />

pode ser uma opção quando se pretende uma melhor caracterização da pleura e artefactos por esta<br />

gerados. A sonda cardíaca permite uma melhor visualização de cada espaço intercostal<br />

individualmente, mas oferece uma visão menos global porque não inclui vários espaços em<br />

simultâneo na mesma avaliação.<br />

Otimização da imagem: Para caracterização das linhas B é importante programar uma profundidade<br />

de pelo menos 12 a 13cm de forma a garantir que essas linhas se prolongam até ao final do ecrã, sem<br />

se extinguir. É importante não confundir as linhas B com outras de aspeto semelhante. As linhas E<br />

são artefactos em cometa com origem acima da linha pleural e que não se movem com o ciclo<br />

respiratório; representam a presença de enfisema subcutâneo. As linhas Z são também artefactos em<br />

cometa que se desvanecem ao longo da tela sem apagar as linhas A e não possuem significado<br />

patológico. Devem ser feitos pequenos movimentos de basculação da sonda para otimizar a<br />

visualização da pleura e os artefactos por esta produzidos. Uma vez que as linhas B são artefactos,<br />

os aparelhos mais recentes e melhor equipados tendem a tentar corrigi-las. Para uma correta<br />

avaliação das linhas B devemos desativar os filtros e os ajustes automáticos de imagem (figura 4.2).<br />

Figura 4.2: Ecografia pulmonar demonstrando uma mesma linha B captada com os filtros de correção do ecógrafo ativos (à<br />

esquerda) e desativados (à direita), sendo a linha mais facilmente notada, e mais evidentemente distinguível como uma única<br />

linha B em vez de várias, quando observada sem filtros.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 24


Planos de aquisição: As imagens devem ser inicialmente adquiridas em posição longitudinal,<br />

identificado o Sinal do Morcego e posteriormente em posição transversal, para uma exploração mais<br />

detalhada de toda a extensão de cada espaço intercostal, procurando e caracterizando as linhas B em<br />

cada espaço. Estas só são valorizadas como patológicas se presentes num número superior a 3.<br />

Áreas a Explorar: Para um exame completo devem ser realizadas pelo menos 12 observações,<br />

correspondendo às seis zonas de avaliação (P1 a P6) em cada hemitórax (figura 3.5).<br />

Aplicação clínica<br />

Pelo previamente exposto facilmente se depreende a enorme utilidade da ecografia pulmonar, com<br />

pesquisa de padrão B, no apoio ao diagnóstico diferencial de múltiplas patologias respiratórias.<br />

As linhas B estão ausentes nas doenças que não interferem com o interstício (ex.: DPOC, asma,<br />

pneumotórax, tromboembolia pulmonar sem enfarte pulmonar) e presentes nas doenças que afetam<br />

o interstício por edema, inflamação ou fibrose.<br />

Quando presentes podemos classifica-las como difusas, se ocupam pelo menos duas áreas<br />

pulmonares ou envolvem ambos os hemitóraxes ou localizadas, se presentes em uma ou duas áreas<br />

limitadas a um hemitórax. Podemos ainda classificar o padrão de distribuição em gravitacional<br />

(predomínio nas áreas pendentes), homogéneo ou heterogéno. Esta caracterização pode auxiliar no<br />

diagnóstico diferencial: se o padrão for bilateral e difuso com carácter gravitacional é sugestivo de<br />

insuficiência cardíaca; se for bilateral e difuso de distribuição mais homogénea sugere fibrose<br />

pulmonar, enquanto um padrão difuso mas heterogéneo é característico da síndrome da dificuldade<br />

respiratória aguda (ARDS). Se localizado pode apontar para pneumonia, contusão pulmonar,<br />

atelectasia ou tromboembolia pulmonar com enfarte pulmonar. A associação a outros sinais e padrões<br />

ecográficos como a presença de derrames pleurais, irregularidades da linha pleural e consolidações<br />

subpleurais ajudará ainda mais no refinamento das hipóteses de diagnóstico.<br />

Em algumas patologias como, por exemplo, nas pneumonias, contusões pulmonares ou enfartes<br />

pulmonares periféricos, as linhas B podem representar o sinal mais precoce de doença pulmonar<br />

(figura 4.3).<br />

Figura 4.3: TC pulmonar de doente com pneumonia, a mostrar consolidação que apesar de muito próxima não chega a tocar a<br />

pleura (painel A) e ecografia pulmonar síncrona onde, apesar de ainda não se identificar consolidação, já são visíveis linhas B<br />

(seta verde) que apagam a linha A (seta rosa). 48h depois foi repetida ecografia na mesma localização (painel C), já com padrão<br />

de consolidação visível (estrela azul), uma vez que com o crescimento da consolidação esta passou a estar em contacto com<br />

a pleura a sua imagem passou a ser diretamente visualizável.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 25


A presença das linhas B serve não apenas para diagnóstico, mas também para monitorização, uma<br />

vez que a diminuição do seu número pode ser um sinal fidedigno da reposta ao tratamento. Por serem<br />

muito dinâmicas e rapidamente se alterarem, a sua avaliação semiquantitativa pode ser usada como<br />

indicador de resposta ao tratamento em diferentes patologias como a insuficiência cardíaca,<br />

hemodiálise, ARDS ou pneumonias (figura 4.4). A análise quantitativa parece também ser útil, contudo<br />

não foi ainda definido um método universalmente aceite de proceder à valorização do número e<br />

características das linhas B.<br />

Figura 4.4: Ecografia pulmonar de doente admitido com clínica de insuficiência cardíaca descompensada. À admissão (painel<br />

A) com múltiplas linhas B basais que na reavaliação após 24 horas de diurético endovenoso tinham desaparecido (painel B),<br />

passando a apresentar apenas linhas A.<br />

Conclusões<br />

A ecografia pulmonar demonstrou ser um método mais eficaz que a radiografia para a detecção de<br />

síndrome intersticial, parecendo ser comparável à TC pulmonar, mas de muito mais rápida e fácil<br />

execução e acessibilidade.<br />

A caracterização do padrão B relativamente à localização (focal vs difusa), distribuição (homogénea,<br />

heterogénea ou gravitacional) e a sua associação com outros sinais ecográficos (derrame pleural,<br />

consolidações, irregularidades pleurais), é uma ferramenta útil no diagnóstico diferencial da patologia<br />

respiratória. Demonstra ainda valor na monitorização da evolução e resposta ao tratamento.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 26


Bibliografia<br />

Lichtenstein D, Meziére G. Relevance of Lung Ultrasound in the Diagnosis of Acute Respiratory<br />

Failure: The BLUE Protocol. Chest. Jul 2008; 134 (1): 117-25<br />

Lichtenstein D. Novel approaches to ultrasonography of the lung and pleural space: where are we<br />

now? Breathe 2017; 13(2): 100–111<br />

Lichtenstein D et al. The comet-tail artifact. An ultrasound sign of alveolar-interstitial syndrome.<br />

American Journal of Respiratory and Critical Care Medicine. Nov 1997; 156(5):1640-6<br />

Volpicelli G. et al. Bedside lung ultrasound in the assessment of alveolar-interstitial syndrome. The<br />

American Journal of Emergency Medicine. Out 2006; 24(6):689-96<br />

Danish M. et al. Diagnostic Performance of 6-Point Lung Ultrasound in ICU Patients: A Comparison<br />

with Chest X-Ray and CT Thorax. Turkish Journal of Anaesthesiology and Reanimation. Ago 2019;<br />

47(4): 307–319<br />

Volpicelli G. et al. Bedside ultrasound of the lung for the monitoring of acute decompensated heart<br />

failure. The American Journal of Emergency Medicine. Jun 2008; 26(5):585-91.<br />

Torres-Macho, et al. Point-of-care ultrasound in internal medicine: A position paper by the ultrasound<br />

working group of the European federation of internal medicine. European Journal of Internal<br />

Medicine.<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 27


Consolidações<br />

(Nuno Cortesão)<br />

Introdução<br />

A B<br />

C<br />

Uma consolidação pulmonar identificada por ecografia caracteriza-se pela presença de uma imagem<br />

real, anatómica, de aspecto tecidular (semelhante aos órgãos sólidos) em íntima relação com a pleura<br />

e com ecogenicidade, dimensão e morfologia variáveis. Pode associar-se a diferentes causas como a<br />

pneumonia, atelectasia, enfarte pulmonar, tumores (benignos e malignos) e contusão pulmonar. A<br />

distinção entre estas diferentes entidades requer sinais ecográficos adicionais tais como a morfologia<br />

das margens da consolidação, a presença de linhas B à periferia da consolidação, a presença de<br />

broncograma (aéreo e/ou líquido) ou o padrão vascular no interior da consolidação.<br />

Localizam-se maioritariamente, e independentemente da etiologia, nas regiões posteriores e basais,<br />

facto explicado pela ação da gravidade. Naturalmente que há consolidações noutras áreas<br />

pulmonares, de distribuição não-gravitacional, em particular nas consolidações de causa<br />

infeciosa/inflamatória e traumática. Este facto justifica uma exploração sistemática de todas as áreas<br />

ecográficas pulmonares.<br />

Aspetos técnicos<br />

A execução de uma ecografia torácica para identificar consolidações obedece às regras gerais de<br />

manuseio técnico dos equipamentos. O correto posicionamento do doente, a escolha do tipo de sonda<br />

e a otimização da imagem são vertentes técnicas importantes para a obtenção de imagens de<br />

qualidade.<br />

Posição do doente: Idealmente o doente deve estar sentado uma vez que esta posição permite a<br />

exploração detalhada de todas as áreas torácicas. Porém, na doença aguda, a posição mais frequente<br />

