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Gestão Hospitalar N.º 24 2021

#gestão em saúde, por Vasco Reis Homenagem Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração” Testemunhos de familiares e amigos Saúde Global Portugal na saúde global A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19 Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais? SNS: e agora para algo completamente diferente Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório A farmacogenética na prática clínica Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria? Liderança Digital: ENESIS 2020-22

#gestão em saúde, por Vasco Reis
Homenagem
Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração”
Testemunhos de familiares e amigos
Saúde Global
Portugal na saúde global
A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação
Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19
Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia
Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid
Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente
Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais?
SNS: e agora para algo completamente diferente
Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama
Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório
A farmacogenética na prática clínica
Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria?
Liderança Digital: ENESIS 2020-22

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GH homenagem<br />

”Testemunhos<br />

Damos vida à imagem<br />

que nos deixou<br />

Jorge Varanda<br />

Sócio de Mérito e Presidente da APAH (1988-1992)<br />

Natural de Coimbra, de que terá herdado<br />

a bonomia e um certo sentido de humor,<br />

foi nessa cidade que Vasco Reis fez os seus<br />

estudos, liceais e universitários.<br />

Pela minha parte, cheguei apenas a Coimbra<br />

em 1963 para iniciar o 2<strong>º</strong> Ciclo dos estudos liceais<br />

e aí me mantive até acabar a licenciatura em Direito,<br />

em 1968. Os quatro anos de diferença de idade fizeram<br />

com que Vasco Reis fosse finalista quando comecei a<br />

estudar no Liceu D. João III e que usasse já as fitas largas<br />

quando eu fui caloiro na Faculdade de Direito. Percorremos<br />

os mesmos lugares: a escadaria, o átrio e os corredores<br />

do Liceu e a parte velha da Universidade, mas<br />

não resta qualquer memória de algum eventual encontro<br />

ou cruzamento.<br />

O primeiro encontro deu-se só em 1970 no quartel do<br />

Lumiar, onde funcionavam os cursos da Escola Prática de<br />

Administração Militar. Vasco Reis era oficial miliciano e docente<br />

quando transitei de Mafra para o Lumiar no curso<br />

de especialização. Coube-me a especialidade de Licenciados<br />

em Direito que, provavelmente, teria sido a sua e lhe<br />

teria aberto ali a porta a atividades de docência.<br />

Visto à distância, pode dizer-se que foi o Conde de Lippe<br />

que nos aproximou, dada a preponderância do Código de<br />

Disciplina Militar no contexto do Direito Militar.<br />

Durante o curso de especialização, Vasco Reis levou-nos<br />

ao expoente da disciplina militar instituída pelo Conde<br />

Lippe, o presídio militar de Elvas, cujo forte foi por ele<br />

mandado construir cerca de duzentos anos antes. Nesses<br />

longínquos anos 70, o castigo dado aos indisciplinados da<br />

tropa era o de carregarem um barril mal cheio de água<br />

pela encosta do monte até ao topo, despejá-lo por um canal<br />

que a reconduzia à origem e voltar ao sopé para encher<br />

o barril e carregá-lo de novo, monte acima. Assim<br />

passavam os dias. O esforço físico era agravado pelo calor<br />

que fazia naquele dia que visitámos o forte e pelo chocalhar<br />

da água dentro da vasilha. O espírito disciplinador do<br />

Conde ainda sobrevivia quase dois séculos depois de ter<br />

reorganizado as forças militares portuguesas.<br />

Valeu para amenizar essa visita a uma realidade tão estranha<br />

aos nossos valores e costumes atuais um almoço de<br />

excelente comida alentejana na ilustre cidade de Elvas.<br />

Depois do Lumiar, só voltei a encontrar o Professor Vasco<br />

Reis em 1978 a meio do Curso de Administração Militar,<br />

curiosamente na vizinhança do Quartel do Lumiar<br />

onde nos tínhamos conhecido. O novo Professor de Administração<br />

<strong>Hospitalar</strong> vinha da prática de administração<br />

hospitalar nos antigos Hospitais Civis de Lisboa e de certo<br />

modo era um herdeiro apropriado, a nível do ensino,<br />

do Professor Coriolano Ferreira. Com tempo, estaria a<br />

gerar-se a herança deste último, bem ao estilo do seu<br />

pensamento, através de um ensino baseado na prática.<br />

Aliás, todo o Curso, estava desenhado desse modo, com<br />

aulas e estágios de assimilação da realidade.<br />

A partir do fim do Curso e do início das atividades profissionais<br />

cruzei-me uma vez ou outra com o Professor Vasco<br />

Reis na Escola Nacional de Saúde Pública na discussão<br />

de trabalhos dos alunos ou no apoio a estágios realizados<br />

no Centro <strong>Hospitalar</strong> das Caldas da Rainha, onde fui<br />

administrador principal entre meados de Dezembro de<br />

1979 e início dos anos 90. A meio dessa década, coube-<br />

