O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb
um ramo oscilando ou vislumbrar em algum lugar o gibão colorido, mas o fato é que não havianenhum indício da sua passagem.E nenhum significado discernível na sua mensagem absurda. Refleti sobre aquele estranhoencontro durante todo o caminho de volta à torre. Por fim, deixei-o de lado, considerando queaquilo tinha sido um acontecimento estranho, mas sem nenhuma importância.Não foi nessa noite, mas na seguinte, que Breu me chamou. Ardendo de curiosidade, subi asescadas correndo, mas, quando cheguei ao topo, parei, sabendo imediatamente que asperguntas teriam de esperar. Porque ali estava Breu, sentado à mesa de pedra, com Sorrateiroempoleirado no ombro e um novo rolo de pergaminho aberto na mesa diante dele. Um copo devinho servia de peso a uma das pontas do pergaminho enquanto o dedo encurvado de Breu semovia lentamente para baixo, por uma espécie de listagem. Olhei-a de relance. Era uma listade povoados e datas.Debaixo do nome de cada povoado havia um conjunto de valores – quantidade deguerreiros, mercadores, ovelhas, barris de cerveja, grãos e assim por diante. Sentei-me dolado oposto da mesa e esperei. Tinha aprendido a não interromper Breu.– Meu garoto – disse suavemente, sem levantar os olhos do pergaminho. – O que faria se umvalentão te surpreendesse pelas costas e te desse uma pancada na cabeça? Mas só quandoestivesse de costas. Como você lidaria com isso?Pensei por um instante.– Viraria as costas e fingiria estar olhando para outra coisa, mas teria um cajado longo egrosso nas mãos. Quando ele tentasse me dar a pancada, viraria e racharia a cabeça dele.– Hum. Sim. Bem, nós tentamos isso, mas não importa o quão distraídos pareçamos, osIlhéus sempre sabem quando estamos fingindo e nunca atacam. Bem, na verdade, conseguimosenganar um ou dois dos salteadores normais, mas nunca os Salteadores dos NaviosVermelhos. E são eles que queremos pegar.– Por quê?– Porque são os que estão nos atingindo mais. Está vendo, garoto, nós estamos habituadosaos ataques. Podemos quase dizer que nos adequamos a eles. Plantamos um hectare a mais,fazemos mais tecido, criamos mais um boi. Os nossos camponeses e habitantes da cidadetentam sempre produzir um pouco mais do que o estritamente necessário e, quando o celeirode alguém é queimado ou um armazém é incendiado durante a confusão de um ataque, todomundo aparece para ajudar a erguer outra vez as vigas. O problema é que os Salteadores dosNavios Vermelhos não se limitam a roubar e a destruir apenas o que precisam destruir noprocesso todo do roubo. Não. Eles vêm mesmo é com a intenção de destruírem tudo o quepodem, e quando levam alguma coisa com eles parece ser quase por acidente.Breu fez uma pausa e fitou a parede como se enxergasse através dela.– Não faz sentido – ele continuou a conjecturar, mais para si próprio do que para mim. – Oupelo menos não faz nenhum sentido que eu possa decifrar. É como matar uma vaca que dá à luzum bom bezerro todos os anos. Os Salteadores dos Navios Vermelhos ateiam fogo aos grãos eforragem que ainda estão nos campos. Matam todo o gado que não conseguem levar com eles.Há três semanas, em Terra Meeira, puseram fogo no moinho e rasgaram os sacos de grão efarinha que estavam lá. Que proveito eles tiram disso? Por que arriscam suas vidas com osimples intuito de destruir? Eles não fizeram nenhum esforço para conquistar territórios; nãotêm nenhum razão para desejar vingança contra nós que tenham sequer pronunciado. Contra um
ladrão podemos nos proteger, mas esses assassinos e destruidores são imprevisíveis. TerraMeeira não será reconstruída: a população que sobreviveu não tem nem vontade, nem recursosnecessários para fazer isso. Deixaram o local, uns se reunindo a familiares em outrospovoados, outros se tornando pedintes nas nossas cidades. É um padrão que começamos a vercom muita frequência.Suspirou e em seguida abanou a cabeça para desanuviá-la. Quando olhou para cima,concentrou-se totalmente em mim. Era um jeito que Breu tinha. Podia deixar um problema delado tão completamente que uma pessoa seria capaz de jurar que ele tinha se esquecido dele.E naquele momento anunciou, como se fosse esta a sua única preocupação:– Você vai acompanhar Veracidade quando ele for falar com o Duque Calvar em BaíaLimpa.– Bronco me disse isso também, mas ficou intrigado, assim como eu. Por quê?Breu pareceu perplexo.– Você não reclamou há alguns meses de estar cansado de Torre do Cervo e que queria vermais dos Seis Ducados?– Com certeza, mas duvido que seja por causa disso que Veracidade queira me levar.Breu riu.– Como se Veracidade prestasse atenção a quem faz parte do seu séquito. Ele não tempaciência para os detalhes; e, por conseguinte, não tem o talento de Cavalaria para lidar comas pessoas. Contudo, Veracidade é um bom soldado e, em longo prazo, talvez seja disso queprecisaremos. Não, tem razão. Veracidade não faz a mínima ideia da razão por que você vai.Mas o seu rei, sim. Ele e eu conversamos sobre isso. Está pronto para começar a retribuiraquilo que ele fez por você? Está pronto para começar o seu serviço para a família?Disse isso tão calmamente e olhou tão abertamente para mim que foi quase fácil ficartranquilo e perguntar:– Vou ter de matar alguém?– Talvez – ele se mexeu na cadeira. – Você é quem vai decidir isso. Decidir e fazer... édiferente de simplesmente ser comunicado: “Este é o homem e tem de ser feito”. É muito maisdifícil, e não estou completamente seguro de que você esteja pronto.– Algum dia eu estarei pronto? – tentei sorrir e arreganhei os dentes como se tivesse sidoacometido por um espasmo muscular. Fiz um esforço para tirá-lo do rosto, mas não consegui.Um estranho tremor passou por mim.– Provavelmente não – Breu ficou em silêncio e, em seguida, concluiu que eu tinha aceitadoa missão. – Você vai como criado de uma nobre senhora idosa que também participará daviagem, para visitar parentes em Baía Limpa. Não será uma tarefa muito difícil. Ela é muitoidosa e a sua saúde não é boa. Dama Timo viajará numa liteira fechada. Você vai cavalgar aolado dela, para ver se a liteira não balança demais, para trazer água se ela te pedir, e paratomar conta de quaisquer outros pequenos pedidos que ela lhe faça.– Não me parece muito diferente de tratar do cão de Veracidade.Breu fez uma pausa e sorriu.– Excelente. Essa será também sua responsabilidade. Torne-se indispensável a todas aspessoas nessa viagem. Então você terá razões para ir a todo lado e ouvir tudo, e ninguémquestionará a sua presença.– E a minha verdadeira tarefa?