é o supino, facto que dificulta a avaliação das áreas torácicas posteriores. Nestas condições, é<br />

importante avaliar, pelo menos, as regiões posterolaterais, lateralizando o doente com auxílio de uma<br />

terceira pessoa.<br />

Escolha da Sonda: A sonda mais útil na identificação de consolidações é a convexa pela melhor<br />

informação anatómica que fornece. A observação das consolidações, ao contrário dos restantes<br />

elementos semiológicos da ecografia pulmonar para os quais a maximização de artefactos é<br />

importante, beneficia da boa noção anatómica, quer sob o ponto de vista da lesão principal, quer na<br />

relação que estabelece com as restantes estruturas. Na presença de uma consolidação pneumónica,<br />

é importante saber se há broncograma aéreo dinâmico ou estático, broncograma líquido, abcesso<br />

intraparenquimatoso e identificar estruturas vasculares, factos só possíveis com bom detalhe<br />

anatómico. Nas consolidações neoplásicas, é importante saber se há invasão da parede torácica, da<br />

pleural parietal ou das estruturas ósseas. Neste caso, a sonda convexa tem também vantagens sobre<br />

a linear. Na presença de derrames parapneumónicos, o uso da sonda convexa favorece a observação<br />

das características do líquido, a sua quantificação e a identificação de sinais sugestivos de derrame<br />

complicado. Todos estes são exemplos da maior utilidade da sonda convexa quando comparada com<br />

a sonda linear. Esta última, é, contudo, uma alternativa válida sempre que o nosso interesse se centra<br />

em detalhes próximos da pleura/lesões periféricas (ex. análise vascular com doppler no caso de<br />

enfarte pulmonar ou neoplasia). Nestes contextos, o detalhe anatómico oferecido pela sonda linear<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 28


pode ser mais útil, em detrimento da amplitude do campo de observação obtido com uma sonda<br />

convexa.<br />

Otimização da imagem: A otimização da imagem durante a ecografia torácica obedece, de forma<br />

genérica, a 2 princípios: 1) Se o interesse é observar estruturas de expressão anatómica (como o caso<br />

das consolidações ou derrames pleurais), deve ser privilegiada uma parametrização que elimine<br />

artefactos e deve ser ajustada uma profundidade que permita uma boa amplitude de visualização.<br />

Geralmente a sonda convexa é mais adequada; 2) Se o interesse é observar padrões assentes em<br />

imagens artefactuais, geralmente gerados a pouca profundidade (linha pleural) o equipamento deve<br />

ser preparado para intensificar os artefactos (suspensão dos filtros e ajuste da predefinição, ambos<br />

dependentes das características de cada ecógrafo), reduzir a profundidade e otimizar a imagem a curta<br />

profundidade. A escolha da sonda deve recair na linear de alta frequência. Estas linhas gerais de<br />

orientação devem ser ajustadas ao doente em causa e às questões clínicas elencadas.<br />

Planos de aquisição: Na presença de uma consolidação, as imagens devem ser inicialmente<br />

adquiridas em posição longitudinal, identificado o Sinal do Morcego e, posteriormente, em posição<br />

transversal (paralelo ao espaço intercostal), para apreciar a totalidade da extensão da lesão. Em cada<br />

janela, deve manter-se a sonda fixa, durante 1 ciclo respiratório, para visualizar a inspiração e<br />

expiração.<br />

Áreas a Explorar: Na avaliação das consolidações, a exploração ecográfica deve abranger a totalidade<br />

das 6 áreas torácicas (1D a 6D e 1E a 6E). Na presença de dor pleurítica a observação ecográfica pode<br />

(e deve) começar pela zona das queixas. Já no caso das pneumonias, a sua localização não tem<br />

nenhuma preferência em particular, pelo que deve ser feita uma avaliação ecográfica sistemática,<br />

bilateral, de todas as áreas torácicas. Na suspeita de embolia/enfarte pulmonar ou de metástases<br />

pulmonares a sua localização preferencial é postero-inferior, pelo que estas áreas devem ser sempre<br />

avaliadas. Na dispneia aguda, em que geralmente o doente tem que estar sentado, se a exploração<br />

das áreas anteriores mostrar linhas B com um padrão simétrico, pode indiciar EAP. Portanto, se a<br />

condição do doente for estável, a ecografia clínica deve abranger, de forma sistemática, todas as áreas<br />

torácicas, bilateralmente. No doente agudo, no qual a primeira avaliação pretende apenas excluir com<br />

rapidez condições de risco de vida, a ecografia clínica pode abranger, preferencialmente, as áreas nas<br />

quais, com maior probabilidade, se encontrarão alterações patológicas, dependendo da suspeita<br />

clínica e da condição do doente.<br />

Aplicação clinica<br />

Na pneumonia a ecografia permite um diagnóstico mais precoce que a radiografia torácica e é mais<br />

sensível que esta a variações no tempo, facto que traz vantagem no seguimento dos doentes. O uso<br />

da ecografia clínica no diagnóstico de pneumonia da comunidade tem uma sensibilidade que varia de<br />

85% a 97% e uma especificidade que oscila entre 80% e 96%, com uma precisão de diagnóstico > 90%.<br />

Em associação com a auscultação pulmonar, a ecografia clínica tem um likelihood ratio positivo e<br />

negativo de 42.9 e 0.04, respetivamente. Ainda no âmbito do diagnóstico, o uso de ecografia permite<br />

identificar potenciais focos de complicação, nomeadamente abcessos ou derrame pleural. É<br />

importante realçar que a ausência de consolidação identificável na ecografia não exclui o diagnóstico<br />

de pneumonia, por 2 motivos: a pneumonia pode não ter expressão à periferia ou a pneumonia tem<br />

expressão à periferia, mas apenas sob a forma de linhas B (no contexto clínico adequado um padrão<br />

B pode fazer o diagnóstico de pneumonia).<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 29


Vídeo 5.1: Padrão C com imagens hiperecogénicas no seu<br />

interior, correspondentes a broncograma aéreo que, por se<br />

moverem de acordo com o ciclo respiratório, denomina-se<br />

broncograma aéreo dinâmico. Neste caso, associa-se<br />

também a derrame pleural.<br />

Vídeo 5.2: Linhas B, em número e espessura compatíveis<br />

com Padrão B, tradutor de síndrome alveolointersticial. No<br />

contexto clínico adequado, estes achados são compatíveis<br />

com pneumonia.<br />

A natureza inflamatória das pneumonias cria um espectro da proporção entre o conteúdo<br />

gasoso/conteúdo não-gasoso no pulmão afetado, que vai desde a consolidação ao síndrome<br />

alveolointersticial (padrão B) (figuras 5.1 e 5.2). Com frequência, há coexistência de diferentes padrões<br />

morfológicos, dispersos pelas diferentes zonas pulmonares, em ambos os pulmões. Nas fases mais<br />

inflamatórias da doença há substituição total do ar por inflamação/líquido, pelo que o pulmão assume<br />

uma ecoestrutura similar à do fígado (hepatização). Nas verdadeiras consolidações podem encontrarse<br />

brônquios preenchidos por ar, formando no interior da consolidação imagens hiperecogénicas<br />

punctiformes ou ramificadas (broncograma aéreo). Nas pneumonias, o broncograma aéreo é,<br />

tipicamente, dinâmico (vídeo 5.1), ou seja, as imagens hiperecogénicas sofrem modificação em<br />

relação com os movimentos respiratórios porque, nos brônquios arejados, o ar circula de acordo com<br />

o ciclo respiratório. O broncograma aéreo dinâmico é característico das pneumonias estando presente<br />

em 70 a 95% dos casos. De contrário, quando não há movimento do ar intra-brônquico, estamos<br />

perante broncograma aéreo estático (vídeo 5.3), mais característico das atelectasias reabsortivas, mas<br />

que também pode estar presente nas pneumonias. Quando os brônquios ficam preenchidos por<br />

líquido, passam a ter uma estrutura hipo/anecogénica denominada broncograma líquido (vídeo 5.4).<br />

As margens das consolidações pneumónicas são tipicamente irregulares, com o bordo inferior<br />

serreado ou esbatido, num continuum com áreas de linhas B de pulmão adjacente mais arejado (sinal<br />

de Shred) (vídeo 5.5). A vascularização pulmonar numa pneumonia está aumentada, embora com uma<br />

distribuição normal. Pelo contrário, no enfarte pulmonar vascularização está amputada enquanto nas<br />

neoplasias não tem uma distribuição anatómica anormal. Nas consolidações pneumónicas é<br />

importante identificar a presença de derrame pleural, visível em cerca de 50% dos casos, porque a sua<br />

presença reforça o diagnóstico e pode ser um sinal de complicação, em particular se identificarem<br />

septos de fibrina ou sinais de organização do líquido pleural (figura 5.1). Outra complicação<br />

identificável na ecografia são os abcessos pulmonares, caracterizados por zonas hipoecoicas fixas,<br />

de conteúdo homogéneo ou heterogéneo, localizadas no interior da consolidação.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 30


Vídeo 5.3: Padrão C, com broncograma aéreo que, por não se mover de acordo com o ciclo respiratório, se denomina<br />

broncograma aéreo estático.<br />

Vídeo 5.4: Padrão C com broncograma líquido expresso sob a forma de imagens anecogénicas, arredondadas, delimitadas<br />

por margens hiperecogénicas, correspondendo a planos axiais de brônquios preenchidos por material líquido. A distinção<br />

entre broncograma líquido e um vaso baseia-se numa parede mais espessa do brônquio (huperocogénico) e na presença de<br />

fluxo Doppler no caso do vaso.<br />

Vídeo 5.5: Padrão C com broncograma aéreo e margens irregulares, “desfiadas” (shred), para além das quais há um padrão B<br />

marcado, de acordo com a alteração ecográfica espectral que se espera encontrar num quadro inflamatório-infecioso.<br />

No enfarte pulmonar a ecografia clínica tem uma sensibilidade e especificidade, quando comparado<br />

com a TC torácica, que varia de 57% a 98% e de 82% a 95%, respetivamente. No enfarte pulmonar as<br />

consolidações são mais frequentes nas regiões inferiores e posteriores do tórax, mas todas as áreas<br />

devem ser exploradas. No caso de dor pleurítica associada, é desejável focar a avaliação nessa área.<br />

