Gestão Hospitalar N.º 24 2021
#gestão em saúde, por Vasco Reis Homenagem Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração” Testemunhos de familiares e amigos Saúde Global Portugal na saúde global A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19 Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais? SNS: e agora para algo completamente diferente Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório A farmacogenética na prática clínica Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria? Liderança Digital: ENESIS 2020-22
#gestão em saúde, por Vasco Reis
Homenagem
Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração”
Testemunhos de familiares e amigos
Saúde Global
Portugal na saúde global
A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação
Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19
Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia
Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid
Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente
Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais?
SNS: e agora para algo completamente diferente
Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama
Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório
A farmacogenética na prática clínica
Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria?
Liderança Digital: ENESIS 2020-22
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GH homenagem<br />
”Testemunhos<br />
VASCO REIS<br />
Manuel Delgado<br />
Sócio de Mérito e Presidente da APAH (1992-2008)<br />
Um professor, um chefe, um colega e sobretudo<br />
um amigo. Foi com estes quatro<br />
chapéus que conheci e partilhei os últimos<br />
42 anos da minha vida com Vasco<br />
Reis. Sempre afável, sereno, atento às falhas<br />
mas também aos pequenos ou grandes sucessos, Vasco<br />
Reis sabia ser solidário, reunir consensos e liderar projetos.<br />
Fazia-o como ninguém, discretamente, dando liberdade<br />
de pensamento e de ação, incentivando quando a vontade<br />
esmorecia, discutindo em pé de igualdade caminhos<br />
ou soluções, partilhando sempre a autoria dos projetos,<br />
preocupando-se sempre com o futuro dos seus discípulos,<br />
abrindo-lhes portas, dando-lhes oportunidades.<br />
1. O Professor<br />
Vasco Reis foi um dos professores que mais admirei quando<br />
fui aluno do X Curso de Administração <strong>Hospitalar</strong>, da<br />
Escola Nacional de Saúde Pública. Conheci-o antes, quando<br />
realizei as provas de acesso finalizando com uma entrevista<br />
em que ele também esteve presente. Não me recordo<br />
já do conteúdo desses primeiros contactos, mas fiquei<br />
impressionado com a tranquilidade e segurança daquele<br />
plêiade de professores em que VR se integrava. Era um<br />
professor claro na mensagem, que combinava com elegância<br />
e sabedoria a parte teórica com a parte prática, nas<br />
suas aulas. Tive o privilégio de o ter como Gestor do Curso<br />
e de partilhar com ele várias reuniões ao longo de dois<br />
anos como delegado dos alunos. Recordo-me bem de um<br />
episódio complicado que tivemos de resolver: convidar<br />
um aluno a abandonar o curso, tal a visível inaptidão que<br />
o mesmo revelava todos os dias. VR demonstrou aqui o<br />
seu profundo sentido ético e humano, colocando em cima<br />
da mesa todas as soluções, dando ao aluno todas as oportunidades,<br />
reunindo de forma persistente e serena todos<br />
os prós e contras para a sua continuidade e, por fim, comunicando-lhe<br />
com cuidado e total dignidade a decisão final.<br />
Apesar de doloroso, o colega em causa saiu do curso<br />
aceitando bem a decisão tomada. Como professor, VR<br />
assumiu sempre um grande protagonismo na orientação<br />
académica dos alunos, quer na conceção e distribuição<br />
temporal do programa, quer na escolha dos locais de estágio,<br />
quer no apoio, sempre disponível, no aconselhamento<br />
e orientação dos alunos. Enveredou, entretanto,<br />
pela carreira académica, doutorou-se e assumiu funções<br />
de liderança na gestão da Escola Nacional de Saúde Pública.<br />
Fui seu colega como docente, e sei bem a importância<br />
que VR teve na atualização do Curso de Administração<br />
<strong>Hospitalar</strong>, na forma como defendia o profissionalismo na<br />
gestão dos hospitais e no brio e orgulho como protegia os<br />
seus discípulos. Era o porto seguro a cuja porta todos batiam,<br />
quando já em exercício profissional ou ainda como<br />
alunos, sempre que se colocavam decisões difíceis. Nunca<br />
regateava um conselho amigo, desinteressado e esclarecido.<br />
2. O Gestor<br />
Estagiei nos “velhos” mas sempre atuais HCL (Hospitais<br />
Civis de Lisboa) a partir de 1980 e tive aí o meu primeiro<br />
emprego como administrador hospitalar. VR era então o<br />
administrador da Comissão Coordenadora, com o médico<br />
Mateus Marques e a enfermeira Maria Silva. Faziam um<br />
trio notável, em que a combinação de competências, o nível<br />
ético e técnico dos protagonistas e a sua capacidade de<br />
liderança marcaram provavelmente um dos melhores períodos<br />
do grupo hospitalar. VR tinha, como colaboradores,<br />
um conjunto de jovens administradores hospitalares que<br />
desenvolveram novos métodos de gestão, criaram novos<br />
indicadores e começaram a dar os primeiros passos na governação<br />
clínica. Os HCL eram, ao tempo, uma das principais<br />
referências nacionais na administração hospitalar e<br />
isso deve-se muito ao trabalho de VR.<br />
3. O Amigo<br />
Cresci, como pessoa e profissional, com os ensinamentos<br />
e os conselhos de VR. Devo-lhe as oportunidades de carreira<br />
que sempre tinha a gentileza de me sugerir. A nossa<br />
