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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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resolver o que anda consumindo a sua alma. Devolva o cachorro à mãe, agora.

E assim fiz, mas a contragosto, e não totalmente seguro de que Bronco estivesse certo

quando dizia que me apegar ao cãozinho não resolveria coisa nenhuma. Ansiava pelo seu

pequeno mundinho caloroso de palha e irmãos e leite e mãe. Nesse momento não podia

imaginar nada melhor.

Então Bronco e eu fomos comer. Levou-me ao refeitório dos soldados, onde um homem

mostrava as maneiras que tinha e ninguém esperava conversa. Era reconfortante ser

despreocupadamente ignorado, ter comida passada sobre a cabeça sem ninguém ser atencioso

comigo. Mas Bronco prestou atenção ao que comi, e depois nos sentamos do lado de fora, em

frente à porta dos fundos da cozinha, e bebemos. Eu tinha tomado cerveja e vinho antes, mas

nunca tinha bebido com a determinação que Bronco agora me mostrava. Quando Tempero

ousou aparecer do lado de fora e o repreendeu por dar bebidas alcoólicas fortes a um mero

garotinho, ele a fitou com um dos seus olhares silenciosos que me lembrou da noite em que o

conheci, quando fez um salão inteiro de soldados ficar calado, em respeito pelo bom nome de

Cavalaria. E ela saiu.

Ele mesmo me acompanhou até o quarto, tirou a minha túnica, passando-a pela minha

cabeça, enquanto eu tentava me manter em pé, cambaleando ao lado da cama, e então ele me

jogou para cima do colchão despreocupadamente e lançou um cobertor sobre mim.

– E agora durma – ordenou numa voz grossa. – E amanhã faremos o mesmo. E sempre

assim. Até que um dia irá acordar e descobrir que seja lá o que for que aconteceu com você,

não veio para te matar.

Apagou a vela e saiu. A minha cabeça girava e o meu corpo doía depois de um dia de

trabalho, mas ainda assim não dormi. O que acabei fazendo foi chorar. A bebida tinha

libertado um nó qualquer que me mantinha sob controle, e eu chorei. E não silenciosamente.

Solucei e gemi com o queixo tremendo. Minha garganta se fechou, o meu nariz começou a

escorrer incessantemente, e chorei com tanta força que tive a sensação de que não podia

respirar. Penso que chorei cada lágrima que não tinha derramado desde o dia em que o meu

avô tinha forçado a minha mãe a me abandonar.

– Mero! – eu me ouvi gritar, e subitamente havia braços à minha volta, segurando-me com

firmeza.

Breu me segurou e me embalou como se eu fosse uma criança de colo. Mesmo na escuridão,

reconhecia aqueles braços ossudos e o cheiro de ervas e pó. Descrente, agarrei-me a ele e

chorei até ficar rouco, com a boca tão seca que não produzia som algum.

– Você tinha razão – disse, falando para o meu cabelo, calmo, plácido. – Você tinha razão.

Eu estava te pedindo para fazer algo errado, e você fez bem em recusar. Não será testado

dessa forma outra vez. Não por mim.

Quando finalmente fiquei quieto, deixou-me só por algum tempo e, quando voltou, trazia

para mim uma bebida, morna e quase sem sabor, mas que não era água. Levou a caneca à

minha boca, e bebi sem fazer perguntas. Em seguida, deitei-me para trás, tão subitamente

sonolento que nem sequer me lembro de Breu deixar o quarto.

Acordei quase de madrugada e me reportei a Bronco depois de um café da manhã

substancial. Fui rápido na execução de todas as tarefas e atento aos meus deveres, e não

conseguia compreender por que é que ele tinha acordado maldisposto e com dores de cabeça.

Ele resmungou qualquer coisa sobre “a mesma cabeça do pai para o álcool” e me dispensou

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