Os enfartes pulmonares originam habitualmente pequenas consolidações, com limites bem definidos,<br />

triangulares ou arredondadas, de base pleural (interrupção da linha pleural), sem broncograma aéreo<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 31


e com > 5mm de diâmetro. A vascularização pulmonar numa consolidação resultante de um enfarte<br />

pulmonar está diminuída ou ausente. Na suspeita de embolia pulmonar a avaliação deve ser<br />

complementada com ecocardiografia e exploração das grandes veias dos membros inferiores.<br />

As atelectasias assemelham-se às consolidações pneumónicas mas não possuem broncograma<br />

dinâmico. Associam-se frequentemente à presença de derrame pleural com movimento sinusoidal da<br />

ponta do pulmão atelectasiado. A ventilação artificial com pressão positiva reduz ou elimina a<br />

presença de broncogramas aéreos dinâmicos, pelo que dificulta o diagnóstico diferencial entre<br />

pneumonia e atelectasia. Na ausência destes aspectos diferenciadores, o enquadramento clínico é<br />

decisivo no seu diagnóstico diferencial.<br />

As neoplasias, primárias ou metastáticas, manifestam-se, sob o ponto de vista ecográfico, por um<br />

padrão C, denso, sem broncograma, de limites bem definidos e com uma estrutura vascular anómala<br />

e irregular. Pode, inclusivamente, associar-se a sinais de invasão de estruturas ósseas (no caso, as<br />

costelas), com perda da linha perióstea e associar-se a derrame pleural metastático.<br />

A<br />

B<br />

Figura 5.1 (A) Derrame pleural com septos/locas de fibrina, atestando a sua natureza exsudativa. (B): Derrame pleural com<br />

septos espessos, adesivos à superfície diafragmática.<br />

Para alguns doentes o uso da ecografia no diagnóstico de consolidações parenquimatosas surge<br />

como exame de primeira linha, seja porque o risco da exposição à radiação não é aceitável ou deve<br />

ser evitado, seja porque a imagem por radiação ionizante (radiografia e TC) não pode ser feita (não<br />

existe equipamento disponível ou o doente não pode ser mobilizado). No primeiro caso, as crianças e<br />

as grávidas são o exemplo mais típico. Nestes grupos, a possibilidade de diagnosticar consolidações<br />

pulmonares sem recurso a radiação são uma clara vantagem oferecida pela ecografia. No caso de<br />

doentes admitidos numa UCI ou em situação de difícil mobilização, a ecografia é uma boa alternativa<br />

à radiografia e à TC.<br />

Para além do diagnóstico, a ecografia pode ser útil na monitorização da evolução da doença. No caso<br />

da pneumonia, são sinais de boa evolução a diminuição da área da consolidação (padrão C), que vai<br />

sendo substituído por linhas/Padrão B e o desaparecimento de broncograma líquido (indiciador de<br />

menor exsudação). O aumento dimensional, o aparecimento de um abcesso intrapneumónico ou o<br />

desenvolvimento de outros focos pneumónicos são sinais de má evolução passíveis de serem<br />

identificados com a ecografia. A monitorização ecográfica das características e dimensão de um<br />

derrame pleural associado a uma consolidação (ou a um enfarte pulmonar) permite identificar com<br />

precocidade se há uma evolução negativa ou, pelo contrário, se a evolução é favorável (vídeos 5.6). A<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 32


função diafragmática pode ser também avaliada por ecografia e, no contexto de uma opacidade<br />

pneumónica, identifica se há ou não excursão adequada (geralmente a inflamação local induz<br />

hipomotilidade diafragmática relativa) e de que forma evoluiu. A importância desta avaliação é<br />

autoexplicativa, mas, no caso de doentes sob ventilação mecânica invasiva, pode ser usada como um<br />

critério (entre outros) para planeamento do momento da extubação.<br />

D1<br />

D3<br />

D8<br />

Vídeo 5.6. Evolução da imagem ecográfica de uma pneumonia (aquisição em P4 direito). Na imagem do dia 1 (D1) observa-se<br />

uma extensa consolidação com uma ecogenicidade parecida com a do fígado (hepatização), um padrão B à periferia e um<br />

derrame pleural de pequeno volume. No dia 3 (D3) o padrão B passa a ser mais notório e o padrão C passa a estar mais<br />

arejado, facto traduzido pela presença de mais broncograma aéreo. A extremidade do pulmão oscila mais do que no primeiro<br />

dia, o que significa que o derrame pleural não está organizado, mas também que o pulmão está menos consolidado (menos<br />

denso). Por fim, oitavo dia (D8) observa-se apenas um padrão B. Assim, neste caso, a ecografia permitiu monitorizar a boa<br />

evolução do foco pneumónico, excluindo complicações como por exemplo abcesso pulmonar ou derrame pleural<br />

parapneumónico complicado.<br />

No caso do enfarte pulmonar, da mesma forma, a ecografia avalia no tempo a evolução dimensional<br />

da área enfartada e inclusivamente a perfusão dessa área. Neste contexto, a avaliação<br />

ecocardiográfica simultânea permite também identificar uma possível sobrecarga de câmaras direitas.<br />

No caso das atelectasias, a diminuição da área de padrão C e a substituição do broncograma estático<br />

por broncograma dinâmico são sinais ecográficos de melhoria/resolução da atelectasia. De igual<br />

forma, a integração destes dados com a evolução do derrame pleural (quando presente e<br />

etiologicamente responsável pela atelectasia) e da mobilidade diafragmática podem ser obtidos com<br />

a ecografia.<br />

Por último, a portabilidade dos ecógrafos, a sua inocuidade e amplitude de dados que fornece, permite<br />

a sua utilização repetida, em qualquer momento do dia, de acordo com a evolução clínica e as<br />

intervenções terapêutica, de forma autónoma e independente.<br />

Conclusões<br />

A utilidade da ecografia clínica no diagnóstico e monitorização de consolidações é um facto bem<br />

documentado, que assenta numa semiologia própria, muito sensível, mas pouco específica e que,<br />

portanto, precisa de estar indexada a um adequado enquadramento clínico. A sua utilização regular,<br />

integrada no exame físico habitual, permite o treino e adaptação a uma semiologia muito diferente da<br />

habitual (dimensão formativa - pedagógica), permite melhorar as imagens obtidas (dimensão técnica)<br />

e acrescenta valor à clínica pela sua capacidade de diagnóstico e de monitorização.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 33


Bibliografia<br />

Laursen CB, Rahman NM, Volpicelli G. Thoracic Ultrasound (ERS Monograph). Sheffield, European<br />

Respiratory Society, 2018; pp. xiii–xv.<br />

Volpicelli G et all. International evidence-based recommendations for point-of-care lung ultrasound.<br />

Intensive Care Med (2012) 38:577–591<br />

Nazerian P et all. Accuracy of Point-of-Care Multiorgan Ultrasonography for the Diagnosis of<br />

Pulmonary Embolism. Chest 2014; 145(5):950–957<br />

Gargani L, Volpicelli G. How I do it: Lung ultrasound. Cardiovascular Ultrasound 2014, 12:25<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 34


Pneumotórax<br />

(Raquel Martins)<br />

Introdução<br />

O pneumotórax é uma patologia frequente no serviço de urgência e o diagnóstico é habitualmente<br />

confirmado por radiografia torácica. No entanto, sabe-se que esta tem uma sensibilidade<br />

relativamente baixa, sobretudo se realizada em supino, e que pode ser negativa até mesmo em casos<br />

de pneumotórax de dimensões significativas, sobretudo se efetuada em decúbito na incidência<br />

anteroposterior. A TC torácica, tida como o gold-standard para o diagnóstico, permite uma<br />

identificação precisa de pneumotórax, mesmo que de muito pequeno volume, porém tem importantes<br />

desvantagens relacionadas com a acessibilidade, a dificuldade do transporte no caso de doentes<br />

críticos ou politraumatizados, a exposição a radiação ionizante e o custo elevado.<br />

A ecografia possui um elevado valor preditivo negativo para o diagnostico de pneumotórax e o<br />

diagnóstico pode ser afirmado com a detecção do ponto pulmonar. A identificação deste sinal permite<br />

estabelecer o diagnóstico de pneumotórax com especificidade próxima dos 100% e quantifica-lo, uma<br />

vez que quanto mais lateralmente e inferior se encontrar o ponto pulmonar, maior será o volume de<br />

pneumotórax subjacente. Esta avaliação semiquantitativa pode ser útil na decisão de colocação de<br />

dreno torácico.<br />

Aspetos Técnicos<br />

Posição do doente: O exame pode ser feito em decúbito dorsal ou na posição de sentado, recordando<br />

que o ar livre tende a acumular-se nas zonas superiores. Assim, a pesquisa de ponto pulmonar (que<br />

representa o ponto de separação das pleuras visceral e parietal provocada pelo ar acumulado na<br />

cavidade pleural) deve ser feita das zonas mais elevadas para as zonas inferiores e posteriores.<br />

Escolha da Sonda: Na suspeita de pneumotorax devemos usar preferencialmente a sonda linear, de<br />

alta frequência. As sondas abdominal (convexa) e cardíaca (sectorial), com frequências mais baixas,<br />

não facultam uma observação tão nítida da linha pleural. Apesar disso é igualmente possível fazer o<br />

diagnóstico de pneumotorax com sondas de baixa frequência, com a vantagem de permitir uma<br />

visualização em maior profundidade o que pode permitir a deteção de outros diagnósticos nos casos<br />

em que se existe um padrão A sem deslizamento pleural mas sem identificação do ponto pulmonar.<br />

