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progredindo sob o olhar aprovador de Breu.
Logo ele começou a me usar para pequenas tarefas na torre. Nunca me dizia, antes do
tempo, se eram testes às minhas habilidades ou verdadeiras missões que desejava ver
cumpridas. Para mim não tinha nenhuma diferença: executava cada uma delas com
determinação e devoção a Breu e a tudo o que ele me ordenava. Na primavera desse ano,
preparei as taças de vinho de uma delegação visitante de mercadores de Vilamonte para que
ficassem muito mais bêbados do que pretendiam. Mais tarde, nesse mesmo mês, escondi um
boneco de uma trupe de teatro de marionetes, para que tivessem de apresentar o Incidente das
Taças Correspondentes, um breve conto popular, em vez do longo drama histórico que haviam
planejado para aquela noite. No Festival do Solstício, adicionei uma certa erva à chaleira que
continha o chá da tarde de uma criada, de modo que ela e três amigas suas fossem acometidas
por diarreia e não pudessem servir à mesa naquela noite. No outono, amarrei uma linha em
volta do calcanhar do cavalo de um nobre visitante, para que o animal ficasse
temporariamente manco, convencendo o nobre a permanecer em Torre do Cervo por dois dias
a mais do que havia planejado. Nunca sabia das razões por trás das tarefas que Breu me dava.
Naquela idade, concentrava os meus pensamentos em como fazer uma coisa e não no porquê
dela. E isso, também, era algo que creio ter sido ensinado intencionalmente para mim:
obedecer sem questionar a razão por que a ordem foi dada.
Houve uma tarefa que me deliciou. Mesmo na ocasião, sabia que a missão era mais do que
um capricho de Breu. Ele me chamou no final da noite, um pouco antes da madrugada.
– Dom Falcorreia e a sua dama estão aqui de visita, desde duas semanas atrás. Você os
conhece de vista; ele tem um bigode muito longo e ela vive ajeitando o cabelo, mesmo à mesa.
Sabe de quem estou falando?
Franzi a sobrancelha. Muitos nobres estavam reunidos em Torre do Cervo para formar um
conselho com o intuito de discutir o aumento de invasões dos Ilhéus. Pelo que eu tinha
percebido, os Ducados Costeiros queriam mais navios de guerra, mas os Ducados do Interior
opunham-se à partilha dos impostos para aquilo que viam como um problema puramente
costeiro. Dom Falcorreia e a Dama Dália eram do interior. Falcorreia e os seus bigodes
pareciam ter um temperamento instável e estar constantemente em comoção. A Dama Dália,
em contrapartida, parecia não se interessar muito pelo conselho, e passava a maior parte do
tempo explorando Torre do Cervo.
– Ela sempre usa flores no cabelo? Que vivem caindo?
– Essa mesma – respondeu Breu enfaticamente. – Bem. Você a conhece. Agora, esta é a
missão, e não tenho tempo de planejá-la em mais detalhes com você. Num dado momento
durante o dia de hoje, ela vai enviar um mensageiro ao quarto do Príncipe Majestoso. O
mensageiro irá entregar qualquer coisa – um bilhete, uma flor, um objeto qualquer. Você
deverá retirar esse objeto do quarto de Majestoso antes que ele o veja. Entendeu?
Eu concordei e abri a boca para dizer algo, mas Breu se levantou subitamente e quase me
expulsou do quarto.
– Não temos tempo, já está quase amanhecendo! – anunciou.
Eu dei um jeito de estar no quarto de Majestoso, escondido, quando a mensageira chegou.
Pela maneira como a mocinha entrou no quarto, convenci-me de que não era a sua primeira
missão. Colocou um pequeno rolo de pergaminho e um botão de flor na almofada de
Majestoso e esgueirou-se para fora do quarto. No instante seguinte, ambos os objetos estavam