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Gestão Hospitalar N.º 24 2021

#gestão em saúde, por Vasco Reis Homenagem Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração” Testemunhos de familiares e amigos Saúde Global Portugal na saúde global A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19 Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais? SNS: e agora para algo completamente diferente Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório A farmacogenética na prática clínica Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria? Liderança Digital: ENESIS 2020-22

#gestão em saúde, por Vasco Reis
Homenagem
Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração”
Testemunhos de familiares e amigos
Saúde Global
Portugal na saúde global
A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação
Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19
Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia
Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid
Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente
Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais?
SNS: e agora para algo completamente diferente
Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama
Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório
A farmacogenética na prática clínica
Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria?
Liderança Digital: ENESIS 2020-22

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GH Iniciativa APAH | 8 A CONFERÊNCIA DE VALOR<br />

A FARMACOGENÉTICA<br />

NA PRÁTICA CLÍNICA<br />

Ana Teresa Freitas<br />

CEO da HeartGenetics<br />

Na atualidade, um dos grandes problemas<br />

de saúde pública prende-se com a<br />

variabilidade na resposta dos pacientes<br />

aos medicamentos, que leva a gastos<br />

excessivos com internamentos, com a<br />

gestão de efeitos secundários e com a gestão da falha<br />

terapêutica. Estas questões tornam-se ainda mais graves<br />

quando se considera o sofrimento causado no paciente<br />

pelos efeitos secundários da medicação ou pela falha<br />

terapêutica e respetivo prolongamento do tratamento.<br />

Dados da Europa indicam que a resposta inadequada às<br />

terapêuticas representa atualmente entre 0,5% a 12,8%<br />

de todos os internamentos hospitalares, dependendo<br />

da geografia. 1 Em Portugal, os dados referem que 11.1%<br />

das admissões hospitalares em Portugal devem-se a<br />

efeitos adversos, sendo que mais de 53% destes casos<br />

poderiam ser prevenidos. 2 O documento “Farmacovigilância<br />

em Portugal 25+”, publicado pelo INFARMED,<br />

refere que todos os anos morrem na União Europeia<br />

mais de 197 000 pessoas devido a reações adversas a<br />

medicamentos. 3,4 Adicionalmente, cerca de 30% das novas<br />

terapias dão origem a efeitos adversos que não são<br />

identificados durante os ensaios clínicos. 5 Face à dimensão<br />

destes números, é possível afirmar que assistimos<br />

todos os anos a uma pandemia silenciosa causada pela<br />

utilização inadequada de fármacos.<br />

Para além da gravidade da situação associada ao elevado<br />

número de mortes, é muito relevante e urgente olhar<br />

para os custos diretos para os sistemas de saúde associados<br />

à hospitalização devido à existência de efeitos<br />

adversos a medicamentos. Estes custos são uma componente<br />

chave do custo de estrutura nas análises económicas<br />

em saúde e estudos fármaco-económicos. Os<br />

dados avaliados em 31 estudos com uma média de 19<br />

meses, realizados em vários países Europeus, 12 estudos<br />

na Alemanha, Espanha, França, Inglaterra, Itália, Suécia,<br />

e 19 estudos nos EUA, mostraram que o custo direto<br />

acrescido por doente devido a efeitos adversos variava<br />

entre €702.21 e €40,273.08 em ambiente ambulatório<br />

e entre €943.40 e €7,192.36 em ambiente hospitalar. 6<br />

A variabilidade, entre os pacientes, na resposta aos medicamentos<br />

associada à farmacocinética e à farmacodinâmica<br />

tem sido tradicionalmente explicada por vários<br />

fatores tais como a demografia, a idade, a altura, o peso<br />

e o género. 7,8 Estes fatores são normalmente referidos<br />

nas bulas dos medicamentos e utilizados pelos médicos<br />

durante a prescrição. Desta forma, a decisão médica<br />

tem sido personalizada até certo ponto, no que diz respeito<br />

à utilização das melhores informações disponíveis<br />

no momento da prescrição de uma terapêutica para<br />

um paciente. 9<br />

Apesar da qualidade da informação existente para apoio<br />

à prescrição terapêutica ser muito elevada, existem custos<br />

associados à falha terapêutica e a efeitos secundários<br />

e reações adversas aos medicamentos que demonstram<br />

que esta informação está longe de ser suficiente.<br />

Com os avanços alcançados durante a última década na<br />

área da farmacogenética (também designada PGx), são<br />

vários os estudos que demonstram que a genética de<br />

um indivíduo pode afetar, de forma muito significativa, a<br />

segurança e a eficácia de um medicamento. 10,11 A variabilidade<br />

na resposta a um medicamento pode ocorrer<br />

como resultado da existência de diferentes características<br />

genéticas que interagem com os medicamentos<br />

prescritos. Esta interação pode traduzir-se em situações<br />

de toxicidade severa e/ou falta de eficácia do medicamento<br />