Otimização da imagem: Para melhor visualizar o deslizamento pleural devemos reduzir o ganho de<br />

maneira a aumentar o contraste sobre a linha pleural. Se a dúvida persistir em modo B podemos alterar<br />

a avaliação para modo M. O deslizamento pleural é representado em modo M pelo sinal da praia. Na<br />

ausência de deslizamento, este sinal é substituído pelo sinal da estratosfera ou sinal do código de<br />

barras, podendo identificar-se a transição entre ambos no ponto pulmonar (figura 6.1). Não obstante,<br />

devemos ter cuidado na utilização de modo M porque a própria manipulação da sonda facilmente<br />

produz artefactos que podem induzir erros na interpretação.<br />

A presença de enfisema subcutâneo invalida a observação de pneumotórax, uma vez que a existência<br />

de ar entre o tecido subcutâneo e a pleura vai tornar impossível a visualização da linha pleural. Num<br />

doente traumatizado e instável, a presença de enfisema subcutâneo será, por si só, um forte indicador<br />

da possibilidade de pneumotórax.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 35


A B C<br />

Figura 6.1 - Diagnóstico de pneumotorax em modo M. No pneumotórax podemos observar do ponto pulmonar em Modo M,<br />

notando-se a transição entre sinal da praia e sinal da estratosfera.<br />

Planos de aquisição: Devemos iniciar o exame com a sonda em posição sagital com o ponteiro e<br />

direção cefálica, ao nível do 2º espaço intercostal na linha medioclavicular, identificando o “sinal do<br />

morcego. Podem ser necessários pequenos movimentos de basculação para otimizar a visualização<br />

da linha pleural e das linhas A, se presentes, e procurar o deslizamento pleural, o pulso pulmonar ou<br />

linhas B. Na ausência destes progredir lateral e inferiormente com a sonda pesquisando pelo ponto<br />

pulmonar (figura 6.2).<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 36


A<br />

B<br />

Figura 6.2 - Posicionamento da sonda (preferencialmente sonda linear) perpendicular à pele, com marcador cefálico (A). Iniciar<br />

exame na região torácica anterior e superior. e posteriormente movendo a sonda lateral e inferiormente em busca de ponto<br />

pulmonar (B).<br />

Áreas a explorar: Na suspeita de pneumotorax a exploração deve começar pelo lado correspondente.<br />

A avaliação deve iniciar-se nas zonas mais superiores e, na ausência de deslizamento, progredir em<br />

direção lateral e inferior até ás zonas mais posteriores e dependentes. Uma alternativa é procurar<br />

deslizamento na zona mais superior e em seguida na zona mais inferior. Se não houver deslizamento<br />

na avaliação superior e e houver nas zonas mais inferiores é provável que se consiga identificar o<br />

ponto pulmonar no trajeto entre uma e outra zona. Se não se identificar deslizamento em nenhuma<br />

das zonas isto poderá sugerir a presença de pneumotorax completo, mas é necessário equacionar<br />

outras causas de ausência de deslizamento e enquadrar os achados ecográficos com a clinica e<br />

restantes dados do exame objectivo.<br />

A comparação em modo B com o hemotórax contralateral pode tornar mais evidente a ausência de<br />

deslizamento pleural no lado com pneumotórax: o paciente funciona como o seu próprio controlo,<br />

excetuando os raros casos de pneumotórax bilateral.<br />

Aplicação clínica<br />

Diagnóstico e monitorização do pneumotórax<br />

No pneumotórax o ar acumula-se na cavidade pleural, interpondo-se entre a pleura parietal e a<br />

visceral. Uma vez que se mantém a presença de ar abaixo da pleura parietal, o padrão habitual de<br />

linhas A mantém-se (vídeo 6.1). No entanto, a perda de justaposição entre pleura parietal e visceral<br />

implica a perda sinais formados a partir do contacto entre ambas, nomeadamente a ausência de<br />

deslizamento pleural, de linhas B ou de pulso pulmonar (vídeos 6.3, 6.4 e 6.5). A presença de qualquer<br />

um destes sinais exclui o diagnóstico de pneumotórax com uma sensibilidade de 100%. No entanto,<br />

a identificação de um padrão A sem deslizamento pleural não permite, só por si, afirmar o diagnóstico<br />

de pneumotórax porque pode aparecer noutras condições em que o pulmão se mantém arejado mas<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 37


com compromisso ou mesmo ausência de ventilação como, por exemplo, na intubação seletiva, na<br />

fase precoce de uma atelectasia maciça, na apneia, nas crises de asma ou na DPOC.<br />

Video 6.1: Padrão A sem deslizamento pleural. Existe<br />

movimento vertical da linha pleural que reflete o movimento<br />

da parede torácica durante os ciclos respiratórios, mas não<br />

há deslizamento pleural. A presença de ar na cavidade<br />

pleural produz um padrão A sem deslizamento.<br />

Video 6.2: Ponto Pulmonar. Na suspeita de pneumotórax em<br />

que é identificado um padrão A sem deslizamento pleural nas<br />

zonas superiores, deve ser pesquisado o ponto pulmonar. A<br />

identificação do ponto pulmonar confirma o diagnóstico de<br />

pneumotorax<br />

Para confirmar o diagnóstico de pneumotórax, a ausência de deslizamento deve ser sempre<br />

complementada com a pesquisa do ponto pulmonar (vídeo 6.2), que correspondente ao ponto de<br />

transição entre a área de pneumotórax em que não há deslizamento pleural e a área em que o pulmão<br />

expandido toca a parede torácica voltando a observar deslizamento pleural. Como é fácil de perceber,<br />

o ponto pulmonar só é detetável no pneumotórax parcial, porque no pneumotórax completo não existe<br />

nenhum ponto de contacto do pulmão colapsado com a pleura parietal.<br />

Na suspeita de pneumotórax o deslizamento pleural é o primeiro sinal a ser pesquisado e é<br />

normalmente facilmente identificável na observação direta em modo B. Em caso de dúvida pode ser<br />

utilizando o modo M no qual, em casos de pneumotórax, se encontra o sinal de estratosfera (aspeto<br />

de “código de barras”) em vez do normal sinal da praia, presente quando há deslizamento pleural. O<br />

ponto pulmonar é representado no modo M pelo ponto de transição dos sinais da praia e da<br />

estratosfera (figura 6.1).<br />

Vídeo 6.3 (A), 6.4 (B) e 6.5 (C): Sinais que excluem pneumotórax. O deslizamento pleural (A), o pulso pulmonar (B) e as linhas B<br />

(C) necessitam, para a sua formação, que as pleuras visceral e parietal estejam justapostas. A presença destes artefactos exclui<br />

o diagnóstico de pneumotórax na zona explorada<br />

A ecografia é também útil para monitorizar a evolução. A marcação cutânea do ponto pulmonar por<br />

reavaliação periódica ao longo do tempo permite avaliar a evolução de forma instantânea e não<br />

invasiva. A deslocação num curto período de tempo do ponto pulmonar em sentido lateral e inferior<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 38


significa que o pneumotórax está a aumentar e alerta para a necessidade de estratégia terapêutica<br />

diferente.<br />

A documentação de deslizamento após drenagem torácica afirma a expansão completa do pulmão,<br />

reduzindo o número de radiografias necessárias para as decisões terapêuticas.<br />

Apoio a procedimentos invasivos<br />

Nos procedimentos com risco de pneumotórax (toracocentese, cateterização venosa central) deve ser<br />

feita sempre uma avaliação do deslizamento pleural do próprio hemitórax antes e depois da<br />

intervenção. Isto permite uma valorização mais segura dos achados ecográficos pós-procedimento.<br />

Em resumo, na pesquisa ecográfica de pneumotórax existem três sinais com alto valor preditivo<br />

negativo (presença de deslizamento pleural, linhas B e pulso pulmonar) e um sinal com alto valor<br />

preditivo positivo (ponto pulmonar). A observação deste conjunto de sinais permite a identificação de<br />

pneumotórax à cabeceira do doente, com elevada sensibilidade e especificidade, de forma rápida,<br />

inócua e semiquantitativa. Por tudo isto, esta aplicabilidade da ecografia clínica tem vindo a ser cada<br />

vez mais reconhecida e já foi mesmo incorporada em protocolos de abordagem de doentes<br />

politraumatizados (protocolo e-FAST) e no protocolo BLUE, descrito por David Lichtenstein para<br />

avaliação ecográfica de doente crítico. Abaixo segue uma proposta de protocolo de pesquisa de<br />

pneumotórax adaptado a partir do protocolo BLUE. (figura 6.3)<br />

Figura 6.3 - Algoritmo de diagnóstico de pneumotórax<br />

Conclusões<br />

A ecografia pulmonar já é amplamente reconhecida como um método simples, rápido e seguro para<br />

estabelecer o diagnóstico de pneumotórax com um elevado valor preditivo negativo. É também útil<br />

para a monitorizar a evolução e avaliar a resposta às intervenções terapêuticas. A expectativa é que o<br />

seu uso continue a crescer, face à maior sensibilidade em relação à radiografia de tórax e maior<br />

facilidade de utilização em relação ao TC torácico.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 39


Bibliografia<br />

Volpicelli G. Sonographic diagnosis of pneumothorax. Intensive Care Med. Feb 2011; 37(2):224-32.<br />

Lichtenstein D. Lung Ultrasound in the Critically Ill. Ann Intensive Care. Jan 2014; 9;4(1):1.<br />

Lichtenstein D et al. The “Lung Point”: An Ultrasound Sign Specific to Pneumothorax. Intensive Care<br />

Med. Oct 2000; 26(10):1434-40.<br />

Bahner D et al. AUIM practice guidelines for the performance of the focused assessment with<br />

sonography for trauma (FAST) examination. J Ultrasound Med. Nov 2014; 33(11):2047-56.<br />

Lichtenstein D et al. Ultrasound diagnosis of occult pneumothorax. Crit Care Med. Jun<br />

