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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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da sua mãe. Sorri e fiquei feliz por ela.

O verão chegou, trazendo ventos mais quentes às nossas costas e, com eles, os Ilhéus.

Alguns vieram como mercadores honestos, com produtos das terras frias para fazer comércio

– peles, âmbar, marfim e garrafas de óleo – e relatos incríveis, daqueles que me faziam

arrepiar o pescoço, como os que eu ouvia quando era pequeno. Os nossos marinheiros não

confiavam neles e os chamavam de espiões e coisa pior, mas os produtos que vendiam eram

excelentes, e o ouro que traziam para comprar os nossos vinhos e grãos era sólido e pesado, e

os nossos mercadores o aceitavam.

Também havia outros Ilhéus que visitavam as nossas costas, embora não tão perto de Torre

do Cervo. Vinham com facas e tochas, com arcos e aríetes, para pilhar e destruir as mesmas

aldeias que tinham pilhado e destruído durante anos. Às vezes parecia uma competição

metódica e sangrenta, eles tentando encontrar aldeias desprevenidas ou mal-armadas, e nós

tentando atraí-los para alvos aparentemente vulneráveis, de modo que eles próprios fossem

massacrados e pilhados. Mas, sendo competição ou não, as coisas correram muito mal para

nós naquele verão. Em cada uma das minhas visitas à cidade, voltava cheio de notícias de

destruição e de queixas do povo.

Na torre, entre os homens de armas, havia um sentimento coletivo de imbecilidade que eu

compartilhava. Os Ilhéus driblavam os nossos navios de patrulha com facilidade e nunca

caíam nas nossas armadilhas. Atacavam sempre onde estivéssemos em menor número e mais

desprevenidos. O mais afrontado de todos era Veracidade, pois a ele cabia a tarefa de

defender o reino desde o momento em que Cavalaria tinha abdicado. Nas tabernas, eu ouvia

murmúrios de que, desde que ele tinha perdido o bom conselho do irmão mais velho, tudo ia

de mal a pior. Ninguém ainda falava contra Veracidade, mas era perturbador que ninguém

falasse com convicção a seu favor também.

Aos meus olhos de criança, os ataques dos Ilhéus pareciam algo distante, que não me

atingiam pessoalmente. É claro que era algo ruim, e eu sentia pena, de um jeito meio vago, dos

aldeões daquelas casas queimadas e saqueadas. Mas, com exceção do que acontecia em Torre

do Cervo, eu tinha pouca compreensão de toda vigilância e do medo constante que os outros

portos tinham de suportar, e das agonias dos aldeões que a cada ano tinham de reconstruir os

povoados, apenas para verem o resultado dos seus esforços arder no ano seguinte. Não sabia

disso naquela época, mas minha inocência ignorante não seria mantida por muito tempo.

Numa manhã, fui até Bronco para a minha “aula”. Para falar bem a verdade, costumava

gastar tanto tempo tratando dos animais e treinando potros, quanto sendo ensinado. Em grande

parte, eu tinha tomado o lugar de Garrano nas baias, enquanto este tinha se tornado o rapaz do

estábulo e tratador de cães de Majestoso, mas, nesse dia, para minha surpresa, Bronco me

levou ao andar de

cima, no seu quarto, e sentou-se comigo à mesa. Receei ter de passar uma manhã entediante

consertando arreios.

– Vou te ensinar boas maneiras hoje – anunciou Bronco subitamente.

Havia um tom de dúvida na voz dele, como se não acreditasse na minha capacidade em

aprender esse tipo de coisa.

– Com os cavalos? – perguntei, incrédulo.

– Não. Essas você já tem. Com as pessoas. À mesa e depois, quando as pessoas se sentam e

falam umas com as outras. Esse tipo de boas maneiras.

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