12 que requeiram modificação da terapêutica, pelo<br />

aumento ou diminuição da dose, a sua interrupção<br />

ou a utilização de uma alternativa. 13 A utilização da informação<br />

genética durante a prescrição do medicamento<br />

está a introduzir avanços significativos na personalização<br />

e precisão da medicina permitindo selecionar, para cada<br />

paciente, o medicamento certo na dose certa.<br />

Desta forma, a promessa da farmacogenética é a de<br />

que a utilização da informação genética de um indivíduo<br />

pode ajudar a prever a resposta a fármacos, permitindo<br />

uma ainda maior personalização da prescrição<br />

de medicamentos tornando-a mais segura, mais eficaz<br />

e com um melhor custo-benefício para o tratamento e<br />

para o doente.<br />

Em 2019, a UK Pharmacogenetics and Stratified Medicine<br />

Network organizou um evento para discutir a necessidade<br />

de melhorar a prescrição de medicamentos, visando<br />

beneficiar os tratamentos e diminuir custos com falhas<br />

terapêuticas e reações adversas. Foi reportado que no<br />

Reino Unido: 14<br />

• A maioria dos medicamentos normalmente prescritos<br />

(como é o caso dos antidepressivos) são eficazes<br />

em apenas 30-50% dos casos;<br />

• As reações adversas a medicamentos são responsáveis<br />

por 6,5% dos internamentos, sendo que 15% dos<br />

pacientes internados apresentam uma reação adversa a<br />

um medicamento durante a sua permanência no hospital;<br />

• Os internamentos por reações adversas correspondem<br />

a cerca de 8.000 dormidas/ano em leitos hospitalares,<br />

custando todo o processo ao estado mil milhões<br />

de libras.<br />

Para facilitar a prescrição dos testes de farmacogenética<br />

nos EUA, a American Medical Association (AMA)<br />

implementou códigos únicos para estes atos médicos<br />

em 2013, tendo realizado uma atualização da lista em<br />

2018. Muito recentemente, no início de 2020, a U.S. Food<br />

and Drug Administration (FDA) estendeu a lista de<br />

medicamentos para os quais a informação genética é<br />

determinante antes da sua prescrição, reforçando a utilização<br />

desta informação na prática clínica. 15,16<br />

Na Europa, em janeiro de 2019, o governo do Reino<br />

Unido apresentou um plano de longo prazo do NHS,<br />

que enfatizava o papel que a prescrição assertiva dos<br />

medicamentos pode desempenhar na promoção da saúde<br />

dos pacientes. 17 Para além do Reino Unido, países como<br />

a Estónia e a Holanda têm estado a implementar programas<br />

de avaliação do impacto dos testes de farmacogenética<br />

na prática clínica, com resultados muito significativos<br />

e incontornáveis. No caso particular da Estónia,<br />

após a realização de painéis de avaliação de múltiplos<br />

genes a mais de 44.000 pessoas, foi verificado que 99,8%<br />

dos indivíduos avaliados apresentaram um genótipo associado<br />

a risco aumentado de falta de eficácia ou efeitos<br />

secundários para pelo menos um medicamento. 18<br />

Uma das principais barreiras à implementação da farmacogenética<br />

na prática clínica tem sido a tradução do<br />

conhecimento sobre a interação genoma-fármaco para<br />

“<br />

ATUALMENTE, EXISTEM VÁRIAS<br />

ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS<br />

DE ELEVADA CREDIBILIDADE<br />

A DESENVOLVER ORIENTAÇÕES<br />

PARA APOIAR A PRESCRIÇÃO,<br />

CLARIFICANDO E IDENTIFICANDO<br />

A ASSOCIAÇÃO GENE-FÁRMACO.<br />

”<br />

uma ação clínica útil. Atualmente, existem várias organizações<br />

internacionais de elevada credibilidade a desenvolver<br />

orientações para apoiar a prescrição, clarificando<br />

e identificando a associação gene-fármaco. Algumas das<br />

organizações de referência são:<br />

• CPIC - Clinical Pharmacogenetics Implementation Consortium;<br />

19<br />

• DPWG - Dutch Pharmacogenetics Working Group; 20<br />

• CPNDS - Canadian Pharmacogenomics Network for<br />

Drug Safety. 21<br />

No contexto Europeu, foi também financiado pelo programa<br />

Horizon 2020, em 2016, o projeto “The Ubiquitous<br />

Pharmacogenomics (U-PGx) project - Implementing<br />

pharmacogenomics decision support across seven<br />

European countries (The Netherlands, Spain, UK, Italy,<br />

Austria, Greece, Slovenia) (http://upgx.eu/)”. Este projeto,<br />

concluído em dezembro de 2020, identificou e tornou<br />

público no seu website e em numerosos relatórios:<br />

1. Uma necessidade urgente para a implementação da<br />

farmacogenética na prática clínica, referindo que, nos<br />

próximos quatro anos, 50% dos pacientes idosos irão<br />

receber uma terapêutica que poderá ser otimizada via<br />

farmacogenética;<br />

2. Que 98% dos médicos inquiridos ao longo do projeto<br />

pensam que a farmacogenética pode ajudar a prever<br />

melhor a resposta ao medicamento;<br />

3. Que apenas 10% dos médicos sentem que atualmente<br />

possuem conhecimento e ferramentas adequadas<br />

à utilização de farmacogenética.<br />

Face a estas constatações, o projeto tem realizado um<br />

forte investimento em formação e divulgação junto dos<br />

profissionais de saúde, de entidades reguladoras e de<br />

companhias de seguros.<br />

No continente asiático, a Rede de Investigação Farmacogenómica<br />

do Sudeste Asiático (SEAPharm) foi esta- }<br />

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