2005;33(6):1231-8<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 40


Derrame Pleural<br />

(José Miguel Maia)<br />

B<br />

Introdução<br />

O derrame pleural é um achado frequente nas enfermarias e unidades de cuidados intensivos. Pode<br />

ser identificado através do exame físico, radiografia, tomografia computorizada ou ecografia. Se a<br />

tomografia for considerada o gold standard, a ecografia torácica é claramente superior à radiografia,<br />

com maior sensibilidade (94%) e especificidade (98%). É pouco provável que no exame físico sejam<br />

identificados derrames pleurais com menos de 300mL. A radiografia consegue detetar apenas<br />

derrames pleurais em posição ortostática se o volume for de pelo menos 200mL e a sensibilidade do<br />

exame diminui quando realizado em decúbito dorsal. Em contrapartida, a ecografia consegue<br />

identificar derrames com cerca de 20mL. Além de detetar o derrame, também permite avaliar o seu<br />

volume, fornece informações sobre as suas características e indica o local apropriado para a<br />

realização de procedimentos pleurais, com consequente redução da taxa de complicações.<br />

A ecografia consegue não só confirmar facilmente a presença de derrame pleural mas também<br />

identificar patologias que podem ser confundidas com o derrame no exame físico ou na radiografia<br />

como, por exemplo, consolidações e atelectasias da base pulmonar, doença pleural sem derrame ou<br />

paresia diafragmática com elevação da hemicúpula.<br />

É importante reconhecermos algumas limitações. A inexperiência do operador com a aquisição ou<br />

interpretação da imagem pode levar a falsos positivos ou falsos negativos. É fundamental garantir um<br />

ensino de qualidade e uma metodologia de treino que permita o desenvolvimento de competências na<br />

aquisição e interpretação das imagens.<br />

Aspetos Técnicos<br />

Posição do doente: Se possível o exame deve ser efetuado com o doente sentado. Nesta posição o<br />

líquido livre vai acumular-se nas zonas pendentes, em localização posterior, permitindo a<br />

identificação de quantidades mínimas de derrame. No entanto, nem sempre é possível este<br />

posicionamento, pelo que o exame pode ter de ser realizado em decúbito lateral ou decúbito dorsal.<br />

Nestas posições, o local ideal para deteção do derrame pleural livre é ao nível da linha axilar posterior<br />

acima do diafragma. Aqui a identificação da coluna torácica pode ser útil para confirmar a presença<br />

de derrame.<br />

Escolha da sonda: A sonda habitualmente utilizada é a convexa com frequência entre 2-5MHz porque<br />

permite uma boa penetração nas estruturas profundas, com boa resolução lateral sem se perder uma<br />

visão global da parede torácica. A sonda sectorial, usada em ecocardiografia, pode também ser usada.<br />

Permite uma boa penetração em profundidade, com a vantagem de facilitar a visualização entre os<br />

espaços intercostais, possibilitando a avaliação ecográfica do tórax, incluindo coração, apenas com<br />

uma sonda. Para uma imagem detalhada da superfície pleural deve ser usada a sonda linear, com<br />

consequente má penetração em estruturas profundas. O exame é efectuado em modo B podendo em<br />

casos excepcionais ser complementado com modo M e Doppler colorido.<br />

Áreas a explorar: A exploração pode ser realizada em todo o tórax quando se pretende uma avaliação<br />

mais completa ou apenas na zona mais dependente quando se pretende apenas verificar a presença


do derrame. Quando pesquisamos apenas o derrame pleural devemos iniciar a aquisição da imagem<br />

ao nível do diafragma na linha axilar posterior (doente em decúbito ou semilateralizado) ou na linha<br />

medioescapular (doente sentado). Deve haver a preocupação de identificar as principais referências<br />

anatómicas, nomeadamente o diafragma e a superfície pleural visceral. Isto é particularmente<br />

importante para evitar erros de interpretação das imagens e também para orientar procedimentos<br />

invasivos, a fim de evitar lesões em órgãos adjacentes.<br />

Planos de aquisição: A avaliação deve ser efetuada orientando a sonda longitudinalmente<br />

(perpendicular às costelas) e obliquamente (ao longo dos espaços intercostais), sempre com o<br />

ponteiro da sonda orientado em posição cefálica ou para a direita do doente. Pode ser necessária<br />

alguma angulação na orientação dos espaços intercostais para escapar às costelas.<br />

Otimização da imagem: Quando se pesquisa derrame pleural a profundidade do campo deve ser<br />

aumentada de forma a permitir a avaliação dos ângulos costofrénicos. O foco deve ser posicionado<br />

ao nível do local a avaliar e os ganhos devem ser ajustados para uma correta identificação do derrame<br />

e das estruturas adjacentes, incluindo as áreas de interface do tórax com o abdómen.<br />

Aplicação clínica<br />

Diagnóstico e caracterização do derrame pleural<br />

O derrame pleural é identificado em modo B como uma área habitualmente escura que corresponde<br />

ao componente líquido, entre o diafragma, o pulmão e a parede torácica. Partindo do Sinal do Morcego<br />

pode ser identificado em modo B pelo Sinal do Quadrilátero ou “Quad sign” (vídeo 7.1) ou o seu<br />

correspondente em modo M Sinal do Sinusoide (figura 7.1) que corresponde à variação do espaço<br />

interpleural contendo líquido durante os ciclos respiratórios e representa o movimento do pulmão a<br />

flutuar em direção à parede torácica com a respiração.<br />

Vídeo 7.1 - Sinal do quadrilátero: Pela sua composição<br />

liquida, o derrame pleural caracteriza-se pelo movimento das<br />

estruturas adjacentes. O quad sign é representado por quatro<br />

estruturas: a linha pleural, as sombra acústica das duas<br />

costelas e o pulmão. A estrutura dentro do quadrilátero é o<br />

derrame pleural. A superfície do pulmão move-se em direção<br />

à linha pleural durante a inspiração<br />

Figura 7.1 - Sinal do Sinusoide: No modo M podemos<br />

observar o pulmão a mover-se dentro do derrame pleural,<br />

aproximando-se e afastando-se da parede torácica.<br />

O derrame pleural pode apresentar quatro diferentes padrões. O padrão anecoico (vídeo 7.2) é o mais<br />

frequentemente encontrado na prática clínica. É o aspeto típico dos transudados mas também pode<br />

ser visto em exsudados. pelo que a toracocentese deve ser sempre realizada quando é necessária<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 42


uma caracterização etiológica. A identificação do Sinal da Medusa ou “Jelly Fish Sign” traduz<br />

atelectasia do pulmão a mover-se dentro do derrame. Isto pressupõe ausência de aderências e sugere<br />

que o derrame é pouco denso e, deste modo, a favor de transudado. (vídeo 7.2).<br />

No padrão complexo não septado o derrame possuiu ecos no seu interior (partículas móveis<br />

representando elevado conteúdo celular ou proteico). A presença de partículas ecogénicas móveis no<br />

líquido pleural é definida como “Plankton Sign” (vídeo 7.3) e é tradicionalmente descrita como sendo<br />

associada a exsudados ou hemotorax embora também pode ser encontrado numa percentagem<br />

significativa de transudados. O Sinal do Hematócrito (video 7.4) aparece quando os restos celulares<br />

sofrem deposição nas zonas mais dependentes do derrame criando um efeito de camada e é frequente<br />

nos hemotoraxes.<br />

Vídeo 7.2 - Sinal da medusa: a extremidade do pulmão<br />

normal ou atelectásico move-se livremente no interior do<br />

derrame<br />

Vídeo 7.3 - “Plankton sign”: elevado conteúdo celular<br />

representado por ecos brancos dentro do derrame que se<br />

movem com os ciclos respiratórios e batimentos cardíacos<br />

O padrão complexo septado (vídeo 7.5) é definido pela presença de septos ou bandas de fibrina dentro<br />

do líquido pleural e é sugestivo de exsudado. Por último o padrão homogéneo hiperecogénico é mais<br />

comum no hemotórax ou no empiema. Por vezes os empiemas organizados podem adquirir um<br />

aspecto semelhante a uma consolidação, sobretudo se possuírem ar no seu interior (vídeo 7.6 e figura<br />

7.2). A ecografia torácica pode ainda identificar e caracterizar derrames pleurais loculados.<br />

A presença de espessamento pleural ou nódulos pleurais é mais frequente nos exsudados e nos<br />

derrames malignos. O espessamento da pleura parietal > 10mm, a presença de nódulos pleurais ou o<br />

espessamento diafragmático > 7mm possuem alta especificidade para patologia pleural maligna.<br />

Em alguns casos a presença de outros sinais ecográficos externos ao derrame podem ajudar no<br />

diagnostico diferencial da etiologia derrame. Um consolidação com broncograma aéreo aumenta a<br />

probabilidade do derrame ser parapneumónico enquanto a presença de linhas B bilaterais com<br />

carácter gravitacional aponta para insuficiência cardíaca. A identificação destes padrões na ecografia<br />

ajuda na determinação da etiologia do derrame, no entanto deve ser sempre interpretada à luz dos<br />

achados clínicos, e complementada pela caracterização citoquímica do líquido sempre que indicado.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 43


Vídeo 7.4 - Sinal do Hematócrito : na base pulmonar visualizase<br />

derrame pleural com área hiperecogénica “decantada” no<br />

fundo de saco posterior; a imagem do derrame é “apagada”<br />

pela interposição de ar durante os movimentos respiratórios<br />

Vídeo 7.5 - Padrão complexo septado: Observa-se<br />

consolidação na base pulmonar com “Schred sign” e<br />

pequeno derrame pleural associado com septos móveis no<br />

seu interior. No seu conjunto estes dados sugerem tratar-se<br />

de derrame parapneumónico<br />

Vídeo 7.6 e Figura 7.2 - Empiema: Derrame adquire aspecto organizado, por vezes com imagens hiperecogénicas no seu interior<br />

correspondentes a bolhas de ar e que pode ser confundido com broncograma aéreo numa consolidação. A tomografia do<br />

mesmo paciente mostra o empiema com múltiplas bolhas gasosas no seu interior.<br />

