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O Aprendiz De Assassino - Saga - Robin Hobb

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Que pedido para fazer a um garotinho. Mesmo assim, creio que algo em mim eriçou os meus

pelos da nuca e farejou com desconfiança a ideia, mas, garotinho que era, não pude encontrar

nenhuma objeção. Além disso, a curiosidade me roía por dentro.

– Eu posso aprender a fazer isso.

– Ótimo – ele sorriu, mas o rosto mostrava cansaço, e não tinha a aparência de estar assim

tão satisfeito quanto àquilo. – Por enquanto, é suficiente. Mais do que suficiente – olhou em

volta do quarto. – Podemos começar esta noite. Vamos primeiro arrumar um pouco isso aqui.

Há uma vassoura ali. Ah, mas antes de qualquer coisa, tire essa camisola e vista algo... ah, há

uma velha túnica aqui. Por enquanto, vai servir. Não podemos ter o pessoal da lavanderia se

perguntando por que é que a sua camisola cheira a cânfora e a analgésico, não é? Agora: varra

o chão que eu vou arrumar umas coisas.

E assim se passaram as horas seguintes. Eu varri e esfreguei o chão de pedra. Ele me

orientou enquanto eu limpava a parafernália na grande mesa. Virei as ervas sobre a grelha

onde secavam. Dei de comer aos três lagartos que ele mantinha enjaulados num canto,

cortando alguns pedaços de carne velha e pegajosa que eles engoliram de uma só vez. Limpei

vários potes e tigelas e os guardei. Ele trabalhava ao meu lado, parecendo grato pela

companhia, e papeava comigo como se fôssemos ambos velhos. Ou ambos jovens.

– Nada de letras ainda? Nada de cifras? Que absurdo! O que é que o velho está pensando?

Bem, vou me assegurar de que isso seja resolvido logo. Você tem as sobrancelhas do seu pai,

garoto, e o mesmo jeito de franzi-las. Alguém já tinha te falado isso? Ah, aí está, Sorrateiro,

seu patife! O que é que você anda aprontando?

Uma doninha marrom apareceu por trás de uma tapeçaria, e fomos apresentados um ao

outro. Breu me deixou alimentar Sorrateiro com ovos de codorna de uma tigela que estava em

cima da mesa e riu quando o pequeno animal me perseguiu, mendigando por mais. Deu-me um

bracelete de cobre que achei debaixo da mesa, avisando que poderia deixar o meu pulso verde

e que, se alguém me perguntasse sobre ele, deveria dizer que o tinha encontrado atrás do

estábulo.

Em dado momento, paramos para comer bolos de mel e beber vinho quente com

especiarias. Sentamo-nos em uma mesa baixa, sobre uns tapetes em frente à lareira, e observei

a luz do fogo dançando no rosto cheio de cicatrizes dele e perguntei a mim mesmo por que

antes tinha achado aquilo tão assustador. Ele percebeu que eu o observava, e suas feições se

contraíram num sorriso.

– Ele te parece familiar, não é, garoto? O meu rosto, eu quero dizer.

Não parecia. Eu estava era vendo as cicatrizes grotescas na pele pálida. Não fazia ideia do

que ele queria dizer. Encarei-o intrigado, tentando descobrir o que era.

– Não se preocupe com isso, garoto. Deixa marcas em todos nós, e mais cedo ou mais tarde

você vai se acostumar com elas. Mas por enquanto, bem... – ele se levantou, espreguiçandose,

de tal forma que a sua túnica revelou umas coxas magras e brancas. – Agora é tarde. Ou

cedo, dependendo de que parte do dia você gosta mais. É tempo de voltar à sua cama. Agora.

Você vai se lembrar de que tudo isso é ultrassecreto, não vai? Não só este quarto, mas a coisa

toda, o acordar à noite e as lições sobre como matar pessoas, e tudo isso.

– Vou me lembrar, sim – disse-lhe e então, percebendo-me de que talvez significasse algo

para ele, acrescentei: – Tem a minha palavra.

Ele gargalhou e em seguida concordou, quase com tristeza. Troquei de roupa, vestindo outra

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