amizade foi também crescendo e sempre contei com a<br />
sua experiência e conhecimentos em muitas conferências,<br />
congressos, debates e pareceres que, ao longo dos muitos<br />
anos em que presidi à APAH, patrocinei ou organizei.<br />
VR nunca esqueceu as suas raízes profissionais na administração<br />
hospitalar, mantendo sempre uma relação ativa<br />
e colaborante com os interesses dos profissionais, sentindo-se<br />
sempre um dos nossos. Nos últimos anos partilhei<br />
com VR mais a amizade do que o trabalho. Depois da sua<br />
aposentação veio também a minha e passamos a almoçar<br />
periodicamente, já livres da pressão dos acontecimentos. Foi<br />
uma nova fase do nosso relacionamento, e aquela que mais<br />
me ligou à sua personalidade e ao seu caráter. Tínhamos<br />
longas conversas que se estendiam por variadíssimos temas:<br />
a família, a saúde, os amigos, as férias, a política, etc. VR era<br />
uma pessoa de grandes princípios, de grande amor e uma<br />
ternura cativante pelos que mais amava: a mulher, os filhos<br />
e os netos. Estará sempre presente na minha vida como um<br />
exemplo a seguir. Almoçaremos juntos um dia destes. Ã<br />
MEMORANDO<br />
Pedro Lopes<br />
Presidente da APAH (2008-2013)<br />
O<br />
meu primeiro contacto com o Professor<br />
Vasco Reis ocorreu no ano de<br />
1984, na Escola Nacional de Saúde<br />
Pública, no momento em que realizava<br />
as minhas provas para a entrada<br />
para o curso na altura designado por “Curso de Administração<br />
<strong>Hospitalar</strong>”.<br />
Tive a honra e o privilégio da posterior ligação ao “nosso<br />
Professor” como seu aluno e ainda nos contactos<br />
necessários originados pelo facto de ser o Gestor do<br />
Curso de Administração <strong>Hospitalar</strong> na altura.<br />
Uma pessoa com uma personalidade muito vincada que<br />
não deixava ninguém indiferente, designadamente pela<br />
forma como abordava a relação quer como professor,<br />
quer como confidente, com o seu semblante majestoso<br />
e também coloquial/jocoso que só a sua elevação colocava<br />
no correto momento discursivo.<br />
Um professor muito atualizado que rasgava o status quo<br />
da “Administração” de influência francesa na linha dos<br />
“meninos de Rennes”, os nossos primeiros colegas formados<br />
na Ecole Nationale de Santé Publique e partilhava<br />
o discurso da “<strong>Gestão</strong>” de cariz essencialmente anglo-saxónico.<br />
Sempre preocupado com a nossa formação lembro-me<br />
bem das suas sugestões para a leitura de revistas de<br />
administração e gestão hospitalar, designadamente a<br />
“Gestion Hospitaliére” que ainda hoje acompanho com<br />
a sua leitura mensal no serviço de Documentação do<br />
meu hospital.<br />
O seu percurso profissional, iniciado na década de 60,<br />
em Coimbra, sua cidade natal, na Direção Geral da Saúde,<br />
na nova estrutura regional em criação, a Comissão<br />
Inter-<strong>Hospitalar</strong>, como técnico superior, seguido de vários<br />
cargos e desempenho como administrador hospitalar,<br />
nomeadamente de Administrador Geral dos Hospitais<br />
Civis de Lisboa que culminou com a ocupação<br />
do cargo de Administrador da Comissão Coordenadora<br />
desses mesmos hospitais foi relevantíssimo, não só pelo<br />
seu contributo para a gestão do hospital público português,<br />
mas também para o ensino, refletindo assim, todo<br />
este conhecimento prático no seu papel de docente na<br />
Escola Nacional de Saúde Pública.<br />
As suas aulas de Administração <strong>Hospitalar</strong> recheadas<br />
de conhecimento teórico traziam, também, as suas vivências<br />
da prática hospitalar que transmitia, muitas vezes,<br />
com episódios por si passados no ambiente da gestão<br />
hospitalar e recheados de momentos humorísticos,<br />
pitada de sal que tão bem administrava nos momentos<br />
presenciados por todos os alunos do curso de administração<br />
hospitalar.<br />
Não tendo trabalhado pessoalmente com o Professor<br />
Vasco Reis não posso, no entanto, deixar de mencionar<br />
o seu espírito inovador designadamente a criação do<br />
Sistema de <strong>Gestão</strong> Previsional Descentralizado (SGPD)<br />
que recolhia informação dos vários serviços dos hospitais<br />
do Grupo com vista à definição das estratégias de<br />
planeamento e gestão, sistema este referido no Livro<br />
“50 Anos em 20 Olhares” da Associação Portuguesa<br />
de Administração <strong>Hospitalar</strong> que passo a citar: “Lancei,<br />
por exemplo, um método baseado numa experiência<br />
americana…”.<br />
Da sua vasta obra como investigador, professor e gestor<br />
hospitalar, não posso deixar de salientar o seu contributo,<br />
para mim o maior, no estudo, análise e proposta<br />
de um novo Estatuto Jurídico do Hospital que culminou<br />
com a apresentação em Janeiro de 1997 do respetivo<br />
Relatório Final, na sequência da nomeação para Coordenador<br />
do Grupo de Trabalho criado pelo Despacho<br />
169/96, de 19 de Abril, da Ministra da Saúde Maria de<br />
Belém, com vista ao estudo e eventual modificação do<br />
estatuto jurídico dos hospitais.<br />
O detalhe histórico dos vários estatutos jurídicos dos<br />
hospitais e a abordagem e recomendações práticas, em<br />
particular a questão da autonomia dos hospitais que ainda<br />
hoje discutimos, estão plasmadas nesse portentoso<br />
documento que infelizmente não foi levado à prática na<br />
sua totalidade.<br />
Estes são pequenos apontamentos de uma vida plena<br />
de intervenções quer no panorama académico, quer no<br />
panorama gestionário dos hospitais públicos portugueses.<br />
Deixa saudades o nosso Professor Vasco Reis. Ã<br />
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