O derrame pleural pode ser quantificado qualitativamente em pequeno, moderado ou grande. Existem<br />

várias formas de quantificar o volume, mas a sua utilidade clínica é reduzida. Uma forma prática<br />

envolve a medição da distância entre a pleura visceral e parietal na expiração (distância interpleural<br />

expiratória máxima ou DIEM). Esta distância é maior nas regiões mais dependentes pelo que deve ser<br />

medida na li<br />

nha axilar posterior nos doentes em decúbito dorsal e na linha médio escapular nos doentes sentados.<br />

Um DIEM de 5cm medido num plano transverso é preditivo de um volume superior a 500mL com<br />

sensibilidade (83-100%) e especificidade (67-90%).<br />

Apoio a procedimentos pleurais invasivos<br />

A ecografia torácica também pode ser utilizada para guiar (com visualização direta durante o<br />

procedimento) ou assistir (sem visualização direta) a realização de exames invasivos pleurais, com<br />

maior taxa de sucesso e menor risco de complicações. A localização do melhor local para a punção<br />

depende da identificação do maior espaço entre a pleura parietal e visceral e, idealmente, o mais<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 44


afastado possível do baço, fígado e coração. É importante medir a distância entre a pele e a pleura<br />

visceral para assegurar que, durante a punção, agulha não toca a superfície pulmonar. Na localização<br />

do sítio para a punção devemos analisar os movimentos do diafragma durante a respiração,<br />

assegurando que, no nível puncionado, não há contacto em nenhum momento do ciclo respiratório<br />

com o fígado ou baço. A ecografia pode ainda ser útil para identificar variações anatómicas de vasos<br />

intercostais que contraindiquem a punção numa determinada localização. A localização do local da<br />

picada por outro imagiologista, fora do sítio onde vai ser realizada a toracocentese não reduz a taxa<br />

de complicações.<br />

Conclusões<br />

A ecografia é uma ferramenta com utilidade crescente e ganho progressivo de popularidade devido à<br />

sua capacidade diagnóstica não invasiva. Na abordagem do derrame pleural a ecografia pode ser<br />

essencial desde o diagnóstico até o tratamento final. É um método não invasivo com sensibilidade e<br />

especificidade superior ao exame físico e radiografia de tórax. Além da sua capacidade diagnóstica<br />

também pode ajudar, como complemento dos achados clínicos, na distinção dos diferentes tipos de<br />

derrame e consequente decisão estratégica. É também uma mais valia durante a realização de<br />

procedimentos pleurais, com redução do número de complicações.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 45


Bibliografia<br />

Volpicelli, G., Elbarbary, M., Blaivas, M. et al. International evidence-based recommendations for pointof-care<br />

lung utrasound. Intensive Care Med (2012) 38: 577.<br />

Prina E, Torres A, Carvalho CR. Lung ultrasound in the evaluation of pleural effusion. J Bras Pneumol.<br />

2014;40(1):1–5.<br />

Brogi E, Gargani L, Bignami E, et al. Thoracic ultrasound for pleural effusion in the intensive care unit:<br />

a narrative review from diagnosis to treatment. Crit Care. 2017;21(1):325.<br />

Cotton, D. W., Lenz, R., Kerr, B., Ma, I. Point of Care Ultrasound for the General Internist: Pleural<br />

Effusions. Canadian Journal of General Internal Medicine, 13(2).<br />

Gargani L, Volpicelli G. How I do it: lung ultrasound. Cardiovasc Ultrasound. 2014;12:25.<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 46


Dor pleurítica<br />

(Rui Barros)<br />

B<br />

Introdução<br />

A dor pleurítica caracteriza-se por uma dor localizada numa determinada região do tórax, geralmente<br />

unilateral, e que é agravada pela inspiração profunda ou tosse. Por vezes pode sofrer irradiação para<br />

o ombro homolateral ou região cervical. A sua instalação é habitualmente aguda e ela é tipicamente<br />

descrita como “pontada” ou “facada”. Na maioria dos casos é causada por patologia da parede<br />

torácica, traduzindo geralmente doença menos grave, autolimitada e sem necessidade de<br />

investigação etiológica adicional. Num número menor, mas significativo, deve-se a patologia<br />

pulmonar ou pleural potencialmente grave podendo ser a forma de apresentação de um grupo<br />

heterogéneo de doenças, como a embolia pulmonar, pneumonia, metástases pleurais ou<br />

pneumotórax. Estas têm em comum a possibilidade de envolver a superfície pulmonar estendendo o<br />

processo patológico à pleura. Como a pleura parietal é a única estrutura pulmonar que possui<br />

receptores da dor, quando a dor pleurítica é causada por patologia pulmonar, ela obrigatoriamente<br />

atinge a superfície pleural, sendo deste modo visível por ecografia.<br />

Aspetos técnicos<br />

Posição do doente: O exame pode ser realizado com o doente sentado ou em supino. No doente<br />

estável e colaborante a posição de sentado permite um acesso mais fácil a todas as áreas a explorar,<br />

nomeadamente as regiões posteriores, e facilita a identificação de derrame pleural.<br />

Escolha da sonda: Deve ser utilizada uma sonda linear para potenciar a resolução da imagem<br />

superficial. O objectivo é obter uma boa visualização da linha pleural e de potenciais alterações<br />

subpleurais. Caso sejam identificadas alterações, pode ser útil complementar o exame com a sonda<br />

convexa para melhor caracterização em profundidade e da relação com as estruturas adjacentes.<br />

Áreas a explorar: A sonda deve ser colocada no espaço intercostal correspondente ao ponto de maior<br />

intensidade da dor. Toda a extensão desse espaço intercostal deve ser visualizada, bem como os<br />

espaços intercostais imediatamente adjacentes, acima e a abaixo. Cada espaço intercostal deve ser<br />

avaliado em inspiração e expiração forçada para ganhar acesso a áreas cobertas pelas estruturas<br />

ósseas e aumentar a superfície de área explorada. Na suspeita de pneumotórax devem ainda ser<br />

exploradas cuidadosamente as zonas superiores (no doente sentado) ou anteriores (no doente em<br />

supino) para avaliar a presença de deslizamento e deteção do ponto pulmonar. Quando são<br />

identificadas alterações, o exame deve estender-se a todo o tórax para uma caracterização completa.<br />

Planos de aquisição: A avaliação deve ser iniciada no plano longitudinal, com identificação do sinal<br />

do morcego e completada no plano oblíquo, paralelo aos arcos costais. Se o ponto doloroso se<br />

localizar sobre uma costela devemos avaliar toda a extensão a linha da cortical óssea procurando<br />

soluções de continuidade que apontem para fracturas costais.<br />

Otimização da imagem: O ajuste da profundidade é necessário conforme a avaliação se centre na linha<br />

pleural ou em alterações encontradas num plano subpleural. Para melhor identificação do


deslizamento pleural devemos reduzir o ganho, aumentando o contraste entre a linha pleural e<br />

estruturas vinhas.<br />

Aplicação clínica<br />

Na avaliação da dor pleurítica, o primeiro objetivo é distinguir patologia da parede torácica,<br />

habitualmente sem gravidade e de prognóstico favorável, de patologia pulmonar ou pleural que pode<br />

ser potencialmente grave e até fatal. A radiografia de tórax é normalmente o primeiro exame<br />

complementar realizado, mas mesmo na presença de patologia pulmonar, a radiografia pode ser<br />

normal, seja porque o processo ainda se encontra numa fase precoce sem tradução radiológica, seja<br />

porque se desenvolve em zonas não visíveis na radiografia. A ecografia tem uma elevada sensibilidade<br />

(96%) e especificidade (96%) para a deteção de lesões pleuropulmonares radio-ocultas quando existe<br />

dor pleurítica e deve ser usada sempre que a causa da dor não é evidente. O segundo objetivo é<br />

determinar a etiologia da patologia pulmonar quando presente. Dependendo da experiência do<br />

operador, a ecografia pode também aqui ajudar no diagnóstico diferencial das diferentes causas de<br />

dor pleurítica com origem em patologia do parênquima pulmonar.<br />

Devemos iniciar a avaliação ecográfica na zona de maior intensidade da dor. O exame é considerado<br />

positivo ou anormal na presença de 1) ausência de deslizamento pleural (vídeo 8.1); 2) síndrome<br />

intersticial focal (vídeo 8.2), definido pela presença de 3 ou mais linhas B espaçadas a menos de 7mm,<br />

em pelo menos dois espaços intercostais contíguos; 3) consolidações alveolares periféricas (vídeo<br />

8.3); 4) aspeto espessado e irregular da linha pleural, com ou sem derrame pleural associado (vídeo<br />

8.4). O exame só é considerado positivo ou diagnóstico quando as alterações encontradas têm<br />

correspondência anatómica com a localização da dor.<br />

Vídeo 8.1 - Ausência de deslizamento pleural. Podemos<br />

observar o movimento da parede torácica durante o esforço<br />

da respiração, mas não existe deslizamento da a linha pleural.<br />

Vídeo 8.2 - Padrão B focal. Na figura identificam-se várias<br />

linhas B no espaço intercostal analisado<br />

A identificação destes sinais é simples e exige conhecimentos básicos de ecografia pulmonar.<br />

Quando estão presentes devemos considerar que a dor pleurítica é de causa pleuropulmonar e que<br />

carece de investigação adicional. Quando a dor não é acompanhada dos sinais descritos acima<br />

podemos considerar que é, com grande probabilidade, causada por patologia da parede torácica e o<br />

doente pode ter alta com tratamento sintomático e vigilância clínica. Em situações particulares o<br />

exame ecográfico no ponto doloroso pode até confirmar a presença de patologia muscular ou óssea,<br />

como por exemplo hematomas ou fraturas costais que tenha não tenha sido identificada na radiografia<br />

de tórax.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 48


Vídeo 8.3 - Pequena consolidação subpleural de forma<br />

poliédrica de bordos irregulares e com broncagrama aéreo,<br />

traduzindo pequeno foco pneumónico.<br />

Vídeo 8.4 - Irregularidade da linha pleural com pequeno<br />

derrame pleural associado. Na figura são também visíveis<br />

linhas B na zona das alterações pleurais.<br />

Quando a exploração ecográfica é positiva ela deve ser complementada por TC tórax ou avaliação<br />

ecográfica avançada, caso o operador seja perito em ecografia pulmonar (figura 8.2). Neste caso<br />

podemos caracterizar as consolidações subpleurais em 3 tipos que representam diferentes etiologias:<br />

