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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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mula que transportava a nossa bagagem e servir a ocupante da liteira. Tratava-se da muito

idosa Dama Timo, que eu nunca tinha conhecido antes. Quando por fim ela apareceu para

entrar na liteira, estava tão envolta em capas, véus e lenços que consegui apenas ficar com a

impressão de que era idosa de uma forma mais descarnada do que roliça, e que o seu perfume

fazia Fuligem espirrar. Acomodou-se no meio de um ninho de almofadas, cobertores, peles e

cobertas, e ordenou de imediato que as cortinas fossem fechadas e atadas, apesar da agradável

manhã. As duas pequenas aias que a tinham acompanhado até ali dispararam alegremente para

longe e deixaram-me sozinho, como seu único assistente. Fiquei com o coração apertado.

Tinha esperado que pelo menos uma delas viajasse com a Dama Timo. Quem iria cuidar das

suas necessidades pessoais quando a tenda fosse montada? Não fazia ideia do que era servir

uma mulher, e ainda menos uma tão idosa. Resolvi seguir o conselho de Bronco a um jovem

que tivesse de lidar com senhoras idosas: ser atento e educado, bem-disposto e agradável. As

velhas são facilmente conquistadas por um jovem simpático, ele tinha me dito. Aproximei-me

da liteira.

– Dama Timo? Está confortável? – perguntei.

Um longo intervalo se sucedeu sem resposta. Talvez ela fosse ligeiramente surda.

– Está confortável? – perguntei mais alto.

– Pare de me importunar, jovem! – foi a resposta surpreendentemente enérgica. – Se eu

precisar de você, eu te digo.

– Peço perdão – disse rapidamente.

– Pare de me importunar, já disse! – resmungou, indignada. E acrescentou, em meio-tom: –

Caipira estúpido.

Ao ouvir isso, tive o bom senso de ficar calado, embora a minha irritação tivesse

aumentado dez vezes. A esperança de que a viagem fosse alegre e divertida foi por água

abaixo. Sem querer, ouvi as trompas soarem e vi o estandarte de Veracidade erguido a

distância, à nossa frente. A poeira que voou na minha direção me indicou que a guarda

avançada tinha iniciado a viagem. Longos minutos se passaram antes que os cavalos adiante

começassem a se mexer. Mano forçou os cavalos que puxavam a liteira a andarem e eu

assobiei para Fuligem. Ela se colocou em movimento com boa vontade, e a mula, resignada,

nos seguiu.

Lembro-me bem desse dia. Lembro-me da poeira de todos os que nos precediam, pairando

espessa no ar à nossa frente, e de como Mano e eu conversávamos em voz baixa, pois, na

primeira vez que rimos alto, a Dama Timo gritou:

– Parem com esse barulho!

Também me lembro do azul-claro do céu formando um arco de colina a colina à medida que

seguíamos as ondulações suaves da estrada costeira. Do topo das colinas, a vista para o mar

era maravilhosa; e o ar, espesso e inebriante da fragrância das flores nos vales. Havia também

as pastoras, todas enfileiradas em cima de um muro de pedra soltando risinhos e apontando

para nós, corando enquanto passávamos. O seu rebanho lanoso espalhava-se pela ladeira atrás

delas, e Mano e eu soltamos exclamações de espanto ao ver como elas tinham posto as saias

coloridas de lado e as haviam atado num nó, deixando joelhos e pernas nuas ao sol e ao vento.

Fuligem estava inquieta e aborrecida com a lenta progressão, ao passo que o pobre Mano

constantemente dava pancadas nas costelas do velho pônei para forçá-lo a manter o passo.

Fizemos duas pausas durante o dia, para que os cavaleiros pudessem descer dos cavalos,

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