-me coordenar as comemorações dos 500 anos do Hospital<br />

Termal Rainha Dona Leonor. Os Hospitais Civis interessaram-se<br />

depois pelo nosso programa de comemorações<br />

quando da preparação do V Centenário do Hospital<br />

de Todos os Santos, fundado em Lisboa em 1492.<br />

Assinalo ainda que, a meio dos anos 80, tive muito gosto<br />

em colaborar com o Professor Vasco Reis num painel<br />

Delphi para o trabalho que apresentou em 1986 “O Papel<br />

do Administrador Principal no Hospital Portuguêsˮ,<br />

no concurso para Professor Auxiliar da Cadeira de Administração<br />

<strong>Hospitalar</strong> da Escola Nacional de Saúde Pública,<br />

pedra basilar da sua carreira docente. Guardo, aliás, um<br />

exemplar que me ofereceu com uma dedicatória pessoal.<br />

Outro momento que posso recordar é o da discussão<br />

do meu curriculum apresentado em 1990 numa Comissão<br />

de Avaliação que ele integrava. Eu vinha de 10 anos<br />

de gestão no Centro <strong>Hospitalar</strong> das Caldas da Rainha e<br />

tinha um longo historial de colaboração com o Curso de<br />

Administração <strong>Hospitalar</strong> da ENSP. Em termos de resultados,<br />

orgulhava-me o aumento da produção dos dois<br />

hospitais que constituíam o Centro <strong>Hospitalar</strong> e, em particular,<br />

a redução da demora média que permitia tratar<br />

muitos mais doentes no respetivo Hospital Distrital. Lembro<br />

que Vasco Reis quis puxar por mim, não deixando a<br />

avaliação apenas por um terreno formal ou laudatório.<br />

Para isso é que servem as Comissões de Avaliação.<br />

Essa baixa da demora média aproxima-me de uma referência<br />

que Vasco Reis faz no texto que escreveu para o<br />

livro comemorativo dos 50 anos da carreira de Administração<br />

<strong>Hospitalar</strong> pela APAH em que ele identifica uma<br />

certificação de estadia nos Hospitais Civis de Lisboa, pela<br />

qual os médicos assistentes da cada doente eram conduzidos<br />

a fazer a previsão da alta do doente, com base<br />

numa justificação clínica. Recordo que o Dr. João Urbano<br />

colaborou com a gestão dos Hospitais Civis num trabalho<br />

de planeamento de altas, talvez nessa solução que tanto<br />

Carlos Pereira Alves<br />

Presidente da Direção da APDH<br />

Conheci o Vasco Reis a seguir ao 25 de abril<br />

nos Hospitais Civis de Lisboa (HCL), sendo<br />

ele Membro da Comissão Instaladora<br />

e eu vogal da Assembleia Geral de Trabalhadores<br />

do Hospital dos Capuchos.<br />

Desde aí, não sendo de convívio íntimo com o Vasco Reis<br />

e não tendo trabalhado com ele diretamente, iniciou-se<br />

uma longa viagem de encontros, convívio, reuniões, discussões<br />

e cumplicidades que me permitiram o conhecimento<br />

de Vasco Reis como homem e como profissional.<br />

Vasco Reis é por mim recordado como homem do lado<br />

do progresso, progresso em sentido lato, no seu sentido<br />

de progresso social, homem de contributos para uma<br />

Sociedade mais justa, mais equitativa, mais fraterna.<br />

Homem a favor do estado social, a favor de um Serviço<br />

orgulhou o Professor Vasco Reis.<br />

Todos nós sentimos a morte das pessoas que nos são<br />

próximas em termos de relacionamento. Todos nós, porém,<br />

sabemos que a morte é inevitável e que a soma<br />

dos anos nos aproxima desse fim no qual nos custa pensar.<br />

Cinquenta anos de carreira de administração hospitalar<br />

são, aliás, uma fatia considerável das vidas de quem<br />

os empreendeu em maior ou menor medida.<br />

Nessa perspetiva, não nos admiremos de termos perdido<br />

num espaço de tempo limitado os Drs. João Urbano,<br />

Eduardo Sá Ferreira, Cristiano de Freitas, Santos Cardoso<br />

e Vasco Reis.<br />

O Professor Vasco Reis foi o que mais consistentemente<br />

se dedicou em simultâneo ao exercício profissional e<br />

à docência, bem à imagem de Coriolano Ferreira. Lembrando<br />

os seus feitos e as suas qualidades, estamos a dar<br />

vida à imagem que nos deixou. Ã<br />

Pequena nota<br />

de reconhecimento e saudade<br />

Nacional de Saúde (SNS) como pilar essencial e fundamental<br />

da defesa da saúde, SNS não olhado como negócio,<br />

mas como um direito universal e gratuito no momento<br />

do cidadão dele necessitar.<br />

Para esse SNS, deu contributos para o seu desenvolvimento<br />

e organização como executivo nas suas funções<br />

nos HCL e como académico na Escola Nacional de Saúde<br />

Pública (ENSP).<br />

Vasco Reis era um homem da tolerância, do diálogo e de<br />

consensos, a favor da inclusão, jamais defendendo uma<br />

divisão da sociedade entre bons e maus.<br />

Homem de convicções e não de imposições. Homem da<br />

Liberdade e da defesa dessa mesma liberdade.<br />

Homem de convívio afável que lhe granjeou muitos amigos,<br />

como confirmado no jantar de homenagem que se<br />

realizou no restaurante Clara Jardim, ali tão perto do nosso<br />

inesquecível Hospital dos Capuchos.<br />

Por tudo isto, como disse Constantino Sakellarides na<br />

sessão de homenagem que lhe prestou a ENSP, “O Vasco<br />

vai fazer falta.ˮ<br />

Vasco Reis continuará presente e a fazer falta. Ã<br />

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