• Tipo 1: em forma de cunha, de base pleura e bordo bem definidos sem broncograma aéreo<br />

(vídeo 8.5; figura 8.1). Sugestivas de enfartes pulmonares.<br />

• Tipo 2: de forma irregular e margens esbatidas, que podem conter broncograma aéreo no seu<br />

interior (vídeo 8.3). Sugestivas de pneumonia.<br />

• Tipo 3: redondas ou ovaladas, de margens irregulares e sem broncograma aéreo. Sugestivas<br />

de metástases pulmonares.<br />

Vídeo 8.5 - Consolidação subpleural. O formato triangular, de<br />

bordos bem definidos e sem broncograma aéreo é sugestivo<br />

de enfarte pulmonar.<br />

Figura 8.1 - TC tórax do mesmo doente a documentar embolia<br />

pulmonar e enfarte pulmonar (seta) correspondente à<br />

imagem no vídeo 8.5)<br />

A caracterização etiológica adicional pode ser completada pela pesquisa de ponto pulmonar quando<br />

não se identifica deslizamento pleural (vídeo 8.6). A presença de síndrome intersticial focal sugere<br />

pneumonia ou embolia pulmonar enquanto a presença de irregularidade da linha pleural com ou sem<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 49


derrame associado levanta as hipóteses de pleurisia, pneumonia, embolia pulmonar ou neoplasia.<br />

Todas estas hipóteses têm de ser enquadradas com a clínica e restantes exames complementares de<br />

diagnóstico.<br />

Vídeo 8.6 - Dois exemplos de ponto pulmonar. (A) com sonda linear, (B) com sonda convexa, Em ambos, na metade esquerda<br />

da linha pleural existe deslizamento enquanto na metade direita não há deslizamento. A identificação do ponto pulmonar<br />

confirma o diagnóstico de pneumotórax.<br />

Figura 8.2 - Algoritmo avaliação da dor pleurítica radio-oculta. no serviço de urgência<br />

Conclusão<br />

Na avaliação da dor pleurítica, a ecografia pulmonar é mais sensível que a radiografia de tórax na<br />

deteção de patologia pulmonar ou pleural subjacente e deve ser realizada sempre que a radiografia<br />

de tórax é normal. É um bom método complementar ao exame objetivo, que permite reduzir o número<br />

de doentes que necessita de investigação adicional, diminuindo custos e exposição a radiação. Um<br />

resultado negativo na exploração da zona dolorosa aponta com grande probabilidade para patologia<br />

da parede torácica.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 50


Bibliografia<br />

Volpicelli G, Caramello V, Cardinale L, Cravino M. Diagnosis of radio-occult pulmonary conditions by<br />

real-time chest ultrasonography in patients with pleuritic pain. Ultrasound Med Biol 2008;34:1717-<br />

23<br />

Volpicelli G, Cardinale L, Berchialla et al. A comparison of different diagnostic tests in the bedside<br />

evaluation of pleuritic pain in the ED. Am J Emerg Med 2012;30:317-24<br />

Lichtenstein DA, Mezière G, Lascols N, et al. Ultrasound diagnosis of occult pneumothorax. Crit Care<br />

Med 2005;33:1231-8<br />

A<br />

Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 51


Via aérea<br />

(Luis Magalhães)<br />

Introdução<br />

Recentemente, tem sido publicada evidência crescente sobre a utilidade da ecografia na gestão da via<br />

aérea em diversos cenários, desde a emergência pré-hospitalar, unidade de cuidados intensivos ou<br />

bloco operatório. Tal como descrito em capítulos anteriores, o seu uso está centrado na resposta a<br />

problemas e contextos específicos.<br />

Neste capítulo será abordada a anatomia cervical, bem como a utilização da ecografia no contexto do<br />

trauma, intubação orotraqueal e acesso invasivo da via aérea difícil. Especialmente no doente crítico,<br />

é importante reforçar que a ecografia é um complemento à avaliação clínica, não devendo atrasar<br />

procedimentos que se considerem emergentes.<br />

Aspetos técnicos<br />

Posição do doente: Preferencialmente o doente deverá estar em decúbito dorsal e com o pescoço em<br />

extensão, sempre que a situação clínica o permita.<br />

Escolha da sonda: Uma vez que a maioria das estruturas da via aérea que queremos observar são<br />

relativamente superficiais, a sonda mais indicada será uma sonda de alta frequência, como a linear.<br />

Planos de aquisição: A via aérea deverá ser observada em dois eixos, um transverso, em que a sonda<br />

se encontra orientada perpendicularmente à traqueia com o ponteiro para a direita do doente e um<br />

longitudinal, em que a sonda se encontra paralela ao eixo maior da traqueia, com o ponteiro em<br />

direcção cefálica.<br />

Áreas a explorar: Começando pelo plano transverso, iniciamos o exame medialmente acima da<br />

incisura jugular do esterno e progredimos em direção cefálica sempre com a sonda perpendicular à<br />

traqueia. Os anéis traqueais são identificáveis como estruturas arredondadas hipoecoicas, com uma<br />

linha hiperecoica subjacente que corresponde à interface sólido/ar (figura 9.1A). Ainda num plano<br />

transversal, mas a um nível mais cefálico, é possível observar a cartilagem cricoide (figura 9.1B), uma<br />

estrutura habitualmente hipoecogénica arredondada, maior e mais superficial que os anéis traqueias<br />

e, num plano ainda mais cefálico, a cartilagem tiroide, de aspeto triangular. As cordas vocais podem<br />

ser visualizadas através da cartilagem tiroide (figura 9.1C). Entre o bordo superior da cartilagem<br />

cricoide e o bordo inferior da cartilagem tiroide (ou seja, quando estamos a mover a sonda<br />

cefalicamente e deixamos de ver a cartilagem cricoide e ainda não estamos a ver a cartilagem tiroide)<br />

encontramos a região onde se encontra a membrana cricotiroideia. Dependendo do nível em que<br />

estamos, podem ser identificadas outras estruturas da região cervical: lateralmente o feixe vascular<br />

do pescoço (veia jugular e artéria carótida) e os lobos da tiroide e anteriormente o istmo da tiroide. No<br />

plano transversal, o esófago pode ser identificado numa posição posterior e à esquerda da traqueia<br />

(figura 9.2). Tem um aspeto estratificado e e facilmente reconhecido através dos movimentos de<br />

peristálticos pedindo ao doente colaborante para engolir.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 52


Figura 9.1 (à esquerda) – Janela transversal da via aérea com a sonda linear, de caudal para cefálico: A: Anel traqueal (a azul),<br />

com a glândula tiroide em ambos os lados (T); B: Cartilagem cricoide (a amarelo), maior e mais superficial; C: Cartilagem<br />

tiroide (a vermelho), com forma triangular.<br />

Figura 9.2 (em baixo): O esófago(seta) ao lado da via aérea (VA).<br />

No eixo longitudinal (figura 9.3), obtido através da rotação da sonda em 90º no sentido dos ponteiros<br />

do relógio a partir do transversal – o marcador fica orientado cefalicamente – podemos ver um corte<br />

dos anéis traqueais (aspeto de colar em missangas), seguidos pela cartilagem cricoide (maior e mais<br />

superficial) e pela cartilagem tiroide. Atenção ao primeiro anel traqueal que normalmente é maior que<br />

os restantes e pode ser confundido com a cartilagem cricoide.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 53


Figura 9.3: Via aérea em janela longitudinal. Imagem de cima num plano mais caudal e imagem inferior num plano mais<br />

cranial. A azul, os anéis traqueais, a amarelo a cartilagem cricoide e a vermelho a cartilagem tiroide. A seta branca marca o<br />

local da membrana cricotiroideia.<br />

De relembrar que os ultrassons são dissipados em contacto com o meio gasoso, pelo que abaixo da<br />

interface sólido/ar, caracterizada pela linha hiperecoica localizada sob anéis traqueais, são<br />

projectados artefactos que não permitem a análises de estruturas profundas a esta (são imagens<br />

virtuais).<br />

Otimização da imagem: Principalmente nos homens, por possuírem uma cartilagem tiroide mais<br />

angulada, pode ser difícil ter a sonda no eixo medial e manter contacto com toda a superfície. Uma<br />

maior quantidade de gel pode aumentar a área de contacto com a pele. Deve ter-se especial atenção<br />

em diminuir a profundidade, uma vez que são estruturas muito superficiais, e adequar o ganho às<br />

estruturas que queremos observar.<br />

Aplicação clínica<br />

a) Confirmação da posição do tubo orotraqueal<br />

Sabemos que estabelecer uma via aérea segura no doente crítico é fundamental para o processo de<br />

reanimação, uma vez que a colocação errada do tubo orotraqueal pode significar um aumento<br />

significativo da morbimortalidade destes doentes. A incidência estimada de intubações esofágicas<br />

em situações de emergência pode chegar aos 15%, sendo essencial a sua rápida identificação e<br />

correção. No momento da intubação queremos responder a duas perguntas: se a intubação foi<br />

endotraqueal ou esofágica e se estamos a ventilar ambos os pulmões ou se a intubação foi seletiva.<br />

Existem vários métodos para esta avaliação (visualização direta, auscultação pulmonar, capnografia,<br />

radiografia do tórax) cada um com as suas vantagens e limitações. A ecografia pode ser um meio<br />

complementar a estes, com sensibilidade e especificidade que variam entre 90 e 100%, de acordo com<br />

a metodologia usada, tipo de doentes e ambiente onde é efectuada (bloco operatório, emergência ou<br />

reanimação). As guidelines de reanimação da AHA 2015 e as recomendações da ACEP 2016 já incluem<br />

a ecografia como um dos métodos complementares a utilizar para a confirmação da posição correta<br />

do tubo endotraqueal. O protocolo mais utilizado e validado é o Tracheal Rapid Ultrasound Exam<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 54