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um ramo oscilando ou vislumbrar em algum lugar o gibão colorido, mas o fato é que não havia
nenhum indício da sua passagem.
E nenhum significado discernível na sua mensagem absurda. Refleti sobre aquele estranho
encontro durante todo o caminho de volta à torre. Por fim, deixei-o de lado, considerando que
aquilo tinha sido um acontecimento estranho, mas sem nenhuma importância.
Não foi nessa noite, mas na seguinte, que Breu me chamou. Ardendo de curiosidade, subi as
escadas correndo, mas, quando cheguei ao topo, parei, sabendo imediatamente que as
perguntas teriam de esperar. Porque ali estava Breu, sentado à mesa de pedra, com Sorrateiro
empoleirado no ombro e um novo rolo de pergaminho aberto na mesa diante dele. Um copo de
vinho servia de peso a uma das pontas do pergaminho enquanto o dedo encurvado de Breu se
movia lentamente para baixo, por uma espécie de listagem. Olhei-a de relance. Era uma lista
de povoados e datas.
Debaixo do nome de cada povoado havia um conjunto de valores – quantidade de
guerreiros, mercadores, ovelhas, barris de cerveja, grãos e assim por diante. Sentei-me do
lado oposto da mesa e esperei. Tinha aprendido a não interromper Breu.
– Meu garoto – disse suavemente, sem levantar os olhos do pergaminho. – O que faria se um
valentão te surpreendesse pelas costas e te desse uma pancada na cabeça? Mas só quando
estivesse de costas. Como você lidaria com isso?
Pensei por um instante.
– Viraria as costas e fingiria estar olhando para outra coisa, mas teria um cajado longo e
grosso nas mãos. Quando ele tentasse me dar a pancada, viraria e racharia a cabeça dele.
– Hum. Sim. Bem, nós tentamos isso, mas não importa o quão distraídos pareçamos, os
Ilhéus sempre sabem quando estamos fingindo e nunca atacam. Bem, na verdade, conseguimos
enganar um ou dois dos salteadores normais, mas nunca os Salteadores dos Navios
Vermelhos. E são eles que queremos pegar.
– Por quê?
– Porque são os que estão nos atingindo mais. Está vendo, garoto, nós estamos habituados
aos ataques. Podemos quase dizer que nos adequamos a eles. Plantamos um hectare a mais,
fazemos mais tecido, criamos mais um boi. Os nossos camponeses e habitantes da cidade
tentam sempre produzir um pouco mais do que o estritamente necessário e, quando o celeiro
de alguém é queimado ou um armazém é incendiado durante a confusão de um ataque, todo
mundo aparece para ajudar a erguer outra vez as vigas. O problema é que os Salteadores dos
Navios Vermelhos não se limitam a roubar e a destruir apenas o que precisam destruir no
processo todo do roubo. Não. Eles vêm mesmo é com a intenção de destruírem tudo o que
podem, e quando levam alguma coisa com eles parece ser quase por acidente.
Breu fez uma pausa e fitou a parede como se enxergasse através dela.
– Não faz sentido – ele continuou a conjecturar, mais para si próprio do que para mim. – Ou
pelo menos não faz nenhum sentido que eu possa decifrar. É como matar uma vaca que dá à luz
um bom bezerro todos os anos. Os Salteadores dos Navios Vermelhos ateiam fogo aos grãos e
forragem que ainda estão nos campos. Matam todo o gado que não conseguem levar com eles.
Há três semanas, em Terra Meeira, puseram fogo no moinho e rasgaram os sacos de grão e
farinha que estavam lá. Que proveito eles tiram disso? Por que arriscam suas vidas com o
simples intuito de destruir? Eles não fizeram nenhum esforço para conquistar territórios; não
têm nenhum razão para desejar vingança contra nós que tenham sequer pronunciado. Contra um