(T.R.U.E), que consiste na confirmação da intubação endotraqueal através da exclusão da intubação<br />

esofágica.<br />

A sonda é colocada num plano transversal à traqueia acima da incisura jugular do esterno. Se<br />

possível, toda a via aérea deve ser observada previamente ao procedimento para detetar alterações<br />

preexistentes. É importante visualizar simultaneamente a traqueia e o esófago. Para ser mais fácil de<br />

encontrar o esófago, a sonda pode ser desviada ligeiramente para a esquerda do doente (figura 9.2).<br />

Com as duas estruturas identificadas (traqueia e esófago), a ecografia é realizada em tempo real, à<br />

medida que o tubo orotraqueal é introduzido por um operador adicional. Uma intubação esofágica irá<br />

mostrar uma segunda estrutura oval com uma linha hiperecoica posterolateral à traqueia que<br />

corresponde ao tubo orotraqueal a passar através do esófago, criando como que duas “duas<br />

traqueias” (figura 9.4). Neste momento, o operador deve avisar que a intubação não foi bem sucedida<br />

e nova tentativa deve ser feita. Caso a imagem não se altere significativamente quando há a<br />

progressão do tubo, podemos assumir que o tubo avançou, mas não entrou no esófago, indicando<br />

assim, de forma indireta, que entrou na traqueia. A confirmação de intubação traqueal não depende<br />

da visualização direta do tubo no interior da traqueia que pode ser difícil devido à presença de ar entre<br />

a traqueia e o tubo orotraqueal.<br />

As principais vantagens da verificação da posição endotraqueal do tubo através da ecografia em<br />

relação aos restantes métodos mais vezes utilizados são:<br />

• Não depender do fluxo ventilatório<br />

• Diagnosticar intubação esofágica antes de se iniciar a ventilação<br />

• Em caso de paragem cardiorespiratória não ser preciso parar as compressões para auscultar<br />

b) Exclusão de intubação seletiva<br />

A segunda questão a responder envolve a exclusão de intubação seletiva ou endobrônquica. Como<br />

referido anteriormente, na maioria das vezes o tubo orotraqueal não é visualizado dentro da traqueia,<br />

pelo que recorremos mais uma vez a sinais indiretos para excluir esta complicação. A mesma sonda<br />

que utilizamos para visualizar a traqueia durante a intubação pode ser utilizada para procurar sinais<br />

de ventilação em ambos os hemitóraxes através da documentação de deslizamento pleural (Figura<br />

9.4). No entanto, a ausência de deslizamento pleural pode não significar necessariamente ausência de<br />

ventilação. Para aumentar o grau de confiança, sempre que possível, deve-se proceder a uma<br />

avaliação do deslizamento antes da intubação para perceber se existem, à partida, regiões sem<br />

deslizamento pleural antes da intubação (por exemplo, por pneumotórax ou atelectasia). Esta<br />

metodologia está validada contra a confirmação da posição do tubo orotraqueal através da radiografia<br />

do tórax, com a vantagem de ser significativamente mais rápida de realizar. A ecografia traz um valor<br />

acrescido à avaliação clínica na deteção de intubação seletiva, aumentando a especificidade (50% vs<br />

22%), exatidão (88% vs 72%) e valor preditivo positivo (86% vs 70%) na determinação da correta<br />

posição de tubos orotraqueais de duplo lúmen.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 55


Figura 9.4: Algoritmo T.R.U.E para verificação da posição do tubo orotraqueal.<br />

c) Tamanho da via aérea<br />

A ecografia pode ser utilizada para avaliar o tamanho do tubo orotraqueal a utilizar. Habitualmente, o<br />

diâmetro mais pequeno da via aérea situa-se ao nível da cartilagem cricoide, sendo o diâmetro<br />

transversal mais pequeno que o anteroposterior. Utilizando a ecografia, podemos visualizar o<br />

diâmetro transversal da via aérea nesse ponto (de relembrar que, devido aos artefactos gerados pela<br />

interface sólido/ar, não conseguimos avaliar o diâmetro anteroposterior). Para tal, deve ser localizada<br />

a cartilagem cricoide, preferencialmente varrendo a via aérea na linha média desde a sua região<br />

inferior para evitar confusão com os anéis traqueais. Em seguida mede-se a distância entre as os<br />

bordos internos da cricoide na sua maior distância, imediatamente antes dos artefactos gerados pela<br />

interface sólido/ar (figura 9.5). Esta medição pode ter especial interesse na população pediátrica, uma<br />

vez que mostrou ser superior às fórmulas baseadas na idade e no peso. De ressalvar que devemos<br />

pensar sempre no diâmetro externo do tubo endotraqueal - se medirmos um diâmetro de 9 mm,<br />

podemos utilizar um tubo 6 (6mm de diâmetro interno e cerca de 8-9mm de diâmetro externo).<br />

As calcificações das cartilagens dependentes da idade podem ser uma limitação importante a esta<br />

técnica, uma vez que criam artefactos de sombra acústica que podem comprometer a correta<br />

avaliação do diâmetro da via aérea no adulto.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 56


Figura 9.5: Janela transversal da via aérea ao nível da cartilagem cricoide. A linha vermelha representa a medição do diâmetro<br />

da via aérea que deve ser utilizada para prever o tamanho do tubo orotraqueal.<br />

d) Técnicas de abordagem invasiva da via aérea<br />

Existem situações que necessitam de abordagem invasiva da via aérea. A ecografia pode aumentar a<br />

taxa de sucesso e diminuir o número de complicações destes procedimentos através da definição da<br />

anatomia da via aérea, principalmente útil em doentes obesos e com pescoços curtos, antecipação de<br />

variações anatómicas e exclusão de patologias que alteram a normal anatomia, tais como hematomas<br />

e massas cervicais ou desvio da traqueia por patologia torácica. A cricotiroidostomia é um<br />

procedimento de emergência em situações em que não é possível entubar nem ventilar o doente. No<br />

entanto, a membrana cricotiroideia nem sempre é facilmente identificável através de referências<br />

anatómicas, sendo especialmente importante a sua identificação nos doentes que se antevê uma<br />

intubação difícil ou quando a sua identificação pela palpação não é esclarecedora. A ecografia revelase<br />

um método complementar nestes casos, sendo que a membrana cricotiroideia pode ser visualizada<br />

tanto no eixo transversal como longitudinal.<br />

No eixo transversal, iniciamos com a sonda perpendicularmente à via aérea na região inferior do<br />

pescoço e ascendemos até identificar a cartilagem cricoide. Cefalicamente à cartilagem, será<br />

identificável a membrana cricotiroideia como uma linha hiperecoica sem nenhuma estrutura<br />

hipoecogénica superficialmente. Continuando o movimento em direção cefálica iremos encontrar a<br />

cartilagem tiroide, mais triangular. Movendo a sonda no sentido caudal, encontramos novamente a<br />

membrana cricotiroideia. O mesmo princípio é utilizado com a sonda em posição longitudinal,<br />

começando a varrer cefalicamente a via aérea desde a região inferior ao longo da linha média até ser<br />

possível visualizar na mesma imagem a cartilagem cricoide e a cartilagem tiroide (figura 9.3). Entre<br />

estas duas estruturas é visível a linha hiperecoica que corresponde à membrana cricotiroideia. Para<br />

identificar com maior precisão o local na pele, podemos passar uma agulha entre a sonda e a pele do<br />

doente, causando um artefacto de sombra acústica posterior. Quando este artefacto se encontra sobre<br />

o local da membrana, podemos levantar a sonda e marcar o local onde se encontra a agulha com uma<br />

caneta.<br />

Nos doentes que necessitam de traqueostomia, a ecografia pré-procedimento ajuda na escolha da<br />

técnica de abordagem da via aérea, através da identificação da traqueia e dos espaços entre os anéis<br />

traqueais, determinação da profundidade a que se encontram e identificação de vasos ou outras<br />

estruturas superficiais à traqueia. Os aspectos técnicos são sobreponíveis aos descritos previamente,<br />

podendo a traqueia ser observada ao longo do eixo transverso ou longitudinal.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 57


e) Traumatismo da via aérea<br />

O conhecimento da anatomia normal da via aérea é útil nas situações de traumatismo. A incapacidade<br />

de visualizar corretamente as estruturas anatómicas cervicais pela presença de enfisema subcutâneo,<br />

no contexto clínico adequado, deve levantar a suspeita de trauma da via aérea e à realização de meios<br />

complementares de diagnóstico mais específicos, nomeadamente a tomografia computadorizada.<br />

Conhecendo a anatomia expectável da via aérea e tecidos envolventes, podemos identificar estruturas<br />

que alteram essa anatomia, mais frequentemente hematomas resultantes de traumatismos ou como<br />

complicação de colocação de acessos venosos cervicais. A ecografia pode ser útil para monitorizar a<br />

sua evolução e o seu efeito sobre a via aérea.<br />

Conclusão:<br />

A ecografia é uma técnica complementar útil na avaliação do doente crítico com problemas da via<br />

área. Permite de forma rápida confirmar a posição correta do tubo endotraqueal através da exclusão<br />

de intubação esofágica e da verificação de deslizamento pleural bilateral.<br />

Por outro lado, pode ser uma ajuda importante aos procedimentos de acesso invasivo à via aérea e<br />

permite reduzir a taxa de complicações associadas a estas técnicas. É também um complemento<br />

importante na avaliação de lesões traumáticas cervicais.<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 58


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American College of Emergency Physicians Policy Statement: Verification of Endotracheal Tube<br />

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Índice<br />

Manual de ecografia clínica pulmonar - 1ª edição 2021 59

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